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Criar seres novos têm sido, por bilhões de anos, o privilégio da Natureza, através do
processo contínuo de mutação e seleção natural e por outros mecanismos de alteração
do DNA que agora começam a ser compreendidos. Mas a humanidade sempre "criou"
seus próprios seres, geralmente extraordinários. Os gregos eram particularmente
imaginativos, e a mitologia clássica é cheia de monstros como a Quimera, o cão Cérbero,
o Minotauro, a Medusa e um sem-número de outros híbridos. Como se verá mais adiante,
a palavra quimera foi tomada de empréstimo na mitologia para designar as construções
artificiais de moléculas (em geral DNA). Inicialmente a imaginação do homem atribuía a
algum deus a geração dos seres monstruosos ou, ao contrário, extraordinariamente belos.
A idéia de que estes seres podiam ser fabricados por um ser humano só veio muito
depois, mas em várias partes do mundo os homens criaram "protocolos" para a geração
de vida a partir de material "morto", desde simples insetos até o próprio ser humano. A
partir do meio do século XVIII a ciência começou a mostrar a verdadeira face da criação e
a esclarecer a origem das ossadas que eram em parte o combustível para a imaginação
dos homens naquele tempo: a vida só podia ser criada a partir da vida e os ossos
imensos ou estranhos achados em toda a parte eram de seres extintos, mas que tinham
sido produto da Natureza, como todos os demais.
Entretanto, a criação de híbridos de verdade é muito mais difícil do que insinua o
cinema ou pensam as pessoas, porque a maior parte das espécies têm algum tipo de
restrição para o cruzamento com uma espécie diversa. Na melhor das hipóteses o híbrido
costuma ser estéril. Esta é a regra entre animais. Os híbridos entre vertebrados, por
exemplo, são raros, e quando ocorrem, em geral são estéreis. É o caso da mula e do
burro, híbridos de cavalos e jumentos. Entre plantas, contudo, a obtenção de híbridos é
muito mais fácil e uma enorme fração das plantas que hoje cultivamos é produto de
cruzamento entre duas ou mais espécies.
Uma abordagem mais simples à produção de novas formas de vida (ao menos em
teoria) é a clonagem de genes de um organismo e a transfecção destes para outro
organismo. A vantagem desta abordagem é que se pode selecionar da espécie doadora
apenas as marcas que interessam, evitando a introdução de genes indesejados.
Adicionalmente, ela permite (também em teoria...) total controle sobre a construção final,
contornando as recombinações que a Natureza produz durante a reprodução sexuada
(entre indivíduos da mesma espécie ou não).
Clonar genes parece simples a princípio, mas as ferramentas para cortar DNA e
"emendar" os fragmentos com um vetor (DNA que se replica e que desta forma conserva
o pedaço "emendado" nele, chamado inserto) não eram conhecidas até o meio da década
de 70.
1. Primeiros passos
Como não havia uma forma simples e precisa de cortar DNA numa sequência ou
posição específicas, produzindo segmentos de extremidades conhecidas, era impossível
unir de forma eficiente um segmento de DNA de doador com as extremidades de um vetor
(viral ou plasmidial, como veremos mais adiante). A falta desta tesoura molecular
restringiu durante anos o avanço da nascente "engenharia genética", nome que a mídia
deu ao que se chama nos meios acadêmicos de tecnologia do DNA recombinante. Além
disso, o fato de todos os primeiros vetores de clonagem terem sido vírus que infectam o
homem fez da engenharia genética uma tecnologia de alto risco. As legislações foram,
compreensivelmente, duríssimas no princípio, com uma opinião pública inteiramente
desfavorável, como ocorre hoje com a questão da clonagem de mamíferos. O cuidado
era, contudo, muito importante. Apesar de todo cuidado, e um pouco antes das tentativas
de se fazer engenharia genética de forma sistemática e abrangente, o SV40 acabou
sendo o protagonista de uma infecção acidental de milhões de pessoas, através da vacina
de poliomielite, nas décadas de 50 e 60. A infecção pelo SV40 não provocou, até onde se
pode saber, qualquer problema de saúde nos indivíduos infectados, apesar de
potencialmente ser possível a ação direta do vírus no organismo ou através de sua
recombinação in vivo com o S2, um vírus humano.
Figura 1: A restrição controlada pela hospedeira: Fagos que se desenvolvem bem numa certa linhagem
de bactéria, frequentemente produzem uma progênie pequena quando infectam pela primeira vez uma outra
linhagem da mesma bactéria, mas os poucos fagos sobreviventes prosperam .
Como poderia ser este "aprendizado"? Afinal, quando um fago entra na bactéria,
apenas o seu DNA subsiste e se replica, ficando o capsídeo do lado externo da
hospedeira. Então, todo o processo de adaptação teria que estar ligado ao DNA. Vejamos
a hipótese de Arber (mostrada de forma esquemática na figura a seguir):
Aqui cabe uma pergunta: como a bactéria "decide" se uma sequência deve ser modificada ou restrita? As
enzimas de restrição (E.R.) estão dispersas no citosol bacteriano, mas as de modificação em geral têm uma
proximidade com o aparato de replicação do DNA. Por isso, um DNA invasor é mais provavelmente restrito
antes de ser modificado. Ao contrário, o DNA bacteriano recém sintetizado (uma fita nova, já que a outra,
velha, já está modificada) será provavelmente modificado na fita nova antes de ser restrito. Além disso, uma
hemi-metilação também confere um razoável grau de proteção contra o ataque de enzimas de restrição, o
que faz com que o DNA bacteriano seja essencialmente imune à ação da enzima de restrição da própria
bactéria. De forma equivalente, o DNA viral, que não tem nenhuma metilação, é muito mais sensível ao
corte pela E.R..
Pelas suas descobertas, Hamilton Smith recebeu o Prêmio Nobel em Fisiologia ou
Medicna em 1978, dividindo a premiação, merecidamente, com Arber e Nathan. As
palestras dos três laureados, Arber, Nathans e Smith, com uma descrição de seus
trabalhos, estão também disponíveis no site de downloads, no formato pdf.
Como vimos acima, cada bactéria possui em geral uma enzima que reconhece uma
sequência de DNA curta, com 4 a 12 pares de bases. Nas diferentes bactérias estes sítios
têm em sua maioria uma característica comum: a de terem a mesma sequência de bases
quando lidas nas duas fitas complementares. As sequências abaixo, reconhecidas pela
enzimas de restrição EcoR1 (obtida da Escherichia coli) e HindIII (obtida de Hemophilus
influenzae) exemplificam o que chamamos de sítio de restrição. Observe a sequência e
veja sua simetria. Sequências de DNA fita dupla com estas características são chamadas
palíndromos.
Figura 3: As setas indicam a ponte fosfodiester clivada pelas enzimas EcoRI e HindIII. A linha indica o eixo
de simetria do palíndromo
Quando uma enzima de restrição digere o DNA, ela produz um corte em cada fita,
podendo resultar em extremidades colantes ou adesivas, como as geradas pelas enzimas
acima, ou extremidades cegas, isto é, sem bases despareadas. Cada vez que elas
encontram um sítio de restrição que lhes é próprio, clivam o sítio.
Figura 4: Ação da enzima de restrição EcoR1, com geração de extremidades colantes(ou adesivas) e
união de fragmentos de DNA de origens distintas
Os sítios de restrição ocorrem ao acaso no DNA e tanto mais freqüentes são quanto
mais curtos. A probabilidade de se ter uma seqüência qualquer definida de seis bases é
(1/4)6, isto é 1: 4096. Uma enzima que reconheça um sítio de restrição de 12 bases
cortará o DNA com uma freqüência muito baixa. Após a digestão de um DNA longo por
uma enzima de restrição muitos fragmentos são gerados, tanto menores quanto maior for
o sítio de restrição.
Para finalizar: qual a vantagem para um fago ter um sítio de restrição alvo de uma
determinada enzima? Nenhuma, evidentemente, mas como os sítios ocorrem ao acaso, é
provável que um fago possa ser restrito por várias de suas potenciais hospedeiras. Por
outro lado, qual a vantagem para uma bactéria em ter uma enzima de restrição que
reconhece sítios com 10 pb? Não será muito raro encontrar um sítio destes num fago?
Provavelmente estas bactérias tem uma gama bastante restrita de fagos que lhes são
infectivos e por isso não precisam estar prontas para clivar sítios frequentes, mas apenas
aqueles que existem nos seus fagos invasores. Como a Natureza estabelece este
balanço é uma questão de estudos ainda.
4. Vetores (falta)
5. Construção de Bibliotecas
O processo se inicia pela extração do DNA das células doadoras e do plasmídeo
(neste exemplo, um plasmídeo pequeno, de aprox. 2,5 kpb, da bactéria E. coli). A
extração de DNA não é um processo complexo: resumidamente, as células são lisadas
com um detergente, os restos celulares e boa parte das proteínas precipitadas por
centrifugação em presença de uma concentração elevada de sal (em geral acetato de
potássio) e o sobrenadante, transferido para outro tubo, é misturado com isopropanol. O
DNA não é solúvel neste álcool, mesmo diluído com água, e tende a precipitar. Para
acelerar o processo centrifuga-se o material a 13.000 rpm por alguns minutos e o
precipitado é ressuspenso ém água ou num tampão adequado. O DNA que se obtém
desta forma não é muito limpo, mas serve para uma boa parte das aplicações corriqueiras
de laboratório. Atualmente kits comerciais permitem a extração rápida de DNA de
praticamente qualquer tipo de célula, em quantidades e grau de pureza que satisfaçam ao
mais exigente pesquisador.
Uma vez com os dois DNAs disponíveis (doador e plasmidial), resta cortá-los com
a enzima de restrição escolhida e misturar os dois DNAs. A tendência será parear as
extremidades coesivas, formando construções híbridas, ou quimeras. A adição de ligase
completa a cadeia fosfodiéster em cada uma das fitas de DNA. Este passo está
representado na parte superior da figura abaixo.
Figura 5: Esquema para a obtenção de plasmídeos recombinantes, a partir do uso de uma enzima de
restrição que cria extremidades coesivas. Para maiores detalhes veja o texto abaixo.
Ao menos 5 produtos distintos podem ser formados a partir desta mistura. O
produto 1 é o desejado, no qual um inserto (verde) foi clonado no plasmídeo (vermelho).
Mas, lamentavelmente, outras construções também aparecem: o produto 2 é o mais
danoso ao processo, pois se trata do plasmídeo vazio, fechado sem inserto. Ele é
perfeitamente funcional e não pode ser descartado do processo. O produto 3 é a
circularização de vários fragmentos de DNA do doador, numa ordem qualquer. Este "lixo"
não é problemático, porque não contém uma origem de replicação bacteriana. É um DNA
que será perdido ao longo do tempo. O produto 4 é a união de dois (ou mais) plasmídeos
e não se replica tão rápido quando o plasmídeo vazio ou carregado com apenas um
inserto, de forma que acaba desaparecendo ao longo do tempo. O último "lixo" é o
plasmídeo carregado com vários insertos catenados (ligados em cadeia) ou com um
inserto muito grande. É uma construção instável, também, e tende a desaparecer. Assim,
excetuando o plasmídeo vazio, todos as outras quimeras "lixo", uma vez na bactéria,
tendem a desaparecer e não são um problema para o experimentador.
Uma vez ligado o inserto com o plasmídeo (e produzidos os vários possíveis lixos,
também), é preciso introduzir estas construções na bactéria hospedeira. Isto é feito pela
entrada passiva de DNA através da membrana de bactérias previamente tratadas com
uma solução de cloreto de cálcio, ou ativamente, através de choques elétricos, num
processo chamado eletroporação. A eficiência de transformação (entrada de DNA na
bactéria) é bastante baixa (10 -3 a 10-8), mas os transformantes terão o plasmídeo dentro
deles, o que lhes deve conferir propriedades novas, que permitam uma seleção positiva.
De fato, os plasmídeos têm uma gene que confere à bactéria a resistência a um certo
antibiótico (suponhamos, ampicilina), de forma que basta adicionar ampicilina ao meio e
eliminaremos rapidamente todas as bactérias que não tiverem plasmídeo (vazio ou
carregado).
E como se ver livre do "lixo" representado pelas bactérias que têm o plasmídeo
vazio? Não é possível, pois o plasmídeo vazio confere a mesma resistência ao antibiótico
que o plasmídeo carregado. Entretanto, é possível averiguar ao menos se, no conjunto de
plasmídeos formados, a maior parte está carregada (com inserto) ou, ao contrário, vazia.
Para tal os plasmídeos de clonagem têm uma segunda marca de resistência a antibióticos
(em geral, tetraclina), que é perdida quando o plasmídeo é aberto e o inserto é clonado.
Significa dizer que o sítio de clonagem é interno ao gene para a resistência à tetraciclina.
Significa também dizer que as bactérias que têm plasmídeos vazios são resistentes a
ampicilina e tetraciclina, enquanto as que têm plasmídeos com inserto só mostram
resistência a ampicilina. O procedimento baseia-se na obtenção de uma réplica de uma
placa de Petri contendo colônias crescidas em presença de ampicilina, que é então
carimbada sobre uma nova placa de Petri contendo tetraciclina. As colônias que
crescerem também em tetracilcina não interessam, mas podem ser contadas. A figura
abaixo mostra esquematicamente o procedimento, desenvolvido para outros fins, há
quase 50 anos, por Joshua Lederberg, que também recebeu o Prêmio Nobel pelos seus
estudos (Joshua Lederberg, George Beadle e Edward Tatum receberam o prêmio Nobel
de Fisiologia ou Medicina em 1958. Lederberg provou a existência da recombinação
genética em bactérias e contribuiu de forma importante para o conhecimento da
organização gênica de microrganismos. Beadle e Tatum mostraram que os genes agem
regulando eventos químicos definidos. As Palestras Nobel dos três pesquisadores estão
disponíveis no site de downloads).
Você pode ver uma animação da clonagem em plasmídeos neste site (é um arquivo muito
grande e exige que você tenha o QuickTime movie player instalado):
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/data/mcb/pictures/ch7/ch7anim2.mov
Figura 6. O processo conhecido como réplica, na qual um carimbo de veludo estéril, facilmente
improvisado sobre um cilindro de madeira, serve para transferir um pouco de bactérias de cada colônia de
uma placa para outra. Após 24 horas o crescimento na nova placa é avaliado. Neste caso a primeira placa
contém meio de cultura adicionado de ampicilina, enquanto na segunda o meio contém tetraciclina. Da
figura pode-se concluir que a maior parte das bactérias da amostra é sensível à tetraciclina e alberga,
portanto, plasmídeos recombinantes (quiméricos, ou com inserto).
Neste e nos próximos sub-itens vamos discutir as razões pelas quais um gene
eucarioto em geral não pode ser expresso num procarioto se clonado diretamente num
plasmídeo ou fago. Vamos discutir que estratégia pode ser adotada para contornar esta
limitação. Vamos também discutir como deve ser o desenho de um plasmídeo (ou outro
vetor) de expressão para permitir a produção de proteína a partir do gene clonado. E
veremos como deve ser a hospedeira para que o produto final seja de interesse para o
pesquisador. Por fim, vamos discutir como são as proteínas recombinantes, ou quimeras,
e como podemos nos beneficiar destas construções protéicas artificiais.
Como mostrado na aula 2, é comum nos eucariotos que o quadro aberto de leitura
ou ORF (a região do gene que vai deste o primeiro ATG a ser traduzido até o códon de
terminação) seja interrompido por um ou mais trechos de DNA que não serão
posteriormente traduzidos, pois serão retirados do conjunto, no nível do RNA, no
processo de maturação do RNA mensageiro. Este mecanismo de retirada de segmentos
de DNA não codificantes, chamados íntrons, é conhecido como splicing.
A figura abaixo mostra uma estrutura hipotética, genérica, de um gene eucarioto, e
a geração de um mRNA eucarioto por splicing e adição de cauda poli-A, acompanhadas
de modificação da extremidade 5´(capping). Adicionalmente, mostramos como seria a
organização de um mRNA com introns, produzido a partir do mesmo segmento gênico,
por um procarioto (por exemplo, a bactéria hospedeira de um plasmídeo recombinante).
Figura 7: Após a produção do transcrito primário, os spliceossomos aproximam o fim e o início de exons
adjacentes e formal um laço com o intron, preparando o conjunto para a retirada da região intrônica (1). O
RNA gerado após o splicing dos introns (2) ainda não é um mRNA maduro, pois terá ainda retirada uma
porção 3´ após o sinal de poliadenilação, deverá receber uma cauda poli-A e a modificação da extremidade
5´(cap 7-metil-guanosina) (3). Um procarioto não é capaz de realizar o splicing e o sistema de tradução
considerará como mRNA válido o RNA transcrito primário (4), desde que os ribossomos possam se ligar ao
RBS da sequência (nos sistemas de clonagem com expressão veremos que o RBS faz parte do vetor).
É fácil, após a análise da figura acima, entender que um procarioto não será capaz
de produzir uma proteína igual àquela produzida pelo eucarioto, se iniciar o processo com
genes contendo introns. Na verdade, mesmo um outro eucarioto poderá não fazê-lo se o
sistema de splicing não compreender os sinais de splicing (sequências de bases) contidos
no início e no fim dos introns. Por isso, a estratégia para se clonar e expressar genes
eucariotos tem que ser distinta da apresentada na aula 5.
O processo se inicia pela extração do mRNA. Este processo é, do ponto de vista
bioquímico, semelhante ao processo de extração de DNA, porém o RNA é muito lábil,
sujeito à ação das RNAses do próprio organismo e de praticamente qualquer fluido
biológico, inclusive a água não autoclavada. Tomadas as devidas precauções (e
empregando kits comerciais, de preferência) pode-se obter uma boa quantidade de RNA
praticamente a partir de qualquer célula eucariota. Mas o que queremos é mRNA, e não
RNA total (uma mistura de RNA heterogêneo nucelar, RNA transportador, RNA
ribossomal e pequenos RNAs do núcleo, além de mRNA). Por isso, empregamos uma
segunda etapa de purificação, onde o mRNA é separado por cromatografia de afinidade
dos demais RNAs. Geralmente se usa um kit, no qual uma pequena seringa cheia de gel
de sepharose ligada a oligonucleotídeos poli-T serve de sistema de captura dos mRNAs
(pela extremidade poli-A, que vai parear com os poli-T do gel). Após lavar com tampão
tudo o que não ficou aderido, desloca-se o mRNA da coluna com uma solução de alta
força iônica e, pronto! Temos em três ou quatro gotas de tampão mRNA suficiente para
obter uma biblioteca de cDNA.
Em seguida vamos discutir o processo de produção do DNA fita dupla a partir de
mRNA. O processo, que é todo conduzido em tubo de ensaio, se inicia pela produção de
um DNA complementar fita simples, a partir do mRNA. Como a transcriptase reversa
necessita de um primer para iniciar sua tarefa, empregamos oligonucleotídeo poli-T. No
caso mostrado na figura, detalhe (1), o oligo dT é prolongado, no sentido 5´, por um
conjunto de bases que contém o sítio de restrição para uma enzima A (neste caso, a
enzima XhoI, cujo sítio de restrição é 5´- CTCGAG - 3´). Esta é a forma de adicionarmos
ao nosso futuro DNA um sítio de restrição conhecido bem na extremidade 3´.
Uma vez pareado, o primer vai permitir a síntese da primeira fita de DNA, que será
estendida com a ajuda da transcriptase reversa e com dNTPs (desoxirribonucleotídeos tri-
fosfato), como na síntese de DNA normal (etapa (2)). Para proteger a fita de DNA contra a
ação de enzimas de restrição (que serão empregadas mais adiante), o sistema de reação
tem, no lugar de desoxicitosina-trifosfato, um precursor metilado, a 5´-metil-citosina-
trifosfato, que vai impedir a ação das duas enzimas de restrição sobre o DNA recém
sintetizado, numa etapa posterior que já iremos comentar. A transcriptase reversa tende a
parar seu processo de síntese de DNA complementar antes de chegar ao início do mRNA
(estamos produzindo o cDNA de "trás para frente"). Esta parada é ocasionada, em parte,
por uma atividade RNásica residual da enzima, que pode degradar o RNA que ela mesma
está prestes a copiar como DNA. Nos kits modernos a transcriptase reversa recombinante
empregada tem uma atividade RNásica muito pequena, mas ainda assim se observa uma
parada da produção do cDNA antes da extremidade do mRNA, por razões ainda não
completamente compreendidas, e que acaba gerando um cDNA mais curto que o mRNA
original. Mais adiante discutiremos a importância da perda de informação genética nesta
região 5´ do cDNA.
Para a síntese da segunda fita de DNA a maior parte dos kits comerciais usa um
artifício, denominado nick translation (tradução por cortes), que é uma denominação muito
mal encontrada pelos seus inventores para o processo de replicação de DNA descrito a
seguir. Inicialmente, com o uso da atividade endonucleásica de uma enzima adequada,
inserimos pequenos cortes na cadeia de fosfatos do RNA (os chamados nicks). Estes
cortes criam automaticamente extremidades 3´-OH, que servirão de apoio para que a
DNA polimerase (em geral o chamado fragmento Klenow da DNApol I bacteriana, que
polimerisa mas não faz revisão da síntese). Estes nicks estão mostrados na etapa (3). A
partir deles a DNApol I (ou o fragmento Klenow) sintetiza pequenos trechos de DNA,
apoiando-se nas extremidades 3´-OH criadas pelos nicks. Ao término desta etapa a DNA
pol produz uma série de fragmentos e reconstitui, em fita dupla, o sítio Xho I na
extremidade 3´ do DNA (detalhe (5)).
Figura 8: Síntese de cDNA para clonagem uni-direcional em vetor de expressão. Cada etapa está
discutida no texto. Os círculos vermelhos representam as bases metiladas. A seta na etapa 4 aponta para
um nick ou corte.
Em seguida os fragmentos são ligados entre si pela ação da ligase (etapa (6)) e
eventuais saliências (overhangs) da fita são retirados pela ação de uma exonuclease
adicionada ao tubo. Esta ação é chamada de trimming (segundo detalhe (6)). A próxima
etapa é a adição de adaptadores, que são pequenos fragmentos de DNA fita dupla
contendo um sítio de restrição para uma segunda enzima (no exemplo, o sítio GAATTC,
da enzima EcoRI). Estes adaptadores são colados durante algumas horas pela incubação
do DNA 'trimado" na presença de ligase. O resultado é o que está mostrado na etapa (7).
A adição de vários adaptadores em cada extremidade é minimizada por um artifício
bioquímico, que envolve a desfosforilação de uma das extremidades 5´ dos adaptadores.
O penúltimo passo é o corte do fragmento de DNA fita dupla com as duas enzimas
de restrição para as quais adicionamos sítios (neste caso, Xho I e Eco RI), mostrado na
etapa (8). As duas enzimas cortam o DNA formando extremidades coesivas, isto é,
deixando bases despareadas, numa saliência (overhang) 5´. As duas enzimas não podem
cortar o DNA recém sintetizado em algum sítio de restrição interno, pois ele está protegido
pela adição das bases metiladas na primeira etapa de síntese. Os adaptadores e o sítio
XhoI, contudo, não têm esta proteção e podem ser clivados. Os fragmentos de DNA
gerados por estes cortes são eliminados de nosso tubo por uma reação de filtração ou de
precipitação e o DNA fita dupla, pronto para ser clonado unidirecionalmente, fica
disponível finalmente (etapa (9)).
Inicialmente, devemos ter em mente que os cDNAs gerados pelo sistema
descrito acima nem sempre contêm toda a ORF (o quadro aberto de leitura) do gene. O
esquema abaixo mostra as várias possibilidades, fruto do fato de que a transcriptase
reversa encerra aleatoriamente seu trabalho de síntese da primeira fita .
Figura 10: Vários cDNAs de tamanhos diferentes são produzidos a partir do mesmo mRNA. A razão
desta variação é o abandono da síntese da primeira fita pela enzima transcriptase reversa em diferentes
momentos da síntese, provavelmente devido à clivagem do RNA mensageiro adiante dela pela ação
remanescente de RNAseH que existe naturalmente nesta enzima. O mRNA original (1) é em geral mais
longo do que qualquer um dos cDNAs gerados pela ação da trascriptase reversa. O mais curto (4) não
contém sequer um trecho da ORF. UTR = "untranslated region" ou região não traduzida.
Como as ORFs costumam ser muito mais longas do que as UTRs (veja
proporções no alto da figura 5.10), a maior pare dos cDNAs gerados cai no caso descrito
em 3, isto é, contém uma parte da ORF e a região 3´ não traduzida (3´- UTR).
Figura 11 Esquema representativo de um vetor de expressão que emprega parte do operon lac (muito
modificado) para garantir a expressão controlado dos insertos clonados no sítio múltiplo de restrição (MRS).
Veja o texto abaixo para detalhes. A cabeça do cavalo é a parte aminoterminal da proteína (NH2) e cauda
da tartaruga a extremidade carboxi-terminal (COOH).
Observe que o local onde a clonagem será feita é chamado MRS ou sítio múltiplo
de restrição, por conter vários sítios de restrição muito próximos e únicos em todo o
plasmídeo. A vantagem deste arranjo sobre aquele que emprega uma única enzima é que
o experimentador tem muito mais liberdade de escolher a enzima de restrição que irá
empregar para contar o DNA doador. Além disso, ele pode cortar o vetor com duas
enzimas e obter extremidades diferentes à esqueda (5´) e à direita (3´), o que permitirá a
clonagem unidirecional dos fragmentos gerados com a técnica descrita na figura 5.8.
A clonagem será feita, neste exemplo, dentro do gene lacZ. Consequentemente,
se a bactéria hospedeira for lacZ -, ela se tornará lac + quando receber o plasmídeo vazio
(sem inserto) e permanecerá lac- se receber um plasmídeo recombinante (carregando um
inserto). Mediante o uso de um indutor do sistema (no caso, um análogo de latose, o
IPTG ou isopropil-tio-galactosídeo) e um indicador da atividade da b-galactosidase (a X-
gal), é possível visualizar como colônias azuladas aquelas formadas por bactérias com
plasmídeos vazios e como colônias transparentes aquelas formadas por bactérias com
plasmídeos recombinantes. É a chamada "seleção por cor".
Como não podemos ter certeza de que o primeiro ATG da ORF original do gene
obtido do organismo doador está disponível (o que implicaria dizer que a transcriptase
reversa teria copiado toda a região 3´não-traduzida mais toda a ORF antes de parar),
convém contar com a presença de um ATG no plasmídeo, que é justamente o ATG do
gene lacZ. É indispensável também ter um RBS procarioto antes deste ATG, como
indicado pelas caixas azuis na figura, para fazer do RNA transcrito um verdadeiro mRNA.
Na figura acima o inserto clonado contém parte da ORF do organismo doador e a
extremidade 3´ não traduzida (3´ UTR). Quando se dá a clonagem, o gene lacZ fica
interrompido. A primeira parte do gene servirá para codificar os primeiros aminoácidos da
proteína recombinante (representados pela cabeça de cavalo ao final do esquema). A
segunda metade nunca será expressa porque os ribossomos terminarão a síntese num
códon de terminação muito anterior ao início do trecho restante do lacZ. No caso
específico do exemplo da figura, o inserto contém parte da ORF (presumivelmente no
mesmo quadro de leitura do lacZ, 1a. parte) e portanto há no fim desta ORF um códon de
terminação do gene do organismo doador. Se o quadro de leitura estiver errado ou se
apenas a extremidade 3´ UTR for clonada, existe uma pequena chance de que os
ribossomos alcancem a 2a. parte do lacZ, mas provavelmente fora do quadro de leitura (2
chances em 3). De uma forma geral, podemos afirmar que a segunda parte do lacZ nunca
é traduzida.
A partir do ATG após o RBS plasmidial, forma-se então uma ORF que termina em
geral no códon de terminação (stop) do gene doador. É necessariamente uma ORF
recombinante, que dará consequentemente origem a uma proteína recombinante, ou
quimérica. A proteína é sempre muito menor do que o mRNA sintetizado a partir do
promotor lac do plasmídeo. A "cabeça" beta-galactosidase da proteína recombinante (ou
quimérica) não é enzimaticamente ativa.
Como saber se a biblioteca de cDNA que construímos tem qualidade, isto é, têm a
maior parte dos clones cheia com insertos? No exemplo dado na figura acima temos um
poderoso recurso, a seleção por cor. De fato, basta plaquear no meio indicador (contendo
IPTG e X-gal) a bactéria e poderemos em poucas horas avaliar se a porcentagem de
colônias brancas é muito maior que a de colônias azuis. Uma biblioteca razoável deve ter
ao menos 90% de colônias brancas.
É evidente que também podemos empregar, como fizemos para a triagem de
bibliotecas genômicas, sondas de DNA, mas os clones encontrados não necessariamente
estarão expressando os insertos na forma de proteínas recombinantes, porque os insertos
podem estar fora do quadro de leitura inicial do lacZ.
Há muitos detalhes técnicos na triagem que não discutimos, porém a base do
processo está adequadamente esclarecida.
Mesmo uma proteína quimérica pode ter aplicação imediata. Apenas como
exemplo discutimos duas aplicações rotineiras: como antígeno diagnóstico e como vacina.
Se, por qualquer razão, não podemos de forma alguma usar uma proteína
quimérica, podemos lançar mão de vetores que têm imediatamente antes do sítio de
restrição empregado na clonagem uma sequência de bases que codifica um pequeno
peptídeo reconhecido e cortado por uma enzima adequada. Na figura 11 é como se a
cabeça de cavalo estivesse ligada ao corpo da tartaruga por uma pequena haste de
peptídeo, que pode ser cortada por uma enzima. Podemos então capturar as proteínas
recombinantes da lise bacteriana por uma coluna de cromatografia de afinidade com
anticorpos dirigidos contra a parte plasmidial da proteína recombinante (a cabeça de
cavalo). Uma vez lavada a coluna para retirar o material não fixado, adiciona-se a ela um
pequeno volume de tampão contendo a enzima que corta a união entre a cabeça e o
corpo, e recolhe-se no efluente da coluna apenas a parte que interessa (proteína do
organismo doador) da proteína quimérica.
III. PCR - Uma técnica de mil e uma utilidades
Esta aula é bastante longa. Por isso optamos por construir internamente links para seus
diversos temas, tabelados abaixo. Basta clicar sobre o tema de interesse.
Sinopse da aula
Primeiros passos - Introdução ao PCR
PCR na investigação de Paternidade
PCR na investigação de crimes
PCR no diagnóstico de enfermidades genéticas
PCR em tempo real - o sistema Taqman
Um pouco de história
Artigos importantes sobre PCR
A. Primeiros passos
A sigla significa "polymerase chain reaction", que em português seria reação em cadeia
da polimerase. Então, a base da técnica é a ação in vitro da DNA ´polimerase. Para
compreendermos como funciona a técnica, que é na verdade bem simples, precisamos
recordar que, para iniciar a síntese de uma fita nova, a DNA polimerase precisa de um
primer (de RNA ou de DNA), de um DNA molde e de precursores de síntese de DNA,
coletivamente chamados dNTPs (desoxinucleotídeos tri-fostato, i.e., dATP, dTTP, dCTP e
TGTP).
A idéia de Mullis era simples. Adicionava-se ao tubo de ensaio um pouco de DNA
contendo o trecho que queria amplificar, os dNTPs, a DNA pol e dois primers de DNA
feitos em laboratório, um hibridizando numa fita e "apontando" para o outro, que
hibridizava com a outra fita e "apontava" para o primeiro. A distância entre os sítios de
pareamento dos dois primers não podia ser muito grande, e foram escolhidos para testes
trechos com menos de 1000 pb. Com todos os reagentes no tubo, a reação era
inicialmente aquecida a 94 oC, para que todas as fitas de DNA se desnaturassem. Em
seguida a temperatura era reduzida para permitir o pareamento dos primers, em geral
para 50 oC. Por fim, a temperatura era reduzida ainda mais, até 37 oC, para que a DNA
polimerase de E. coli pudesse trabalhar e estender duas fitas simples de DNA, uma a
partir de cada primer, duplicando, assim, a sequência alvo escolhida. Ao se repetir o ciclo
os primers encontrariam agora dois alvos cada um, a partir do primeiro alvo replicado: um
no DNA original e outro na cópia recém sintetizada, gerando, por sua vez, ao fim do novo
ciclo, 4 cópias do alvo. É claro que a repetição do processo geraria um número de cópias
do alvo que se elevaria exponencialmente, com base 2.
Na verdade, a coisa não foi tão fácil assim: a DNA pol era termoinstável (como a maioria
das proteínas dos seres vivos) e se inativava irreversivelmente a 94 oC. Era preciso
adicionar mais DNApol no tubo a cada ciclo de extensão. Além disso, a baixa temperatura
de funcionamento da DNApol de E. coli propiciava o aparecimento de pareamentos
espúrios (sem sentido, errôneos) no sistema, gerando ao final produtos de PCR
inesperados.
A solução foi encontrada logo: a DNA pol de E. coli foi substituída por uma DNA
polimerase de um microrganismo termo-tolerante, o Thermus aquaticus. A enzima foi
batizada de Taq polimerase e permitiu, finalmente, que o PCR se tornasse uma
ferramenta extraordinariamente útil na genética molecular. Que propriedades têm a Taq
polimerase que a fazem tão útil? Ela é termoestável e sua temperatura ótima de
funcionamento é 72 oC. Com isto três problemas ficaram automaticamente resolvidos:
Figura 12: Eventos relacionados às três temperaturas básicas da PCR: Desnaturação a 94 oC,
pareamento dos primers a 50 oC e extensão de novas fitas a 72 oC, supondo neste caso que a enzima
empregada seja a Taq polimerase ou outra DNA polimerase termo-estável.
O processo descrito acima gera dois tipos de fitas simples: uma de comprimento variável,
obtida a partir de um primer que tenha hibridizado com a fita de DNA original (em geral
um longo fragmento de DNA obtido diretamente de um ser vivo ou de um vírus ou
plasmídeo), e outra, de comprimento determinado, que é obtida sempre que um DNA
previamente copiado é empregado como molde em sua síntese.
Esta situação está claramente representada na figura abaixo, que mostra os três
primeiros ciclos de uma PCR. Observe que a fita estendida a partir de um primer
hibridizado com o DNA molde original não tem comprimento fixo, porque o molde é muito
longo. Seu comprimento final vai ser determinado pelo instante em que o primer hibridizar
com o sítio de complementariedade e pela tempo de extensão total, à temperatura de 72
o
C. As duas primeiras fitas estendidas estão indicadas com a letra e à sua direita. Já as
fitas que são produzidas a partir de primers que hibridizaram em fitas previamente
copiadas têm fatalmente ser comprimento definido, já que inicia, no primer e terminam ao
fim do DNA molde, que é exatamente a e extremidade 5´do primer já incorporado na fita
molde. As fitas de comprimento definido aumentam de número exponencialmente,
formando aos poucos um imenso número d fita duplas de comprimento definido, enquanto
as fitas estendidas aumento linearmente (duas a cada ciclo, por alvo). Uma inspeção da
figura a seguir esclarecerá o leitor sobre esta questão.
Figura 13: Produção de novas fitas a partir de um DNA alvo pela PCR. Após hibridização dos primers a
56 oC, as fitas novas são sintetizadas a 72 oC, dando origem a fragmentos estendidos (indicados no primeiro
ciclo pela letra e) e fragmentos amplificados (contornados em amarelo). Os fragmentos amplificados
acumulam exponencialmente na reação.
A visualização dos produtos de uma reação de PCR costuma ser feita através do uso da
eletroforese em gel. Pode-se usar um gel de poliacrilamida, que corre verticalmente, e
corar as bandas de DNA com nitrato de prata ou se pode optar por correr um gel
horizontal de agarose e visualizar as bandas por transiluminação UV, "corando"
previamente o DNA com brometo de etídio (esta substância se intercala entre as fitas de
DNA e nestas condições absorve o UV e fluoresce com cor alaranjada). O produto de
PCR será sempre um DNA fita dupla e o que distingue um do outro, no gel, será apenas o
comprimento relativo. Esta situação está representada no esquema da figura seguinte.
Figura 14: Visualização de três reações de PCR. Em a e b dois produtos são gerados, a partir de dois
pares de primers diferentes. Os dois produtos têm comprimentos de 400 e 360 pb. A migração das bandas
na eletroforese é de cima para baixo. O fragmento menor migra mais rápido e produz a banda em vermelho.
O maior se desloca mais lentamente no gel e produz a banda em verde. A coluna c é um controle negativo,
essencial em qualquer reação de PCR. A coluna d mostra os marcadores de peso molecular (neste caso,
uma escada de DNA - DNA ladder - de 100 pb). Na transiluminação ou na coloração por prata,
evidentemente, todas as bandas têm a mesma cor.
Quando fazemos um PCR, a prática aconselha a deixar o tubo com os reagentes por 5 a
10 minutos a 94 oC antes de iniciar o ciclo. Em geral 1 minuto a cda temperatura é
suficiente para as etapas do ciclo, que é repetido de 35 a 40 vezes. Por fim, ao terminar a
última extensão muitas vezes os protocolos experimentais sugerem a manutenção da
temperatura de 72 oC por mais 5 a 10 minutos. A opção de esperar 10 minutos antes de
começar o ciclo, mantendo o tubo aquecido, garante que todo o DNA alvo esteja
desnaturado antes de se iniciar o ciclo. Por outro lado, o período final a 72 oC garante que
todas as fitas terão o mesmo comprimento pois pode acontecer que, durante o ciclo,
algumas fitas copiadas não tenham atingido o fim do molde. A figura a seguir sintetiza o
ciclo da PCR.
Figura 15: Ciclo padrão de uma PCR. Antes de iniciar o ciclo o tubo com os reagentes é mantido a 94 oC
para garantir a desnaturação inicial de todo DNA alvo. Da mesma forma, ao terminar o ciclo, a manutenção
do tubo a 72 oC garante que todos as fitas tenham exatamente o mesmo número de bases.
Nos dias de hoje uma PCR é feita numa máquina chamada termociclador. É
simplesmente um bloco aquecido, controlado por um sistema digital, que eleva e abaixa a
temperatura do material nele inserido (tubos de ensaio pequenos, micro-placas de 96
poços, etc), de acordo com a programação digitada pelo operador. Mais de duas décadas
foram necessárias para que estas máquinas pudessem atingir um grau de precisão e
confiabilidade aceitáveis, aliado a um preço razoável. Também os reagentes para PCR
reduziram de preço consideravelmente na última década, tornando o método
comercialmente atrativo. Uma reação de PCR pode, agora, ser feita por US$ 1,00.
Outro ponto importante é a questão dos erros na sequência devido à tautomeria de bases.
A Taq polimerase não faz revisão (proof reading) in vitro. Se, ao copiar pela primeira vez o
DNA alvo, ela introduzir uma base errada numa das duas fitas, 25% do produto final
estará com sua sequência diferente nesta base. As consequências deste erro podem ser
trágicas se estamos procurando fazer um diagnóstico genético (veja item
correspondente). Para evitar isto todos os testes são feitos em duplicata. A idéia é que a
probabilidade da Taq polimerase "errar" nas duas reações sempre na primeira extensão é
muito reduzida e se um resultado conflitante surgir, fica claro que num dos tubos a Taq
"errou". Se o "erro" for cometido depois do terceiro ciclo ele já se torna praticamente
imperceptível, pois uma pequena porcentagem das fitas terá erro e não será possível
detectá-lo facilmente.
Seria ideal que pudéssemos disponibilizar em Downloads um relato de Mullis sobre o
PCR a partir da sua apresentação na Academia Nobel. Entretanto, não há na página da
Academia Sueca que coordena o Nobel (http://www.nobel.se) as palestras de Kary Mullis
e Michael Smith. Uma apresentação on-line dos trabalhos dos dois laureados Nobel em
Química, do ano de 1993 está disponível: Michael Smith (pelo aperfeiçoamento da
tecnologia da mutação sítio-dirigida) e Kary B. Mullis (pela invenção da PCR).
http://www.nobel.se/chemistry/laureates/1993/illpres/index.html
para outro.
Quando o sistema acima é analisado em gel de agarose, duas bandas serão visíveis se o
indivíduo for heterozigoto para aquele STR. No caso de investigação de paternidade, o
filho de um casal deve herdar um cromossoma do pai e outro da mãe. Isto que dizer que,
para um sistema qualquer, o filho terá um STR (e uma banda) materno e outro paterno. A
figura abaixo retrata a situação onde um casal avalia a paternidade de dois meninos. O
primeiro (Fo.1) tem claramente uma banda de origem materna e a segunda banda está na
mesma altura da banda paterna. Portanto, o marido não pode ser excluído de ser o pai.
No segundo caso, contudo, a criança tem uma banda materna mas nenhuma que
corresponda a alguma banda paterna. Esta situação exclui o marido de ser pai do
segundo filho (Fo. 2).
Figura 18: Representação esquemática de um gel representando o resultado de um sistema de STR para
investigação de paternidade. A primeira coluna tem marcadores alélicos padrão, equivalentes aos
marcadores de peso molecular. As colunas 2, 3, 4 e 5 mostram o resultado da amplificação de um sistema
para o suposto pai, a mãe e dois filhos. A banda materna de cada filho está indicada e a banda paterna de
um deles está contornada com uma elipse. O teste exclui o suposto pai da paternidade do segundo filho.
A inclusão obrigatória da mãe em testes de paternidade evita que uma eventual troca de
recém-nascido na maternidade possa confundir os resultados. O mesmo processo
descrito acima pode ser empregado em qualquer animal que tenha reprodução sexuada.
É preciso apenas identificar os STRs candidatos e avaliar criteriosamente a distribuição
dos alelos na população em estudo. Para os seres humanos os alelos estão distribuídos
igualmente em todas as populações do globo, mas em bovinos, por exemplo, devido ao
cruzamento controlado pelo produtor, os STRs estão distribuídos de forma muito diferente
de uma raça para outra. Ainda assim, a avaliação de pedigree em animais de raça é um
campo crescente de aplicação desta tecnologia.
Apenas como lembrete: os STRs não são os únicos alvos possíveis para investigação de
paternidade via DNA. Além disso, a investigação bioquímica e genética de paternidade já
era um método bem estabelecido muito antes da invenção do PCR. Sugerimos que o
leitor mais interessado procure informações na internet para complementar esta questão.
Observe que, neste caso, cada suspeito aparece, para cada sistema com duas bandas
(aparecerá apenas uma se o indivíduo for "homozigoto" para aquele STR). Na amostra as
duas bandas do suspeito 2 estão claramente visíveis. O suspeito um tem apenas uma
banda, a outra portanto o exclui de ser a fonte da amostra. O teste exclui dois indivíduos,
mas não prova, como na paternidade, que o outro é o "dono" da amostra. A inclusão do
resultado de 5 a 8 sistemas eleva a probabilbidade de não exclusão (como no caso de
paternidade) para 99,99999999%. Isto quer dizer que não podemos excluir o suspeito
dois com uma margem de acerto de 99,99999999%.
Figura 19: Representação esquemática de um gel representando o resultado de um sistema de STR para
investigação criminal. Três suspeitos estão sendo investigados e uma amostra de sangue está disponível.
A primeira coluna tem marcadores alélicos padrão, equivalentes aos marcadores de peso molecular. As
colunas 2, 3 e 4 mostram o resultado da amplificação de um sistema para os possíveis criminosos. A coluna
5 mostra o resultado do mesmo sistema para a amostra. O padrão de duas bandas é idêntico ao do
suspeito 2 e exclui os demais.
As aplicações forenses (na justiça) da PCR são ilimitadas, mas não há espaço aqui para
maior detalhamento.
A figura abaixo ilustra o caso em que o sítio de restrição para EcoRI, GAATTC, inclui um
nucleotídeo que está frequentemente mutado no caso da doença genética em estudo. No
alelo normal o sítio de restrição está preservado e no alelo mutante ele foi perdido, pela
troca de um par AT por um GC. Se o contrário tivesse acontecido, a técnica também
poderia ser aplicada da mesma forma, apenas com a mudança equivalente na
interpretação dos resultados. Quando o trecho de DNA em estudo é amplificado por dois
primers anelando nas regiões acima e abaixo da mutação (em princípio todo o restante do
gene é conservado), os produtos gênicos terão o mesmo tamanho, sejam provenientes do
alelo normal (wt - wild type)ou do mutante. Então, será preciso uma intervenção nos
produtos para que uma distinção entre eles possa aparecer. Isto é feito pela ação da
enzima de restrição escolhida (no caso, a EcoRI). O produto de PCR produzido a partir do
alelo normal pode ser clivado pela enzima de restrição, dando origem a duas bandas. O
produto originado da amplificação do alelo mutante não tem mais o sítio para EcoRI e não
pode ser clivado, permanecendo do tamanho original. Assim, num indivíduo heterozigoto
(portador são de uma mutação recessiva) o sistema produzirá três bandas: a maior,
correspondente ao produto de PCR do alelo mutante, que não pôde ser clivado pela
EcoRI, e duas menores, fruto da clivagem do produto de PCR do alelo normal.
Figura 22: Resultado da investigação da presença de mutação no sítio EcoRI por PCR (PCR/RFLP). A
figura representa o caso de um indivíduo heterozigoto para a marca estudada (coluna b), um indivíduo
afetado e um normal homozigoto. A mutação elimina um sítio EcoRI existente no alelo selvagem (wt). A
amplificação dos dois alelos produz fragmentos de mesmo comprimento. Entretanto, a digestão destes
fragmentos com a enzima gera um polimorfismo de comprimentos, com o alelo mutante permanecendo não
cortado, enquanto o alelo selvagem é clivado em dois pedaços de tamanho distinto.
Em muitos casos de mutações pontuais a técnica de PCR/RFLP não pode ser aplicada,
seja porque não há sítio de restrição conhecido para o entorno da mutação, seja porque
múltiplas mutações são possíveis no gene de interesse, tornando a abordagem acima
impraticável. Uma alternativa é o mis-match PCR, ou PCR com pareamento errôneo. O
princípio desta técnica, descrito pela primeira vez por Cotton et al., em 1988, e também
conhecido com CMC - chemical mismatch cleavage - baseia-se na clivagem de DNA em
locais com pareamento errôneo pela piperidina, e está representada na figura abaixo. Um
indivíduo heterozigoto tem uma mutação pontual numa região qualquer do gene.
Podemos amplificar esta região com primers dirigidos a suas extremidades, como fizemos
na PCR/RFLP. Em seguida aquecemos o produto do PCR e deixamos esfriar
rapidamente para induzir a formação de heteroduplexes (uma fita simples de um alelo e a
complementar do outro) além dos homoduplexes (as dus fitas pareadas de volta, de um
mesmo alelo). Nas região não pareadas ou com pareamento errôneo com bases C e T
liga-se o produto hidroxilamina ou o tetróxido de ósmio, respectivamente. Uma vez
ligados, estes produtos permitem a clivagem do DNA neste local pela piperidina. Assim,
50% dos produtos de PCR serão cortados por este sistema em todo lugar onde houver
uma mutação. Em geral os fragmentos gerados pro este sistema são pequenos e devem
ser visualizados em gel de poliacrilamida. A figura abaixo mostra como funciona este
sistema.
Figura 23: Resultado da investigação da presença de mutação em uma base desconhecida pela técnica
de PCR-mismatch. A figura representa o caso de um indivíduo heterozigoto para a marca estudada: o alelo
selvagem tem o par TA e o mutante o par GC. A amplificação por PCR do trecho onde a mutação está usa
primers que estão a alguma distância à direita e à esquerda da provável mutação. Quando o produto do
PCR é aquecido os dois tipos de fita (TA e GC) se separam, dando origem a 4 fitas simples. Quando a
mistura é rapidamente aquecida, as fitas simples se reassociam ao acaso de 4 formas distintas, pois a
diferença de uma única base não impede o pareamento das fitas quase complementares. Após o uso de um
sistema químico adequado, os pares de base errôneos são clivados e as fitas com mis-match geram dois
fragmentos no gel, ao contrário das fitas com pareamento perfeito. O heretozigoto aparece, no gel, com três
bandas (veja figura abaixo).
Figura 24: Resultado da investigação da presença de mutação pela técnica de mismatch PCR. A figura
representa o caso de um indivíduo heterozigoto para a marca estudada (coluna b), dois indivíduo afetados e
um normal homozigoto. A amplificação dos dois alelos produz fragmentos de mesmo comprimento.
Entretanto, a clivagem destes fragmentos pela piperidina gera um polimorfismo de comprimentos, com o
alelo mutante permanecendo não cortado, enquanto o alelo selvagem é clivado em dois pedaços de
tamanho distinto. No caso do primeiro afetado (homozigoto) não há mismatch interno porque os dois alelos
são idênticos. Nocaso do afetado heterozigoto cada alelo é diferente do outro em dois pontos distintos, o
que gera três fragmentos pela piperidina, mais o produto não clivado do homoduplex.
Figura 25: Princípio de funcionamento do Taqman, ou PCR em tempo real. Uma sonda fita simples com
dois florocromos é adicionada à reação de PCR. O fluorocromo Q atua com atenuador da fluorescência de
R, sendo protanto um quencher. Para isto é preciso que esteja próximo a R. A TAq polimerase separa os
dois fluorcromos à medida em que degrada a sonda quando sintetiza a fita nova. O fluorocromo R recém
liberado da sonda emite então luz num comprimento de onda característico, diferente de Q. A excitação dos
fluorocromos é feita com laser que atravesse o tubo de reação.
A medição da radiação é feita pelo aparelho, que taça um gráfico com a absorção obtida
após cada ciclo de PCR. O ciclo em que o patamar (limite) de negatividade é ultrapassado
está diretamente relacionado à quantidade de DNA molde na mistura. Com isto, a
quantificação de DNA molde passou a ser não apenas possível, mais rápida. O sistema
ainda é bastante dispendioso mas tenderá a se tornar mais barato à medida em que
novos sistemas entrarem no mercado e um maior número de máquinas for disponível.
Figura 26: Gráfico obtido com o Taqman. A seta indica o ciclo em que a reação ultrapassa o limite da
reação negativa. Quanto menor a quantidade de DNA molde no tubo de reação maior o número de ciclos
necessários para ultrapassar o limite da negatividade. A reação de PCR no Taqman emprega em geral
apenas duas temperaturas (94 oC para desnaturação e 60 oC, para hibridização e extensão) e o resultado da
PCR pode ser dado em menos de 30 minutos.
K. Mullis nasceu em 1944 em Lenoir, Carolina do Norte, EUA. Obteve o grau de bacharel
em química em 1966 no Instituto de Tecnologia da geórgia e o PhD em Bioquímica pela
Universidade da Califórnia em Berkeley. Passou então 7 anos como pós-doutor em
Cardiologia Pediatria e Química Farmacêutica na Escola de Medicina da Universidade de
Kansas (EUA). Em seguida reebu um convite para trabalhar como técncio na Cetur
Corporation, em Emeryville, em 1978. Foi lá que teve a idéia da PCR.
Segundo ele, foi dirigindo seu carro de San Francisco para sua casa em La Jolla,
California, que ele começou a imaginar uma maneira simples de determinar uma
sequência de nucleotídeos a partir de um trecho de DNA. Ele então, como querem para si
outros cientistas, tece uma inspiração súbita: a solução não era apenas para seu
problema original, mas tinha um alcance muito maior. Ele imaginou uma forma de fazer a
DNA polimerase iniciar e terminar seu trabalho em pontos pré-determinados e,
consequentemente, pelo uso desta proipriedade, descobriu uma maneira de amplificar
exponencialmente uma sequencia de DNA num tubo de ensaio.
Mullis então levou a idéia para seus colegas da Cetus e juntos eles a colocaram para
trabalhar de verdade. Ela foi apresentada pela primeira vez ao público numa conferência
em 1985 e foi pronta e amplamente aceita pela comunidade científica. A popularidade da
técnica, assim como seu conceito, ganhou crescente popularidade ao longo dos anos
seguintes.
Em 1989 a revista Science escolheu a molécula usada na PCR, a Taq polimerase, como
a primeira "Molécula do Ano".
Devido ao alcance e popularidade da PCR Kary Mullis foi apontado e recebeu o prêmio
Nobel de Química em 1995. Esta indicação foi duramente contestada por muitos que
acreditavam que a PCR foi apenas um desenvolvimento de técnica e que sua concepção
não era suficiente para dar a Mullis o status de nobelista. Mullis argumentou a seu favor
que a união das técnicas pré-existentes no formato por ele criado fazia toda a diferença.
Para uma história um pouco mais detalhada sobre o desenvolvimento da PCR veja o site
http://usitweb.shef.ac.uk/~mba97cmh/history/history.htm
Uma seleção dos mais importantes artigos sobre PCR, tanto durante o desenvolvimento
da técnica quanto para diversas aplicações, pode ser encontrada na página específica da
Universidade de Berkeley:
http://sunsite.berkeley.edu/pcr/foundationalPCR.html#anchor1239949
Vale a pena conferir!
IV. Sequenciamento de DNA
Até meados da década de 70 não era nada simples obter uma sequência de DNA, fosse
ele fita simples ou dupla. De fato, trabalhar com DNA era muito mais complicado do que
com proteínas e o conhecimento sobre os ácidos nucléicos avançava de forma lenta. No
início da década de 80 uma técnica relativamente rápida de sequenciamento de DNA foi
desenvolvida, que empregava a quebra de uma cadeia de DNA com diferentes produtos
químicos e a visualização dos fragmentos gerados por eletroforese. Havia necessidade de
fazer-se a marcação radiativa das moléculas porque a quantidade de material produzida
era muito pequena e não podia ser detectada de outra forma. Mesmo com todas estas
dificuldades houve então um rápido progresso no conhecimento de sequências de DNA.
Poucos anos depois um novo avanço tecnológico foi alcançado pela introdução da técnica
de interrupção da sequência pela incorporação aleatória de um nucleotídeo modificado
(sem a hidroxila na posição 3´), que ficou conhecida como técnica de didesoxi ou dideoxi.
Esta técnica suplantou imediatamente a anterior e permitiu o desenvolvimento de
sequenciadores automáticos de DNA, sobre os quais versa este capítulo. Ainda se faz
eventualmente o sequenciamento manual, mas é muito mais trabalhoso, caro e arriscado,
pois emprega substâncias radiativas. De uma forma geral quando desejamos saber uma
sequência de bases de um fragmento qualquer de DNA, purificamos o fragmento e
enviamos para sequenciamento numa empresa prestadora deste serviço.
Mas, afinal, como produzir um DNA para sequenciamento e do que se trata a técnica de
dideoxi?
Por fim, basta recordarmos que as fitas assim produzidas devem ser muito numerosas
para poderem ser detectadas. Por isso, temos que começar a reação de sequenciamento
com muito mais DNA do que uma reação de PCR. As fitas produzidas podem ser
separadas pelo tamanho em eletroforese de poliacrilamida, e a base final da sequência da
fita identificada pela fluorescência emitida quando a banda eletroforética correspondente à
fita cruza o ponto do gel que é iluminado por um feixe de laser. Neste sistema de
detecção a eletroforese não pára, as bandas passando no fim (em baixo) do gel é que são
detectadas em movimento. Com isto, podemos identificar com precisão 600 a 700 bases
a partir do primer.
Ainda na figura, podemos ver que fragmentos de diferentes tamanhos são gerados,
porém nunca (exceto no caso onde houver moldes de DNA com polimorfismo de base,
como no caso A/G mostrado) dois fragmentos de igual tamanho terminarão em bases
diferentes. Na parte de baixo da figura todos os fragmentos representados na parte de
cima estão organizados por ordem de tamanho. Observe que:
a) podem existir muitos fragmentos (fitas simples estendidas a partir do primer) do mesmo
tamanho, mas fatalmente terminarão na mesma base (exceto no caso do polimorfismo do
DNA molde);
b) podem existir fitas terminado na mesma base (afinal, só temos 4 opções, A,T,G ou C!),
com comprimentos diferentes. Não há qualquer restrição para isto.
Examine, por favor, atentamente a figura abaixo antes de continuar a leitura desta aula.
Figura 27: Fragmentos de diferentes comprimentos gerados a partir do primer, interrompidos quando um
didesoxinucleotídeo é incorporado na fita. Os didesoxinucleotídeos são marcados com substâncias
fluorescentes diferentes, conforme a base (A,T,G ou C).
Examine, por favor, atentamente a figura 8.2 abaixo antes de continuar a leitura desta
aula.
Figura 28: Os fragmentos de diferentes comprimentos migram no gel, os menores na frente. São
iluminados por um feixe de laser e fluorescem quando atravessam a janela do feixe. Um gel pode resolver
96 sequências simultaneamente. Os géis têm sido substituídos por capilares preenchidos de polímero nas
máquinas mais modernas. As bandas pretas indicam ausência de material e são apenas um recurso gráfico
usado aqui para indicar o espaço aumentado entre bandas que aconteceria neste caso. Entretanto, isto não
ocorre na reação de sequenciamento finalizada, porque o número de fragmentos gerados é muito grande e
a probabilidade de uma classe de tamanho não ser representada na reação é praticamente nula.
Figura 29: Eletroferograma parcial de uma sequência de DNA obtida no sequenciador automático
ABI3100 Prism, da Applied Biosystems, na Unidade de Genômica do Laboratório de Genética Molecular do
Departamento de Genética da UFPE. Observe que os picos são agudos e regularmente separados, o que
indica alta qualidade do sequenciamento neste trecho
Esperamos que este texto tenha esclarecido a maior parte das questões básicas
pertinentes ao sequenciamento de DNA. Entretanto, julgamos que uma visita à nossa
sub-página de animações é essencial, pois a animação sobre sequenciamento é muito
ilustrativa do que foi dito aqui.