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CALÚNIA
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Protege-se, com essas normas, a honra objetiva da pessoa, inclusive morta, sua
reputação, o conceito que as outras pessoas têm sobre a vítima.
Sujeito passivo é somente a pessoa humana, porque somente o ser humano é capaz
de cometer fatos definidos como crime, daí que é impossível a calúnia contra pessoas
jurídicas, que, no sistema brasileiro, não podem ser sujeitos ativos de crimes. A vítima deve
ser uma pessoa certa, determinada.
Grande parte da doutrina entende impossível que o sujeito passivo seja um menor
de 18 anos ou um inimputável, com o argumento de que, não podendo ele cometer crimes,
não pode ser caluniado. Para os adeptos da teoria bipartida do crime, entretanto, ambos
podem cometer crimes, logo podem ser caluniados.
Assim, mesmo aquele que não pode cometer crime, por sua inimputabilidade, pode,
entretanto, praticar fatos definidos como crime, e se alguém atribuir-lhe, falsamente, a
prática de um acontecimento que encontra correspondência em norma penal
incriminadora terá cometido calúnia.
A vítima não precisa ser uma pessoa honorabilíssima, imaculada, porque toda e
qualquer pessoa tem sua honra própria, inclusive os criminosos, as prostitutas ou pessoas
de má fama. Alguma honra eles têm e essa é protegida.
Na calúnia contra os mortos, são sujeitos passivos seus parentes e amigos. A calúnia
contra si mesmo não existe, mas constitui crime a auto-acusação falsa (art. 341, CP).
15.2 TIPICIDADE
São três as figuras típicas: imputar falsamente fato definido como crime; propalar
ou divulgar a imputação que sabe ser falsa, e caluniar a pessoa morta.
15.2.1.1 Conduta
Os núcleos dos tipos são: imputar fato definido como crime a alguém ou à pessoa
morta, divulgar ou propalar a imputação.
Imputar é atribuir a alguém a prática do fato típico. É afirmar que a vítima praticou
tal comportamento proibido. Propalar é relatar por meio da linguagem oral e divulgar é
fazê-lo por qualquer outro meio.
O agente deve imputar a alguém a prática de um fato definido como crime. Deve ser
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Há calúnia quando o agente afirma que a vítima praticou coito anal com uma
determinada menor de 14 anos.
Para existir calúnia a imputação deve ser falsa, porque se verdadeira calúnia não
há. A imputação pode ser falsa porque o fato típico não aconteceu ou, se aconteceu, não foi
praticado pela vítima. A falsidade é, portanto, elemento normativo indispensável para a
caracterização do crime. Quando verdadeiro, o agente poderá prová-lo por meio da exceção
da verdade, excluindo-se, pois, a tipicidade do fato.
Quando o agente supõe ser verdadeira a imputação e por isso a atribui à vítima, terá
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agido sem dolo, e ainda que tenha errado por negligência não haverá crime, por atipicidade
do fato decorrente de erro de tipo.
Além do dolo, deve o sujeito atuar com o chamado animus diffamandi vel injuriandi,
que é a vontade de ofender a honra. Deve ter atuado com a seriedade que revela a intenção
inequívoca de ofender. É o ânimo de ofender, de tripudiar sobre a honra da vítima,
maculando-a e atingindo sua reputação.
Não haverá calúnia quando o agente, embora consciente da ofensividade das palavras
que profere, não tem a intenção de ofender, como nas hipóteses em que se limita a narrar
determinado acontecimento (animus narrandi), a defender a si ou a terceiro (animus
defendendi), ou ainda quando, por leviandade, tem apenas a intenção de divertir-se com a
vítima (animus jocandi).
Não comete o crime o promotor que denuncia a vítima, nem a testemunha que presta
depoimento no inquérito policial, em comissão parlamentar de inquérito, ou no processo
judicial, porque nessas situações o ânimo é o de esclarecer a verdade dos fatos. A não ser
quando, é óbvio, sabendo perfeitamente da falsidade da imputação mesmo assim o
promotor dá início à ação penal com o fim de dar início à instauração de inquérito ou de
processo contra a vítima ou a testemunha presta declarações falsas. Nestes casos poderá
haver o crime de denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal) ou falso testemunho
(art. 342 do Código Penal).
Por meio escrito, porém, é aceitável a tentativa se, por exemplo, a carta enviada é
devolvida ou se extravia, não chegando, por essa razão, ao conhecimento de ninguém.
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São quatro as causas que impõem aumento de pena. Se o sujeito passivo for o
Presidente da República, chefe de governo estrangeiro ou funcionário público, em razão de
suas funções, se a calúnia tiver sido proferida na presença de várias pessoas, a pena será
aumentada de um terço (art. 141, I, II e III)ou se praticada contra pessoa maior de 60
(anos) ou portadora de deficiência (art. 141, IV, introduzido pela Lei nº 10.741/2003).
Na primeira causa, a razão da maior apenação é a alta consideração que o Direito tem
em relação aos chefes de governo, brasileiro ou estrangeiro, porquanto são essas as pessoas
que representam a soberania das nações. A condição de chefe de governo depende da
legislação do país estrangeiro, assim o Presidente da República, Primeiro-Ministro, Rei,
Rainha ou qualquer outro título, desde que seja o seu titular o representante do Estado.
O Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) acrescentou, ao art. 141, o inciso IV, para impor
a majoração da pena sempre que a vítima tiver mais de 60 anos ou for deficiente.
A calúnia, viu-se, é a imputação falsa de um fato definido como crime. Falsa porque
não houve o fato ou porque o caluniado não é seu autor ou partícipe. Realizado o tipo de
calúnia, o sujeito passivo poderá propor a ação penal contra o agente, a fim de obter sua
condenação. Este poderá defender-se alegando e provando que a imputação é verdadeira.
Se for bem-sucedido nesse intento, será excluída a tipicidade do fato, por ser verdadeira a
imputação.
nada mais é do que o instrumento processual defensivo de que dispõe para provar a
veracidade do fato imputado (art. 138, § 3º).
Não será, entretanto, possível argüir a exceção da verdade, ainda que verdadeira a
imputação, em três situações.
Se o fato típico é de um crime de ação penal de iniciativa privada e o caluniado não foi
condenado por sentença penal irrecorrível, não será admitida a exceção da verdade. Não
podia ser diferente. Nos crimes em que a ação penal é privativa do ofendido, somente este
pode dar início ao processo. É que a ordem jurídica a ele reservou esse direito de agir em
juízo. Se é assim, não pode terceira pessoa, o caluniador, promover, por meio da exceção da
verdade, a apuração do fato. Quando a vítima do crime imputado preferiu não ajuizar a
queixa é porque, tendo disponibilidade da ação e não a tendo manejado, acabou por
consentir na realização do fato, que, por isso, deve ser considerado lícito. Se o fato é lícito,
não é crime, logo a sua imputação é calúnia.
Se, porém, a ação penal privada foi proposta e houve sentença penal condenatória
irrecorrível, demonstrada estará a existência de crime, daí que o acusado de calúnia poderá
promover a exceção da verdade, juntando, para tanto, a certidão ou cópia da própria
sentença penal condenatória, com a demonstração de seu trânsito em julgado, livrando-se,
assim, da acusação de calúnia, porque terá imputado um fato verdadeiro.
Também não se admitirá a exceção da verdade quando a calúnia tiver sido proferida
contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro. Ainda que verdadeira a
imputação, o caluniador não poderá promover a exceção da verdade, em razão da
qualidade das funções exercidas pelo caluniado, chefe de governo, nacional ou estrangeiro.
Por último, é impossível tentar provar a verdade se o sujeito passivo da calúnia tiver
sido absolvido pela prática do fato imputado, com sentença penal transitada em julgado. Se
o Poder Judiciário já tiver se manifestado, em decisão definitiva, pela absolvição do
caluniado, por qualquer razão, inclusive por insuficiência de prova, existe a coisa julgada,
não sendo permitida a revisão contra o réu que poderia ocorrer caso a exceção da verdade
viesse a ser julgada procedente.
A exceção da verdade pode ser promovida a qualquer tempo, até mesmo após a
sentença condenatória de primeiro grau, desde que nas razões de apelação, e, submetida
ao contraditório, será julgada por sentença. Procedente, importará na absolvição do agente
da calúnia, pela atipicidade do fato. Improcedente a exceção da verdade, prosseguirá o
feito para julgar a prática da calúnia.
Quando o caluniado gozar de foro especial por prerrogativa de função e tiver sido
admitida exceção da verdade, esta, e somente esta, será julgada no foro especial. Julgada
procedente no foro especial, a ação penal pela calúnia será julgada prejudicada, devendo os
autos da exceção da verdade ser encaminhados ao Ministério Público, para promover a
ação penal contra o imputado. Julgada improcedente, os autos serão remetidos ao juízo de
origem, para prosseguir na ação penal pela calúnia.
Para que possa exercer com independência e plena liberdade o mandato outorgado
pelo povo, necessita o parlamentar ficar fora do alcance da norma penal, podendo
expressar suas opiniões e palavras com total e ampla liberdade. Não fora assim ficaria
manietado, em vista da possibilidade de responder criminalmente pelo que dissesse.
Pode, por isso, denunciar, criticar, rebater, tecer comentários, informar, discutir toda
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e qualquer matéria, sem qualquer limitação. Se precisar imputar, a quem quer que seja,
fato definido como crime, ainda que não tenha certeza sobre sua veracidade, poderá fazê-
lo, porque aí prevalece o interesse público. Tudo isso, evidentemente, no exercício do
mandato e em razão dele.
Não pode, entretanto, o parlamentar, no âmbito de sua vida privada caluniar uma
pessoa, como o vizinho com quem discute, a mulher com quem se desentende ou o árbitro
de futebol durante a partida em que seu time é derrotado. Aí não há imunidade
parlamentar, porque aí não há parlamentar, mas o cidadão comum, que, como tal,
responde pelo que tiver dito ou escrito.
15.3 ILICITUDE
Não há causa que exclua a ilicitude da calúnia. Impossível falar-se em legítima defesa
ou estado de necessidade. Há quem diga que o autor da ação penal, o representante do
Ministério Público e o querelante estariam agindo, respectivamente, no estrito
cumprimento do dever legal e no exercício regular de direito, quando descrevem, na peça
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Não é isso o que ocorre. Se imputam falsamente a alguém o fato descrito na petição
inicial, desconhecendo a falsidade, não realizam sequer fato típico por ausência de dolo,
ainda porque, ao fazê-lo, não agem com o fim de caluniar, mas de buscar a prestação
jurisdicional. Se conhecem a falsidade da imputação, entretanto, cometem fato típico e
ilícito, pois não estariam assim realizando um fim justificado pelo ordenamento jurídico.
As excludentes de ilicitude do art. 142 dizem respeito apenas aos crimes de difamação
e de injúria, e serão objeto de comentários adiante, onde se demonstra a impossibilidade
de sua aplicação aos crimes de calúnia.
“Se a regra geral para a tutela penal da honra é ação privada, compreende-se, não
obstante, que, para desonerar dos seus custos e incômodos, o funcionário ofendido em
razão da função, o Estado, por ele provocado, assuma a iniciativa da repressão da
ofensa delituosa; o que não se compreende, porém, é que só por ser funcionário e ter
sido moralmente agredido em função do exercício de cargo público, o que não ilide
o dano à sua honorabilidade pessoal, o ofendido não a possa defender pessoalmente
em juízo como se propicia a qualquer outro cidadão, mas tenha de submeter
previamente a sua pretensão de demandar a punição do ofensor ao juízo do MP.
Por isso, a admissão da ação penal pública, quando se cuida de ofensa propter
officium, para conformar-se à Constituição (art. 5º, X), há de ser entendida como
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Quando alguém se sentir caluniado poderá promover de imediato a ação penal contra
o ofensor, através do oferecimento da queixa. Nem sempre, entretanto, as afirmações feitas
pelo ofensor são claramente caluniosas, especialmente quando ele utiliza subterfúgios na
manifestação de seu pensamento.
Afirmações dúbias, de duplo sentido, podem ou não constituir calúnia por não se
evidenciar a intenção de ofender. Quando isso acontecer aquele que se julgar ofendido
poderá notificar o possível autor da ofensa para que, acerca delas, preste explicações em
juízo, conforme preconiza o art. 144 do Código Penal: “se, de referências, alusões ou
frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir
explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá
satisfatórias, responde pela ofensa”.
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RT 711/403
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15.6 RETRATAÇÃO
O art. 143 contém uma causa de extinção da punibilidade: “o querelado que, antes da
sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena”.
Retratar-se quer dizer desdizer-se, voltar atrás no que foi dito. O ofensor retira as
ofensas, reconhecendo, assim, seu erro. Ao fazê-lo estará de certa forma reparando o dano
causado à vítima, por isso que, em razão da retratação, extingue-se o direito de punir.
A retratação deve ser cabal, plena, total, perfeita, capaz de desfazer qualquer dúvida
acerca da honorabilidade da vítima. Não é um simples pedido de desculpas, mas uma
confissão da injustiça e, portanto, da inveracidade da imputação feita. Não depende da
aceitação do ofendido, e pode ser feita no momento do interrogatório do querelado ou
através de petição, mas deve ocorrer, necessariamente, antes da publicação da sentença de
primeiro grau.
Só se admite a retratação nas ações de iniciativa privada, não cabível portanto nos
crimes contra a honra do Presidente da República, de chefe de governo estrangeiro ou de
funcionário público em razão de suas funções.