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A “METAFÍSICA” DO CONSUMO INFINITO E A BUSCA DA FELICIDADE

Marcelo Pelizzoli1

Palavras-chave: Metafísica, consumismo, desejo, ambiente, saúde, felicidade

Resumo

Trata-se de investigar sobre uma possível metafísica ligada ao consumo enquanto condicionado pelo
consumismo na sociedade atual, na medida em que esta é perpassada por desejos infindáveis e abismais, que
cristalizam a vivência da subjetividade e da coletividade em torno do ideal de felicidade material e de supérfluos.
Disso se retira conseqüências em termos de saúde e meio ambiente e a necessidade de repensar valores
essenciais do humano em torno do sentido de sua vida pessoal e social.

A título de introdução

Cada vez mais busco ter cuidado ao escrever um texto ou então fazer uma palestra, denunciando coisas
que não estão boas em nossas corporações, e em nosso comportamento. Este receio revela um pouco do nosso
tempo, em que temos muitas informações sobre os problemas sociais e ecológicos, muitos deles distantes e
grandes, outros próximos e menores que se assomam, porém, temos reduzidas motivações e habilidades para a
ação. Um clima de medo se instaura neste momento, e o risco dele é a queda na embriaguez, entorpecimento,
ou no esquecimento. Em todo caso, há uma dor, culpa e impacto que se grava em nós aos poucos, e se une à
nossa crise existencial. Muitas pessoas evitam entrar em contato com a dor de ver, a inquietude de tomar
consciência, a responsabilidade de saber algo e que se poderia fazer algo outro, pois a situação deveria ser
diferente, melhor. Mais intenso ainda é quando olhamos para as nossas crianças, e tememos pelo futuro. O
tempo exige superar esse torpor. Talvez uma reconciliação mais profunda se possa encontrar debaixo da
desesperança.
O tema do consumo e do comportamento pessoal dos hábitos das pessoas em sociedade, no ambiente,
é dramático. De um lado, temos um esbanjamento de recursos, a criação de um consumo baseado quase todo
em cima de supérfluos, a produção de novas demandas, e de outro lado uma miséria que campeia. Imagine o
quanto é surpreendente perceber que os próprios hábitos alimentares, por exemplo, estão causando impactos
ecológicos e urbanos crescentes, ou mesmo em nossa saúde, ou até em nossas relações? Sim, relações,
afetivas em especial, pois cada vez mais elas não estão imunes às demandas de consumo, de troca de
mercadoria ou obtenção do novo. Num estágio de alto grau de mercantilização, não apenas econômica mas a
invadir a esfera cultural, nossa vida simbólica, emocional, familiar é afetada pela lógica vigente, da rotatividade e
do efêmero. O que se coloca agora, como melhor forma para enfrentar esta lógica vigente, não é apenas o uso
do nível racional da informação, pois ela não tem nos levado a uma postura responsável. Pode até nos paralisar
ou fazer entrar na velocidade do descarte, como num tablóide em que lemos mil notícias soltas. A melhor forma
parece ser cada vez mais a mudança de energia psicossocial, ou de modelos relacionais, e através de bons
exemplos; ou seja, observar como emitimos formas de “ser com os outros” no mundo e com o ambiente onde
estamos; como atraímos eventos negativos ou positivos, como reproduzimos a violência que nós mesmos
estamos a criticar. É algo em cima disso que este artigo buscará refletir, em torno de um conceito lapidar e novo,
a metafísica do consumo em nossa vida, e como ela pode determinar nossa saúde e ambiente, impedindo,
através do apego doentio, caminhos de felicidade mais sustentáveis e originais do humano.

A idéia de Metafísica aplicada ao entendimento do fenômeno do Consumo

Em metafísica trata-se de buscar uma explicação e causa primeira e fundante do que tem sentido. Ou
seja, a metafísica tradicionalmente serviu para argumentar sobre o significado mais profundo das coisas, sua
ligação com os fundamentos e sobre a realidade que está mais além, primordial, e que justifica o sentido da
realidade presente. A metafísica busca então as verdades primeiras, as causas, as essências que me permitem
entender o mundo mais profundamente. Operar metafisicamente é colocar causas, é crer numa verdade
fundamental, é unir verdade e bem, pois o que é verdadeiro, em geral, é bom e se liga ao bem, a uma moral;
implica buscar algo que visa transcendência, que vai além do efêmero e além da aparência, pois busca o que

1
Doutor em Filosofia. Vice-coordenador do Curso de Filosofia da UFPE. Professor do Mestrado em Gestão e Políticas
Ambientais (UFPE); coordenação da Especialização em Bioética, Sociedade e Saúde (UFPE). Membro do Comitê de Ética
em Pesquisa da UFPE. Escritor, ecólogo e sempre estudante da Vida. Contato: opelicano@ig.com.br

1
tem substância. O que dá sentido à vida presente? De onde viemos, para onde vamos? Qual o sentido da vida,
da morte, da sociedade ? Eis grandes perguntas que convidam a um olhar metafísico, que pode ser abstrato ou
bem presente em nossa existência.
A metafísica aponta assim para a nossa busca de infinitude, de ser mais que animal, de ir além, e até de
imortalidade. Ser humano é “in-sistir” na vida, numa busca do paraíso perdido, do eldorado (do ouro...) do
segredo, do divino. É a eterna fome humana pelo sentido inesgotável da Vida, da natureza, de Deus. Como diz
Levinas, ser humano é situar-se no reino da necessidade mas também no modo desejante, do Desejo metafísico,
abertura humana como fome que nada sacia; e é aí somente que ele pode apontar para e aceitar o outro como
outro, que permanece infinito2.

O fenômeno do consumo é próprio de toda sociedade humana, é um fato social que dá contas de
necessidades básicas do animal humano. No entanto, hoje falamos em consumismo. É aí que podemos cotejar a
idéia de metafísica, ou até, uma outra idéia agregada a esta: a religião do consumo. Diz-se que a religião estaria
moribunda, e superada pela ciência. Talvez não, pois ela pode estar camuflada em muitas práticas sociais.
Muitos acham que o mundo da tecnociência e do mercado, e então do consumo voraz, teriam matado a
metafísica, que é sinônimo de filosofia. Seria o fim da filosofia e da preocupação metafísica com os fundamentos
e da própria religião ? Se assim o fosse, seria evidente o problema, mas o “furo da bala” talvez seja mais
embaixo. Ocorre que a metafísica tornada consumo, nitidamente na atual sociedade do american way of life,
parece antever e viver a possibilidade de tomar o outro, o infinito e o metafísico como consumível, engolível, e
talvez de modo trágico, pois este consumo torna-se crescente e insatisfeito. Voltando à nossa tese inicial, parece
plausível entender que o consumo atual - e todo o marketing invasivo presente é prova disso - tomou o lugar das
metafísicas, e modificou as formas tradicionais de vida e organização social em torno da busca de bens e
consumo no modelo desenfreado do capitalismo.

O mito de Sísifo é excelente para demonstrar essa situação social contemporânea. Na mitologia grega,
Sísifo, filho do rei Éolo, da Tessália, e Enarete, era considerado o mais astuto de todos os mortais. Mestre da
malícia e dos truques, ele entrou para a tradição como um dos maiores ofensores dos deuses. Chegou a
enganar por duas vezes a Morte. Sísifo morreu de velhice e Zeus enviou Hermes para conduzir sua alma ao
Hades. No Hades, Sísifo foi considerado um grande rebelde e teve um castigo, juntamente com Prometeu, Títio,
Tântalo e Ixíon. Por toda a eternidade Sísifo foi condenado a rolar uma grande pedra de mármore com suas
mãos até o cume de uma montanha, sendo que toda vez que ele estava quase alcançando o topo, a pedra
rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida por meio de uma força irresistível. Daí que, a tarefa
que envolve esforços inúteis ou dispendiosos demais passou a ser chamada "Trabalho de Sísifo".

O sistema atual pressupõe uma instância inesgotáveis de possibilidades de recursos naturais e de usos
os mais variados. A fome tecnológica, a sua expansão vertiginosa, a abertura de mercados e o arrebanhar de
consumidores intermitentes, tudo se liga para formar a nova Metafísica, do consumo. Mas como toda metafísica,
ela precisa se justificar, fazer valer seu sentido, e como ela o faz ? Os argumentos aqui seriam fracos: como
defender a abertura de mercados, a idéia de crescimento econômico e progresso, bases que dependem
exatamente do consumo crescente, diante da destruição socioambiental ? É neste momento que a metafísica do
consumo mostra uma de suas partes perversas: ela se justifica pelo que tem sido, pelo fato de ela estar aí, estar
“funcionando” e ser “necessária”, e não haver na praça (e se há é considerada menor, fraca, radical, ou
romântica, ou louca, algo assim, anormal) nada que a supere. Ou seja, a sua verdade esta no fato de que ela é,
ela é o próprio ser, ou seja a ontologia do real, a saber, a própria realidade ! Como diz a Coca-cola 3, “Coca-cola
é isso aí” ! Seria absurdo dizer isso, ou coisas como: “Isso é que é", "Coca-Cola dá mais vida a tudo", "Emoção
pra valer", além das mais recentes: "Essa é a real". Surpreendente não ? Mas para um produto que nos
bombardeia com milhões de símbolos o tempo inteiro, musicados, falados, filmados, vistos e usados, ele se torna
o próprio real, o normal, e os outros, apêndices dele. E nós queremos estar in, ou seja, dentro do real,
participantes sociais. Eis o processo exato de tomada do lugar metafísico explicativo e justificativo do sentido do
real, e por sua vez da própria vida. Algo que é porque está sendo, e sendo confirmado pela veiculação maciça,
acompanhada do uso maciço. “Sempre Coca-cola”; mais uma vez é a própria ontologia4 do real, a metafísica que
permanece! Não obstante, a destruição de nossa saúde e do ambiente tem sido maciça também, não é ? Mas
2
Sobre Levinas indico: Pelizzoli, Marcelo. Levinas: a reconstrução da subjetividade. Edipucrs, 2002.
3
Se observarmos a fórmula original da Coca-cola do final do séc. XIX, até que parece um produto não tão nefasto: Açúcar:
2400g, água, Caramelo: 37g, Cafeína: 3,1g, Folha descocainizada de coca, 1,1g, Noz de cola: 0,37g, Embeba as folhas de
coca e nozes de cola em 22g de álcool a 20%, coe e acrescente líquido ao xarope. Suco de lima: 30g, Glicerina: 19g, Extrato
de baunilha: 1,5g, óleo de laranja: 0,47g, óleo de limão: 0,88g, noz-moscada: 0,07g, óleo de cássia (canela chinesa): 0,20g,
óleo de coentro: traços Nerol (tirado de uma variedade de flores de laranjeira): traços óleo de lima: 0,27g.
2
para a Coca-cola, ou o Mcdonald´s, isso seria uma falha vinda de outro lugar, não do uso de seus produtos! E
quando temos uma medicina que separa as causas dos efeitos, e só vê a doença isoladamente e sem ir às
causas, o ciclo de perversão está fechado. O problema não seria pois, nessa ótica, o consumo, seus excessos,
seus aditivos químicos, sua precariedade nutricional, e sua capacidade de destruição da saúde e do ambiente,
mas a falta dele, e a falta dele de modo ainda mais sofisticado.

O ato do consumo levado ao consumismo pode beirar a uma religião objetificada ?

Uma das obras mais destacadas e fortes, em tom crítico e irônico, ao uso de religiões para a defesa do
próprio ego e a auto-proteção enganosa em nome de práticas místicas se chama: Para além do materialismo
espiritual, do mestre tibetano-americano Chogyam Trungpa. É uma denúncia muito perspicaz de como podemos
estar enredados nos objetos que pretensamente seriam indispensáveis para nós, crescentemente, e de como
passamos desta objetificação para as relações com os outros e com o divino ou o místico. Portanto,
compreende-se como a própria religiosidade pode estar “comprada” pela busca ansiosa do gozo fugaz, do gole
mais forte, das novas conquistas, da retenção de coisas que se tornam apêndices nossos, tudo muito difícil
quando chega o momento de largar as coisas, momento da entrega.
Análises consagradas neste campo do que movimenta a economia, veio com Marx com a idéia do
fetiche, ou feitiço, gerado pela cultura capitalista. Tais mistificações seriam essenciais para o girar da roda que
em seu movimento torna a tudo mercadoria, mas não qualquer objeto oferecido, mas objetos altamente
desejados, enfeitiçados. A metafísica aqui seria a produção alienante de fantasmas para além da realidade
presente. Numa voracidade da mercadoria, o que importaria na realidade não é tanto o que ou como é
consumido, mas o próprio movimento de consumir. Quer um exemplo? Quando alguém entra numa loja ou num
supermercado, sem ao menos saber bem o que vai comprar ! O que conta é dar vazão à ansiedade, preencher
algo que me falta mas não sei bem o que é5. É mais do que o objeto a que eu passo a precisar.
Na religião fetichista do objeto, não há na verdade uma autonomia e liberdade do sujeito no seu uso;
surpreendentemente, há uma objetificação do próprio sujeito e uma quase autonomia do objeto, ou da máquina.
“A produção produz não só um objeto para um sujeito, mas também um sujeito para um objeto. Do mesmo modo
o consumo produz a disposição do produtor solicitando-o como necessidade que determina a finalidade da
produção.”6 A metafísica do consumo tem como motor a repetição. Voltar e voltar, na mesma ação, no hábito. E
neste roldão, as corporações sabem que precisam massificar a marca nas mentes e desejos dos consumidores;
eles devem ser bons consumidores, assim como quem diz que “comer bem” é comer bastante, e sempre. As
formas invasivas de inserir uma marca são hoje as mais diversas, desde a propaganda direta na mídia, até entrar
em filmes, novelas, escolas, produtos de uso diário, músicas, sempre em associações com imagens de
juventude, beleza, grandeza, natureza, força, constituindo verdadeira mitologia. Há departamentos inteiros
especializados em psicologia do consumidor!
Outro aspecto considerável diz das escalas, níveis e lugares de consumo. Há toda uma área de consumo
feita somente para padrões de elite; é a organização burguesa do consumo. Ela precisa separar e oferecer algo
como um serviço especial, de muitas formas, onde você é VIP, ouro, classic, elite, executivo, luxo, cliente
especial, gold, fashion, plus, preferencial, exclusivo, e toda uma hipocrisia nebulosa; nestes âmbitos, onde
poucos entram, o sujeito é acolhido no status, é considerado mais e melhor do que os outros pelo simples fato de
ser do padrão, da classe, e possuir mais, podendo contudo ser até um “cafajeste de marca maior”, um ladrão de
colarinho ou um empresário assassino de pessoas e do ambiente.
Há também uma confiança excessiva nos objetos do consumo. Mas morremos pela boca. A quantidade
de aditivos químicos, a qualidade precária da alimentação artificial, o uso de produtos sem saber de que é feito,
de onde vem, que empresa o sustenta, que trabalho escravo o produziu etc., tudo isso revela uma fé cega, quase
religiosa na sociedade de consumo e suas corporações, hoje pouquíssimas e poderosas. Enfim, a questão aqui é
poder viver uma religiosidade mais feliz e menos materialista e frustrante, menos faminta, anti-ecológica,
prejudicial. Afinas, até que ponto estes novos templos do consumo, shoppings, nos religam à transcendência que
buscamos ou não ?

“Small is beautiful” – O que podemos aprender do pequeno, do simples e da irmã morte ?

4
Ontologia estuda a essência, o ser, aquilo que é, e que permanece. E a essência do ser humano.
5
“la avidez insatisfecha que pasa por deseo se corresponde com el deseo ilusorio que pasa por necesidad; el gozo fáustico de
lo nuevo se aplana en la acallada indiferencia de un ciclo que sólo remeda la novedad apelando a la repeticion” (Schnaith,
Nelly, p. 18)
6
Marx, Elementos fundamentais para a critica da economia política, Siglo XXI, Buenos Aires, 1972, p.13.
3
Este é um lema econômico-ecológico famoso nos anos 60; no pequeno está o belo. Viva a beleza das
pequenas coisas. Elas te exigem menos. Se alguém vai subir uma montanha ou fazer uma caminhada, quanto
menos coisas ele precisar, melhor. Ele pode, se quiser, subir de helicóptero, mas terá perdido a convivência
próxima das coisas, e terá produzido uma série de poluições ligadas à produção, manutenção e operação da
máquina. Uma família yanomami precisa de menos de 60 objetos para viver, quase que numa vida inteira. Conte
agora ao seu redor quantos objetos você está usando ou comprou ? Sim, ninguém precisa voltar a ser índio,
precisa contudo “dar jeito” na sua atribulada e objetificada vida, para não ser sufocado pelas coisas. A metáfora
de Tio Patinhas e seus sobrinhos é um bom exemplo da metafísica do consumo infinito, acentuando agora a
conservação, a poupança: você deve guardar sempre para, quem sabe, no fim da vida juntar um milhão. Esta é
uma receita que andou pelos jornais e TVs do Brasil por algum tempo, vendendo não só a esperança do milhão,
mas a ética “estoica” do capitalismo, sua moral sem pudores, ou seja, você deve guardar tudo, para quem sabe
um dia poder viver, e este dinheiro é todo seu, não responderá a uma dívida social, não terá responsabilidade
social ou ambiental ! A felicidade estaria num cálculo, numa poupada boa, numa bolsa bem aplicada quem sabe,
para os mais arrojados. A idéia é fazer dinheiro do próprio dinheiro para quem tem bastante, ou das migalhas a
serem disputadas por quem tem pouco. E se, no caso de não ter dado certo, seria você que não soube poupar !
Cá entre nós, qual é a verdadeira poupança ? O que será que fica na vida? E quando morrermos ?
A morte assusta a metafísica do consumo, pois este se quer exatamente infinito. A não aceitação da
morte (ou melhor, é não aceitação da própria Vida) acompanha aquele que segue a esperança ou obsessão de
consumir a vida em cada comprimido, alimento, bem, posse ou pessoa adquirida. Imagine se eu perder aquela
pessoa ? Que pavor. Mas quem sabe, se obtiver dinheiro bastante, juventude ou fama, posso conquistar outra
logo em seguida. A morte é uma irmã sábia. E ela não está apenas no final, e apenas no caixão. Se você reparar
bem, temos a visita ou a possibilidade de contínuas mortes, morte de idéias apressadas, morte por perdas de
pessoas queridas, morte por mudanças sexuais, de religião, de humor, acidentes, mudanças drásticas etc. A
impermanência é senhora. Cronos, deus (titã) do tempo, não deixa pedra sobre pedra. Qual será seu
ensinamento básico, sua metafísica ? O que move o consumo diante da morte é o medo e o desejo, com
certeza. Quando temos medo, desejamos ser o que não somos, fugir do presente e negar o tempo e os
acontecimentos. O consumo infinito nega justamente a impermanência pois nos dá momentaneamente a idéia de
cristalização da mudança, satisfação do ego pela posse, mas sempre momentânea, pois ele precisará sempre
repetir, e defender suas posses e conquistas; o “olho gordo” pode estar por perto ? Alguém pode me roubar ? Ou
algum mau agouro ? Preciso de sigilo bancário, sigilo nas contas, pois preciso defender meu pedaço. Quanto
tempo gastamos defendendo o efêmero ? Quantos milhões de minutos preciosos em torno das contabilidades,
dos cálculos, das defesas, do fazer render, do acumular, do proteger e do resgatar ?
Não devemos negar a importância da economia em nossas vidas. Mas, o que significa, para que e em
que direção deve ser essa economia ? Economia é a lei da casa. Quanto maior essa casa, quanto mais gasto de
energia, de produtos, mais impacto, esforços, defesas, preocupações, mediações de mediações. Hoje, para se
ter um exemplo, existem casas com bankers, com controle via satélite, com sistemas de segurança complexos,
com uma infindável quantidade de instrumentos e utensílios e uma produção de lixo gigantesca. No Brasil, há
uma média de 1,2 Kg de lixo por pessoa. Numa casa de ricos, isso pode chegar a 5 Kg por dia por pessoa ! Se
no Brasil, todos fossem ricos, dentro deste modelo voraz, seriam 850 milhões de quilos de lixo por dia ! Quase
300 bilhões de quilos por ano !! Você sabe o que isso exige e aonde vai parar tudo isso?
Eis a necessidade ecológica, psicológica, econômica, social, de resgatar o princípio do vivere parvo, da
renúncia ao excesso, do gosto pela simplicidade, pelo mais direto, priorizando o tempo inter-humano, a beleza da
natureza, a vida nos alimentos frugais, nos vegetais crus. Esta é a diferença entre destruição da saúde e do
ambiente ou sua sustentabilidade. Que a morte nos encontre razoavelmente felizes e bem vividos, cumpridos em
nossa missão na Terra, e não como espectros famintos.

Quando um supérfluo ganha o estatuto de necessário. Demônios famintos ?

Trata-se de um ardil útil e perverso, a roda do consumo, na medida em que você passa a precisar de
algo que complemente outra coisa, que por sua vez já é um complemento, um complemento do complemento, e
assim ad infinitum. A pergunta crítica aqui, que pode nos colocar “na real” é a seguinte: com todas essas
mediações, você tem ganhado tempo de vida, de silêncio, de amizade, de convivência, de alegria, de
serenidade, paz, ou tem perdido ? Há alguma dúvida quanto a isso? Time is money, diz a economia de
mercado. Quando assim o é, prevalece o significado que não é vital, não é tempo propriamente, mas tempo da
máquina, tempo do sistema, tempo de produção, que em geral não é o tempo mais importante para nossa vida.
Domenico de Masi mostrou bem isso com a idéia de ócio, tempo livre, como algo fundamental para a vida
humana, que é lúdica, brincadeira, liberdade e criação livre7.

7
Veja sua obra O Ócio Criativo, Ed. Sextante.
4
Não obstante, porque não é tão simples fazer uma critica ao consumismo? Porque ele tem um de seus
fundamentos na própria necessidade de consumo próprio à vida humana. Psicologicamente, Freud mostra a
importância da oralidade alimentar, forma primitiva de entrar em contato com a vida, assimilando o que pode ser
incorporado ou rejeitando o que é ruim8. Em muitas situações nosso corpo reage vomitando o que é inadequado.
Mas talvez precisássemos vomitar mais as milhares de coisas que nos são oferecidas e acabamos “engolindo”;
regurgitar enlatados sem qualidade. É claro que se pode justificar dizendo que precisamos de pão e de circo
também, de diversão, de esquecer as dores do mundo, nos proteger diante da constante ameaça e dos medos
modernos. Mas o problema é permanecer apenas nesse padrão. Os sábios budistas desenvolveram uma
imagem excelente para mostrar o que acontece em nossa vida quando dependemos acima de tudo de
satisfações externas, sejam materiais, de consumo, sejam elas de pessoas, filhos, maridos etc. É a figura dos
espectros famintos, ou demônios, não no sentido de diabo como entendemos mal, mas de fantasmas ou
espíritos que buscam viver mas não vivem; nós somos eles, quando nos entregamos à ansiedade da carência
excessiva, de sempre estar atrás de algo; hábitos escravizantes. A figura destes espectros aparece como
pessoas desnutridas com barriga grande, e bocas pegando fogo, sempre atrás de posses que os outros
possuem; o que é consumido não satisfaz nunca, não pára propriamente em seus corpos. É como comer algo
em brasa o tempo inteiro, numa azia e má digestão contínua; ou um “estômago furado”, como se diz. É uma
situação de extrema mendicância, onde você pode ter muito dinheiro e estar absolutamente faminto a vida toda!
Os supérfluos ganham estatuto de necessário quando não sabemos mais nos livrar deles, quando
cremos que são essenciais para nós e ficamos irritados se alguém questiona o seu real benefício e importância.
E se a isso se liga à fome insaciável, fecha-se um ciclo que pode estar escravizando a vida. Há antídotos para
espectros famintos ? Muita meditação, renúncia, bondade, trabalho voluntário, engajamento, associação e
coração, sem negar o bom prazer.

Em que está a saúde? O simples, o natural9, o comedido e o pouco. Partilha


8
Ver o ensaio A negação, de 1925, de Freud.
9
Eis um belo relato sobre medicina natural: Para muitos, medicina preventiva significa um teste Papanicolau anual, check-
ups rotineiros, mamografias e colonoscopias. É este o conceito de prevenção da medicina convencional — exames para
descobrir algo que você já tem — uma boa idéia, mas que certamente não é prevenção. Faz parte do mesmo tipo de
informação enganosa que nos leva a acreditar que precisamos ir ao médico por qualquer desconforto que sentimos — uma
idéia relativamente recente. Abdicar da responsabilidade pela nossa saúde tem trazido conseqüências desastrosas. As
gerações passadas sabiam o que fazer nos casos de dor de estômago, resfriado, artrite e reumatismo. Esse conhecimento era
crucial no início deste século; os médicos eram poucos e estavam distantes. Hoje, há talvez médicos demais, que praticam um
padrão de atendimento idêntico para todos — medicamentos ou cirurgia. Ninguém pode negar que os Estados Unidos
possuem a melhor medicina do mundo para traumas e emergências, mas este tipo de medicina não é adequado para doenças
crônicas ou degenerativas, das quais a maioria dos pacientes sofre. Nos últimos 15 anos, aprendi um sistema de cuidados
pessoais — uma abordagem preventiva que é gratuita ou de custo mínimo e, até agora, manteve minha saúde sem
necessidade de cirurgias ou medicamentos. O ambiente moderno é muito prejudicial ao nosso sistema imunológico — a
Síndrome da Fadiga Crônica e outras disfunções imunológicas refletem o efeito avassalador de muitas investidas contra o
organismo humano. Desde que tive a Síndrome da Fadiga Crônica, há cerca de oito anos, concentro grande parte de meus
cuidados pessoais (preventivos) no meu sistema imunológico, usando, principalmente, mentalização dirigida, um método
fácil e muito eficaz. Outro reforço excelente para o sistema imunológico é a ducha fria, seguida de ducha quente, o banho
alternado. Uma área primordial de prevenção, claro, é a alimentação. Minha estratégia consiste em incorporar tantos
alimentos "medicinais" na minha comida quanto possível. Muitos deles são orientais: chá verde, algas marinhas e missô.
Como duas a três frutas por dia; um limão inteiro ou meio melão, seguidos de cereais integrais, no café da manhã. Como
muitas hortaliças cruas, principalmente brócoli cru, pepino e nabo. Outra parte importante do meu programa de cuidados
pessoais consiste em reduzir o estresse e fazer exercícios. Todos os exercícios orientais como Kwan Do, T'ai Chi, Yoga e
Qigong fazem isso. Comecei a praticar ioga, há alguns anos, para reduzir o estresse e cheguei à conclusão de que este é o
melhor exercício para muita gente. Nossos problemas de saúde começaram realmente quando o exercício da medicina se
tornou um comércio e os medicamentos, um produto. Pagamos verdadeiras fortunas por cuidados médicos inadequados e
muitas vezes, ineficientes. Os produtos farmacêuticos matam centenas de milhares de pacientes a cada ano e, no entanto,
somente se ouvem alertas sobre riscos associados a remédios "alternativos" como, por exemplo, ervas. Apesar do fluxo
contínuo de novos medicamentos lançados pelos laboratórios, dos anúncios semanais de novas conquistas, dos recursos
imensos gastos em pesquisa genética, não estamos ficando mais saudáveis. Em minha opinião, o velho provérbio de que
"mais vale ensinar os homens a pescar do que alimentá-los" aplica-se aos cuidados de saúde. Podemos fazer por nós mesmos
muito mais do que os médicos. Nós, como indivíduos, continuamos a ser responsáveis pela manutenção de nossa saúde.
Cuidar destas três áreas — sistema imunológico, alimentação e exercícios com redução do estresse, funciona muito bem.
Entretanto, é preciso lembrar que cada um de nós é um ser especial; portanto, escolha o seu próprio programa pessoal de
cuidados preventivos. Fonte: Townsend Letter for Doctors & Patients, agosto/setembro 2000. Irene Alleger. Veja
5
Se não curar acrescentando, diz um ditado da medicina chinesa antiga, cure retirando. Diminuição.
Palavra que assusta a muitos economistas e adoradores do progresso e das novas tecnologias e seus
supérfluos. Em medicina, é um grande ensinamento. Quando nosso corpo está com excesso de alimento, algo
muito comum hoje, logo se fica com alguma indisposição ou alguma pequena doença, e o corpo, na sua
sabedoria infinita, sente pouca ou nenhuma fome real, até ficar curado. Comer neste momento é uma violência
em nome do consumo. Muitas e muitas vezes, nossa fome é ansiedade, hábito, apego. Comer sem fome é um
grande sintoma de nossa crise do tempo, de como a metafísica do consumo nos torna ansiosos e de como
achamos que temos de absorver, botar pra dentro, incorporar, engordar, sentir pelo menos aquele prazer. A
sabedoria do corpo diz o contrário. Ela une prazer e saúde, energia e descanso.
Muita comida, curta vida; pouca comida, longa vida. Hoje esta tese antiqüíssima está toda comprovada.
Quem consome menos vive mais (considerando aqui claro a reposição básica de nutrientes fundamentais).
Vivemos uma avalanche do uso de refinados, açucares e proteínas animais, e muitos carboidratos concentrados.
Países com grande consumo nestes itens são mais doentes que alguns da África, como é o caso dos EUA. Os
dados de doença/saúde dos EUA são alarmantes. Os pobres lá são gordos, filhos do fast food. O maior índice de
obesidade dos últimos tempos. A terra do Mcdonald´s, Coca-cola e um amontoado de produtos paupérrimos e
aditivados quimicamente, e a maior quantidade de doenças degenerativas do planeta. É impressionante ver os
carrinhos de alguém num supermercado com hábitos perversos; é lamentável saber que sua qualidade de vida é
péssima e que o mesmo auxilia na crise ecológica e social vigente10.
Nossa medicina, apesar de suas conquistas tecnológicas, traz grandes fracassos cada vez mais
evidentes. Um deles é que a metafísica do consumo e do acrescentar se sobrepõe a do diminuir e do
sustentável. Os hospitais e o próprio sistema exigem médicos aplicadores de equipamentos e receitadores de
drogas11. É incalculável o número de medicamentos no planeta hoje, falamos aqui dos sintético-químicos. Os
laboratórios é que fazem a pressão e ensinam ao profissional qual medicamento usar, para que e o que deve ser
usado. (A ignorância medica é tão grave que, mais de seis meses depois de o Vioxx ter matado 50 mil pessoas
nos EUA, e ter sido retirado do mercado, encontrei um poster dele enorme num consultório médico em Recife - o
terceiro pólo médico em grandeza no Brasil, ao lado de um enorme contingente de doentes !) Temos uma
medicina que não ensina ainda de fato nutrição saudável, quanto menos abordagem curativa naturalista aos
seus profissionais; os bons médicos vão aos poucos estudando por fora, adquirindo experiência, interessando-se
de fato pela SAÚDE e não só por remediar ou escamotear a DOENÇA de modo unilateral. Estes podem então
compartilhar com seus pacientes métodos de manter a saúde, e até debelar doenças de modo muito simples,
sempre no âmbito do natural, do saudável, recuperando os processos de equilíbrio do próprio organismo. Na
verdade, a metafísica que justifica a medicina cartesiana, tecnocientífico-química e cirúrgica, é mais a prática das
grandes corporações ou máfias farmacêuticas e de aparelhos hospitalares agregados, do que a busca real de
manutenção da saúde. Se olharmos a grande história da medicina ocidental e oriental tradicionais nas suas
variadas acepções, elas recuperavam a vis medicatrix naturae, força medicadora da natureza, o equilíbrio, a
saúde verdadeiramente. Temos hoje uma medicina como “engenharia de órgãos” 12 e peças, interações químicas
altamente impactantes e nebulosas, pois opera com o corpo como uma máquina. Você já imaginou divulgar
modos de curar o câncer naturalmente, que existem, alias há mais de um século, sem alguém que lucre muito?
O que aconteceria se diminuíssem os números de doentes? Uma tragédia para a metafísica do consumo infinito
de corpos doentes, ou seja, drogas, equipamentos, porém uma benção para as populações.
No inverno brasileiro, no Sul, reparamos que os hospitais se enchem de doentes. Poucos médicos se
arriscaram a dar causas plausíveis para isso. Em geral a culpa recai sobre o frio e as intempéries, bem como
mudanças de temperatura. A causa está sempre na natureza, fora, ela é a culpada. Se isso fosse a causa real,
não teríamos pessoas que passam bem pelo frio, ou mesmo não teríamos sobrevivido aos milhões de anos com
intempéries no planeta Terra. Mas a causa base é que há um aumento enorme de consumo de alimentos
cozidos, com quase nada de enzimas dos alimentos crus e a preciosa vitamina C, base para o sistema
imunológico e para a saúde como um todo. Há um consumo excessivo, e aí dentro, de carnes, leite, proteínas
animais em geral, e também de carboidratos cozidos e sem fibras (exemplo: farinhas brancas), ocasionando-se
prisão de ventre explícita e explícita, e mau funcionamento do organismo. E somando-se a diminuição das

www.vegetarianismo.com.br
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Quanto a isso assista os seguintes filmes magníficos: The corporation, A carne é fraca, Terráqueos, Uma verdade
inconveniente, Super Size Me.
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Doloroso demais é ver máquinas de refrigerantes, sanduíches, carnes, doces e balas quimificadas, dentro de um hospital ! A
que ponto chegamos de contradição. Mais doloroso é saber que a terceira causa de morte nos EUA está ligada às próprias
intervenções médicas !
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Veja sobre isso a bela obra Contra a desumanização da medicina, de Paulo Henrique Martins, Ed. Vozes.
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atividades físicas, tem-se um campo propício ao aumento de doenças e de mortes. É assustador ver uma mãe
alimentar seu filho apenas com carne, leite e carboidratos cozidos e sem fibras, e depois chorar à beira do leito
do menino derrubado pelas doenças respiratórias, digestivas, infecções e até anemia!
Mais uma vez a natureza é sabia, e quanto mais nos afastamos do simples, do natural, do vegetal, do
frugal, mais sofremos, mais nos complicamos13. É a metafísica da doença sem fim. Muitos biomédicos alegam
um aumento na longevidade neste século, devido ao avanço da medicina e dos medicamentos. Mas qualquer
pesquisador na área de saúde pode desmentir certas afirmações aí e mostrar os dados negados. O aumento da
longevidade começou antes da penicilina e de outros medicamentos, começou pelo aumento da qualidade
SANITÁRIA das populações. Pelo melhor uso da água, pelo uso dos esgotos etc. Um dado que faz cair por terra
os argumentos alopáticos: os dados mostram que as doenças crônicas têm vencido a batalha contra a medicina
da doença. Se conseguimos alargar certa quantidade de vida, em termos de qualidade deixamos a mesma na
miséria. Nunca houve tantos doentes crônicos no planeta. Não podemos, claro, tomar as épocas de pestes ou
síndromes como parâmetro, até porque no mundo ocidental por exemplo, com muito da qualidade de vida
imunda européia de certas épocas, a expectativa de vida era de menos de 40 anos. Por outro lado, nos
promotores de uma vida frugal ligada à terra, vemos nossos bisavós e pessoas do mundo inteiro alcançarem os
100 anos de idade.
Outro dado alarmante, é a epidemia de câncer surgida nos anos 40 e até hoje. Aqui faz-se um alerta
sério, pois de cada quatro pessoas uma vai morrer de câncer. Pasmem: o avanço da medicina vai de braços
dados com o avanço do câncer e de uma série de doenças que campeiam, principalmente as degenerativas !
Pergunte a seu médico se ele conhece amplamente e sistemicamente as causas do câncer, se ele liga isso à
alimentação e qualidade de vida (e como, especificamente), e se ele conhece formas naturais e tradicionais de
cura e prevenção ?! Devemos compreendê-lo, pois sua formação não o preparou para isso. Ele tem sido um
técnico da mecânica da doença e aplicador de drogas. Por isso, se precisar de médico, procure um naturalista,
naturopata, unibiótico, ou até um homeopata consciente e com visão em nutrição natural. As doenças não caem
do céu. Uma das maiores obras escritas no Brasil na área de Saúde se chama “Lugar de médico é na cozinha”,
do Dr. Alberto Peribanez Gonzales, uma das poucas que vai às causas das doenças e propõe alternativas
naturais, inclusive com receitas, para prevenção e cura. Outras obras preciosas conhecidas são as de Dr. Márcio
Bontempo, e de Dr. Yong Suk Yum, criador da Unibiótica. Em todo caso, é sempre um retorno à natureza, ao
simples, à confiança nas energias da vida, a formas de sabedoria tradicionais.

Qual é a sua idéia de felicidade ?

Finalizo este texto sem propor especificamente um modelo de se tornar mais feliz, pois isso diz respeito
ao âmbito pessoal, pois neste particular não temos fórmulas fixas, apenas compartilhamos experiências. Aliás, a
minha idéia-chave é compartilhar, e do que tenho aprendido das grandes tradições existenciais e espirituais, a
partilha, a comunhão, conseguir dar um pouco mais de si a outrem, conseguir agregar forças e abraçar uma luta
em comum pelos grandes ideais de trazer beneficio, pouco que seja, ao nosso meio, aos seres, principalmente
àqueles que sofrem. Este é um grande motivador e sentido para a vida. A questão do consumo passa por aí
também; podemos fazer uma pequena revolução através de sua mudança. Estivemos muito voltados para as
coisas, procurando felicidade nas coisas impermanentes, nas realidades externas, mas, no fundo, sabemos que

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Outro aspecto importante a ser considerado é a composição do alimento cultivado em solo vivo. A integridade e
biodiversidade da flora e da fauna subterrânea dispõem para as plantas uma variedade de nutrientes acarretando melhor
qualidade nutricional dos produtos. Bob Smith publicou em 1.993 no Journal of Applied Nutrition (pg.35 a 45) extenso
estudo sobre a composição de vários produtos orgânicos comparados aos equivalentes obtidos pela agricultura convencional.
Es relação ao trigo, observou-se que o orgânico tem 1.300% mais selênio, 540% mais manganês, 430% mais magnésio; por
outro lado tem 65% menos chumbo e 40% menos mercúrio. Ainda em relação ao trigo a Price Pottenger Nutrition
Foundation divulgou que o trigo de 1.900 continha 90% de proteína enquanto que o de 1.990 tinha apenas 9% (muitas vezes a
seleção de cultivares resistentes às pragas acaba acarretando perdas na qualidade nutricional do produto). Em relação ao
milho Smith constatou que o teor de cálcio era 1.800% maior no orgânico, assim como 1.600% mais rico em manganês,
490% em molibidênio, 300% mais selênio; por outro lado tinha 80% menos alumínio e 80% menos mercúrio. Essa tendência
se mantém em outros trabalhos como demonstra a metanálise de trabalhos desse tipo realizada por Williams em 2.002. No
geral se observa uma marcada tendência na redução de nitratos assim como um incremento no teor de vitamina C nos
alimentos orgânicos; também se observa uma maior disponibilidade protéica. Em 2.001 a nutricionista inglesa Shane Heaton
revisou 400 trabalhos científicos num projeto da "Soil Association" (instituição de pesquisa britânica) concluindo que em
síntese a alimentação orgânica tem efeitos positivos sobre a saúde humana; observou ainda que os teores de minerais dos
produtos da agricultura convencional caíram vertiginosamente na última metade do século e reafirma a influência dos
métodos de cultivo no teor de vitaminas e minerais e associa esse fato ao crescimento da indústria de suplementos
alimentares! Cf. Dr. Fernando A. C. Bignardi. www.aao.org.br (setembro de 2007)
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é um atalho que não leva a lugar algum, ele não transcende e não responde aos nossos desejos mais profundos.
Parece que a felicidade não vem superficialmente nem à força, ela é uma conquista diária, e nos enganamos
achando que ela vem com o dinheiro, com objetos e mais objetos, com coisas, e com pessoas conquistadas, e
não parece ser bem assim. O universo responde à nossa energia, e nos devolve o que plantamos. Então, qual é
sua idéia de felicidade e a sua prática ? Se não é como você quer, como é possível mudar de fato? A mudança
de hábitos de consumo pode trazer uma revolução na economia, na ecologia e na nossa vida (para além do ego
condicionado), pois remove toda uma cadeia negativa, de entropia da vida, e passa a exigir cidadania, direitos,
sustentabilidade, práticas sociais justas, postura de defesa socioambiental14.

Bibliografia

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_________. A emergência do paradigma ecológico. RJ: Vozes, 1999.
_________ (Org.) Bioética como novo paradigma. RJ: Vozes, 2007
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BONTEMPO, Márcio. Obras. In: http://www.drmarciobontempo.com.br/
BOFF, Leonardo. Tempo de transcendência. (CD de Áudio)
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COMTE-SPONVILLE, A. Bom dia angústia! SP: Martins Fontes, 2000.
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DALAI LAMA. Um coração aberto. SP: Martins Fontes, 2001.
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GOLEMAN, Daniel (Org.) Equilíbrio mente e corpo. RJ: Campus, 1997.
GOLEMAN, D. & Dalai Lama. Como lidar com emoções destrutivas. SP: Ediouro, 2002
GONZALES, Alberto P. Lugar de médico é na cozinha. RJ: Ed. Estácio de Sá/Editora Rio, 2006.
HANH, Thich Nhat. Aprendendo a lidar com a raiva. SP: Sextante, 2001.
HESSE, Herman. Sidarta. SP: Record, 1950.
JAMESON, F. Pós-modernidade: a lógica cultural do capitalismo tardio. SP: Ática, 1996.
KORNFIELD, Jack. Um caminho com o coração. SP: Cultrix, 1993
MACY, Joanna. Nossa vida como Gaia. SP: Ed. Gaia, 2005.
SCHNAITH, Nelly. “Metafísica del consumo”. In. Política y sociedad. Madrid. ISSN 1130-8001, Nº 16, 1994
(Exemplar dedicado à Sociologia do consumo), págs. 17-24
TAGORE, R. Sadhana, o caminho da realização. SP: Paulus, 1994.
TENNER, Edward. A vingança da Tecnologia. SP: Campus, 1997. (cap. 2 e 3)
THESENGA, Susan. O eu sem defesas. SP: Cultrix, 1994.
TOLLE, Eckhart. O poder do agora. SP: Sextante, 2002
TRUNGPA, Chogyam. O mito da liberdade. SP: Cultrix, 1976.
_________. Para além do materialismo espiritual. SP: Cultrix.
ZWEIG, S. & ABRAMS J. (Orgs). Ao encontro da sombra. SP: Cultrix, 1991.
YUM, Jong Suk. ABC da Saúde. Ed. Convite, s/d. & Doenças, causas e tratamentos. (esgotados)

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Quanto a isso veja o que proponho em minhas obras na bibliografia. Um bom exemplo é o impacto do consumo da carne.
Para cada quilo consumido, são 10 mil litros de água gastos, perda de fertilidade da terra, produção de metano pelo gado que
aumenta o efeito estufa; 20% da Mata Amazônica foi desmatada para pecuária, a carne produz uma série de doenças, câncer,
cardíacas, obesidade, entre muitas outras associadas. A carne fica 48 hs em nosso intestino; há uma crueldade enorme com os
animais de abate; eles recebem hormônios e antibióticos; um quilo de carne retira dezenas de quilos de grãos não plantados.
Enfim, a carne é um dos maiores problemas ecológicos e de saúde pública do planeta; a sua diminuição traria uma mudança
positiva substancial.
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