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19 de agosto de 2008

Edição nº 3

Perspectivas Relegitimadoras do Sistema Penal


Informativo
Juiz Federal Gilton Batista Brito, palestrante Denílson Feitoza e
Imagens do congresso procurador da República Daniel Salgado: os trabalhos do segundo dia
foram gratificantes com o debate sobre as organizações criminosas.

“O Ministério Público tem um papel fundamental nisso.


Ao mesmo tempo que deve tutelar os direitos individuais,
não pode se furtar a proteger a sociedade”, diz acreditar
Luciano Feldens, procurador da República no Rio Grande
do Sul e palestrante que abriu o congresso.

Presença de autoridades e servidores da


PR/GO: procuradores da República, juízes,
delegados comparecem ao evento (ao
lado) e servidores marcam presença
(abaixo).

Sorteio: dois participantes ganharam


livros do palestrante autografado.

Motivação contra o crime 1) Quais as normas


constituicionais que
as coisas”. Os princípios
da igualdade,
dessa situação diferenciada,
são necessários métodos
Uma retórica motivadora. A crime organizado. “É proporcionalidade, eficiên- desiguais (princípio da
possibilitam tratar as
frase simplifica a palestra do necessário um método cia, federativo e do devido proporcionalidade). “É preciso
organizações criminosas
procurador de Justiça em pluriagencial, processo legal (controle) adequar o método a cada
de maneira diferente?
Minas Gerais e Doutor em interdisciplinar e são os caminhos para se realidade, não podemos
2) Que métodos hoje são
Direito, Denílson Feitoza interparadigmático, ade- encontrar uma solução no combater as organizações
considerados novos?
Pacheco, no segundo dia do quado a fenômenos com- combate às organizações criminosas com métodos
congresso. A complexidade do plexos e dialéticos”, criminosas. ineficazes”, considera.
De acordo com o
tema foi tratada de forma desa- teoriza.
palestrante, a resposta
fiadora e cativante. “Há um Não há mais, na opinião A segunda palestra foi cance-
está na própria legisla-
imperativo de cooperação O tema do debate do palestrante, como lada a pedido do palestrante.
ção existente, já que
hoje”, alertou Feitoza durante o “Persecução às organiza- negar a existência de tais
“método novo é uma Fotos: Via Foto Digital -
evento. ções criminosas e novos organizações. Diante
maneira nova de pensar Johnathan Mateus
métodos de investigação”
Para ele, não é mais possível foi apresentado sob duas
ações isoladas no combate ao linhas de questionamento:
Página 2, 19/08/2008

Entrevista Denílson Feitoza Pacheco

Não há como negar a existência das


organizações criminosas cidade do Rio de Janeiro outra ação dessas
O palestrante Denílson Feitoza concedeu a “Vimos uma das maiores organizações, quando o próprio palácio do
seguinte entrevista logo após o evento desta governo não pôde ser devidamente utilizado
terça-feira: cidade do mundo (São Pau- em função de atuação de ações criminosa. Ou

Qual a importância da promoção de um even-


lo) vítima do PCC (Primeiro seja, as organizações criminosas hoje são uma
realidade e grandes organismos como a ONU
to para discutir o Sistema Penal? Comando da Capital). Essa (Organização das Nações Unidas) já reconhe-
Eu penso que a Escola do Ministério Público da organização transformou cem a sua existência.
União e a Procuradoria da República em Goiás
deram um passo extremamente importante no completamente a lógica de Há dificuldade de definição das organiza-
debate do Sistema Penal. Hoje há uma falsa idéia funcionamento das empre- ções criminosas e a sua negação interes-
de que o Sistema Penal simplesmente tem que sam a alguém?
ser substituído. Na verdade, temos é que encará- sas, do comércio, da socie- Essa dificuldade está em extrair da lei uma
lo dentro de nossa realidade, de um Estado De- dade e do transporte daque- noção de organização criminosa se deve a
mocrático de Direito, com garantias e direitos própria formação do aplicador de direito. A for-
fudamentais. Este evento está dentro deste con- la sociedade”. mação do direito é muito limitante sobre o ra-
texto extremamente importante. E o interessante ciocínio que os profissionais do direito usam
é que o próprio Estado é o realizador do con- para lidar com textos legais. Creio eu que essa
gresso. Isso demonstra que está reafirmando a so penal. Elas são mais úteis de modo específi-
co na investigação criminal, possibilitando inclu- dificuldade se encontra mais nisso do que
legitimação do Sistema Penal sempre em res- numa noção de organização criminosa. Além
peito aos direitos fundamentais. Então, acho sive que o juiz, como garantidor dos direitos fun-
damentais, possa com mais segurança determi- disso, precisamos ter interpretações mais res-
crucial utilizar o Sistema Penal, mas com uma tritivas. Se nós trabalhássemos a noção de or-
nova maneira de olhar e buscando uma maior nar medidas cautelares pessoais como prisão
temporária, preventiva, busca e apreensão, e no ganização criminosa mais seletiva, de manei-
eficiência, repeitando os direitos fundamentais. ra que não abrangesse um cem número de
processo penal elas têm que ser submetidas ao
contraditório e a ampla defesa. casos não relevantes, se a polícia, o Ministé-
Quais são os novos métodos de investigação rio Público e a própria justiça tratassem esse
no combate as organizações criminosas? conceito jurídico inderteminado, nós podere-
Em termos básicos, durante a palestra, procurei Há alguma relação entre os grandes centros
urbanos e as organizações criminosas? mos construir uma noção jurídica de organi-
demostrar de maneira jurídica-dogmática que a zação criminosa. Basta ter critérios de rele-
Constituição da República já possuem as nor- De fato as organizações criminosas tendem a
ter seus principais focos de administração nos vância para poder tratar como organização
mas que criam as condições para que podemos criminosa só aquilo que gere um determinado
atuar em relação as organizaçõs criminosas e grandes centros urbanos, mas isso se deve pe-
las facilidades que esses locais oferecem, tais impacto econômico, financeiro ou social.
utilizar o que a gente chama de novos métodos
de investigação, que na verdade são métodos como finaceiras, econômicas, tecnológicas e de
transportes. No entanto, a organização pode ter A exemplo do PCC em São Paulo, as
antigos. Por exemplo, as atividades de inteligen- ações desse tipo de organização crimino-
tes, contra-inteligentes, ações de busca e técni- sua atuação principal inclusive em municípios
afastados, no interior com pequena população. sa são marcadas por requintes de cruel-
cas operacionais como vigilância, estória-cober- dade. Estamos preparados para lidar com
tura, disfarce, observação, reconhecimento Tudo depende de exatamente o que aquela or-
ganização criminosa está fazendo de forma es- isso?
operacional e interceptações de sinais. Essas Essa questão da violência física é mais mais
técnicas estão sendo vistas como possíveis den- pecífica. Mas o importante é saber hoje em dia
não há mais como negar a existência de tais or- visível e é apenas um aspecto de determina-
tro da investigação criminal e dentro do proces- das organizações criminosas. Então, por
ganizações criminosas.
exemplo, no tráfico de drogas, a violência é
E por que se negaria a existência das organi- bem marcante. Temos, porém, organizações
zações criminosas? criminosas de outras espécies nas quais não
Acho que a negação da existência das organi- há propriamente essa violência física. Preci-
zações criminosas está mais na incompreensão samos ver a questão da biopirataria. Essa
deste fenômeno do que propriamente questão é muito séria e uma face menos
pudesssemos afirmar que ela não existe. Temos vísivel. A corrupção é outro exemplo. Você
dificuldades jurídico-dogmáticas para conceituar pode extrair uma quantidade imensa de recur-
a organização criminosa. Mas não adianta, pois sos do Estado sem matar ninguém, sem ferir
a organização criminosa bate em nossas por- ninguém, e isso é uma violência estrutural,
tas. Vimos uma das maiores cidade do mundo porque retirando esse recurso, deixará de in-
(São Paulo) vítima do PCC (Primeiro Comando vestir em estradas, escolas e o Estado deixa-
da Capital). Essa organização transformou com- rá de cumprir seu papel de intervenção na
pletamente a lógica de funcionamento das em- sociedade. Portanto, a violência é apenas uma
presas, do comércio, da sociedade e do trans- das facetas que podem ocorrer ou não em uma
porte daquela sociedade. Nós vimos também na organização criminosa.

Denílson Feitoza é procurador de Justiça em MG

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