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INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS NO SETOR


AUTOMOBILÍSTICO: IMPACTOS E TENDÊNCIAS.

Lidia Micaela Segre


COPPE/UFRJ Programa de Engenharia de Sistemas e Computação
Cx. Postal 68511 - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21945-970 - segre cos.ufrj.br

Fernando Marmolejo R.
COPPE/UFRJ Programa de Engenharia de Sistemas e Computação
Cx. Postal 68511 - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21945-970 - marmolej urbi.com.br


Guilber Dumans
COPPE/UFRJ Programa de Engenharia de Produção
Cx. Postal 68507- Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21945-970 - guilber openlink.com.br


Abstract
This paper analyzes the impacts of the Information and Communication
Technologies (ICT) on productive restructuring in the globalization context, at the
Brazilian automobile industry. After identifying the dynamics of this industry, it was
studied how ICT help deep transformations on competitive strategies, organization
functions and on the choice of administration and production models. For the coordination
of the different actors of the productive chain the use of peripherical and corporative webs
is very important. The emphases of this work was the study of the changes on the
relationship between companies, on the company structure, on the production system, and
on the work organization.

Key words:
Technological Innovation, Information Technology, Automobile Industry

1. Introdução.
O presente estudo foi motivado pela importância estratégica conferida ao complexo
automotriz em função de sua repercussão na economia do Brasil (13,8% no PIB industrial
em 1996), do número de empregos diretos gerados nas montadoras (104 mil em 1997)1, do
processo de modernização técnico-organizacional adotado por essa indústria, do interesse
em instalar doze novas fábricas investindo 9 bilhões de dólares sendo que cinco projetos já
estão em fase de implantação experimentando novos modelos organizacionais, e finalmente
pelo fato desse setor ser pioneiro na introdução de Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs).
Este estudo tem como objetivo principal analisar os impactos da adoção das TICs
dentro de um contexto de reestruturação produtiva e organizacional do setor
automobilístico no Brasil. Será estudado como a adoção destas tecnologias têm
reconfigurado a produção, a organização do trabalho, a gestão e a distribuição na cadeia
produtiva, interligando computadores de diferentes empresas e de fornecedores de matérias-
primas aos usuários finais.
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A integração das montadoras internamente e externamente com fornecedores,


concessionárias e clientes é caracterizada por uma nova trajetória organizacional, que
incorpora inovações tecnológicas e procura adequar a inserção internacional da indústria
automobilística brasileira ao novo padrão competitivo em gestão nos mercados
crescentemente globalizados.

2. Características e Dinâmica da Indústria Automobilística no Brasil.


Entre 1992 e 1997, a produção da indústria automobilística brasileira passou de
pouco mais de 1,1 milhão veículos para 2,05 milhões e as vendas no mercado interno
saltaram de 756 mil unidades para 1,9 milhões (Anfavea, 1997). Os principais fatores para
explicar esse crescimento foram por um lado, os acordos no âmbito da Câmara Setorial em
1992, que criaram condições para a recuperação e a expansão do mercado doméstico de
automóveis e por outro lado, os incentivos para a produção dos chamados “carros
populares”. Miranda e Corrêa (1997) identificam três tendências explicativas deste
crescimento.
A primeira tendência é a intenção de investimentos de U$16 bilhões das montadoras
no Brasil (antigas e novas) entre 1996 e 1999, valor que dobraria se computados os
investimentos das autopeças. O resultado seria, segundo a Anfavea (1997), uma capacidade
de produção de 2,5 milhões de veículos no ano 2.000, que conduziria o Brasil ao posto de
quinto maior produtor mundial, atrás apenas dos Estados Unidos, Alemanha, França e
Japão.
A segunda tendência é o crescente grau de internacionalização da produção e o
papel reservado ao Brasil, especializando sua produção em modelos de pequeno porte
(mudança do mix de produção). Na década de 90, foram já lançados quatorze novos
modelos, contra apenas sete na década passada. A partir de 1992, quase todos os
lançamentos foram de carros "mundiais". Modelos como o Corsa, o Palio e o Fiesta são
exemplos desta tendência, que deverá se intensificar (Miranda e Correia, 1997).
A terceira tendência é a reestruturação das relações das montadoras com as
empresas de autopeças e outros insumos, implicando na redução do número de
fornecedores diretos e na promoção de uma maior interação dos membros da cadeia
produtiva. A relação mais intensa entre esses parceiros, se dá tanto no processo de
gerenciamento de uma produção mais rápida, enxuta e flexível (just-in-time), como no
desenvolvimento conjunto de novos produtos, incluindo as próprias atividades de P&D, que
passaram a ser objeto de esforços cooperativos. Materiais e peças passaram a ser
desenvolvidos de forma simultânea e coordenada, reduzindo o tempo necessário e os custos
para o desenvolvimento dos novos modelos (Ferro, 1996).
Dentro do contexto de reestruturação produtiva acima analisado, as novas formas de
articulação entre montadoras e fornecedores, tendem a intensificar os fluxos de informação
entre as empresas, permitindo a reconfiguração espacial, organizacional e de gestão da
produção e do trabalho. Paralelamente, a produção compacta e flexível exige formas ágeis
de comunicação e de informação com os distribuidores para detectar mudanças nas
condições de mercado, facilitar a produção orientada para o cliente e reduzir custos de
estocagem e prazos de entrega de veículos. Desse modo o uso das tecnologias de
informação e comunicação (TICs) passam a constituir um suporte necessário e fundamental
para a competitividade na indústria automobilística brasileira.

3. O Setor Automobilístico e a Adoção das Tecnologias de Informação e Comunicação


(TICs).
a) Fluxo de informações gerado nas relações entre as montadoras e outros agentes:
fornecedores, concessionárias, prestadores de serviços e clientes (redes periféricas)
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O intercâmbio eletrônico de dados (EDI) é definido segundo Tigre e Sarti (1997)


como “uma técnica de formatação transacional de computador a computador". Caracteriza-
se por integrar sistemas aplicados a transações entre diferentes organizações, mantendo a
independência e o sigilo. Consequentemente, a utilização das TICs envolve diferentes
recursos tais como: redes de telecomunicações, softwares, padronização das práticas
comerciais e dos dados a serem transmitidos.
No Brasil, o setor da indústria automobilística foi um dos precursores na utilização
das tecnologias de informação e comunicação (TICs), dentro do processo de reestruturação
produtiva. A nível das redes locais, como a nível da interconecção com outros parceiros da
cadeia produtiva (fornecedores, concessionárias e clientes), a troca eletrônica de
informações vem sendo realizada utilizando o sistema público de telecomunicações,
Embratel.
No relacionamento entre as montadoras e os fornecedores, as transações utilizando
EDI tratam fundamentalmente das seguintes informações: necessidade diária de produção,
programação de entregas, peças ou material crítico em atraso, cotação de ofertas, pedido de
compras, alteração no pedido de mercadorias, aviso de modificações técnicas nos desenhos
e projetos, aviso de recebimento, resultado de inspeção, aviso de entregas e/ou embarques,
transmissão de textos pelo correio eletrônico, entre outros.
Nas relações entre as montadoras, as concessionárias e os clientes, o fluxo de
informações abarca fundamentalmente dados comerciais relacionados à encomendas e
distribuição de veículos, ao controle de estoques de peças, à determinação das necessidades
do consumidor, aos serviços de venda e pós-venda, à customização do veículo que será
produzido, etc.
Um exemplo do relacionamento acima mencionado é a Fiat no Brasil que foi a
precursora da informatização do sistema de vendas chamado “UNO-ON-LINE”, para
combater o ágio e reduzir o prazo de entrega dos veículos. Este sistema permite registrar ,
no ato da compra, as características do veículo encomendado e estabelecer o prazo de
entrega. As vendas on-line respondem hoje por uma expressiva parcela do faturamento da
empresa (Gazeta Mercantil 18/07/97) e são produto do modelo de produção just-in-time.
Igualmente a Fiat via EDI, possibilita o acesso das concessionárias a um banco de dados,
que permite obter informações sobre o estágio de fabricação dos veículos encomendados.
Para reduzir custos de distribuição, a empresa utiliza um programa que otimiza o trajeto
dos caminhões “cegonheiros” que ligam a fábrica e o porto às concessionárias, permitindo o
planejamento estratégico na entrega de veículos (Laplane e Sarti, 1995).
Desde maio de 1997, a Fiat utiliza no Brasil os sistemas MultiFiat e Examiner. O
primeiro é um sistema multimídia desenvolvido no Brasil com o objetivo principal de
agilizar o fluxo e a atualização das informações técnicas dos automóveis da fábrica. Sua
versatilidade está na rápida atualização de seu banco de dados feita pelos engenheiros na
fábrica de Betim em Minas Gerais. As informações atualizadas chegam às concessionárias
pelo sistema de correio eletrônico Polypus, da própria Fiat, e na concessionária são
copiadas e transferidas para o MultiFiat (Ortunho, 1997).
Já o Examiner foi importado da matriz da Fiat, na Itália, e permite realizar um
diagnóstico completo do funcionamento do motor do carro on-line. Ambos os programas
estão sendo utilizados nas oficinas das concessionárias e tem demonstrado capacidade para
tornar mais rápido, fácil e eficiente o trabalho de mecânicos, eletricistas e tapeceiros
(Ortunho, 1997).
As outras empresas montadoras de automóveis no Brasil também têm desenvolvido
estratégias de integração com as concessionárias utilizando sistemas de informação e
comunicação. A Volkswagem, por exemplo, está na fase de teste final do sistema Vsat, rede
privada de comunicação via satélite, que permitirá ao cliente, eletronicamente, comprar um
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veículo ou encontrar uma peça numa das 820 concessionárias espalhadas pelo país. Essa
Montadora instalou, em março de 1997, um sistema eletrônico de compra de peças,
permitindo hoje fazer 10 mil cotações de preços em cerca de 500 fornecedores do Brasil, 90
do Mercosul, e centenas de outros mundiais. Segundo o Engº Boschetti, "uma cotação que
demorava 80 dias, é feita hoje em 15 dias" (Boschetti, 1997).
A Scania conectou suas 110 concessionárias via EDI. O acesso on-line à
informações ajuda tanto nas vendas, oferecendo produtos customizados, como também na
gestão, através da melhoria do planejamento e controle da produção.
O intenso fluxo de informações comerciais impôs a necessidade de padronização do
layout dos documentos utilizados por fornecedores de autopeças e montadoras, tendo sido
criado um padrão Anfavea e a Rede Nacional de Dados, que passou a utilizar, ainda que
não exclusivamente, o STM-400 da Embratel como meio de comunicação. Atualmente,
aproximadamente 1.500 fornecedores comunicam-se com as montadoras por intermédio
desse sistema (Anfavea, 1996).
Segundo Tigre e Sarti (1997), no futuro próximo a Internet será o sistema que se
perfilará como modelo padrão de transmissão de dados eletrônicos via EDI, já que este
sistema permitirá a um maior número de pequenas empresas o acesso a esta tecnologia.
Durante o ano 1996 foram realizadas, com certo êxito, as primeiras experiências. Ainda
falta solucionar detalhes a nível de segurança de dados para garantir seu uso a um maior
número de usuários.
As autopeças que possuem sistemas CAD (Computer Aided Design) de pequeno
porte se comunicam com as montadoras no envio e recebimento de desenhos, através da
Internet. Por causa das diferenças na infra-estrutura computacional a comunicação é
realizada através da intermediação de empresas especializadas na tradução dos desenhos
desenvolvidos em sistemas de pequeno porte nas autopeças, para grande porte nas
montadoras. A terceirização desse serviço ampliou o acesso de pequenas empresas à
comunicação de dados pela Internet.

b) Fluxo de informações gerado dentro da própria corporação (redes corporativas).


Segundo Laplane e Sarti (1994) redes corporativas são definidas como redes
internas à empresa ou ao grupo econômico, podendo ser tanto nacionais quanto
internacionais, como geralmente ocorre com as montadoras, interligando unidades
produtivas e administrativas, matrizes e outras filiais. Essas redes têm se ampliado
sobretudo em virtude do processo de globalização, que resulta em maior intercâmbio
comercial, expresso no aumento das exportações/importações de partes e de veículos
acabados e crescente intercâmbio produtivo e tecnológico.
Um exemplo de crescimento da rede corporativa e da demanda por serviços de
telecomunicações pode ser observado na Fiat, que informatizou seu processo de
desenvolvimento e distribuição eletrônica de desenhos industriais utilizando CAD na rede.
A rede permite a integração das áreas de engenharia de produto e processo (engenharia
simultânea ou cooperativa) e destas com outros setores: material, linha de produção, peças
de reposição, garantia e assistência técnica (Ferné e Hawkings, 1996).
A Volkswagen é um exemplo relevante da utilização destas redes, sendo um dos
maiores usuários de CAD, CAM( Computer Aided Manufacturing) e CAPP(Computer
Aided Process Planing) da América Latina, com 200 workstations CATIA-V4. Com a
ajuda de CAD-CAM-CAPP, projetou-se o novo Gol em 36 meses (o antigo Gol foi
desenvolvido em 68 meses). Atualmente, a troca de desenhos em duas dimensões entre a
Volkswagen do Brasil e a matriz na Alemanha, visando a produção de veículos globais com
plataformas comuns (como Gol, p. ex.), é feita entre cinco e 15 segundos. Em três
dimensões, em cinco minutos. O desenvolvimento das peças da carroceira, do chassi, da
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parte elétrica, do motor e do acabamento é feito com o software CATIA, disponível via
rede em todas as unidades do grupo mundial (Boschetti, 1997).
A Volkswagen utiliza igualmente o sistema TOUCH SCREEN que permite o
acompanhamento da montagem de veículos. Este sistema implantado no “chão” da fábrica
em São Bernardo e Anchieta e operado pelos montadores. Permite sinalar em tempo real a
toda a cadeia produtiva, onde há falhas na montagem e possibilita sanar o problema antes de
o veículo sair da linha de produção.
Na fábrica da Volkswagen, em Resende, foi adotado um ambiente CAPP no chão de
fábrica que permitiu montar uma base de dados única, facilitando a integração dos
processos desenvolvidos por cada parceiro em cada módulo. Esse sistema agiliza o cálculo
do tempo de operação e do custo de mão-de-obra na montagem dos veículos, permitindo
reduzir o lead-time do processo. Além disso facilita a elaboração da documentação, a
padronização do processo, o treinamento dos trabalhadores, e a geração das folhas de
operação através da utilização de desenhos e fotografias, disponibilizando a atualização
constante das listas de ferramentas e de peças.
A Scania do Brasil também implantou uma rede interligando as diretorias com as
áreas de engenharia industrial, de exportação e a de sistemas de informações. Mas a maior
importância da rede é que, por intermédio do aluguel de um canal de satélite da Embratel,
foi possível conectar a matriz da Suécia e a filial brasileira. Por essa rede são transmitidas
imagens utilizadas na criação e adoção de projetos para a confecção de cabines, motores e
pequenas peças dos veículos fabricados pela empresa ( Revista Informática Exame, 1995).
O fluxo de informações dentro da própria organização também ocorre nas áreas
onde são implantados Sistemas Flexíveis de Manufatura e automação industrial, como
máquinas automáticas, máquinas ferramentas CNC (Comando Numérico Computadorizado)
e robôs. A seqüência de produção é enviada diretamente pela rede local de dados, iniciando
a operação das máquinas automáticas e o processo de fabricação no qual pode ocorrer fluxo
de informação entre as máquinas. A informação sobre a produção retorna automaticamente
pela rede alimentando bancos de dados que posteriormente são tratados e analisados.

4. A Utilização das TICs e os Impactos sobre a Organização e os Processos de


Trabalho.
Em geral o uso das TICs no setor automobilístico, otimiza a operacionalização das
inovações organizacionais e de gestão decorrentes da produção enxuta e do just-in-time, do
controle de qualidade total e da engenharia simultânea. Também, a nível da engenharia de
processos, o uso das TICs dá maior agilidade e qualidade na geração das informações
permitindo desta maneira produzir dados que podem ser aproveitados por vários setores da
empresa.
As mudanças organizacionais veiculadas pelo uso das TICs podem ser agrupadas em
quatro níveis que estão intimamente inter-relacionados :
a) mudanças na relação entre as empresas.
As montadoras vêm desenvolvendo novas formas de relacionamento com
distribuidores e clientes para a identificação mais seletiva de informações sobre mercados e
sobre os consumidores como instrumento importante para a estruturação de uma estratégia
competitiva. As informações externas são avaliadas por sistemas de base de dados e
ferramentas relacionais (Database Marketing) para melhorar e direcionar os esforços de
marketing dos clientes, e por sua vez ampliar mercados e o potencial de novos produtos.
As novas formas de relacionamento com fornecedores, distribuidores e clientes
permite a padronização da produção (automação), mas com customização (informatização).
As montadoras e as empresas de autopeças passaram a buscar padrões de relação mais
estáveis, com compromissos recíprocos. Segundo Posthuma, (1994) os principais elementos
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dessa relação incluem: crescente terceirização de partes e serviços; redução do número de


fornecedores diretos e crescente demanda por submontagens, ao invés de partes isoladas.
A crescente complexidade nas relações entre as montadoras e um grupo selecionado
de fornecedores torna fundamental a utilização de EDI tanto na área comercial quanto na
engenharia para a introdução de novas formas de gerenciamento, produção, planejamento e
desenvolvimento de produtos e processos.
No caso do modelo “consórcio modular” por exemplo, a utilização do ambiente
CAPP, tem permitido padronizar a documentação da fábrica obtendo uma maior velocidade
de geração de planos de processos. Neste contexto os parceiros trabalham com um modelo
único de plano, permitindo reduzir o lead-time do processo, assim como, agilizar as
revisões de cada operação do processo ao tornar possível a correção de eventuais
informações contraditórias durante a execução do mesmo. Isto é viável devido ao histórico
das revisões que ficam armazenadas na base de dados do sistema, facilitando um
rastreamento de todas as modificações de processo.
b) mudanças na organização geral da empresa.
O uso das TICs nos novos modelos produtivos têm levado a uma maior interligação
com a gerência como conseqüência da redução de níveis hierárquicos da estrutura
organizacional (enxugamento de chefias intermediárias), e a uma alteração no perfil da
supervisão existente. Hoje os executivos precisam estar mais próximos da operação; isto
possibilita que o processo inteiro se torne um trabalho de uma equipe e que a gestão do
processo passe a formar parte do mesmo.
Por exemplo, na Volkswagen , em Resende, o uso do ambiente CAPP permitiu
delegar a responsabilidade do controle de qualidade sobre o executor da tarefa de forma a
diminuir a responsabilidade da inspeção final e aumentar a importância do controle da
qualidade como prevenção à falha. Igualmente está contribuindo para modificar o processo
de trabalho, especificamente na conexão entre desenvolvimento de projeto e chão-de-
fábrica, visando ganhos de flexibilidade, redução no lead-time do processo e, integrando as
diversas tarefas em um fluxo lógico de processo.
Outro fator importante do uso das TICs é possibilitar que as firmas integrem suas
diferentes áreas, particularmente no projeto conjunto de produto e processo e engenharia
simultânea , assim como, possam definir melhor suas “unidades de negócios”, com o
objetivo de buscar novas áreas de atividades que permitam a manutenção de uma sólida
posição na indústria automobilística e de achar oportunidades de mercado mais dinâmicas.
Estas novas áreas tendem a ser marketing, design, distribuição, atendimento ao cliente e
serviços de pós-venda.
c) mudanças na organização da produção.
O uso das TICs facilita a coordenação e a colaboração das pessoas envolvidas no
projeto, no desenvolvimento e na manufatura integrando essas áreas, com um conjunto de
ferramentas computacionais que permitem a aplicação da Engenharia Simultânea. As
atividades relacionadas ao projeto, ao desenvolvimento e à manufatura de novos produtos
passam a ser realizadas em paralelo ao invés de seqüencialmente.
A possibilidade de atender as preferências do cliente customizando o produto, e a
redução do tempo entre o pedido e entrega do veiculo, proporcionado pela tecnologia,
alteram o planejamento e a organização da produção que passa a ser mais flexível. As linhas
de montagem podem produzir hoje um conjunto variado de modelos, não precisando mais
ser linhas dedicadas.
As TICs facilitam a participação dos fornecedores na linha de montagem dos
veículos (por exemplo no Consórcio Modular) através do controle e da coordenação dos
parceiros mudando a organização da produção e a simplificação da montagem. O
fornecimento de sistemas previamente montados ao invés de peças, resultado de uma maior
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aproximação entre as montadoras e os fornecedores proporcionado pelas TICs, permite


maior flexibilidade e uma redução no tamanho da linha de produção.
As TICs permitem prestar um serviço mais eficiente e de melhor qualidade ao
cliente, assim como, possibilitam a redução de estoques, o aumento da produtividade
através de uma maior taxa de ocupação do equipamento, eliminando qualquer função
desnecessária no sistema de produção que traga custos indiretos (Santos e Costas, 1996)
d) mudanças na organização do trabalho.
Tem se desenvolvido a partir do uso intensivo das TICs um maior conteúdo
informacional do trabalho e uma crescente integração das diversas tarefas, exigindo desta
maneira, por parte dos trabalhadores, uma maior capacidade de coordenação, execução e
tomada de decisões. Suas decorrências são as várias formas de polivalência e a junção de
atividades de operação, inspeção de qualidade e primeira manutenção.
A utilização de TICs, em particular do CAPP no “consórcio modular” possibilitou
que o operador de chão-de-fábrica receba um certo nível de informação que facilita a
comunicação interpessoal com a área de projeto, pois o sistema de redes de computadores e
a alocação de um terminal inteligente no seu posto de trabalho permite-lhe o acesso direto à
base de dados do projeto, facilitando assim, uma atuação mais ativa do operário durante o
processo de montagem das diferentes partes do veículo.
O uso das TICs exige a nível das chefias intermédias e do staff , profissionais
capazes de combinar três tipos de conhecimentos: os específicos à atividade desenvolvida
num determinado posto de trabalho, os relativos ao funcionamento geral da empresa e as
competências e saberes em informática. Esse perfil segundo Tigre e Sarti (1997), não é
comum no staff das empresas, onde costuma haver uma dualidade entre os profissionais
orientados para tecnologia (especialistas em TI) e os orientados para o mercado (usuários
de TI).

5. Conclusão.
As TICs são fundamentais na dinâmica do próprio processo de globalização
produtiva das empresas do setor automobilístico facilitando profundas modificações nas
estratégias competitivas, na arquitetura das funções organizacionais e na escolha de
sistemas de gestão e produção dos diferentes atores da cadeia produtiva se apoiando no uso
de redes periféricas e corporativas.
A tendência futura é a incorporação das TICs no produto através da eletrônica
embarcada determinada por pesquisas conjuntas das montadoras Volvo, Renault, Peugeot,
BMW, com a empresa France Telecom. Por exemplo, através da instalação de sensores que
controlam a velocidade do carro e o fluxo de veículos nas estradas indicando a urgência de
freiar em caso de necessidade. Outra aplicação é a utilização de sistemas multimídia para
consultar páginas na Web para obter informações sobre o transito ou a meteorologia através
de um terminal de computador instalado no carro (programa de pesquisa europeu
“Promise”) (Revista Le Point, 1998).
As TICs têm aumentado o acesso ao mercado , seja pelo aumento das oportunidades
de negócios ofertando produtos customizados, seja pela melhoria dos serviços de venda e
pós-venda aos clientes (ex. sistemas de ajuda ao diagnostico), e ainda pelo monitoramento
do mercado. Através do acompanhamento on-line, as empresas podem revisar as previsões
das vendas e ajustar o processo produtivo à demanda. No modelo tradicional fordista, o
papel do sistema de distribuição era simplesmente comercializar produtos padronizados. Em
um regime de demanda instável e com tendência pela diversidade, o papel da rede de
distribuição é de pesquisar as preferencias do consumidor e as tendências do mercado,
constituindo assim, um ponto de referencia das atividades de produção.
Sendo as TICs uma tecnologia para facilitar a troca intensiva de dados, seus
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benefícios atingem mais diretamente as grandes organizações envolvidas com o comércio


fortemente baseado em informações. As pequenas empresas segundo Brousseau (1995),
com baixa intensidade informacional nas transações comerciais são menos beneficiadas
devido ao alto custo de operacionalização dessas tecnologias. Além disso a estrutura do
setor de autopeças no Brasil é muito verticalizada e heterogênea, cabe indagar se será
possível generalizar a utilização das TICs entre todos os segmentos da cadeia produtiva do
setor de autopeças, sobretudo para aquelas empresas que não se beneficiam de suporte
técnico das montadoras ou de seus fornecedores diretos.
Outras dificuldades que têm levado a uma adoção limitada das TICs no Brasil tem a
ver com a falta de padronização das tecnologias provocando dificuldades na interface, a
mão-de-obra pouco qualificada para operar esse tipo de tecnologia, a falta de segurança e
confiabilidade das informações, a necessidade de treinar os parceiros comerciais, a
resistência de gerentes e funcionários ao uso das novas tecnologias e uma infra-estrutura de
telecomunicações precária e cara.
Finalmente é necessário destacar que a introdução das TICs deve estar precedida e
acompanhada de novas formas de organizar e gerir a produção, novas rotinas
organizacionais e novos padrões de relacionamento com fornecedores e clientes, caso
contrário, pode-se apenas cristalizar soluções organizacionais obsoletas ou simplesmente
gerar novas formas de realizar os mesmos erros.

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