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Palavras-chave
Ao longo de seu desenvolvimento, a ciência da como conceito central de seu trabalho a noção de
informação (CI) viu surgirem e se consolidarem, informação.
dentro dela, diferentes áreas e subáreas específicas.
Tais campos, orientados por diversas correntes e Shannon e Weaver reconhecem que as questões
perspectivas teóricas, acabaram por desenvolver, relativas à comunicação envolvem três níveis de
também, conceitos particulares de informação, problemas. O primeiro trata dos problemas técnicos,
algumas vezes semelhantes, outras vezes sobrepostos relativos ao transporte físico da materialidade que
e, em alguns casos, discordantes. compõe a informação (como, por exemplo, o
volume do som numa conversa ou a qualidade da
Neste texto, apresentam-se seis dos campos que impressão em um papel). O segundo nível se refere
constituíram historicamente a CI, analisando-se os aos problemas semânticos, isto é, se relaciona com
conceitos de informação presentes. Naturalmente, a atribuição de significado. Enquanto o primeiro
as demarcações dos campos não são absolutas e, nível envolve apenas uma operação mecânica
sob outros pontos de vista, poder-se-ia apresentar a (reconhecer as letras num papel, captar os sons de
CI composta por outros itens, a partir de diferentes uma fala), o segundo se relaciona a uma operação
critérios de divisão. Busca-se aqui, contudo, tendo mental específica, a de depreender, de determinada
como eixo o conceito mesmo de informação, materialidade (sonora, visual, etc), um sentido, que
identificar percursos específicos (que conformariam pode se dar de maneira conotativa ou denotativa,
áreas, subáreas ou mesmo correntes teóricas) a partir literal ou irônica, metafórica, etc. O terceiro nível
das problemáticas, das contribuições de outros é o pragmático, relaciona-se com a eficácia. Quem
campos e dos conceitos correlatos mobilizados emite informações a outrem deseja, de algum modo,
por eles. provocar um comportamento, causar alguma reação
Ao final, é realizada uma correlação entre as correntes (convencer alguém a comprar um produto, eleger
teóricas, de modo a identificar aproximações e um candidato, pedir um favor, etc).
distanciamentos e, sobretudo, perceber tendências
Ou seja, os autores têm clareza dos diversos níveis
ou traços de estabilidade e de mudança nos
e complexidades envolvidos com os problemas
diferentes conceitos adotados pelas teorias. Para
relacionados à informação (ou à comunicação da
tanto, são utilizados argumentos e ideias de autores
informação). Produzem uma teoria, contudo, que
contemporâneos da CI que dialogam direta ou
está voltada apenas para o primeiro nível. Ao fazer
indiretamente com as correntes teóricas analisadas.
isso, eles tornam possível a construção de um
referencial teórico para os problemas relacionados
TEORIA MATEMÁTICA, RECUPERAÇÃO
com o transporte físico da informação. E é a partir
DA INFORMAÇÃO E BIBLIOMETRIA
dessa “brecha”, dessa proposição de uma forma
É bastante comum encontrar, na área de CI, a “científica” de estudo da informação, que se constrói
indicação da importância da Teoria Matemática da o projeto de uma ciência da informação.
Comunicação de Shannon e Weaver, apresentada
em 1948 e publicada em 1949, como um prenúncio Ao “limpar” o conceito de suas dimensões
ou mesmo inauguradora do campo. Essa teoria de significação e de relação social, Shannon e
é normalmente conhecida como “Teoria da Weaver descartam a subjetividade como elemento
informação” e tal denominação não se deu sem componente da informação, tornando possível
motivos: trata-se da teoria que pela primeira vez uma aproximação dela enquanto um fenômeno
enunciou um conceito científico de “informação”. objetivo, independente dos sujeitos que com ela
Os autores estão preocupados com a eficácia do se relacionam e, portanto, passível de ser estudada
processo de comunicação e, para tanto, elegem “cientificamente”.
Importante destacar que, também no âmbito da ontologias e websemântica são apenas algumas
arquivologia, vive-se um processo semelhante: das manifestações mais recentes do encontro da
inicialmente são constituídos depósitos centrais pesquisa em representação e as tecnologias digitais.
de arquivos em várias cidades europeias (o desafio
é a preservação e a aquisição) e, no século XIX, O conceito de informação que emana das várias
aparece o primeiro grande tratado com propostas pesquisas e aplicações relaciona-se essencialmente
de sistematização dos documentos arquivísticos, o com a ideia de representação – da possibilidade
chamado “Manual dos Holandeses” publicado em de melhorar os processos representacionais,
1898 por Muller, Feith e Fruin. construindo linguagens melhores, notações
mais mnemônicas, classes mais consistentes,
Daí por diante, essa área de estudos assiste a uma terminologias menos ambíguas. Em oposição
profusão de modelos e métodos para definir as às linguagens naturais, buscam-se linguagens
melhores formas de descrever (do ponto de vista controladas, em prol de uma representação que seja
material, relacionados a aspectos “objetivos” útil – útil para recuperar informação.
dos documentos) e classificar (do ponto de vista
do assunto, no âmbito das bibliotecas, ou da PRODUÇÃO E COMUNICAÇÃO
organicidade, nos arquivos). CIENTÍFICA
A fundamentação científica desse campo vai Logo nos primeiros anos do que se convencionou
conhecer importante salto com os trabalhos do chamar de período da gênese da CI (da segunda
indiano Ranganathan, a partir da década de 1930, metade da década de 1940 à década de 1960), a
com a ideia de classificação facetada, em oposição temática da produção científica dava a tônica das
aos modelos hierárquicos até então dominantes. discussões sobre a informação. Tal fato levou
A contribuição de Ranganathan desvia as discussões inclusive a uma compreensão, bastante difundida, de
da problemática de sistemas específicos e suas que a CI seria, na verdade, a ciência da informação
particularidades (quantas classes de assuntos, com científica. Tal visão teve importantes manifestações
que notação, etc) para os fundamentos gerais dos na Inglaterra, na França, nos EUA e, também, na
processos classificatórios e sua lógica operacional. União Soviética.
Suas ideias servem de inspiração para os trabalhos
do Classification Research Group, da Inglaterra Para a compreensão dessa teoria faz-se necessário
(FOSKETT, 1973), então já no âmbito próprio da conhecer o contexto de seu surgimento. No pós-
CI, que por um lado desenvolvem diversos sistemas guerra, estabelece-se o fenômeno da Guerra Fria, o
voltados para áreas específicas do conhecimento conflito entre EUA e URSS que se estende pelos mais
(domínios) e, por outro, realizam discussões teóricas variados campos, da influência política às medalhas
sobre classificação, envolvendo problematizações olímpicas, da ostentação bélica à corrida espacial.
acerca de linguagens e categorizações. Nas décadas Neste contexto de competição, o desenvolvimento
seguintes, juntaram-se a esse campo as teorias do científico e tecnológico torna-se central, estratégico.
conceito, da terminologia, semântica e semiótica, E, para o aumento da produtividade e da velocidade
entre outras. Ao mesmo tempo, instrumentos e de produção de novos conhecimentos científicos,
sistemas particulares foram se desenvolvendo, percebeu-se a importância da informação.
como os tesauros e os instrumentos de linguagem
Informação passou a ser entendida, nesse contexto,
controlada.
como um recurso, uma condição de produtividade.
A partir da década de 1980, as novas tecnologias Cientistas precisavam de informação com rapidez,
digitais somam-se a esse campo, principalmente com com qualidade, com exatidão. Gastava-se tempo
a ideia de hipertexto e com as diversas possibilidades precioso na busca de informação, ou tinha-se
de classificação da informação. Metadados, desperdício de tempo na obtenção de informação
tem, possibilidade maior de dominação e construção tomando corpo nas duas últimas décadas, marcadas
de hegemonia. essencialmente por movimentos de reação ao
paradigma positivista até então dominante, de
No âmbito das teorias da representação e da
indicações do esgotamento de seu poder explicativo.
classificação, verifica-se a presença do mesmo
conceito. À medida que se busca a construção de Entre essas propostas merecem destaque as
sistemas de representação cada vez melhores, isto é, discussões que buscam estabelecer diálogo com as
tem-se no horizonte a perspectiva de construção de ciências hermenêuticas, para quem o entendimento
uma linguagem perfeita, sem erros, sem dubiedades, do que a informação é passa, necessariamente, pelas
para a localização dos itens informacionais, opera- interpretações dadas pelas pessoas que se relacionam
se numa lógica da univocidade de sentido. O que com ela. Tais discussões se dão de diferentes formas.
significa, na prática e mais uma vez, ignorar a Cornelius (1996, p. 22), retomando Habermas,
presença dos sujeitos, as dimensões semântica e lembra que as ações e fatos humanos não são
pragmática da informação. “dados” ao investigador do mesmo modo que os
fenômenos humanos – pois são interpretados pelos
Os estudos em comunicação científica corroboram
sujeitos que os vivenciam ou se relacionam com
as visões de informação da Teoria Matemática e da
eles. Se são interpretados, são dotados de sentido.
Teoria Sistêmica, apenas transportando-as para a
E não há sentido em algum fato ou situação se não
lógica da produção do conhecimento científico.
há sujeito que os experencie (1996, p. 27).
A informação é compreendida como insumo, cujo
acesso e disseminação precisam ser otimizados para Outro autor que recorre à hermenêutica como
o ganho da produtividade. Assim também ocorre forma de ampliar as possibilidades teóricas de
no âmbito dos estudos em gestão da informação, estudo da informação é Capurro. O autor reconhece
em que a informação é tida como insumo para a a existência de três “paradigmas” no campo: o
tomada de decisão de gerentes e administradores. primeiro, a que denomina paradigma físico; o
O fluxo da informação é compreendido como segundo, que identifica como o paradigma cognitivo;
um transporte físico – que, para o aumento da e o terceiro, ao qual ele próprio se filia, denominado
produtividade, precisa ser otimizado, liberado de paradigma social (CAPURRO, 2003).
ruídos e redundâncias.
Criticando os dois primeiros, o autor subverte a
E também os estudos de usuários de natureza ideia comum que se tem de que a informação é
cognitivista reproduziram tal conceito, com a ideia algo prévio que cria o conhecimento, propondo
de estados anômalos de conhecimento, isto é, que, na verdade, o que ocorre é o contrário, pois a
de lacunas na “mente” dos usuários, que seriam informação é o conhecimento em ação – informação
preenchidas com “coisas” chamadas informação, é contextualizar o conhecimento, algo só pode ser
encontradas nos sistemas e serviços de informação. considerado informação pelos atores sociais se já
O mesmo princípio da univocidade presente nas se tem conhecimento daquilo que é definido como
teorias da classificação se repete aqui: de que a informação. Capurro faz sérias críticas ao que
informação é algo fixo, estabelecido, com uma chama de modelo representacionista (presente nos
referência clara, direta – no caso, uma necessidade dois “paradigmas” que critica) ao recusar a ideia de
específica a ser adequadamente satisfeita. representação como duplicação, na mente de um
sujeito, de uma realidade externa a ele, proveniente
SUPERAÇÃO DE UM CONCEITO da mente de outro sujeito. Para ele, a informação
não seria, então, o produto último de um processo
As tentativas mais consistentes de problematização de representação, nem algo que é transportado de
do conceito de informação estabelecido no uma pessoa a outra ou mesmo algo específico para
escopo das diferentes teorias da informação vêm
uma subjetividade isolada. Ela seria, antes de tudo, com e para além da informação. Frohmann (2008)
uma dimensão fundamental da forma como os seres constrói sua fundamentação justamente a partir da
humanos compartilham o mundo com os outros crítica à abordagem cognitivista, tida por ele como
(CAPURRO, 1992). uma abordagem cujo conceito de informação é
essencialmente mentalista, que vê o ser humano
Já Rendón Rojas (2005) busca ir além da tradicional apenas como um ser cognoscente, desprezando
distinção entre dado, informação e conhecimento, todos os condicionamentos sociais e materiais do
a partir de outra tríade de conceitos: informação, existir humano. Continuando a crítica, Frohmann
conhecimento e valor. O autor entende a informação aponta que tal visão da informação limita o estudo
como uma qualidade secundária de objetos dos efeitos da informação às mudanças de estado
particulares. Sua perspectiva é essencialmente de consciência individual, e toda tentativa de
dialética: o autor entende a informação como a estudar os efeitos públicos e sociais estaria limitada
união de dois extremos, os elementos objetivos a contar quantos indivíduos são afetados. A
(dados) e subjetivos (as estruturas interpretativas reconstrução do conceito de informação, pelo autor,
dos sujeitos). Rendón Rojas reconhece a existência passa pela ideia de materialidade da informação
de uma dimensão objetiva, mas também contempla conjugada com os campos institucional, tecnológico,
a subjetividade dos sujeitos que vão construindo os político, econômico e cultural que configuram as
valores (valores tais como beleza, verdade, bondade características sociais da informação.
e – poderíamos acrescentar – informação). Para tal
empreitada teórica, o autor mobiliza conceitos tão Também Braman (2004) tem trabalhado com a noção
distintos quanto inferência, assimilação, adaptação, de informação articulada ao conceito de “regimes
imaginação e criatividade. de informação”, principalmente relacionada com
as políticas de informação. Em tal abordagem, o
Deve-se destacar ainda, no âmbito da CI, as papel ativo dos atores na defesa de seus interesses
aproximações junto à semiótica, com ênfase nas e na configuração dos sistemas institucionalizados
cadeias semiósicas, isto é, nas sucessivas elaborações ganha uma dimensão que reconfigura toda a forma
e reelaborações de sentido das informações, tendo de se pesquisar a informação.
como eixo a tricotomia proposta por Peirce:
objeto, signo, interpretante (SOREN, 1992). Em Os estudos na perspectiva da análise de domínio
tais estudos, resgata-se a dimensão semântica da (HJORLAND; ALBRECHTSEN, 1995) constituem
informação, descartada pela Teoria Matemática e importante exemplo do movimento de superação
por quase toda a pesquisa em CI que se seguiu nos do conceito de informação, principalmente
anos posteriores à publicação das ideias de Shannon ao identificarem a existência de diferentes
e Weaver. A informação, como signo, tem como uma entendimentos do que seja informação para grupos
de suas propriedades a vagueza própria do signo, específicos de atores que se relacionam com a
isto é, o fato de ele representar apenas em parte informação. Ao resgatar a ideia de intersubjetividade,
algo para alguém. tais estudos apontam para o caráter construído da
informação e para o papel ativo dos sujeitos que
Também devem ser relacionadas as teorizações atuam no âmbito dos sistemas de informação e
contemporâneas relativas ao conceito de regime para além destes.
de informação, que buscam analisar os fluxos
informacionais a partir de sua inserção nas Juntos, tais estudos recuperam as dimensões material
dimensões político-econômicas concretas de e cultural em que se dão os fluxos informacionais
um contexto específico, isto é, incorporando no e representam um ressurgimento, com grande
estudo da informação os contextos institucionais, ênfase, da dimensão pragmática descartada pela
condições materiais, sistemas regulatórios e posições Teoria Matemática: a informação existe num
ocupadas pelos diferentes sujeitos que se relacionam contexto concreto, particular, específico, que precisa
necessariamente ser contemplado nos estudos. Ao longo de sua própria evolução, contudo,
Abre-se com isso, entre outras, a possibilidade de principalmente nas duas últimas décadas, reflexões
estudos com abordagens fenomenológicas – na teóricas, discussões consistentes sobre o próprio
contramão da perspectiva original da CI que ansiava conceito de informação e achados empíricos
por leis e generalizações sobre o “comportamento” das pesquisas realizadas têm colocado em xeque
da informação. a hegemonia desse modelo – ainda que outro
modelo ou teoria geral não tenha, ainda, emergido.
Na confluência das contribuições das teorias Provavelmente, aliás, tal modelo sequer venha
citadas, bem como de outras que não foram citadas a emergir, pois o tipo de crítica apontada nos
neste texto, desenha-se uma perspectiva nova de vários estudos contemporâneos se dá mais numa
estudos da informação, que a entende não mais perspectiva pontual, em relação a um ou outro
como coisa, mas como processo – algo construído, aspecto, do que de uma forma geral, global.
essencialmente histórico e cultural, que só pode
ser apreendido na perspectiva dos sujeitos que a O que a existência de tais estudos evidencia
produzem, a disseminam e a utilizam. A informação é a complexidade do fenômeno estudado – a
deixa de ser apreendida como um objeto físico, com informação – e a consequente complexidade
a mesma natureza de uma cadeira, uma pedra, um necessária para as teorias que se propõem a estudá-
elemento químico, e passa a ser entendida como um lo. Assim, o movimento de superação teórica da
fenômeno humano (portanto, cultural e histórico) tal CI tende a ser o movimento da incorporação da
como o poder, a ideologia, a felicidade, entre outros. complexidade, por um lado; e da sua vinculação
decisiva ao terreno das ciências humanas e sociais,
CONSIDERAÇÕES FINAIS de outro.
A história da CI pode ser entendida, assim, Deve-se salientar, contudo, que estudos de natureza
como a história da gradual consolidação de positivista, que reafirmam o conceito de informação
um paradigma positivista para o campo, que se na perspectiva objetivista, sem a consideração do
dá com a incorporação de teorias, conceitos e sujeito e dos contextos socioculturais concretos,
métodos de várias correntes (de diferentes áreas que tomam a informação como um dado e não
do conhecimento) e se manifesta de maneiras como uma construção, continuam existindo e
particulares nas várias subáreas que o compõem. constituindo a perspectiva mais comum dos estudos
Tal paradigma partilha com o positivismo todas as desenvolvidos no campo. Ou seja: a consciência da
suas características: a explicação como sinônimo imaturidade do campo existe (WERSIG, 1993), e o
de simplificação, a quantificação, a busca por que se percebe é que ainda existe longo caminho a
regularidades e leis e o consequente apagamento das trilhar rumo à maior consistência – principalmente
singularidades. Partilha, também, suas limitações – em relação à consolidação das críticas que têm sido
sendo a principal delas a incapacidade de capturar feitas ao modelo positivista de compreensão da
aquilo que o método não dá conta de apreender: a informação e à possibilidade de construção de novas
informação subjetiva, dotada de sentidos diversos e teorias e conceitos.
inserida no terreno da experiência histórico-cultural.
Artigo submetido em 30/04/2009 e aceito em 22/04/2010.