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AULA Nº 17 – Relações entre os

microrganismos e o Homem
• A microbiota normal do corpo humano
• Consequências da exposição aos microrganismos
— Comensalismo
— Mutualismo
— Parasitismo
• Terminologia referente às doenças infecciosas
• Etapas do processo infeccioso

Microbiota Normal do Corpo Humano


Num humano saudável, os tecidos e órgãos internos (cérebro, fígado, pulmões, rins, entre
outros) são completamente estéreis, ao contrário dos tecidos mais superficiais (pele e
membranas mucosas), que estão constantemente em contacto com microrganismos, tornando-se
facilmente colonizáveis por certas espécies microbianas. A mistura de microrganismos que,
normalmente, pode ser encontrada nos vários locais anatómicos é chamada microbiota normal.
O seu estudo é fundamental porque:
• Permite uma melhor compreensão das possíveis infecções que podem surgir em
consequência de uma lesão numa localização específica.
• Torna possível perceber as causas e consequências da colonização e crescimento de
microrganismos normalmente ausentes de um local específico do corpo.
• Ajuda à compreensão dos mecanismos de imunidade: a microbiota interage com o sistema
imunitário, estimulando o seu desenvolvimento e maturação, contribuindo assim para
defender o homem de agentes patogénicos.
• A microbiota fornece nutrientes e capacidades úteis ao homem: vitaminas do complexo B, e
enzimas que permitem a degradação de substratos complexos.

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Locais colonizados pela microbiota e principais bactérias presentes nos mesmos

• Pele e membranas contíguas – a maioria das bactérias da pele são encontradas nas células
superficiais, colonizando células mortas ou associadas com sebo e glândulas sudoríparas. As
secreções destas glândulas fornecem a água, aminoácidos, ureia, electrólitos e certos ácidos
gordos que servem de nutrientes aos Staphylococcus epidermis e Corynebactérias aeróbias.
A bactéria que prevalece em maior quantidade nas glândulas sebáceas é a
Propionibacterium acnes.
• Vias Respiratórias Superiores – Nariz: Stapphylococcus aureus e S. Epidermis.
Nasofaringe: pode conter um pequeno número de bactérias potencialmente patogénicas, tais
como Streptococcus pneumoniae, Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae.
É ainda importante referir que o restante tracto respiratório (traqueia, brônquios, bronquíolos
e alvéolos) não possui uma microbiota normal, uma vez que existem vários mecanismos que
permitem a remoção dos microrganismos, como o muco gerado pelas células caliciformes,
macrófagos presentes nos alvéolos e ainda a presença de lisozima no muco nasal.
• Tracto Gastrointestinal – Estômago: têm uma pequena quantidade de microrganismos,
uma vez que os valores de pH são muito baixos. Apesar disto, podemos encontrar
Helicobacter pylori, Streptococcus, Staphylococcus, Lactobacillus, entre outros. Intestino
delgado: Lactobaccilus spp., Bacteroides spp, Clostridum spp., etc. Intestino grosso (cólon):
é a zona do organismo que tem a maior comunidade microbiana, sendo alguns exemplos de
bactérias lá presentes a Escherichia coli, Klebsiella spp., Proteus spp., etc. È importante
referir que, caso o ambiente intestinal seja perturbado, seja por stress, mudanças de altitude,
fome, parasitas, diarreia ou uso de antibióticos, a microbiota pode mudar em grande escala.
• Abertura externa da uretra – Staphylococcus epidermis, Enterococcus faecalis e
Corynebacterium spp.
• Abertura da vagina – Lactobacillus acidophilus, fermentam o glicogénio produzido pelo
epitélio vaginal, formando acido láctico, mantendo assim o pH da vagina e cérvix entre 4.4 e
4.6
• Canal externo do ouvido – Difeteróides e Pseudomonas
• Partes exteriores dos olhos (conjuntiva e pálpebras) – bactéria predominante:
Staphylococcus epidermis, seguida por S. Aureus, Haemophilus spp. e Streptococcus
pneumoniae.

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Fig. 17.1 - Microbiota normal do corpo humano: microrganismos que podem ser encontrados
em várias localizações do organismo.

Apesar da existência de uma microbiota normal, é fundamental que certos locais, órgãos e fluidos
se mantenham estéreis. Exemplos dos mesmos são:
• Coração • Ouvido médio e interno
• Fígado • Olhos (partes internas)
• Rins e bexiga • Sangue
• Pulmões • Urina nos rins
• Cérebro e espinal medula • Liquido encefaloraquidiano
• Músculos • Líquido amniótico
• Ossos • Sémen
• Glândulas • Saliva antes de entrar na cavidade
• Sinus bucal

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A microbiota de um indivíduo é flutuante, ou seja, este não terá sempre a mesma percentagem de
microrganismos numa determinada parte do corpo. Os vários factores que influenciam a microbiota
são:
• Idade
• Estado de saúde
• Variações na dieta alimentar (ex: pessoa que se torna vegetariana pode ter distúrbios a nível
da microbiota intestinal)
• Higiene
• Hormonas
• Uso de agentes quimioterapêuticos (ex: antibióticos de largo espectro, que alteram a flora
intestinal)

A relação entre a microbiota normal e o hospedeiro


A interacção entre um hospedeiro e o microrganismo é um processo dinâmico, no qual cada um dos
intervenientes tenta maximizar a sua sobrevivência.

As relações entre o microrganismo e o hospedeiro podem ser de 3 tipos:


 Mutualismo – relação da qual resultam benefícios para o hospedeiro e para o
microrganismo.
 Comensalismo – relação da qual o comensal beneficia, embora dela não resulte dano para o
outro ser (por vezes chamado de hospedeiro).
 Parasitismo – relação na qual o microrganismo (parasita) está dependente do seu
hospedeiro, prejudicando-o, sendo que desta situação pode resultar uma infecção ou doença.

Fig. 17.2 - Relações simbióticas. Estas são relações dinâmicas, uma vez que podem ocorrer trocas
entre elas, tal como indicado pelas setas na figura. O mutualismo é a relação mais benéfica, a mais
destrutiva é o parasitismo. A susceptibilidade do hospedeiro, a virulência do organismo parasita e o
número de parasitas são factores que influenciam estas relações.
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Patogénese das Doenças Bacterianas

Um patogene é um microrganismo (ou vírus) que tem a capacidade de produzir doença. A


patogenicidade é a capacidade que um microrganismo tem de produzir doença noutro organismo, o
chamado hospedeiro. A patogenicidade pode ser uma manifestação da interacção hospedeiro-
parasita.
Nos humanos, algumas bactérias da microbiota normal (ex. Staphylococcus aureus, Streptococcus
pneumoniae, Haemophilus influenzae) são potenciais patogenes que vivem numa relação de
comensalismo ou parasitismo, sem produzir doença no hospedeiro, a menos que exista alguma
oportunidade para tal, devido a algum comprometimento/fraqueza nas barreiras anatómicas, na
resistência tecidular ou no sistema imunitário. Sendo assim, o estado de saúde dependerá do
equilíbrio entre as defesas do homem e a multiplicação microbiana.

Quando um parasita esta a crescer no hospedeiro, podemos afirmar que este último tem uma
infecção. A natureza da infecção pode variar em grande número, tendo em conta a severidade,
localização e o número de organismos envolvidos. Uma infecção pode ou não resultar numa doença
infecciosa, que pode ser definida como qualquer mudança do estado de saúde no qual parte ou todo
o organismo do hospedeiro não é capaz de executar as suas funções normais, devido à presença de
um patogene.

Os indicadores de um estado de doença são os sinais e sintomas. Os sintomas são subjectivos,


correspondem a descrições do paciente sobre o que sente, enquanto os sinais são visíveis pelo
observador, são objectivos.
Nas doenças infecciosas temos como sintomas comuns dores, mal estar e falta de apetite.
Relativamente aos sinais, pode verificar-se a presença de edema, granuloma, abcessos e
linfoadenite (nódulos linfáticos inchados). Existem ainda determinados sinais que indicam uma
infecção no sangue, tais como leucocitose (aumento do número de glóbulos brancos), leucopenia
(menor número de glóbulos brancos), septicemia, bacteriemia e anticorpos específicos.
As infecções são, por natureza, assintomáticas.

A doença inicia-se com a colonização e, caso se


verifique um aumento da carga microbiana, esta
pode evoluir para uma infecção e posteriormente
para um estado de doença.

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Fig. 17.3 – Fases do desenvolvimento de uma doença. Inicialmente verifica-se um contacto com o
microrganismo e decorre um período de incubação. Caso a carga microbiana aumente, estaremos na
presença de uma infecção, fase em que já existe uma resposta imunitária mas não se verificam
sintomas, sendo apenas detectáveis algumas manifestações laboratoriais da doença. Com o
progressivo aumento da carga microbiana verificamos a passagem ao estado de doença, em que já
se verificam os sinais e sintomas referidos anteriormente.

Caso a infecção seja resultante de um primeiro contacto com o microrganismo, ou seja, caso
estejamos na presença de uma primo-infecção, poderão ocorrer várias situações:

• Eliminação pura e simples do parasita


Infecção aguda – gripe, vírus influenza
• Transporte do parasita de forma assintomática, temporariamente – Salmonella typhi
• Transporte do parasita de forma assintomática
Infecção latente de forma duradoura – Mycobacterium tuberculosis, HIV

Nos dois últimos casos as pessoas “transportam” o microrganismo, podendo contaminar o


meio ambiente e/ou transmitir o microrganismo a outros seres.

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Etapas do processo infeccioso

Antes de explicar quais as etapas do processo infeccioso torna-se importante clarificar que as
bactérias patogénicas podem causar doença através de diferentes modos:

1. Invasibilidade – é a capacidade de invadir tecidos. Envolve mecanismos de colonização


(aderência e multiplicação inicial), produção de substâncias extracelulares que facilitam a invasão
(invasinas) e a capacidade de vencer os mecanismos de defesa do hospedeiro.

2. Toxigenicidade – é a capacidade de produzir toxinas, que podem ser exotoxinas (substâncias que
são libertadas pelas bactérias, que actuam em locais específicos) ou endotoxinas (substâncias
associadas ao lipopolissacárido da membrana externa das bactérias gram-negativas).

Invasibilidade

O processo infeccioso, por bactérias patogénicas, normalmente inclui as seguintes etapas/condições:


1. Transporte para o hospedeiro
2. Colonização, Adesão e/ou Invasão ao hospedeiro
3. Evasão aos mecanismos de defesa do hospedeiro  lesões e alterações patológicas
4. Libertação do hospedeiro
a. com retorno ao reservatório ou

b. entrada num novo hospedeiro

Colonização

A colonização define-se como o estabelecimento do patogene na porta de entrada apropriada, local


onde se poderá desenvolver e multiplicar. Os patogenes normalmente colonizam tecidos do
hospedeiro que estão em contacto com o meio envolvente. Os locais de entrada em hospedeiros
humanos incluem os tractos urogenital, digestivo e respiratório e ainda a conjuntiva (o revestimento
fino e resistente que cobre a parte posterior da pálpebra e se prolonga para trás para cobrir a
esclerótica (o branco do olho)).

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Fig. 17.4 – As portas de entradas utilizadas pelos microrganismos.

Modos de entrada dos microrganismos no hospedeiro

• Inalação – Vírus influenza, Mycobacterium tuberculosis, Legionella


• Ingestão (via fecal-oral) – Salmonella sp.,Vibrio colerae, Brucella
• Picadas de insectos – Plasmodium e Borrella burgdorferi
• Contacto sexual – HIV, Treponema pallidum, Neisseria gonorrhoeae
• Transfusão de sangue – HIV, HCV (vírus da hepatite C), HBV (vírus da hepatite B)
• Feridas e lesões (naturais ou cirúrgicas) – Clostridium tetani, C. Perfringens
• Transplante de órgãos

Os organismos que infectam as regiões anteriormente referidas desenvolvem mecanismos de


aderência aos tecidos e a capacidade de “ultrapassar” a constante pressão das defesas do hospedeiro
à superfície.

A colonização não resulta necessariamente em invasão ou danos para o hospedeiro. Os factores que
determinam o estabelecimento do agente e a progressão para a doença são:

• O número de parasitas no inoculo


• A capacidade invasiva do agente patogénico
• Grau de resistência do hospedeiro (um dos factores mais importantes)

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A capacidade invasiva do agente patogénico traduz-se pela dose infectante (ID), que é uma forma
de quantificar a virulência do mesmo. A dose infectante pode definir-se como a quantidade do
agente etiológico necessário para iniciar uma infecção.

Exemplos de algumas bactérias e da sua ID:

• Rickettesia (febre Q) – 1
• Mycobacterium tuberculosis – 10
• Giardia – 10
• Neisseria gonorrhoeae - 1000
• Salmonella typhi – 10 000
• Vibrio cholerae – 1 x 109

Aderência

Os patogenes bacterianos aderem, com um alto grau de especificidade, a certos tecidos. A causa
desta especificidade são as adesinas, moléculas de adesão especializadas ou estruturas na superfície
da bactéria, que se ligam a locais receptores complementares na superfície da célula do hospedeiro.
São produtos bacterianos ou componentes estruturais que contribuem para a virulência ou
patogenicidade.

Factor de aderência Descrição


Estruturas filamentosas que permitem que as
Fimbriae
bactérias se fixem a superfícies sólidas
Filamentos de hemaglutinina Causam a agregação dos eritrócitos
Cápsulas e glicocalixes Inibem a fagocitose e ajudam à aderência
Componentes das paredes celulares das
Ácidos teicóicos e lipoteicóicos
bactérias Gram + e que ajudam à aderência

Tabela 17.1 – Exemplos de alguns factores de aderência.

Invasão

A invasão de um hospedeiro por um patogene pode ser ajudada pela produção de substâncias
bacterianas extracelulares, que actuam contra o hospedeiro ao quebrar as defesas primárias ou
secundárias do organismo. Estas substâncias são muitas vezes referidas como invasinas. A maioria
das invasinas são proteínas (enzimas) que actuam localmente para danificar as células do
hospedeiro e/ou ter o efeito imediato de facilitar o crescimento e o “espalhar” do patogene. Os
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danos para o hospedeiro, como resultado desta actividade invasiva pode tornar-se parte da patologia
de uma doença infecciosa.

Invasina Microrganismo Mecanismo de acção


Degrada o ácido hialurónico do
Streptococcus, Staphylococcus
Hialuronidase tecido conjuntivo (importante
e Clostridium
p/abrir o epitélio das mucosas)
Degrada o colagénio do tecido
Colagenase Clostridium sp.
conjuntivo
Vibrio cholerae e Shigella Degrada o ácido neuramínico
Neuraminidase
dysenteriae da mucosa intestinal.
Promove a coagulação do
plasma, promovendo a
Coagulase Staphylococcus aureus
conversão do fibrinogénio a
fibrina
Liga-se ao plasminogénio e
Staphylococcus e induz a produção de plasmina
Estreptoquinase
Streptococcus conduzindo à degradação dos
coágulos de fibrina
Elastase Pseudomonas aeruginosa Degrada a lâmina
Destrói as membranas das
Lecitinase Clostridium perfringes
células do hospedeiro
Induz a endocitose da bactéria
Evasina Yersinia pestis
que a produz.
Repele os fagócitos, destrói a
sua membrana e causa
Streptolysina Streptococcus pyogenes
libertação dos grânulos
lisossomais
Destroem os fosfolípidos na
Fosfolipases Clostridium perfringens
membrana da célula

Tabela 17.2 – Exemplos de proteínas bacterianas extracelulares que são consideradas


invasinas.
Existem ainda bactérias que causam doenças graves sem invadirem os tecidos, ou seja, não é
necessária invasão para existir um efeito patológico, basta as bactérias tocarem nas mucosas e
secretarem uma toxina, que será a responsável pelo aparecimento da doença.

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Tabela 17.3. – Bactérias que causam doenças graves sem invadir os tecidos.

Como já referido, um dos factores mais importantes no estabelecimento de uma doença é o estado
de saúde do hospedeiro, ou seja, o grau de resistência do hospedeiro.
Microrganismos oportunistas podem causar doença em hospedeiros comprometidos, ou seja,
hospedeiros que se encontram seriamente debilitados e tem uma resistência reduzida à infecção.
Existem várias causas para esta condição, incluindo má nutrição, alcoolismo, cancro, diabetes,
leucemia, outra doença infecciosa, trauma de cirurgia, microbiota normal alterada devido ao uso
prolongado de antibióticos e imunossupressão por vários factores como, por exemplo, drogas, vírus
[HIV], hormonas e deficiências genéticas.
Como podemos verificar no seguinte esquema, quando ocorre uma imunodeficiência o organismo
torna-se mais susceptível a bactérias das quais estaria protegido caso o seu sistema imunitário
funcionasse correctamente. Sendo assim pode concluir-se que o estado imunológico do
hospedeiro é das características mais importantes na relação saúde-doença.

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Fig. 17.5 - Associação entre as infecções oportunistas e a contagem de linfócitos CD4+.

A invasão por agentes patogénicos pode levar a várias lesões e alterações, tais como:

1. Morte celular devido à acção de:


- toxinas
- linfócitos citotóxicos
- apoptose
2. Alterações fisiológicas devido à acção de toxinas
- cólera, botulismo e tétano
3. Alterações mecânicas
- obstrução de passagens vitais (por ex., os Staphylococcus “entopem” os capilares)
4. Respostas imunopatológicas
- reacção de inflamação excessiva (Mycobacterium tuberculosis)

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Toxigenicidade
Podemos distinguir duas categorias diferentes de doença, baseando-nos no papel das bactérias no
processo causador da doença: infecções e intoxicações. Uma doença infecciosa resulta, em parte,
do crescimento e reprodução do patogene, que normalmente produz alterações dos tecidos.
Intoxicações são doenças que resultam da entrada de uma toxina específica, previamente formada,
no organismo do hospedeiro. Uma toxina é uma substância, como um produto metabólico do
organismo, que altera o metabolismo normal das células do hospedeiro, com efeitos prejudiciais
para o hospedeiro. É ainda importante referir que as toxinas são os factores de virulência mais
evidentes.
As toxinas bacterianas podem ser divididas em duas categorias: exotoxinas e endotoxinas.

Exotoxinas

As exotoxinas são proteínas solúveis, secretadas pela bactéria, que podem ser destruídas ou
alteradas por acção do calor. Normalmente são libertadas enquanto ocorre o crescimento bacteriano.
Frequentemente as toxinas podem viajar do local de infecção para outros tecidos ou células alvo,
onde exercem os seus efeitos.

As exotoxinas caracterizam-se por várias propriedades:

• São proteínas sintetizadas por bactérias específicas, que contêm plasmídeos ou bacteriófagos
que transportam os genes da toxina.
• São termolábeis: a temperaturas entre 60 e 80ºC são destruídas.
• São tóxicas em pequenas doses.
• Têm mecanismos de acção específicos.
• São altamente imunogénicas e induzem a produção de anticorpos neutralizantes (chamados
anti-toxinas).
• Podem ser facilmente inactivadas pelo calor, pelo formaldeído ou outros químicos,
formando toxóides imunogénicos.
• Não induzem febre directamente no hospedeiro.
• São agrupadas, segundo o seu mecanismo de acção, em neurotoxinas, citotoxinas ou
enterotoxinas.
• Frequentemente dão o nome à doença que produzem.

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Podemos considerar a existência de três tipos de exotoxinas, baseando-nos no seu mecanismo de
acção:
• Tipo I – Superantigénios
• Tipo II – Actuam na membrana dos eucariontes
• Tipo III – Toxinas A-B
o Simples
o Complexas

Superantigénios

São proteínas bacterianas que estimulam, de modo não específico, a proliferação das células T,
através da interacção do MHC-2 (presente nas células apresentadoras de antigénios) com o TCR (T-
Cell Receptor), fora do local de ligação do antigénio. Por outras palavras, o superantigénio promove
a ligação do TCR ao MHC-2, sem este último apresentar um antigénio.
Temos, como exemplo de superantigénio, a toxina do síndrome do choque tóxico (TSTT),
produzida por algumas estirpes de Staphylococcus aureus.
Os superantigénios actuam estimulando a libertação de grandes quantidades de citocinas pelas
células T, sendo capazes de provocar uma resposta imunológica drástica.
Estas citocinas têm dois efeitos no hospedeiro: toxicidade sistémica e supressão da resposta
imunitária específica. Ambos os efeitos contribuem para a patogenicidade bacteriana.

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Fig. 17.6 - Modo de apresentação normal dos antigénios e a acção dos superantigénios.
Exotoxinas tipo II

Estas toxinas actuam ao nível da membrana plasmática, perturbando a integridade da mesma, o que
causará a lise das células do hospedeiro.

Dentro desta categoria de toxinas existem 2 tipos:

 Exotoxina formadora de poros: proteína que se liga à porção da membrana plasmática do


hospedeiro que é formada por colesterol, insere-se na mesma e forma um canal (poro). Isto leva à
libertação dos componentes citoplasmáticos. Além disso, dá-se um influxo de água para dentro da
célula, devido ao facto da osmolaridade do citoplasma ser superior à do fluído extracelular, o que
resulta na ruptura da membrana.
Como exemplos deste tipo de toxinas temos:
• Leucocidinas, produzidas pelos Streptococcus pneumoniae. Destroem os leucócitos,
o que resulta numa diminuição da resistência do hospedeiro.
• Streptolisina O, produzida pelos Streptococcus pyogenes. É inactivada pelo O2 e
causa a β-hemólise dos eritrócitos em placas de agar incubadas anaerobiamente.

 Fosfolipases: estas enzimas removem o grupo carregado da porção lipídica dos fosfolípidos da
membrana do hospedeiro, o que a destabiliza, causando a lise e, consequentemente, a morte celular.
Um exemplo de uma patologia associada à acção das fosfolipases é a gangrena gasosa, doença
bacteriana responsável pela produção de gás entre os tecidos. Nesta patologia a α-toxina da bactéria
Clostridium perfigens destrói, quase totalmente, a população local de leucócitos que se desloca para
o local de infecção, para combater a infecção.

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Fig. 17.7 - Os dois tipos de exotoxinas do tipo II.

Toxinas A-B

São compostas por duas subunidades: uma subunidade enzimática ou fragmento A, que é
responsável pelo efeito tóxico, quando dentro da célula hospedeira, e uma subunidade de ligação
ou fragmento B. As subunidades A, isoladamente, são enzimaticamente activas, mas não têm a
capacidade de se ligarem às células e entrarem nas mesmas, enquanto as subunidades B isoladas
ligam-se às células alvo, mas não são tóxicas nem biologicamente activas.

Já foram propostos vários mecanismos para a


entrada das subunidades A nas células alvo.
Num dos mecanismos a subunidade B insere-
se na membrana plasmática e cria um poro,
através do qual a subunidade A entra no
citoplasma da célula. No outro mecanismo, a
toxina liga-se à célula alvo e ambas as suas
subunidades entram na célula, através de um
processo denominado endocitose mediada por
receptores. A toxina é internalizada na célula,
numa vesícula – o endossoma. A entrada de
iões H+ no endossoma causa uma diminuição
do pH interno desta vesícula, o que leva à
separação das subunidades da toxina. A
subunidade B afecta a libertação da
subunidade A do endossoma, de modo a que
esta atinja o seu alvo no citoplasma da célula.
A subunidade B permanece no endossoma e é
reciclada e transportada para a superfície da
célula.

Fig. 17.7 - Modo de entrada das toxinas do tipo A-B na célula.

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As exotoxinas podem ser simples ou complexas, sendo que a diferença entre elas é o facto de a
subunidade B das exotoxinas complexas poder ser constituída por várias subunidades. Como
exemplos temos, para as exotoxinas simples, a toxina diftérica e, para as complexas, a toxina
colérica e a toxina pertussis.

Fig. 17.8 - Estrutura das exotoxinas simples e complexas.

Mecanismo de acção das Toxinas do tipo A-B

Para explicar o mecanismo de acção deste tipo de toxinas falaremos do modo de actuação da toxina
diftérica (produzida pela bactéria Corynebacterium diphtheriae), uma vez que é aquela que é
melhor conhecida e estudada. Como já referido, é uma exotoxina do tipo A-B, cuja subunidade A
contém a actividade enzimática para a inibição do factor de elongação 2 (EF-2), que está envolvido
na síntese proteica do hospedeiro, e a subunidade B é responsável pela ligação à membrana de uma
célula do hospedeiro. Esta última subunidade possui uma região T que se insere na membrana do
endossoma, assegurando a libertação do componente enzimático para o citoplasma.
Já no citoplasma, a subunidade A irá catalizar a adição de um grupo ADP-ribose ao EF-2, que ajuda
na translocação, durante o processo de síntese proteica. O substrato para esta reacção é a coenzima
NAD+:

NAD+ + EF-2 ADP-Ribose-EF-2 + nicotinamida

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A proteína EF-2 modificada não pode participar no ciclo de elongação da síntese proteica e a célula
morre, uma vez que não consegue sintetizar proteínas.

Fig. 17.9 - Mecanismo de acção das toxinas tipo A-B. A subunidade A cataliza a adição de um
grupo ADP-ribose à proteína alvo, utilizando o NAD+ como co-factor. Este mecanismo impede a
proteína alvo de exercer a sua função.

Papel das Exotoxinas na doença


Existem 3 principais processos através dos quais as exotoxinas podem contribuir para a progressão
da doença num humano

• Ingestão de exotoxinas pré-formadas: a toxina é produzida por bactérias que crescem num
alimento, sendo ingerida quando este é consumido. O exemplo mais comum é o da
enterotoxina, produzida pelos Staphylococcus aureus.
• Colonização da superfície de uma mucosa seguida de produção de exotoxina : a toxina
coloniza a superfície da mucosa mas não invade os tecidos circundantes nem entra na
corrente sanguínea. Após a colonização, pode causar doença localmente ou entrar na
corrente sanguínea, podendo causar doença em locais distantes. Como exemplos de doenças
em que este mecanismo ocorre temos a cólera e a difteria, causadas pelas bactérias Vibrio
cholerae e Corynebacterium diphtheriae, respectivamente.
• Colonização de uma ferida ou abcesso seguida de produção de exotoxina e disseminação: a
exotoxina causa danos no tecido local ou mata os fagócitos que entram na área afectada.
Como exemplo temos a α-toxina da Clostridium perfingens, causadora da gangrena gasosa.

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O conhecimento das toxinas tipo A-B é fundamental para o desenvolvimento de vacinas, uma vez
que atenuando as toxinas, isto é, produzindo anatoxinas, poderemos criar vacinas, que serão
responsáveis pela imunidade a doenças como a difteria e a cólera.

Endotoxinas

As endotoxinas são complexos lipopolissacarídeos que fazem parte da membrana externa da parede
celular das bactérias Gram-negativas. Como já sabemos, estas bactérias possuem lipopolissacárido
(LPS) na membrana externa da sua parede celular que, em certas circunstâncias, é tóxico para
hospedeiros específicos. O LPS é uma endotoxina porque está ligado à bactéria e é libertado quando
ocorre a lise do microrganismo. É também libertado algum LPS durante a multiplicação bacteriana.

O componente tóxico do LPS é a sua porção lipídica, o lípido A., que é responsável pela ocorrência
de febre, inflamação e choque séptico.

Fig. 17.10 - Estrutura do lípido A.

Para além dos aspectos já referidos, as endotoxinas são:


• Sintetizadas a partir de genes localizados nos cromossomas
• Estáveis ao calor (ao contrário das exotoxinas)
• Tóxicas somente em concentrações elevadas
• Pouco imunogénicas
• Capazes de produzir efeitos sistémicos: febre (são pirogénicas devido à libertação de
interleucina-1 pelos monócitos), choque, coagulação sanguínea, fraqueza, diarreia,
inflamação, hemorragia intestinal e fibrinólise (quebra enzimática da fibrina, o principal
componente dos coágulos sanguíneos).

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Fig. 17.11 – Esquema ilustrativo dos vários processos que ocorrem quando o organismo é
invadido por uma endotoxina. O LPS resultante da lise bacteriana liga-se a proteínas. Este
complexo será reconhecido pelos macrófagos, que libertarão citocinas da inflamação (TNF-α, IL-1,
IL-6, IL-8), que serão responsáveis pelo aparecimento de febre, activação da cascata de coagulação,
do sistema de complemento e produção de prostaglandinas e leucotrienos. Esta situação poderá
resultar em choque séptico (inflamação geral causada por grande concentração de LPS no sangue),
que é uma situação irreversível.

Em seguida, para sintetizar o temas das exo e endotoxinas, fica um quadro com as principais
características de cada tipo de toxinas.

Característica Exotoxinas Endotoxinas


Complexo lipopolissacárido na
Proteína, normalmente com 2
Composição química membrana externa: a porção
componentes (A e B)
tóxica é o lípido A.
Infecções Gram negativas,
Exemplos de doenças Botulismo, difteria, tétano
meningococcemia
Altamente variável entre as Similar para todas as
Efeito no hospedeiro
diferentes toxinas endotoxinas
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Normalmente não produzem Produzem febre, por libertação
Febre
febre de IL-1
Frequentemente transportadas
Sintetizadas directamente por
Genética por genes extracromossómicos,
genes cromossómicos
como plasmídeos
A maioria são sensíveis ao
Estabilidade ao calor Estáveis ao calor
calor e inactivadas a 60-80ºC
Antitoxinas dão imunidade ao
Poucos anticorpos produzidos,
Resposta imune hospedeiro; altamente
fracamente imunogénicas
antigénicas
Normalmente excretadas fora Parte da membrana externa das
Localização
da célula bactérias Gram negativas
Encontradas apenas nas
bactérias Gram negativas:
Produzidas por bactérias Gram
Produção libertadas quando a bactéria
positivas e Gram negativas
morre (embora algumas sejam
libertadas no seu crescimento)
Altamente tóxicas e fatais em
Toxicidade Toxicidade moderada
pequenas quantidades (μg)
Convertidas em toxóides
Não podem ser formados
Produção de toxóides antigénicos, não tóxicos, que
toxóides
são usados para imunizar.

Tabela 17.4. – Exotoxinas e Endotoxinas. Principais caracteristicas de cada uma.

Bibliografia

• Slides das Teóricas


• Prescott, Harley, and Klein’s MICROBIOLOGY, de Joanne M. Willey, Linda M. Sherwood e
Christopher J. Woolverton, Edição Internacional – 5ª edição, McGrawHill, Cap. 31, 32, 34
• http://www.textbookofbacteriology.net/
• http://pt.wikipedia.org/wiki/Microbiota

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