Rio, 01 de março de 2004 - Com a entrada em vigor do novo Código Civil,
vários aspectos do direito societário sofreram mudanças, notadamente no que diz respeito às sociedades limitadas. No entanto, os impactos de tais mudanças ainda estão sendo verificados e notados, mais de um ano após o término da vacatio legis, 10 de janeiro de 2003. Logo após a entrada em vigor da nova lei, já alguns aspectos foram amplamente discutidos, como a mudança de quórum deliberativo para algumas matérias, a estruturação das formas de conclave dos sócios, a proibição de sócios cônjuges com determinado regime de bens constituírem sociedade, e outros mais. Um destes impactos, no entanto, não foi amplamente discutido, motivo pelo qual este artigo foi redigido. Tal impacto diz respeito aos artigos 1029 e 1033 do novo diploma legal. O primeiro está relacionado ao direito de retirada de sócio, o segundo à dissolução das sociedades. No entanto, antes de passar ao conteúdo de tais artigos da nova lei, cabe breve explanação do que constava nos antigos diplomas legais, quais sejam, o Decreto? Lei 3708/19 e o Código Comercial de 1850. O Decreto? Lei acima mencionado previa o direito de recesso de sócios que viessem a divergir de quaisquer deliberações tomadas na sociedade por sócios majoritários, que resultassem em alteração contratual. Já o Código Comercial previa a possibilidade de dissolução de uma sociedade por decisão unilateral de qualquer sócio, no caso de sociedades por tempo indeterminado. Tais conceitos, imperativos na antiga legislação, criaram o instituto da dissolução parcial. Explico: para que o sócio se retirasse da sociedade, era necessário que houvesse decisão dos demais sócios alterando o contrato social, hipótese que nem sempre era verificada. Por outro lado, o sócio que desejasse se retirar, mas não possuísse motivação fática para tanto, entrava com pedido de dissolução da sociedade. Ante tal pedido, os juízes costumavam decidir que, para manter a sociedade, deveria ser realizada uma dissolução parcial, a qual teria efeitos absolutamente idênticos aos da retirada do sócio, só que era motivada unilateralmente, sem razão concreta. Criou-se, desta forma, o instituto doutrinário e jurisprudencial da dissolução parcial, que supria as necessidades de retirada desmotivada de quotistas de sociedades por quotas de responsabilidade limitada que simplesmente não quisessem mais continuar na sociedade, sem a necessidade de dissolução da empresa. Já o novo dispositivo legal, a Lei 10.406/02 (novo Código Civil), veio legalizar tais situações de retirada, e afastar a possibilidade de dissolução por decisão unilateral e desmotivada de sócios. Primeiramente, o novo código introduziu o artigo 1029, que determina que em sociedades por prazo indeterminado, qualquer sócio pode proceder à própria retirada, mediante notificação aos demais sócios com antecedência mínima de sessenta dias. Ou seja, não há necessidade de motivo para que qualquer sócio de uma sociedade limitada processe sua retirada. Basta que o mesmo notifique os demais sócios, com a antecedência prevista em lei. Tal inovação, por si só, já serviu para que o conceito doutrinário e jurisprudencial de dissolução parcial fosse relegado ao passado. Se um sócio pode se retirar da sociedade simplesmente através de notificação aos demais sócios, qual a necessidade de se propor dissolução total da mesma, para que fosse atingida a dissolução parcial, e após fosse processada sua saída? Simplesmente não há. Deve-se processar a retirada nos termos do artigo 1029 do novo Código Civil. Adicionalmente, o novo diploma legal trouxe inovações no que tange à dissolução das sociedades limitadas. Em seu artigo 1087, aplicado em conjunto com os artigos 1044 e 1033, ficou previsto que as sociedades limitadas empresárias serão dissolvidas de pleno direito, ou seja, sem necessidade de pleito por parte dos sócios, em alguns casos específicos. Já com relação à dissolução da sociedade por decisão unilateral de algum sócio, o artigo 1034 do novo Código Civil prevê que a sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, em duas hipóteses: quando anulada a sua constituição, ou quando exaurido o fim social, ou verificada a sua inexiqüibilidade. Desta forma, na contra-mão do antigo Código Comercial, o atual Código Civil exclui a possibilidade de dissolução de sociedades limitadas por mera vontade de um dos sócios. A nosso ver, tal exclusão concedeu ao nosso sistema jurídico societário maior segurança, na medida em que fica consignado legalmente a capacidade de um sócio, em uma sociedade limitada, portanto de pessoas em última instância, retirar-se sem que seja necessário utilizar-se de construção doutrinária e jurisprudencial. Construção esta que, convenhamos, acabou por se tornar o quebra galho encontrado pelo sistema para adaptar o ordenamento à realidade. Conclui-se que, atualmente, e com todo o embasamento jurídico necessário, pode um sócio retirar-se de uma sociedade limitada tão somente por meio de notificação enviada aos demais sócios. Cabe lembrar, como ressaltado anteriormente, que tal caso aplica-se às sociedades por prazo indeterminado de duração, e não às com prazo determinado. Para estas é exigida prova judicial que consubstancie justa causa para a saída do sócio. Respondendo às perguntas que encabeçam este artigo, a melhor forma de se pleitear a saída de uma sociedade limitada por sócio que não mais deseja manter?se na mesma, seja por qual motivo for, é o de exercício do direito de retirada previsto no artigo 1029 da Lei 10.406/02, o novo Código Civil. Por fim, cabe mencionar que, com o novo dispositivo legal, foi também inserido o direito de retirada do sócio da sociedade limitada que dissentir de decisão tomada pelos demais sócios (artigo 1077). Tal direito pode ser exercido apenas no caso de modificação do contrato, fusão da sociedade ou incorporação, nos 30 dias subseqüentes à reunião que tiver deliberado as matérias acima. No entanto, da mesma forma que previa o Decreto Lei 3708/19, tal direito de retirada está atrelado à não concordância do sócio com a deliberação de certas matérias. Portanto, tal direito de retirada ainda não satisfaz as necessidades do sócio que resolve sair da sociedade unilateralmente, sem motivação explícita na lei. Continua sendo mais interessante a inovação trazida no artigo 1029 do novo Código Civil. (Gazeta Mercantil) (Antonio Luís G. R. S. Garcia - Advogado do Rozenblum e Marques da Fonseca advogados e consultores Legais)