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Método de avaliação nutricional de gestantes

adolescentes garante parto mais seguro


ENSP, publicada em 15/05/2009

Coordenadora do Centro Colaborador de Alimentação e Nutrição da região Sudeste


(Cecan/CSEGSF/ENSP), Denise Cavalcante Barros acabou de defender sua tese de
doutorado na ENSP, na qual avaliou o estado nutricional de gestantes adolescentes no
Rio de Janeiro. Além de diagnosticar a situação nutricional desse grupo, a pesquisadora,
em entrevista ao Informe ENSP, comentou os riscos que o sobrepeso pode trazer para a
gravidez e apresentou um modelo mais adequado para avaliar gestantes adolescentes.
Confira a entrevista.

Informe ENSP: Quais foram os resultados obtidos na sua tese de doutorado sobre
o estado nutricional das gestantes adolescentes no Rio de Janeiro?

Denise Cavalcante Barros: Antes de tudo, é preciso esclarecer que as


pesquisas nacionais revelam um aumento de sobrepeso/obesidade
sobretudo nas classes sociais mais baixas, em que o acesso à informação é
mais precário. Os resultados da minha tese, para a qual estudei o consumo
alimentar de gestantes adolescentes, mostram que as gestantes mais jovens
dessa classe têm uma alimentação mais restrita em relação ao consumo de
leite e seus derivados, ao consumo de frutas e verduras, ao feijão. Esses são justamente
os alimentos que fazem parte de uma alimentação saudável, e não são consumidos com
tanta frequência e em quantidades insuficientes.

Hoje, temos tendência ao aumento do consumo de refrigerantes e massas,


principalmente o macarrão. Portanto, há uma substituição do antigo feijão com arroz
pelo macarrão, por exemplo. Há também a substituição do antigo lanche da tarde, que
era um café com leite e pão, pelo refrigerante e salgadinhos. Essa tendência de consumo
vem acontecendo em toda nova geração, e é uma preocupação nacional. Temos que
trabalhar a promoção da alimentação saudável nas escolas e outros locais que possam
atingir esses jovens.

Informe ENSP: Quais os riscos desse sobrepeso para a gravidez?

Denise Barros: Quando as grávidas começam a gestação com sobrepeso ou quando têm
um ganho excessivo de peso durante a gestação, isso normalmente está ligado ao
nascimento de bebês macrossômicos (que pesam mais de 4kg ao nascer) e outros
desfechos obstétricos desfavoráveis. Da mesma forma, as que ganham pouco peso têm
maior chance de ter bebês com baixo peso. O método de avaliação nutricional que o
meu estudo sugere como mais adequado para gestantes adolescentes permite identificar
melhor as jovens que têm ganho de peso excessivo, ou que começaram a gestação com
sobrepeso e obesidade.
Se o ganho de peso for controlado, é possível um melhor desfecho obstétrico tanto para
o bebê quanto para a mãe adolescente. Um bebê macrossômico pode trazer
complicações no parto, além do risco de infecções. O estudo encontrou que o ganho de
peso excessivo esteve relacionado a uma maior proporção de partos cesáreos. Isso
mostra que há um desfecho desfavorável.
Informe ENSP: Qual foi a metodologia utilizada na tese? Como chegaram ao
melhor método de avaliação para o estado nutricional na gravidez de adolescentes?

Denise Barros: O estudo faz parte do subprojeto de um projeto bem maior, coordenado
pela pesquisadora Maria do Carmo Leal, para o qual foi feito um estudo da
morbimortalidade da atenção peri e neonatal com gestantes adultas e adolescentes, de
1999 a 2001, no município do Rio de Janeiro. Os dados desse estudo têm enorme
relevância para este campo e resultaram em cerca de 16 teses de doutorado e
dissertações de mestrado e uma edição especial da revista Cadernos de Saúde Pública -
CSP. A partir do estudo, a professora Silvana Granado realizou pesquisa apenas com
gestantes adolescentes. Minha tese foi em cima desse recorte. Fiz uma avaliação
antropométrica (de peso e estatura) para observar como o peso pré-gestacional e o
ganho de peso dessas gestantes se associou aos desfechos obstétricos, entendendo esse
desfecho - o peso no nascimento das crianças e aspectos relacionados à mulher - como a
situação do parto, a idade gestacional, o risco de doenças, fatores socioeconômicos,
dentre outros.

Minha tese resultou em três artigos. Em um deles, fiz uma revisão sistemática que
objetivou a identificação de métodos de avaliação nutricional de gestantes adotados no
Brasil e sua associação com os desfechos obstétricos. Nesse caso, identificamos estudos
brasileiros sobre avaliação antropométrica de gestantes para observar quais os métodos
utilizados para diagnóstico nutricional de gestante. No entanto, encontramos poucas
pesquisas em relação a isso. Elas tinham desenhos metodológicos frágeis e muitos
questionamentos com relação aos métodos utilizados.

O segundo artigo buscou verificar a associação das características maternas e os


resultados obstétricos com o ganho de peso gestacional. Nesse estudo, observamos que,
quanto mais jovem, a situação de ganho de peso dessa gestante é pior, com tendência
para a maior proporção de sobrepeso.

Outro resultado demonstra que as jovens que iniciaram a gestação com diagnóstico de
sobrepeso e obesidade tiveram um ganho de peso excessivo. Isso revela uma associação
de que as mulheres que começam a gravidez com sobrepeso têm tendência a ganhar
peso excessivo durante a gestação.

Informe ENSP: E como esse sobrepeso/obesidade foi constatado?

Denise Barros: Há um método proposto pelo Ministério da Saúde para fazer a


avaliação nutricional de gestantes, mas não existe um método próprio para a gestante
adolescente. Alguns autores orientavam que se fizesse o Índice de Massa Corporal
(IMC) pré-gestacional para adolescentes. As adolescentes ainda estão em fase
crescimento, tem metabolismo diferenciado, estão num outro ritmo de formação
fisiológica, biológica e até comportamental se comparadas às mulheres adultas.
Começamos a testar esses métodos. Utilizamos a proposta internacional do Institute of
Medicine (IOM), recomendada pelo MS. Ainda usamos o IMC pré-gestacional proposto
pela Organização Mundial da Saúde em 1995, específico para diagnóstico do
adolescente.
Mais recentemente, um método de avaliação nutricional antropométrico pré-gestacional
proposto pela OMS (2007) se mostrou mais próximo da velocidade de crescimento
dessas adolescentes. Comparamos esses três métodos e concluímos que o método
proposto pela OMS (2007) supera o método do IOM (1990; 1992) na identificação do
risco para o nascimento de crianças macrossômicas entre as adolescentes, sem perder de
vista aquelas com risco de baixo peso ao nascer. Esses são resultados importantes que
podem ajudar a área de alimentação e nutrição do MS a nortear políticas. Não há
nenhum estudo nacional sobre isso. Essa é uma pesquisa pioneira.

Informe ENSP: De que maneira esses achados podem contribuir para uma melhor
política do Ministério da Saúde?

Denise Barros: Diante do aumento da obesidade, em particular nos grupos mais jovens
da população, recomenda-se a adoção de pontos de corte específicos para adolescentes
no diagnóstico nutricional prévio de gestantes adolescentes, a fim de proporcionar uma
melhor classificação para o ganho de peso dessas jovens durante a gestação. Esses
achados são importantes porque ajudam o MS a definir melhor essa política de
avaliação do estado nutricional de gestantes adolescentes, uma vez que não existe
nenhum estudo nacional que compare esses métodos. Internacionalmente isso tem sido
feito. Os métodos têm sido questionados, e há os indicativos de que deve ser feita uma
avaliação pré-gestacional da adolescente diferenciada para cada faixa etária desse
período da vida. Esse é um resultado espetacular e que carece de novas pesquisas.

Enfim, se há o aumento do sobrepeso/obesidade nas faixas etárias mais jovens e temos


um método que permite identificar isso de maneira precoce, torna-se possível
acompanhar melhor o ganho de peso dessa gestante e identificar se ela está iniciando a
gravidez com sobrepeso. O uso desse método favorece a um melhor acompanhamento e
controle dessa epidemia de obesidade que já está estabelecida

Informe ENSP: E em relação à saúde dessas gestantes? Quais foram as


conclusões?

Denise Barros: Sabemos que a mulher tem uma tendência grande a retenção de peso
pós parto, e a adoção deste método também pode favorecer esses casos. Entre as
adolescentes, também é observado um curto intervalo entre as gestações. O diagnóstico
nutricional pelo método internacional adotado até então no Brasil classifica como peso
adequado uma boa proporção de gestantes adolescentes, que, na verdade, têm baixo
peso ou sobrepeso. Daí, quando programamos o ganho de peso, com certeza ela irá
ganhar mais peso do que o normal, podendo gerar um bebê macrossômico, com
tendência à obesidade em sua vida futura. E isso vira um ciclo vicioso.

Informe ENSP: O Ministério da Saúde já incorporou esse modelo de avaliação?

Denise Barros: Sim. Durante o último ano participamos de reuniões com o MS e está
sendo republicado um Manual do SISVAN: Orientações para a coleta e análise de dados
antropométricos em serviços de saúde, com as orientações específicas para gestantes
adolescentes. No entanto, não há estudos nacionais que o comprovem, apesar de
sabermos que é o método mais próprio para adolescentes. Precisamos de pesquisas que
reavaliem, em particular, as faixas de peso recomendadas pela IOM (1990) e adotadas
pelo MS para as gestantes, inclusive as adolescentes. Precisamos considerar os
diferentes aspectos, pois nossas adolescentes sofrem muito mais por estarem
vulneráveis a diversas questões socioambientais do nosso país.

Informe ENSP: Há algum índice sobre o número de adolescentes grávidas no país?

Denise Barros: Houve uma época em que a gravidez na adolescência aumentou muito.
Ela ainda é uma preocupação grande, mas houve certa diminuição dessa tendência. No
Brasil, resultados da PNDS (2008) mostram isso. Houve redução no sudeste e no sul,
mas as regiões norte e nordeste estão estagnadas. Acredita-se que essa mudança vem
acontecendo por conta de um maior acesso à informação, aos serviços de saúde, nas
áreas mais favorecidas. (Brasil. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e
da Mulher: 2006. Brasília: Ministério da saúde; 2008.)

O jovem hoje passa a ter um acesso maior à informação, seja pela televisão, pelo rádio,
pela internet. Minha perspectiva é olhar como a informação é importante para essas
gestantes adolescentes. Além do cuidado no pré-natal, o acesso à informação é
importante para que elas possam ser saudáveis e romper com esse ciclo que está se
estabelecendo. Assim, com objetivo de dar continuidade às pesquisas nesse campo,
continuo a participar do grupo de pesquisa materno-infantil coordenado pelas
pesquisadoras Maria do Carmo Leal e Silvana Granado, que, recentemente,
desenvolveram uma pesquisa de avaliação da qualidade e da efetividade da assistência
pré-natal na rede SUS do município do Rio de Janeiro, com ênfase na gestante
adolescente.

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