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Haiti, nação mais próspera da América Central no século XVII, a época conhecida
como “Pérola do Caribe”, foi o primeiro país Latino Americano a tornar-se independente,
em 1804. Hoje, país mais pobre da América Latina, possui um PIB de US$ 7 bilhões, uma
população de 10 milhões de pessoas, e uma renda média de menos de US$ 2 por dia, umas
das piores do mundo. Com o terremoto de 12 de janeiro de 2010, um “terremoto de
classe”2, que acarretou a morte de 300 mil haitianos, mais de uma centena de milhares de
feridos e um milhão de desabrigados. Entretanto o aspecto principal do terremoto é que esta
tragédia levou o EUA a ocupar militarmente o país sob o véu da ‘ajuda humanitária’ e não
mais indiretamente via ONU.
Ocupado pelas tropas da ONU, desde 20043, depois do golpe de Estado patrocinado
pelo EUA, na denominada missão Minustah (Missão de Estabilização das Nações Unidas
no Haiti)4. O governo brasileiro cumpre um papel central na ocupação do Haiti a serviço e
mando dos interesses imperialistas estadunidenses. O Brasil enviou 1.600 soldados e
chegou a comandar no Haiti mais de 7.000 soldados. Atualmente o total de soldados e
policiais pertencentes a Minustah, alcança o número de 12.000.
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Professora do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Acre (CCJSA /
UFAC). Contato: naziracorreia@gmail.com
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Expressão do inglês, classquake, denominação do geógrafo norteamericano Kenneth Hewitt, a partir de
estudo que ele realizou sobre o terremoto na Guatemala em 1976. Termo que expressa muito bem o caráter de
serem os pobres maiores atingidos por este fenômeno da natureza, cabe nos perguntar por que um terremoto
em um país imperialista como o Japão não tem a proporção do que ocorreu com a população pobre do Haiti.
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O presidente Aristides, deposto em 2004 pelo imperialismo francês e estadunidense, tinha sido reeleito em
2001, ocasião em que reclamou da França o pagamento da indenização que o Haiti tinha pago aquele país por
sua independência, estes valores estavam estimados em US$ 16 bilhões. Aristides tinha sido o primeiro
presidente eleito do Haiti em 1991, quando tentou aumentar o salário mínimo de US$ 1,76 por dia para US$
2,99 diários, medida duramente reprimida pelo imperialismo por ir contra os interesses econômicos das
multinacionais instaladas no Haiti.
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Criada em 30/04/2004 pelo Conselho de Segurança da ONU, sob o pretexto de combater a proliferação de
bandos armados, realizou verdadeiros massacres em Cité Soleil, bairro mais pobre de Puerto Príncipe e
principal local dos adeptos do presidente Aristides (TEITELBAUM, 2010).
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Após o terremoto de janeiro o EUA, sob o pretexto da ajuda humanitária, enviou ao
Haiti mais de 16.000 soldados. Sobre este processo o jornalista Alberto Cruz5 explica o que
denomina da simbiose existente entre a ajuda humanitária e a ocupação militar em vários
países, tendo a frente as Organizações Não Governamentais (ONGS), as quais ele
denomina de Cavalo de Tróia do imperialismo.
5
Alberto Cruz é analista do Centro de Estudos Políticos Para as Relações Internacionais e o Desenvolvimento
(CEPRID): http://www.nodo50.org/ceprid/
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Cruz (2010) cita que Stuart Bowen (inspetor geral para a reconstrução do Iraque) tinha claro que “a ajuda de
emergência e a reconstrução são uma extensão das estratégias políticas, econômicas e militares” (CRUZ,
2010, p.4)
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O EUA tem hoje no Haiti mais de 16 mil soldados, alegando ajuda humanitária após
os acontecimentos de 12 de janeiro. Como alerta Alberto Cruz7 um soldado com um rifle ou
com 1 kg de alimentos é sempre um soldado. Para isto o autor os denomina de “soldados
diplomáticos”, esclarecendo que esta é uma categoria que esconde os reais interesses
econômicos dos países imperialistas que ocupam países em guerra declarada ou não. Esta
modalidade de ocupação está encoberta pelo véu da ajuda humanitária que nada tem de
humano, porque assassina o povo, estupra suas mulheres, mata crianças, prende e tortura
sob a jocosa desculpa de combate ao terrorismo. Assim ocorre no Iraque, no Afeganistão,
na Palestina e em outros países. A guerra do Iraque e do Afeganistão custa ao imperialismo
até 2010 a quantia de US$ 1 trilhão8.
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Alberto Cruz denomina de “soldado diplomático” como a estratégia política e militar do EUA para o Haiti e
outros países ocupados. Entrevista disponível em : http://www.masvoces.org/El-soldado-diplomatico-la
8
Fonte: http://www.nationalpriorities.org/costofwar_home , acesso em 17/02/2010
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Entrevista disponível em:
http://michelcollon.info/index.php?option=com_content&view=article&id=2517:lel-papel-de-las-ong-en-
haiti-plantea-muchas-cuestionesr&catid=1:articles&Itemid=2 , acesso 01/02/2010
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Jornal O Estado de São Paulo, 31/01/2010.
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Um estudo sobre a geopolítica das ONGs como agentes do imperialismo na Amazônia, ver Camely (2009).
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‘capitalismo da piedade’, demonstrando em seu estudo o que está por trás da ajuda
humanitária dos países imperialistas aos países dominados
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Segundo Jean Lavalasse o Haiti possui um dos maiores índices de ONG por habitante no mundo, em
entrevista disponível em:
http://michelcollon.info/index.php?option=com_content&view=article&id=2517:lel-papel-de-las-ong-en-
haiti-plantea-muchas-cuestionesr&catid=1:articles&Itemid=2 , acesso 01/02/2010
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Sobre este tema nos baseamos inteiramente na pesquisa de Hancock (1991). O autor é jornalista e realizou
extensa e corajosa pesquisa sobre o significado da ajuda e cooperação internacional, e atinge seus objetivos ao
elucidar o significado em si da ajuda aos países pobres. Trabalho de fundamental importância já que a grande
maioria dos estudos voltados a esse objetivo é fortemente desencorajada e os poucos que seguem, trabalham
com os dados permitidos pelas agências de ajuda.
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Hancock (1991) descreve os casos de inoperância, desperdícios e descaso, em países
em situação de catástrofes, que a ajuda humanitária coloca em risco a vida de milhares de
pessoas muito pobres. Para a Somália foram enviadas grandes quantidades de remédios que
as autoridades sanitárias desse país consideraram lixo. O Sudão, um dos países mais
quentes do mundo, recebeu doações inúteis como cremes para rachaduras nos pés e
cobertores elétricos. Países que tem na fome seu principal problema recebem sopas e
chocolates dietéticos em grandes quantidades (HANCOCK, 1991, p. 37-38). A
Comunidade Econômica Européia (CEE) enviou toneladas de trigo radioativo, (idem p.39).
A Food for Hungry (norte americana) enviou ao Camboja dezenove toneladas de alimentos
que por estarem tão velhos, tinham sido recusados pelo jardim zoológico de São Francisco,
e os remédios enviados estavam vencidos há mais de quinze anos ( idem, p.39). Os laxantes
e remédios para indigestão estão entre os produtos favoritos das listas de doações.
Hancock (1991) compara os fluxos de ajuda pública realizados por dezoito países
industrializados que alcançou o montante de 45 a 60 bilhões de dólares por ano na década
de 1980. O autor relativiza esta cifra ao compará-la com outros dados: a) os EUA e a então
URSS gastavam US$ 1,5 bilhões por dia com gastos militares para suas defesas, ou seja, o
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total da ajuda mundial equivalia a um mês dos gastos dos países com despesas militares; b)
cinqüenta mísseis “Peacekeeper MX” custavam US$ 4,5 bilhões, mais que a APD da
Alemanha; c) o custo de um ano da “Guerra nas estrelas” foi de US$ 3,9 bilhões, mais do
que a APD do Reino Unido e do Canadá; d) em 1962 os Estados Unidos gastaram quase
US$ 300 milhões para treinamento de golfinhos com fins militares, mais do que o
orçamento de ajuda anual da Áustria e Nova Zelândia juntos; e) em 1988 a Grã Bretanha
gastou quatorze vezes mais com sua defesa do que com doações (US$ 1,8 bilhão). As
mulheres britânica gastaram US$ 480 milhões em perfumes e cosméticos, mais do que toda
a ajuda da Suíça de US$ 429 milhões; f) os free shops faturaram mais de US$ 5,5 bilhões,
mais do que a França despendeu em ajuda; g) os norte americanos gastavam US$ 22
bilhões com cigarros, mais do que as doações dos três maiores doadores juntos (EUA,
Japão e França); h) Michael David Weill, da sociedade americana Lazaid Frères, ganhava
anualmente como salário o equivalente aos orçamentos de ajuda da Nova Zelânia e Irlanda
(US$ 128 milhões), i) os dez bilhões de dólares que os EUA destinavam a ajuda
estrangeira, representavam menos da metade da fortuna de Yoshiaki Tsutsumi, dono do
Grupo SEIBU e um dos homens mais ricos do mundo (HANCOCK, 1991, p.82-84).
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estacionadas até 1985, quando os apelos em favor dos famintos etíopes multiplicaram de
novo as receitas da Oxfam alcançando a cifra de 51,1 milhões de libras, embora elas fossem
inferiores a 20 milhões de libras em 1983-84; b) também em 1985 a Band Aid coleta 76
milhões de libras para os famintos junto ao público britânico; c) os norte americanos
enviaram 1 bilhão de dólares às organizações benevolentes privadas engajadas no terceiro
mundo; d) as organizações War on Want, Oxfam, International Cristian AId, Care
Incorporated, Project Hope, Médicos sem fronteira e Médicos do Mundo, receberam US$
2,4 bilhões para financiarem seus projetos e programas nos países pobres. Em 1985 esta
cifra chega a US$ 4 bilhões com a campanha de combate a fome etíope (idem, p. 24) .
Historicamente a perversa espoliação dos povos das Américas, África e Ásia, foi
acompanhado por missões religiosas que produziram os nefastos efeitos que a história já
conhece. As ONGs e organizações humanitárias têm também trabalhado neste campo e são
freqüentes as denúncias contra elas também na ação de contra-insurgência e espionagem.
Hancock (1991) cita a acusação contra a atuação da Word Vision em Honduras no período
de 1980-1981, onde seus funcionários se recusavam a dar alimentação aos refugiados que
não participassem dos auxílios religiosos da missão dos protestantes. Os funcionários da
Word Vision foram acusados de serem da polícia e de trabalharem para o serviço secreto
para entregarem a localização e o nome de ativistas políticos que estavam nos campos de
refugiados por eles assistidos. A denúncia mais grave foi sobre episódio ocorrido na noite
de 22 de maio de 1981, quando dois refugiados salvadorenhos que estavam abrigados na
cidade hondurenha de Colomoncagua foram recolhidos pela Word Vision e colocados em
um veículo onde lhe disseram que estavam sendo levados ao campo de refugiados de
Limones. No lugar disto eles foram entregues às forças armadas. Alguns dias mais tarde
eles foram encontrados mortos na fronteira. A Word Vision negou veemente todas as
acusações de envolvimento com o caso (HANCOCK, 1991, p.33-34).
No aspecto da caridade estar associada ao missionarismo religioso é esclarecedora a
fala do ex-presidente da Word Vision, Ted Engstrom:”Nós analisamos cada projeto, cada
programa que estamos envolvidos, para nos assegurar que a evangelização é um
componente significante. Nós não vamos alimentar os indivíduos para em seguida os
enviar o inferno”, citado em Hancock (HANCOCK, op.cit, p. 33).
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Análogo ao sentido dos “terermotos de classe” o geógrafo Mike Davis esclarece
sobre o que denomina de “holocaustos coloniais”, na análise que realiza sobre os impactos
do fenômeno climático da seca, o El Niño e El Niña, como catástrofes as quais os países
dominados não poderiam mais responder de forma adequada, a partir do advento do
imperialismo. Davis (2002) cita de Gonçalves Dias a definição de seca: “um elemento
estratégico no processo de acumulação pelas grandes unidades de produção rural no
Nordeste.” Sobre isto Davis (2002) acertadamente conclui que “cada seca global foi o sinal
verde para uma corrida imperialista pela terra”, e cita vários exemplos. A seca sul-africana
de 1877 foi a oportunidade de Carnarvon para atacar a independência zulu; a fome etíope
de 1889-91 foi o aval de Crispi para construir um novo Império Romano no Chifre da
África. A Alemanha guilhermina explorou as inundações e a seca que devastaram
Shandong (China) no final da década de 1890; os EUA usaram a fome e a doença causadas
pela seca como armas para esmagar a República das Filipinas de Aguinaldo.
Davis (2002) analisa, também baseado nos historiadores indianos, a fome na Índia
antes e depois da colonização britânica. Chega à conclusão de que havia poucos indícios de
que a Índia rural passara por crises de subsistência na escala da catástrofe de Bengala de
1770, sob o domínio da Companhia da Índia Oriental, ou o longo cerco de doenças e fome
entre 1875 e 1920, que diminuíram o ritmo do crescimento da população quase a
paralisação. Davis cita um estudo de 1878 publicado no Journal of the Statistical Society,
onde computaram 31 fomes graves em 120 anos de governo britânico na Índia, contra
apenas 17 fomes registradas nos dois milênios anteriores. Os historiadores indianos
mostraram que os governantes, antes da colonização, contavam com políticas de combate à
fome; como os embargos às exportações de alimentos, regulação de preços contra
especulação, taxa de socorro e distribuição de alimentos gratuitos, e sem a exigência de
trabalhos forçados.
A extrema disparidade entre ricos e pobres no mundo é o reflexo da política de
dominação e saque efetuado pelos países imperialistas. Segundo dados do relatório da ONU
(2006) mostram que mais de metade da riqueza mundial está nas mãos de apenas 2% dos
adultos do planeta, enquanto os 50% mais pobres têm só 1%. A riqueza está distribuída de
forma extremamente desigual e também sua distribuição geográfica: 90% do total da
riqueza está concentrada na América do Norte, na Europa e nos países de alta renda da Ásia
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e do Pacífico. O aumento da concentração da riqueza nas mãos de tão poucos, aumentou
enormemente nos últimos cinqüenta anos. Para termos uma idéia o patrimônio per capita
no Japão é de US$ 181 mil, nos EUA de US$ 144 mil, enquanto no Congo e na Etiópia é de
menos de US$ 200.
Conclusão
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Entretanto a ajuda e cooperação dos países imperialistas não significam solidariedade
porque fere toda a autonomia do povo e da nação.
A declaração da Batay Ouvriye16, de 12 de fevereiro de 2010, analisa a dura
situação do povo haitiano e chama a todos para a dura tarefa de reconstrução do país sob o
princípio de que a autonomia da nação não pode ser negociada com o imperialismo e
convoca o povo do Haiti a erguer a cabeça e partir de suas próprias forças para a
reconstrução da nação, conclamando a solidariedade internacional de todos os
trabalhadores.
Referência bibliográfica:
HANCOCK, Graham. Les nababs de la pauvreté. Paris: Éditions Robert Leffont, 1991.
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Considerada a principal organização sindical do Haiti, a declaração completa está disponível em:
http://www.lahaine.org/index.php?p=43225
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