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ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS
Rolf Madaleno1
www.rolfmadaleno.com.br
SUMÁRIO
1. A responsabilidade civil 2. Responsabilidade civil
subjetiva e objetiva 3. Pressupostos da responsabilidade
civil 3.a. Ação ou omissão 3.b. Relação de causalidade
3.c. Dano material e dano moral 4. Os graus de culpa 5.
Abuso do direito 6. A responsabilidade civil no direito de
família 7. Afastamento da culpa na ruptura do casamento
8. A natureza jurídica dos alimentos 9. Os alimentos
compensatórios 10. Diferenças entre obrigação de
alimentos e a pensão compensatória 11. Responsabilidade
objetiva no direito de família 12. Constituição de capital
13. Bibliografia
1. A responsabilidade civil
Todo cidadão tem o peculiar dever de ressarcir qualquer conduta sua consciente,
que tenha eventualmente vulnerado e imposto um dano a outro sujeito, quer esta
violação decorra de uma transgressão contratual, quer se trate de responsabilidade
aquiliana, quando ausente relação jurídica entre o autor do dano e a vítima do ilícito.
Por conseguinte, ao agir no plano dos fatos ou dos contratos, todo ser humano tem o
dever de abster-se de causar qualquer comportamento lesivo para com as demais
pessoas, sob pena de ser civilmente responsabilizado em comando ao sistema normativo
por quebra de dever de conduta contratual ou imposto pela lei.
2
PEREIRA,Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, 9ª ed., Rio de Janeiro:Forense, 1998, p.69.
3
CALIXTO. Marcelo Junqueira. A culpa na responsabilidade civil, estrutura e função, Rio de
Janeiro:Renovar, 2008, p.12-13.
2
E definitivamente não existe um padrão exclusivo de diligência e de
razoabilidade, observando Anderson Schreiber4 ser cada vez mais difícil, frente às
complexidades da vida, com a especialização das atividades humanas e com o avanço
da tecnologia pudesse o julgador, isolado em seu gabinete, estabelecer o cuidado médio
que deveria ser elaborado em uma empresa ou na conduta do homem para encontrar em
sua decisão a definição de um padrão de diligência. Vivenciamos o fenômeno da
fragmentação do modelo de conduta e precisamos nos socorrer de uma orientação
plural de procedimentos técnicos de proceder, e de recomendações de entidades
especializadas nas áreas de aferição dos fatos.5
Uma avaliação moderna do significado de ser um bom pai de família pode ser
encontrado em uma pessoa razoável, que leva em consideração os interesses de outras
pessoas ao seu redor, cujos direitos não podem ser lesados a qualquer preço, e por isso
agir com cuidado e perícia, preocupado com o direito alheio. Se for preciso usa métodos
alternativos para alcançar propósitos lícitos, muito embora, a maior proximidade entre
as pessoas em decorrência do afeto, da amizade ou do parentesco, pode implicar em um
relaxamento desses cuidados, pelo excesso de confiança que une essas pessoas.
Para configurar o ato ilícito devem estar presentes: i) uma conduta dolosa ou
culposa ilícita; ii) a existência de um dano material ou moral; e iii) o nexo de
causalidade entre a conduta e o dano.
3
A responsabilidade era fundamentada exclusivamente na teoria da culpa, que,
presente, obrigava a reparar o dano pela responsabilidade subjetiva. Dentro desse
prisma, o dever de o agente reparar o dano só se configurava se tivesse agido com dolo
ou culpa. Ao lado da responsabilidade subjetiva surgiu a teoria da responsabilidade
objetiva, ou do risco, pela qual, todo o dano deve ser indenizado, independentemente da
culpa, bastando estar presente o elo do nexo causal. Por vezes, a culpa é presumida e
nesses casos há inversão do ônus da prova, devendo a vítima apenas demonstrar a ação
ou omissão do agente e o dano dela resultante, salvo que o demandado comprove a
culpa exclusiva da vítima ou a ocorrência de força maior. A teoria da responsabilidade
sem culpa proclama a reparação do dano por uma crescente necessidade de socialização
do direito, não importando se o agente agiu com acerto ou desacerto, pois acima dos
interesses individuais devem ser garantidos os interesses sociais. O ponto de partida da
socialização do direito está na denominada solidariedade social, cujo suporte fático é a
pessoa humana e a defesa de sua dignidade. Seu propósito é o de reduzir as
desigualdades sociais e o desequilíbrio existente na qualidade de vida das pessoas. Leva
em conta a vulnerabilidade da pessoa humana e a melhor tutela dos direitos da
personalidade quando surgir qualquer conflito entre uma situação jurídica material e um
direito existencial.6
6
MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana, uma leitura civil-constitucional dos danos
morais, Rio de Janeiro:Renovar, 2003, p.120.
4
para regular todos os casos de responsabilidade civil,7 e por isso não exclui uma
ampliação dos casos de dano indenizável que surgem com a teoria da responsabilidade
objetiva.
7
GONÇALVES, Carlos Roberto. (Coord.) AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Comentários ao Código
Civil, São Paulo:Saraiva,v.11, 2003, p.30.
5
ressarcível8 e, no direito de família tem restringido sua incidência pelo temor na
banalização das relações de afeto.
O dano a ser reparado pode ser material ou meramente moral, mas só o efetivo
prejuízo proveniente de ato ilícito do agente deve ser civilmente reparado, pois
nenhuma indenização poderá ser exigida, apesar da violação culposa ou dolosa de um
dever jurídico, se deste ato não houve qualquer prejuízo. O dano material é aquele que
afeta exclusivamente o patrimônio da vítima e representa o ressarcimento do bem
jurídico lesado e que pode ser quantificado economicamente, ao passo que o dano moral
ou imaterial, consolidado pelo artigo 5°, V e X da Carta da República, não tem como ser
economicamente mensurado e tem por objetivo ressarcir qualquer sofrimento ou
incômodo humano que não é causado por perda em pecúnia.9
4. Os graus de culpa
Embora o Código Civil não faça nenhuma distinção entre as medida de culpa
para efeito de reparação do dano, ela tem sido classificada em três diferentes graus:
grave, leve ou levíssima. A culpa grave revela um erro de conduta grosseiro e absoluta
falta de cautela, quase se aproximando do próprio dolo eventual, que acontece quando o
agente assume o risco de produzir o resultado danoso, ainda que não o deseje, Contudo,
na culpa grave, inexiste a intenção e tampouco o agente assume intencionalmente o
risco de produzir o dano, mas seu agir, no entanto, carece da percepção que qualquer
pessoa seria capaz de verificar, para evitar o dano. A culpa grave decorre da violação do
dever de diligência exigido de uma pessoa de média inteligência e seu grau de
negligência vai ao extremo da inconsequência, como no exemplo de um motorista
embriagado. Na culpa leve, o erro de conduta não seria cometido pelo ser humano
prudente e a culpa levíssima seria aquele desvio de conduta que nenhum diligente pai de
família causaria. Marcelo Junqueira Calixto exclui qualquer relevância à culpa graduada
como levíssima, pois se a falta de um mínimo de diligência já seria suficiente para gerar
8
SCHREIBER, Anderson. Ob. cit..,p.75.
9
TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena e MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil
interpretado conforme a Constituição da República, Rio de Janeiro:Renovar, 2004, v. I, p.335.
6
a responsabilidade do agente, mostra-se totalmente irrelevante distinguir a culpa
subjetiva da responsabilidade objetiva,10 até por que, é sabido que o maior ou menor
grau de culpa não interfere no montante da indenização devida à vítima, que tem direito
ao integral ressarcimento do dano sofrido, embora o artigo 944 do Código Civil autorize
o juiz a reduzir equitativamente, a indenização se houver excessiva desproporção entre a
gravidade da culpa e o dano.11
5. Abuso do direito
Conforme prescreve o artigo 187 do Código Civil, também comete ato ilícito o
titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo
seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. O abuso do direito
nasceu da prática jurisprudencial, com o intuito de reprimir os atos que, não obstante
praticados com estrita observação da lei, violam o seu espírito. 12 Trata-se de uma
conduta lícita, contudo o seu exercício se mostra abusivo e desconforme com a
finalidade da lei, por que de nada adianta ater-se à estrutura formal da lei se pela via
reflexa o agente desvia de seu fundamento axiológico, como corrente exemplo sucede
no desvio de finalidade pelo uso abusivo da personalidade jurídica, que deve ser
episodicamente desconsiderada quando o sócio ou a sociedade se desviam dos fins
sociais do contrato para fraudar direito de terceiro. A doutrina do abuso do direito
dispensa a existência de culpa e decorre do dever que todo cidadão tem de ressarcir o
dano que causa ao direito de outrem quando abusa de um direito. Observa Carlos
Roberto Gonçalves que o instituto do abuso do direito é destinado a reprimir o exercício
antisocial dos direitos subjetivos e, portanto, tem aplicação em todos os campos do
direito.13
7
ordinárias, perdendo, inclusive, sua moradia pela cobrança judicial do condomínio,
resultando na expropriação de sua moradia e na inclusão de seu nome no cadastro dos
serviços de proteção ao crédito. Sem esquecer toda a exposição e humilhação pública
sofridas pela intolerância dos demais condôminos do imóvel, tudo isso conjuminando
para que o consorte atingido em sua honra e dignidade pessoal, e que também sofreu
perdas materiais com o leilão de sua habitação, ingresse com processo de reparação dos
danos morais e materiais sofridos pelo abuso do direito de defesa do seu ex-cônjuge.
O direito de família ainda não tem nenhuma simpatia para com a doutrina da
responsabilidade civil, e o Código Civil brasileiro mantém um conveniente silêncio
acerca da responsabilidade civil nas relações familiares. Como tem acontecido na
maioria das decisões judiciais, a reparação civil tem sido afastada das relações
familiares, especialmente no tocante ao dano moral. Importava realçar no tradicional
direito de família, a defesa da sua estabilidade e da hierarquia na sua estrutura, cujos
preceitos apontam na direção oposta aos princípios da responsabilidade civil.
O Código Civil teria remédios específicos para causas concretas de danos entre
familiares e boa parcela da doutrina argumenta que o rompimento dos casamentos pela
infração dos deveres conjugais deve ser apartado das regras de responsabilidade civil,
porque a legislação já prevê sanções próprias diante da culpa conjugal na falência do
matrimônio e a única consequência jurídica da quebra de algum dever nupcial é a sua
absorção como causa da separação judicial.14
14
GUITIÁN, Alma Maria Rodríguez.Responsabilidad civil en el derecho de família:especial referencia
el âmbito de las relaciones paterno-filiales, Navarra:Thomson Reuters, 2009, p.25.
8
O casamento e a união estável não representam vínculos inquebrantáveis, e
embora o contexto sentimental que una duas pessoas tenha essa expectativa, essas
relações podem persistir por maior ou menor tempo, mas ninguém poderá considerá-las
permanentes, a ponto de não se sujeitarem à ruptura pelos mais variados motivos,
inclusive pelo adultério, que é um fato previsível, não se justificando qualquer
indenização, senão nos casos excepcionais de uma situação vexatória e de enorme
repercussão social, suficientemente escandalosa para ultrapassar os limites do
desgosto pessoal causado pela conduta do cônjuge adúltero.15
9
institutos estão sujeitos ao término dos relacionamentos na prática cotidiana das
relações humanas,18 constituindo-se em uma temeridade para a harmonia familiar a
monetarização da quebra dos relacionamentos.
18
Voto vencedor declarado pelo Desembargador Maia da Cunha na Apelação Cível n. 465.038-4/0, da 4ª
Câmara de Direito Privado do TJSP, j. 29.05.2008, com a seguinte ementa: “Dano moral. Adultério.
Circunstância que, em si mesma, salvo excepcionalidade. Inocorrente na hipótese, não acarreta dano
moral indenizável. O relacionamento extraconjugal é apenas a conseqüência de uma união cujos
sentimentos iniciais não perduraram no tempo, dando ensejo a que outros se sobrepujassem e levassem
algum dos cônjuges ou companheiros à relação afetiva com outras pessoas. Considerações e
jurisprudência deste TJSP. Improcedência da ação que se impõe. Recurso provido.”
19
PEREIRA, Sérgio Gischkow. Estudos de Direito de Família, Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2004, p.82.
10
como fez o desembargador Ênio Santarelli Zuliani, em declaração de voto vencido, na
Apelação Cível n. 361.324-4/7 da 4ª Câmara de Direito Privado do TJSP (aresto
reproduzido na nota de rodapé n.13, supra), ao reconhecer o direito de a esposa traída
pela infidelidade conjugal do marido ser ressarcida pelo dano moral que sofreu, não em
decorrência da perda do afeto, mas como resultado da conduta desleal do esposo e que
se constituiu em verdadeiro abuso do eventual direito que tinha de terminar seu
relacionamento.20
É tal qual foi bem lembrado por Alma Maria Rodríguez Guitián, de que nem
sempre em nome da paz familiar se deve excluir a responsabilidade civil no âmbito
familiar, sendo forçoso discernir quais seriam os danos próprios das sanções previstas
no direito de família, e quais seriam as violações que vulneram a relação em família,
que devem ser objeto de ressarcimento, cujo grau de gravidade é capaz de romper o
equilíbrio dos vínculos em família e ferir direitos fundamentais do parente ou parceiro
vitimado.22 Pode até não ser indenizável o simples descumprimento de um dever
conjugal, e realmente a sua admissão poderia afetar a paz familiar, acarretando uma
20
Ao declarar seu voto vencido na Apelação Cível n. 361.324-4/7, j. em 27.03.2008, o Desembargador
Ênio Santarelli Zuliani redigiu a seguinte ementa: “Responsabilidade civil. Adultério do marido praticado
com mulher do relacionamento social da família e que motiva o abandono abrupto do lar, desestruturando
a vida da mulher abandonada, tanto no aspecto financeiro como na administração dos interesses comuns,
especialmente por testemunhar o filho mais novo ser tomado pelo vício das drogas. Ato ilícito que
ultrapassa os limites do Direito de Família e que provoca lesão a direitos da personalidade, justificando a
indenização por danos morais, admitida a solidariedade da amante, pela maneira maliciosa de agir. Não
provimento do recurso dos requeridos, com provimento, em parte, do recurso da autora, majorando o
quantum para R$20.000,00.”
21
OLTRAMARI, Vitor Ugo. O dano moral na ruptura da sociedade conjugal, Rio de Janeiro:Forense,
2005, p.142.
22
GUITIÁN, Alma Maria Rodríguez. Ob. cit., p.88-89.
11
indesejável multiplicação de pleitos judiciais, mas o fato de existir um dano em
concreto a causar séria lesão a direito fundamental de familiar, seja ele moral ou
patrimonial, não pode ser afastado da apreciação judicial e do ressarcimento
pecuniário, como sucede, por exemplo, com os danos à saúde, causados pela
infidelidade, com o risco do contágio por doenças venéreas ou pela AIDS; pelos danos à
integridade física e psíquica provocados pelos maus tratos durante a convivência; os
danos à honra, com os casos de infidelidade, muitas vezes noticiados na imprensa em
revistas de variedades e até em crônicas policiais; os danos à liberdade sexual, pelas
práticas pouco convencionais de um dos cônjuges ou companheiros; pelos danos à
integridade psíquica e à honra, causados pelo nascimento de filhos extramatrimoniais
registrados como se fossem conjugais.23
23
Idem, p.90.
24
Ibidem, p.91.
12
realidade da dependência química; sem esquecer os registros da violência física
doméstica e os covardes espancamentos de um cônjuge física e psicologicamente
vulnerável e, portanto, indefeso.25
25
ALVES, Leonardo Barreto Moreira. O fim da culpa na separação judicial, uma perspectiva histórico-
jurídica, Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p.105.
26
“Separação judicial. Pretensão à reforma parcial da sentença, para que o autor-reconvindo seja
condenado ao pagamento de indenização por danos morais, bem como seja garantido o direito de postular
alimentos por via processual própria. Fidelidade recíproca que é um dos deveres de ambos os cônjuges,
podendo o adultério caracterizar a impossibilidade de comunhão de vida. Inteligência dos arts. 1.566, I e
1.573, I, do Código Civil. Adultério que configura a mais grave das faltas, por ofender a moral do
cônjuge, bem como o regime monogâmico, colocando em risco a legitimidade dos filhos. Adultério
demonstrado, inclusive com o nascimento de uma filha de relacionamento extraconjugal. Conduta
13
A prática do ato ilícito que fere de morte direito fundamental do cônjuge ou
familiar admite e impõe o ressarcimento do dano material, ou a compensação do agravo
moral e, embora a separação judicial ou o divórcio e por sua vez, a indenização
material ou moral tratem de pedidos independentes, nada impede sejam
postulados e cumulados em uma única demanda.
desonrosa e insuportabilidade do convívio que restaram patentes. Separação do casal por culpa do autor-
reconvindo corretamente decretada. Caracterização de dano moral indenizável. Comportamento do autor-
reconvindo que se revelou reprovável, ocasionando à ré-reconvinte sofrimento e humilhação, com
repercussão na esfera moral. Indenização fixada em R$ 45.000,00. Alimentos. Possibilidade de requerê-
los em ação própria, demonstrando necessidade. Recurso provido.” (Apelação Cível n. 539.390.4/9 da 4ª
Câmara de Direito Privado do TJSP, rel. Des. Luiz Antonio de Godoy).
27
LEONARDO, Teresa Marin García de. Remédios indemnizatorios en el ambito de las relaciones
conyugales, In Daños em el derecho de família, Navarra; Thomson Aranzadi, n.17, 2006, p.159.
28
MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família, 3ª ed., Rio de Janeiro:Forense, 2009, p.634-635.
14
onde devem ser aproveitados todos seus princípios e propósitos para beneficio do
destinatário dos alimentos.
Nessa toada também andou Mário Moacyr Porto, ao dizer ter “a firme convicção
de que a dívida de alimentos de que cuida o art.19 da Lei 6.515, de 26.12.77, é, na
verdade, uma indenização por ato ilícito, que se cumpre sob a forma de pensão
alimentar. Uma reparação pecuniária pela dissolução prematura e reprovável da
sociedade conjugal, por culpa de um dos cônjuges.”31
9. Os alimentos compensatórios
15
na constância da sociedade conjugal ou na constância da união estável, conforme artigo
1.724 do mesmo Diploma Civil. Advindo a separação do par conjugal ou convivencial,
os alimentos encontram uma nova denominação institucional no artigo 1.694 do Código
Civil, proporcionando o suprimento das necessidades de subsistência do ex-cônjuge ou
convivente na proporção, inclusive, do padrão social do credor dos alimentos.
32
MOZO, Fernando Moreno. Cargas del matrimonio y alimentos, Granada:Editorial Comares, 2008,
p.43.
33
Idem. Ob. cit., p.45.
16
objetiva nos alimentos compensatórios, quando identificou na pensão alimentícia o
meio de reparar o prejuízo sofrido pela esposa privada, com a separação, dos recursos
do casamento que contava para viver.34
17
na sua quantificação, consistindo-se das seguintes variantes: 1ª) Os acordos a que
chegaram os cônjuges; 2ª) A idade e o estado de saúde; 3ª) A qualificação profissional e
as probabilidades de acesso a um emprego; 4ª) A dedicação passada e futura à família;
5ª) A colaboração com seu trabalho e as atividades mercantis, industriais ou
profissionais do outro cônjuge; 6ª) A duração do casamento e da convivência conjugal;
7ª) A eventual perda de um direito de pensão; 8ª) A riqueza e os meios econômicos e as
necessidades de um e do outro cônjuge; 9ª) Qualquer outra circunstância relevante.
Pela análise de cada uma dessas circunstâncias próprias da vida conjugal o juiz
formará uma ideia muito precisa do nível de vida do cônjuge durante o matrimônio e
poderá concluir se a separação ou o divórcio o deixou em uma situação visivelmente
desvantajosa em relação ao seu consorte, e em comparação com o modo de vida
experimentado durante o casamento.36
35
Idem, ob. cit., p.65.
36
GONZÁLEZ, Maria Paz Sánchez. Ob. cit. p.57.
18
artigo 1.694 do Código Civil e sim corrigir o desequilíbrio existente no momento da
separação, quando o juiz compara o status econômico de ambos os cônjuges e o
empobrecimento de um deles em razão da dissolução da sociedade conjugal, podendo a
pensão compensatória consistir em uma prestação única, por determinados meses
ou alguns anos, e pode abarcar valores mensais e sem prévio termo final.
37
“Alimentos. Ação revisional. Peculiar natureza compensatória da pensão em prol da mulher,
considerando que o vultoso patrimônio rentável tocou ao varão. Ação improcedente. Sentença
confirmada.” (RJTJRGS n.146, p.220, publicada em junho de 1991).
38
Em uma passagem do despacho proferido pela juíza Ana Maria Gonçalves Louzada ela destacou que a
alimentanda estava “acostumada ao luxo que o marido lhe proporcionava, acrescido ao fato de que com
ele manteve envolvimento afetivo por quase três décadas, dele advindo quatro filhos, é razoável seja
mantida em seu nível de vida, eis que hoje se vê alijada de usufruir a enormidade de bens que possuem.”
19
mensais da agravante lhe conferia um elevadíssimo padrão de vida e o valor se mostrava
ajustado para uma cognição judicial ainda sumária.39
39
Eis a íntegra da emente do acórdão n. 361.793(AI n.20080020195721), da 6ª Turma Cível do TJDFT,
relator o Des. Jair Soares, julgado em 10.06.2009: “Alimentos compensatórios. Manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro. Alimentos compensatórios são pagos por um cônjuge ao outro, por ocasião da
ruptura do vínculo conjugal. Servem para amenizar o desequilíbrio econômico, no padrão de vida de um
dos cônjuges, por ocasião do fim do casamento. Fixados em valor razoável, não reclamam elevação.
Agravo não provido.”
40
MOZO, Fernando Moreno. Ob. cit., p.51.
20
de um efetivo desequilíbrio econômico-financeiro de um cônjuge em oposição ao outro.
Embora a desigualdade já existisse antes mesmo da ruptura do casamento, essa
disparidade era preenchida pelo dever mútuo de socorro presente na constância do
matrimônio.
Além dessas diferenças a pensão alimentícia pode ser revista quando, depois de
fixada sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os
recebe (art.1.699 do CC), enquanto na pensão compensatória as alterações de fortuna do
devedor não justificam a mudança da quantia alimentar, dado à circunstância de os
alimentos compensatórios corrigirem o desequilíbrio existente no momento da
separação, só cabendo a sua redução ou extinção se aumentar a fortuna do credor ou se
diminuírem os recursos do prestador dos alimentos compensatórios.
41
ALBERDI,Beatriz Saura. La pensión compensatória; critérios delimitadores de su importe y extensión,
Valencia: Tirant lo Blanch, 2004, p.32.
21
credor percebesse alimentos mesmo quando exercesse vínculos de trabalho, os quais
não supõem a privação do direito aos alimentos compensatórios pelo fato de o credor
dos alimentos ter uma fonte própria de proventos, posto que importa apurar se, com o
rompimento da relação, instalou-se uma visível disparidade na condição de vida de um
dos cônjuges em confronto com a do outro e, destarte, proteger o consorte mais débil
economicamente. Tampouco adianta afirmar que com a partilha dos bens os consortes
se mantêm economicamente equilibrados, se com o marido, por exemplo, ficaram os
bens rentáveis e com a pensão alimentícia a ex-esposa sequer consegue preservar sua
meação.
Outro fato rotineiro nas separações conjugais também ilustra a finalidade dos
alimentos compensatórios quando um juiz reduz o percentual da pensão alimentícia do
cônjuge porque, por exemplo, o pai ainda está ajudando financeiramente filhos maiores
e estudantes. Mas por qual razão a mãe desses mesmos filhos também não pode ajudá-
los financeiramente? E, as respostas são óbvias e cruéis, primeiro, porque ela não mais
desfruta como credora de pensão alimentícia, a cuja categoria foi alçada com a
separação oficial, do equilíbrio econômico e financeiro experimentado durante a
convivência conjugal e o pior de tudo, porque ainda vige na sociedade brasileira o
surrado preconceito da chefia masculina da sociedade familiar.
22
gerando toda sorte de acidentes; no trânsito os automóveis e os serviços de transporte;
nas fábricas os acidentes de trabalho com as máquinas industriais. Logo ficou patente
que a culpa como condição de ressarcir não mais explicava outras necessidades de
reparação civil diante de uma emergente necessidade de proteger uma nova categoria de
vítimas e, diante da luta desigual que passou a ser travada entre o poder e a vítima
desprovida de recursos.43 Seguir condicionando a indenização à prova da culpa se
mostrou injusto para as vítimas e sua cobrança como requisito ao dever de indenizar se
apresentou claramente insuficiente para fundamentar a responsabilidade civil, que
precisava ampliar seus horizontes doutrinários.
43
LIMA, Alvino. Culpa e risco, 2ª ed., São Paulo:RT, 1998, p.113.
44
Idem, ob. cit., p.114.
45
LAGE, Juliana de Sousa Gomes. “Responsabilidade civil nas relações conjugais”, In Manual de
Direito das famílias e das sucessões, (Coord.) TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado e RIBEIRO, Gustavo
Pereira Leite, Del Rey/Mandamentos: Belo Horizonte, 2008, p.488.
23
Dentro dessa visão, Juliana de Sousa Gomes Lages defende a ampliação de
proteção à autonomia privada nas relações de família para o abrigo da dignidade da
pessoa do personagem familiar.46 A expressão autonomia privada tem o sentido de o
indivíduo conduzir sua consciência de maneira ética, atento aos comandos superiores de
uma organização social e familiar, e assim se apresente em sociedade e diante da sua
célula familiar, como uma pessoa responsável, com proceder tranquilo nas suas relações
de família, como deve agir com equilíbrio nas suas relações para com terceiros.
46
LAGE, Juliana de Sousa Gomes. Ob. cit., p.492.
47
Nesse sentido merece especial referência o artigo 944 do Código Civil:”A indenização mede-se pela
extensão do dano.”
48
PORTO, Sérgio Gilberto. Doutrina e prática dos alimentos, Rio de Janeiro:Aide, 1985, p.13.
49
COLOMA, Aurelia María Romero. Reclamaciones e indemnizaciones entre familiares em el marco de
la responsabilidad civil, Barcelona:Bosch, 2009, p.67.
24
dissolução da sociedade nupcial. A responsabilidade surge exclusivamente do fato
consubstanciado no manifesto desequilíbrio econômico e financeiro de um dos
cônjuges ou conviventes em confronto com o de seu ex-parceiro no momento do
rompimento da relação, sendo avaliadas circunstâncias que atendem a critérios
indenizatórios, alimentícios e equilibradores, todos eles absolutamente alheios à
ideia de culpa. A pensão compensatória conforma, portanto, uma natureza mista de
indenização e de pensão com mais sentido no regime de separação de bens, e se o
cônjuge ainda carece de atividade laboral, vai sendo preenchida cada uma das variantes
fáticas preordenadas pelo artigo 97 do Código Civil espanhol.
A pensão compensatória visa a reparar o passado, cuidando para que ele não
falte no futuro. Tem a toda evidência, um propósito indenizatório, que não exclui
sua função compensatória, mas antes, se completa, pois corrige um descompasso
material causado pela separação e compensa o cônjuge que se viu em condições
financeiras inferiores com o término da relação, e cobre as oportunidades que
foram perdidas durante o matrimônio.
50
COLOMA, Aurelia María Romero.Ob. cit., p.70.
25
Os alimentos compensatórios ao contrário da pensão alimentícia (CC, art.
1.707) são renunciáveis e seu pleito não é de caráter obrigatório, sendo endereçados
apenas ao cônjuge ou convivente em razão da dissolução conjugal, para compensar a
perda do padrão social e econômico,51 ficando sua fixação a critério do juiz, consoante
as circunstâncias fáticas a serem ponderadas na quantificação dos alimentos
compensatórios, tais como:
26
indústria ou atividade de seu consorte, sem receber nenhuma retribuição pecuniária por
seu esforço. É inquestionável o desequilíbrio econômico quando rompidas as núpcias o
consorte que contribuiu com seu trabalho deixa inclusive de trabalhar na empresa do ex-
consorte, que foi beneficiado pelo desapegado auxílio do parceiro afastado;
54
GONZÁLEZ, Maria Paz Sánchez. Ob. cit., p.75.
27
Os alimentos compensatórios, como qualquer direito alimentar55 e não somente
os decorrentes do ato ilícito, podem dar origem à constituição de capital, cuja renda
deve assegurar o pagamento mensal da pensão, conforme preceituado pelo artigo 475-Q
do CPC, com a redação dada pela Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de 2005. A garantia
da formação de capital ordenada pela legislação processual do cumprimento da
sentença decorre do ato ilícito ou da responsabilidade objetiva e visa a garantir qualquer
crédito de pessoa beneficiada de alimentos mensais, constituindo-se o capital de uma
soma em dinheiro equivalente ao montante da indenização devida e que será
financeiramente aplicada, seja por meio de imóveis que produzam frutos ou através de
títulos da dívida pública.
13. Bibliografia
55
RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes de trânsito, 10ª ed., São Paulo:RT, 2009, p.197.
28
GUITIÁN, Alma Maria Rodríguez.Responsabilidad civil en el derecho de
família:especial referencia el âmbito de las relaciones paterno-filiales,
Navarra:Thomson Reuters, 2009.
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