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ESTANTE

Livro documenta a
arqueologia da O fotógrafo Maurício de
Paiva documenta um
outro lado desta imensa

Amazônia região brasileira, com


o foco no passado

Por Juan Esteves

U
ma boa maneira de entrar apenas memorialístico, mas versus documentário. A importância
no livro Amazônia antiga, engajado e responsável por aqueles da ação está na capacidade que um
arqueologia do entorno, com poucos gritos preservacionistas que livro pode provocar por sua atitude
imagens de Maurício de Paiva e raramente são ouvidos. adequada. Das visões ufanistas de
ensaios de Mônica Trindade Canejo, Maurício de Paiva e Mônica Jean Manson às denúncias de
é o texto escrito pelo historiador e Canejo estão numa caminhada que Claudia Andujar, da paisagem
arqueólogo Eduardo Góes Neves, já superou a questão do livro de arte magnífica de George Love e
diretor do Museu de Arqueologia e
Etnologia da Universidade de São
Paulo (USP), para quem os
arqueólogos mantêm uma relação
especial com seu objeto de estudo:
“precisam destruí-lo para estudá-lo”.
É claro que os métodos usados
pelos estudiosos não comungam
com a destruição perpetrada
constantemente na região
amazônica. Em nome da medicina,
iniciou-se um extrativismo sem
precedentes. Sob a alegação da
interação humana, milhões de índios
foram dizimados. Em nome do
progresso e da industrialização,
milhões de árvores e espécies da
fauna foram exterminadas.
Da mesma forma que a região
resiste bravamente, como um
gigante paquiderme que se
esvai em sangue mas não morre,
nem sempre conseguimos conjugar
o verbo no passado, pois a ação
destruidora está longe de parar e,
se depender de ação
governamental, tudo andará como
sempre. Por isso, a importância
fundamental dos livros que
destacam a preservação mais que
necessária. Não é um registro

Estatueta antropomorfa da cultura


tapajônica, exemplo da rica cultura
pré-colonial da Amazônia, exposta
em museu de Santarém (PA)

36 Fotografe Melhor
PAIVA
DE
FOTOS: MAURÍCIO

Amazônia antiga e atual: acima, homem com a cabeça de urna funenária (conhecida como maracá) encontrada em sítio arqueológico no
sul do Amapá; abaixo, crianças brincam com fragmentos de cerâmica arqueológica encontrados no quintal de casa, em Parintins (AM)

Fotografe Melhor 37
ESTANTE

PAIVA
DE
MAURÍCIO
Plantação de mamões no entorno de um sítio arqueológico em Iranduba (AM): vestígios orgânicos do passado enriqueceram o solo no local

David Zingg à deslumbrante fauna atenciosa. O autor consegue prover ideias e que possam originar
de Araquém Alcântara, cada livro expressar uma ampla variedade, uma vida melhor. Certamente, esta
que discute o tema encontra um não submetendo a informação aos arquelogia amazônica, de imagens
desafio de superação tão grande estilismos gráficos desnecessários. e textos, feita em cinco longos anos
quanto a região. Não sacrifica, igualmente, a poética de dedicado trabalho, traz
Pedro Martinelli, Alex Webb, pela sintaxe, que está longe de em suas páginas a expansão
Luiz Braga, David Alan Harvey, ser panfletária ou repetitiva. desse pensamento. f

apenas para citar alguns fotógrafos, Entre fortes e delicadas imagens,


produziram imagens memoráveis da os ensaios da jornalista Mônica
região, das pessoas e costumes. Trindade Canejo funcionam como
No entanto, em Amazônia Antiga, um especial contraponto. A
Maurício de Paiva, como escreve realidade fotográfica amazônica
o fotojornalista João Bittar na é acompanhada com muita
apresentação, traz “uma fronteira sensiblidade numa narrativa que
visual raramente abordada” e alude à informação e que inclui
acertadamente coloca cada página acertadamente suas experiências
virada como uma viagem cósmica no pessoais na região, desmistificando
tempo. Definição apropriada para o o caráter apenas jornalístico e
conteúdo que mescla informação a colocando um pouco mais de
uma imagem muito bem trabalhada. emoção em sua vivência, o que por
certo é ajudado pelas legendas de
A LUZ AMAZÔNICA caráter testemunhal.
Não ha dúvida de que a própria Sempre temos que pensar no Serviço
luz amazônica nos coloca diante de futuro em função do passado e do Amazônia antiga - arqueologia
referências anteriores. Difícil não presente. Uma coisa não existe sem no entorno.
lembrar em certos momentos de a outra. A função do documentário Imagens de Maurício de Paiva,
Braga ou Webb (como na imagem fotográfico sério certamente é textos de Mônica Trindade Canejo,
escolhida para a capa). Entretanto, fornecer subsídios imagéticos e Editora DBA; formato 28 x 28 cm,
144 páginas; ISBN 978-85-7234-
o clichê é superado com maestria filosóficos a essa máxima,
401-2; Preço: R$ 79,00.
por meio de uma leitura mais revelando situações que podem

38 Fotografe Melhor

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