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Discurso de Paul Hawken

Anne-Sophie Bertrand (annesophie@rede-verde.org)


01/2010

Palavras-chave: Paul Hawken, Humanidade, civilização, mundo, natureza

Discurso de início das aulas de 2009 feito por Paul Hawken na Universidade de Portland em
3 de Maio de 2009.

Quando eu fui convidado para fazer este discurso, me perguntaram se eu


poderia fazer um discurso simples e curto, que fosse “direto, cru, firme,
honesto, apaixonado, curto, vibrante, surpreendente e elegante”. Sem
pressões.

Vamos começar com a parte assustadora. Turma de 2009: você terá que
descobrir o que significa ser um ser humano na terra numa época em que cada
sistema de vida está diminuindo e a taxa de diminuição está aumentando. Um
tipo de situação impressionante... mas nenhum artigo publicado nos últimos
trinta anos pode contestar esta afirmação. Basicamente, a civilização precisa de
um novo sistema operacional, vocês são os programadores e nós precisamos
dele em algumas décadas.

Este planeta veio com uma série de instruções, mas parece que nós as
perdemos. Regras importantes como não poluir a água, solo ou ar, não permitir
que a terra seja superpovoada e não tocar no termostato foram violadas. Buckminster Fuller disse que a
nave terra foi tão engenhosamente desenhada que ninguém percebe que nós estamos dentro dela,
voando através do universo a milhões de milhas por hora, sem necessidade de cintos de segurança,
vários assentos e comida realmente boa – mas isso está mudando.

Há um texto invisível no verso do diploma que você vai receber, e caso você não tenha suco de limão
para decodificá-lo, eu posso dizer o que está escrito: Você é brilhante e a terra está contratando. A terra
não pode se dar ao luxo de enviar recrutadores ou limusines para a sua escola. Ela mandou chuva, pôr-
do-sol, cerejas maduras, floradas de damas-da-noite e a pessoa inacreditavelmente adorável que está
saindo com você. Aproveite a dica.

E aqui está o acordo: esqueça que esta tarefa de salvar o planeta não é possível no tempo necessário.
Não seja persuadido por pessoas que sabem o que não é possível. Faça o que tem que ser feito e
verifique se era impossível apenas depois de ter feito.

Quando me perguntam se eu sou pessimista ou otimista sobre o futuro, minha resposta é sempre a
mesma: se você olhar para o que a ciência mostra que está acontecendo na terra e não for pessimista,
você não entende os dados. Mas se você encontra as pessoas que estão trabalhando para restaurar esta
terra e as vidas dos pobres e você não é otimista, você não tem sangue nas veias.

O que eu vejo por todo lado no mundo são pessoas comuns, dispostas a enfrentar o desespero, poder e
chances incalculáveis a fim de restaurar alguns semblantes com graça, justiça e beleza. O poeta Adrienne
Rich escreveu: “Tanto foi destruído que eu coloquei o meu destino na mão daqueles que, época após
época, perversamente, sem nenhum poder extraordinário, reconstituem o mundo.” Não pode haver
melhor descrição. A humanidade está se unindo. Isto é a reconstituição do mundo, e a ação está

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acontecendo nas salas de aula, fazendas, florestas, aldeias, campus, empresas, acampamentos de
refugiados, desertos, peixarias e favelas.

Você se junta a uma multiplicidade de pessoas conscientes. Ninguém sabe quantos grupos e
organizações estão trabalhando nos assuntos mais significativos do nosso dia: mudanças climáticas,
pobreza, desmatamento, paz, água, fome, conservação, direitos humanos e muito mais. Este é o maior
movimento que o mundo já viu. Mais do que controle, procura-se conexão. Mais do que dominância, há
um esforço para dispersar as concentrações de poder. Como a Mercy Corps (Organização não
governamental envolvida em ações humanitárias e promoção do desenvolvimento), trabalha-se nos
bastidores e a tarefa é cumprida. Grande como é, ninguém sabe o verdadeiro tamanho deste movimento.
Ele proporciona esperança e significado para bilhões de pessoas no mundo. Sua influência está na idéia,
não na força. Ele é formado por professores, crianças, camponeses, empresários, rappers, fazendeiros
orgânicos, freiras, artistas, funcionários públicos, pescadores, engenheiros, estudantes, escritores
incorrigíveis, carpideiras muçulmanas, mães preocupadas, poetas, médicos sem fronteiras, cristãos
angustiados, músicos de rua, presidente dos Estados Unidos da América e, como o escritor David James
diria, o Criador, Aquele que ama a todos nós enormemente.

Há um ensino rabínico que diz que se o mundo estiver acabando e o Messias chegar, primeiro plante uma
árvore e só então veja se história é verdadeira. A inspiração não é mencionada nas litanias sobre o que
pode nos acontecer; ela reside na vontade da humanidade para restaurar, corrigir, reformar, reconstruir,
recuperar, reimaginar e reconsiderar. “Um dia você finalmente soube o que tinha que fazer e começou,
embora as vozes ao seu redor continuassem gritando maus conselhos.“, é a descrição de Mary Oliver de
afastar-se do profano em direção a um profundo sentimento de conexão com o mundo vivo.

Milhões de pessoas estão trabalhando em nome de estranhos, mesmo se o jornal da noite geralmente
seja sobre a morte de estranhos. Esta bondade de estranhos tem origem religiosa ou até mesmo mística
e raízes muito específicas no século XVIII. Os abolicionistas foram os primeiros a criar um movimento
nacional e global para defender os direitos daqueles que não conheciam. Até aquela momento, nenhum
grupo havia apresentado uma queixa exceto em nome de si próprio. Os fundadores daquele movimento
eram desconhecidos – Granville Sharp, Thomas Clarkson, Josiah Wedgwood – e seu objetivo era ridículo:
naquela época, para cada quatro pessoas no mundo, três eram escravas. Escravizar uns aos outros era o
que os seres humanos faziam há muito tempo. E o movimento abolicionista foi saudado com
incredulidade. Os porta-vozes dos conservadores ridicularizaram os abolicionistas chamando-os de
liberais, progressistas, humanitaristas, intrometidos e ativistas. Disseram que eles iriam arruinar a
economia e levar a Inglaterra à pobreza. Mas pela primeira vez na história, um grupo de pessoas se
organizou para ajudar pessoas que eles nunca haviam visto, de quem direta ou indiretamente nunca
haviam recebido nenhum benefício.

E hoje, dezenas de milhões de pessoas faz isso todos os dias. Chama-se o mundo dos sem fins lucrativos,
sociedade civil, escolas, empreendedorismo social, organizações não governamentais e companhias que
colocam a justiça social e ambiental no topo de seus objetivos estratégicos. O escopo e a escala deste
esforço não tem paralelos na história.

O mundo vivo não é algum lugar “lá fora”, mas em nosso coração. O que nós sabemos sobre a vida? Nas
palavras da bióloga Janine Benyus, a vida cria as condições que propiciam vida. Eu não posso imaginar
nenhum lema melhor para uma economia futura.

Nós temos dezenas de milhares de lares abandonados sem pessoas e dezenas de milhares de pessoas
abandonadas sem lares. Nós temos banqueiros falidos dando conselhos para reguladores falidos sobre
como salvar seus bens da falência. Nós somos a única espécie no planeta sem emprego pleno. Brilhante.

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Nós temos uma economia que nos diz que é mais barato destruir a terra em tempo real do que renová-
la, restaurá-la e sustentá-la. Você pode imprimir dinheiro para salvar um banco, mas você não pode
imprimir vida para salvar um planeta. Neste momento nós estamos roubando o futuro, vendendo-o no
presente e chamando-o de produto interno bruto. Nós podemos facilmente ter uma economia baseada na
cura do futuro ao invés de roubá-lo. Nós também podemos criar bens para o futuro ou tomar os bens do
futuro. Um se chama restauração e o outro, exploração. E sempre que exploramos a terra, nós
exploramos pessoas e causamos sofrimentos incalculáveis. Trabalhar para a terra não é uma maneira de
obter riquezas, é uma maneira de ser rico.

A primeira célula viva surgiu há 40 milhões de séculos atrás e todos os seus descendentes diretos estão
em todos os nossos fluxos sanguíneos. Literalmente, neste segundo você está respirando moléculas que
foram inaladas por Moisés, Madre Teresa e Bono. Nós estamos infinitamente conectados. Nossos destinos
são inseparáveis. Nós estamos aqui por causa do sonho de cada célula em tornar-se duas. E os sonhos
se realizam. Em cada um de vocês há um quadrilhão de células, 90% das quais não são células humanas.
Seu corpo é uma comunidade e sem esses outros microorganismos vocês morreriam em poucas horas.
Cada célula humana tem 400 bilhões de moléculas realizando milhões de processos entre trilhões de
átomos. A atividade celular total num corpo humano é escalonável: um septilhão de ações a cada
momento, o número um com 24 zeros depois. Em um milissegundo nosso corpo sofre dez vezes mais
processos do que existem estrelas no universo, o que é exatamente o que Charles Darwin anunciou
quando disse que a ciência descobriria que cada criatura viva era um “pequeno universo, formado por
hospedeiros de organismos que se autopropagam, minuto inconcebível e tão numerosos como as estrelas
do céu”.

Assim, eu tenho duas perguntas para vocês.

Primeira: vocês podem sentir seus corpos? Parem por um momento. Sintam seus corpos. Um septilhão
de atividades acontecendo simultaneamente e seu corpo faz isso tão bem que você está livre para
ignorá-lo e imaginar, por exemplo, quando este discurso vai acabar. Vocês podem senti-los. Isso se
chama vida. Isso é o que vocês são.

Segunda pergunta: Quem está no comando do seu corpo? Quem está gerenciando aquelas moléculas?
Espero que não seja a parte política. A vida está criando as condições que geram vida dentro de você,
assim como em toda a natureza. Nossa natureza inata é criar as condições que levam à vida. O que eu
quero é que vocês imaginem que coletivamente a humanidade está manifestando a mais profunda e
inata sabedoria em se unir para curar as feridas e danos do passado.

Ralph Waldo Emerson uma vez perguntou o que faríamos se as estrelas surgissem apenas uma vez a
cada mil anos. Ninguém poderia dormir naquela noite, é claro. O mundo criaria novas religiões toda
noite. Nós ficaríamos empolgados, delirantes, deliciados pela glória de Deus. Mas ao invés disso, as
estrelas surgem todas as noites e nós assistimos televisão.

Neste momento extraordinário quando nós estamos globalmente cientes de nós mesmos e dos múltiplos
perigos que ameaçam a civilização que nunca aconteceram, não em milhares de anos, não em dez
milhões de anos. Cada um de nós é tão complexo e belo como todas as estrelas no universo. Nós fizemos
coisas ótimas e fomos longe em termos de honrar a criação. Vocês estão se formando no mais
assustador e estupefante desafio jamais enfrentado por qualquer geração. A geração anterior falhou. Eles
não dormiram todas as noites. Eles se distraíram e perderam de vista o fato de que a vida é um milagre
em cada momento de nossa existência. A natureza assegura que você esteja do lado dela. Você não
pode pedir por um chefe melhor. A pessoa mais realista do mundo é o cínico e não o sonhador.

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Esperança só faz sentido quando não faz sentido ter esperança. Este é o nosso século. Pegue-o e corra,
como se sua vida dependesse disso.

………
Paul Hawken é um renomado empresário, ativista ambiental visionário e autor de vários livros, o mais
recente é "Bem-aventurada crise: Como o maior movimento do mundo surgiu e porque ninguém o viu
chegando."

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Tradução para Rede Verde Conservation Network Inc.: Maria do Carmo Dias Bueno

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