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UFRJ - ENCONTRO UFRJMAR

PREOCUPAÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS: GRUPOS DE TRABALHO


INTERDISCIPLINAR.

“Renunciar à psicologia na hora de elaborar um projeto de educação


significa renunciar a toda a possibilidade de entender/explicar e fundamentar
cientificamente o processo educativo, significa constituir o corpus técnico da
educação social e da instituição sobre bases exclusivamente ideológicas, seria
prescindir dos alicerces para a formação de docentes, prescindir de elos de
conexão entre as múltiplas disciplinas que deviam ter como resultado imediato
uma virada radical nos enfoques científicos do processo educativo.

Lev. S. Vigotsky.

O experimento pedagógico é uma observação múltipla conformada pelo


problema estudado, em geral demanda um período bastante amplo de
atividades complexas de caráter interdisciplinar.
A atividade mental tem que ser vista como processo. A base de estudo
da atividade mental; inclui a(s) lógica(s), o estudo do psiquismo – as
diversidades das formas no pensamento, das relações mútuas, dos seus
movimentos intercondicionados.
Ao investigar problemas de ensino/aprendizagem é preciso partir de
uma pesquisa multifacética referida às relações globais dos fenômenos
psicopedagógicos e sócio históricos. Para conhecer verdadeiramente um
objeto é preciso incluir e estudar todos os seus aspectos, seus vínculos, suas
mediações. É evidente que nunca se examinam todos os limites, mas a
exigência da multilateralidade previne quanto à rigidez anquilosante ou o
encapsulamento temático.
Qualquer ato de cultura é um ato social, ocorre primeiro entre pessoas ou
entre pessoas e os suportes de comunicação, existe sempre um outro ou há
outros. Nos confrontos, na interlocução sabendo ouvir, podem aparecer novos
traços simbólicos e/ou afetivos, pontos de vista diversos que facilitem a
apropriação de assuntos ou temas que se precise vir a conhecer. Caminha-se
pelo interpessoal para o intrapessoal, não perdendo de vista a produção final.
O homem como ser social ao constituir conhecimento desenvolve
atividades de sujeito/objeto diante da natureza ou com o que ele produz:

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técnicas e tecnologias. Também, se vê especificamente como sujeito/sujeito
quando tem contato direto ou indireto com outros para reconstituir a herança
cultural e histórica.
Para a psicologia é importante revelar o papel da comunicação na
formação e no desenvolvimento do sujeito grupal ou coletivo, nas conexões
que existem na realidade, nos processos de interação, onde se revelam
cooperação, consentimento, contradição, identificação, rejeição, recusa... Um
grupo de pessoas que realiza atividades se manifesta como um conjunto que
possui um sistema de qualidades e não se reduz à soma do que é de cada um.
O papel decisivo é o do intercâmbio recíproco de informação entre os
componentes de grupos interdisciplinares, tanto no planejamento conjunto, na
divisão de funções, na coordenação, no estímulo recíproco, no controle
dividido entre todos, na elaboração das normas, na determinação dos
princípios de convivência não hierarquizada: não existirão, inicialmente,
coordenadores que planejam e fazem projetos e executores que realizam
tarefas.
O diálogo interdisciplinar se esteriliza quando os problemas são mal
propostos em torno de ortodoxias, conformismos, exatidões ou quando cada
um luta por ser reconhecido, no presente, em função do seu passado,
paralisando-se diante da incerteza do futuro.
Henri Wallon, em PORTRAITS D’EDUCATEURS afirma: “O grupo é
indispensável não só para a aprendizagem social, mas para desenvolver
conhecimentos e formar eticamente a consciência, a lealdade científica que
pode se desenvolver. O grupo coloca duas exigências opostas:
• De um lado a “afiliação” ao todo em seu conjunto, caso contrário perde
a qualidade de grupo. Os participantes ainda tem de assemelhar sua
posição à posição dos outros, cada um deve se identificar ao grupo em
sua totalidade: aos indivíduos, aos interesses e às aspirações .
• De outro lado, ninguém pode verdadeiramente se agregar ao grupo a
não ser entrando em sua estrutura, quer dizer tomando um lugar, um
papel específico, diferenciando-se dos outros, aceitando-os como
árbitros de seus acertos ou de seus desfalecimentos, mantendo-se entre
eles como figura distinta. O lugar é variável conforme os méritos que o
grupo lhe garante, as tarefas que assume, as sanções a seu amor próprio
com que se depara e elabora.

As normas impostas para o pertencimento ao grupo, obrigam cada um a


regular sua ação e a controlar as dos outros como num espelho, a ter
consciência de alteridade. Tem que ser feita uma imagem exterior do si
mesmo conformando-a a exigências que reduzem a absoluta espontaneidade e

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a visão subjetiva. O grupo depende daquilo que os membros são e do que
fazem, impõe exigências, dá novas formas aos fins particulares em suas
atividades. A existência de um grupo não se 3póia só em relações afetivas dos
indivíduos, sua constituição impõe aos membros obrigações definidas.
A contestação da lógica positivista amplia a discussão sobre os modelos
em que se organizam os conhecimentos. Contrapõem-se linearidades e
árvores, modelos à dicionário e à enciclopédia. Uns apenas encaram o homem
como animal racional, ponto. Outros, como ser que antecipa resultados e
conquista o espaço, que projeta mundos futuros.
Na rede, teia ou constelação cada ponto pode ter conexão com qualquer
outro ponto, não há interior ou exterior, nem direção obrigatória. Cada um de
seus pontos, nexos, pode ser ligado a qualquer outro ponto, sendo o processo
de conexão um contínuo de correção das conexões. Torna-se ilimitada porque
sua configuração é sempre distinta da que era um momento antes e pode-se
percorrê-la segundo linhas diferentes.
No trabalho interdisciplinar será possível, talvez, desvelar o que é evidente
– nunca houve uma época áurea de certezas e tranqüilidade para o homem e
suas instituições. Pode-se afirmar que “natural é o conflito”. A contraposição
leva a entender que a objetividade científica reside no trabalho de crítica às
teorias anteriores de onde poderá surgir alguma síntese nova, provisória,
também, como verdade.
A revitalização das instituições de ensino depende também, da
competência desenvolvida no “ensinar a criticar”. Isso impõe trabalhos que
evitem a reprodução da palavra do mestre e encaminhem para levantamento
de hipóteses, desenvolvimento de capacidade de reversão de análises e
interpretações, multiplicação de relações de inclusão ou exclusão capazes de
preparar para a obtenção de novas hipóteses.
A sociedade exige com urgência a formação multifacética,
pluridisciplinar que capacita a incluir temas ou problemas em diferentes
repertórios ou seriações.
Num projeto interdisciplinar, entre outras atitudes será necessário atentar
para:
• Estabelecer patamares comuns quanto à postura diante da filosofia e da
ciência.
• Reexaminar as relações entre as disciplinas e a sociedade, incluindo
objetivos culturais e exame da instituição.
• Explicitar os conceitos-chave para a fundamentação teórico-prática.
• Registrar as experiências, observações, leituras para examinar
procedimentos e contribuições que possam gerar novas práticas ou
conhecimentos.

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• Criar hábitos novos de franco convívio científico, pautados na possibilidade
de duvidar de conclusões apresentadas, fazer objeções, pedir
esclarecimentos, admitir a modificação de posturas teóricas, procurar as
convergências, expor trabalhos inconclusos ou em impasse para ouvir
sugestões ou críticas.

Há anos caímos na superespecialização no ensino, tópicos ou unidades de


disciplinas vieram a se constituir em “novas disciplinas”, microfragmentando
informações, em prejuízo da constituição conceitual e da formação
profissional de intelectuais que possam vir a ser dirigentes. Tem sido
insuficiente, senão inexistente, a reflexão sobre como essas decisões absurdas
vem afetando o percurso da apropriação do saber pelos alunos, contribuindo
para a desistência, a sensação de dificuldades insuperáveis e, finalmente, a
evasão dos cursos. Esse ensino-partido atribui ao aluno, quase
exclusivamente, a reconstituição do percurso das transformações da
acumulação histórica do conhecimento. Aos 18, 20, 22 anos só alguns poucos,
muito poucos alunos, conseguem. Isso gera frustrações amplas em discentes e
docentes.
O grupo é o vinculo de práticas sociais, ultrapassa as relações puramente
subjetivas de pessoa a pessoa, porque seus objetivos estão no conhecimento
que deve chegar a produzir, na contribuição às instituições que lhe dão
suporte, nos compromissos sociais e políticos que deram origem ou
justificaram sua criação.

Texto em elaboração.
Maria Helena Silveira
UFRJ - 08/2006.

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