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gem? Do lado do escritor preciso frisar que ele no possui de modo absoluto
a idia daquilo que vai escrever. Trata-se, na verdade, de uma fixao ou de uma
coagulao produzida durante muito tempo de trabalho. Esta fixao delimita
o campo no interior do qual o uso das significaes disponveis expressar algo
novo. Ainda que haja trabalho de pensamento, o trabalho do escritor , antes,
um trabalho de linguagem que produz um sistema de signos que restitui por
seu agenciamento interno a paisagem de uma experincia.18 No decorrer de seu
trabalho ele embaralha todas as distines, e isto, porque ao passar da linguagem
instituda linguagem instituinte ele se liberta ao mesmo tempo da semelhana
com as coisas e do ideal da obra de arte acabada. Merleau-Ponty interpreta a
adequao da linguagem ao seu sentido total e o fato da expresso ser sempre
aproximada como um pathos da linguagem comum a muitos escritores do sculo passado. A experincia da linguagem chama ateno do filsofo para a fala
espontnea que se encontra nos antpodas da literatura significante. Do lado do
escritor interessante lembrar o exemplo de Valry e de Stendhal. Em Valry,
Merleau-Ponty chama a ateno para o fato de que h uma espcie de reabilitao
total da linguagem, donde sua literatura consciente e aceita, assim como sua
vontade de falar e de viver. Em Stendhal, trata-se de sublinhar que a linguagem
a funo central que constri uma vida como uma obra, e que transforma em
motivo de vida at nossas dificuldades de ser.19
Do lado do leitor no podemos deixar de notar que ele j se encontra
operando no registro da linguagem em que a obra foi escrita. Ele comea a ler um
livro sem que tenha dvidas das palavras que so empregadas, mas, aos poucos,
graas a uma espcie de desvio da linguagem instituda, o leitor passa a habitar
o mundo criado pelo escritor. A partir desta perspectiva, a realeza do leitor
apenas imaginria, j que ele tira toda sua potncia desta mquina infernal que
o livro, aparelho de criar significaes.20 Donde o poder que o leitor tem de
ultrapassar-se pela leitura; ele deve isto ao fato de ser sujeito falante, isto ,
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Referncias bibliogrficas
MERLEAU-PONTY, Maurice. Signes. Paris: Gallimard, 1996.
______. A prosa do mundo. Traduo de Paulo Neves. So Paulo: Cosac & Naif,
2002.
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