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09/09/2009

Vexame internacional
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Lula foi ali, comeu uma moqueca com o presidente da França, Nicolas Sarkozy, e
fez uma confusão dos diabos, com repercussão dentro e fora do país.

O processo de seleção para a compra de 36 aviões de caça para renovar a frota da


FAB está no seguinte pé: a Aeronáutica já analisou todas as propostas, afunilou a
escolha para três opções e está finalizando o relatório confrontando condições,
preços e desempenho de cada um para apresentar a Jobim e, por ele, a Lula.

Mas Lula, embalado pela moqueca, pelo prazer da companhia de Sarkozy, pela
ânsia de fechar logo a "aliança estratégica" com a França, meteu os pés pelas
mãos. Chamou os diplomatas e produziu uma espécie de adendo ao comunicado
conjunto para anunciar que o Brasil havia optado pelos Rafale, da francesa
Dassault, em detrimento dos F-18, da Boeing dos EUA, e dos Gripen, da Saab
sueca.

A notícia não foi manchete apenas em todos os grandes jornais brasileiros. Foi cair
na rede da internet e parou em espaços generosos da imprensa internacional toda.
Também, não é para menos. É negócio para a bagatela de R$ 10 bilhões.

Atônitos, brigadeiros, coronéis, capitães e toda a hierarquia da FAB se


perguntavam:

1) Como é possível anunciar a escolha dos franceses, se o relatório técnico nem


sequer foi concluído?

2) Com que cara nós vamos dizer aos suecos e aos americanos que a seleção era
só de brincadeirinha, porque a decisão já tinha sido tomada?

3) Se o Brasil entregou o jogo e os Rafale já ganharam, como pressionar por


melhores preços e juros?

Diante disso, lá foi o Comando da Aeronáutica reclamar com Jobim, ele próprio tão
incomodado com o processo todo que se recusara a dar entrevista no Alvorada --
apesar de toda a questão ser na sua área.

Bem, discute daqui, discute dali, o jeito foi providenciar um contorcionismo retórico
para dar o dito pelo não dito. Sai o comunicado Lula-Sarkozy, entra a nota da
Defesa. Era os Rafale, mas agora também podem ser os F-18, como bem pode ser
também o Gripen.
Na verdade, a decisão está tomada há muito tempo e é política, não técnica. Lula e
seu governo querem porque querem o acordo com a França, o parceiro rico que
alavanca os sonhos de liderança do Brasil entre os emergentes e ajuda a
reequilibrar o tal mundo unipolar (onde só os EUA mandam). Ok. Mas, mesmo com
decisão política, há que seguir os "trâmites"!

Lula agiu como sindicalista afoito, não como chefe de Estado num processo de
seleção internacional envolvendo valores bilionários. E a última foi ironizar a crise
que ele próprio criou: "Daqui a pouco, eu vou receber [os aviões] de graça".

Como se tudo tivesse sido um jogo para baixar os preços. Não foi. Foi voluntarismo
puro e simples de um presidente que, com 80% de popularidade, acha que pode
tudo.

Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e
externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S.
Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha
em Brasília.

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