You are on page 1of 28

1

INTRODUÇÃO

Um dos mais belos romances da nossa literatura romântica, Iracema

é considerado por muitos “um poema em prosa”. A trágica história da bela índia

apaixonada pelo guerreiro branco é contada por José de Alencar com o ritmo e

a força de imagens próprios da poesia.

Em Iracema, José de Alencar construiu uma alegoria perfeita do

processo de colonização do Brasil e de toda a América pelos invasores

portugueses e europeus em geral. O nome Iracema é uma anagrama da

palavra América. O nome de seu amado Martim remete ao deus greco-romano

Marte, o deus da guerra e da destruição. O autor demonstra, já a partir do

título, um evidente trabalho de construção de uma linguagem e de um estilo

que possam melhor representar, para o leitor, “a singeleza primitiva da língua

bárbara”, com “termos e frases que pareçam naturais na boca do selvagem”.

O livro foi publicado em 1865 e, em pouco tempo, agradou tanto aos

leitores quanto aos críticos literários, a começar pelo jovem Machado de Assis,

então com 27 anos, que escreveu sobre Iracema no Diário do Rio de Janeiro,

em 1866:

“Tal é o livro do Sr. José de Alencar, fruto do estudo e da meditação,

escrito com sentimento e consciência… Há de viver este livro, tem em si as

forças que resistem ao tempo, e dão plena fiança do futuro…Espera-se dele

outros poemas em prosa. Poema lhe chamamos a este, sem curar de saber se

é antes uma lenda, se um romance: o futuro chamar-lhe-á obra-prima.”

 
2

A OBRA EM RESUMO

1 A partida (Martim, Japi e Moacir)


"onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao
fresco terral a grande vela?"
2 O encontro (Martim e Iracema)
"Rumos suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos,
que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e
não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que
bordam o mar, nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e
tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo. Foi rápido, como o olhar, o gesto de
Iracema. A flecha partiu. Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da espada; mas sorriu. O
moço guerreiro aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é símbolo de
ternura e amor. Sofreu mais d'alma que da ferida.
O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu. Porém a virgem
lançou de si o arco e correu para o guerreiro, sentida da mágoa que causara. A
mão que rápida ferira, estancou mais rápida e compassiva o sangue que
gotejava. Depois Iracema quebrou a flecha homicida; deu a haste ao
desconhecido, guardando consigo a ponta farpada. O Guerreiro falou:
— Quebras comigo a flecha da paz?"
3 Martim, hóspede de Araquém

 Importante: tema da hospedagem;


 regras rigorosas;
 respeito absoluto a elas.

4 Relação amorosa

 Vestal - religiosidade;
3

"Estrangeiro, Iracema não pode ser tua serva. É ela que guarda o segredo de
jurema e o mistério do sonho. Sua mão fabrica para o Pajé a bebida de Tupã."

 Apaixona-se por Martim;


 Envolve e seduz o guerreiro branco.

5 Ciúme de Irapuã

 Apaixonado por Iracema;


 Ódio por Martim;
 Desejo de vingança;
 Obrigado a respeitar a hospitalidade de Araquém.

"— Nunca Iracema daria seu seio, que o espírito de Tupã habita só, ao
guerreiro mais vil dos guerreiros tabajaras! Torpe é o morcego porque foge da
luz e bebe o sangue da vítima adormecida!...
— Filha de Araquém, não assanha o jaguar! O nome de Irapuã voa mais longe
que o goaná do lago, quando sente a chuva além das serras. Que o guerreiro
branco venha, e o seio de Iracema se abra para o vencedor.
— O guerreiro branco é hóspede de Araquém. A paz o trouxe aos campos do
Ipu, a paz o guarda. Quem ofender o estrangeiro ofende o Pajé."
6 Confrontos
a) Martim X Irapuã

 Aldeia tabajara: ambiente de revolta;


 Martim foge, ajudado por Caubi;
 Irapuã persegue e intercepta o fugitivo;
 Caubi intercede.

b) Tabajaras X Pitiguaras

 Irapuã retira-se

7 Guerra
4

 Tapuitingas + Irapuâ X pitiguaras;


 Jacaúna chama Poti e Martim;
 Martim parte para a guerra.

8 Abandono de Iracema
"[...] Poti refletiu:
— As lágrimas da mulher amolecem o coração do guerreiro, como o orvalho da
manhã amolece a terra.
— Meu irmão é grande sabedor. O esposo deve partir sem ver Iracema.
O cristão avançou. Poti mandou-lhe que apressasse: da alijava de setas que
Iracema emplumara de penas vermelhas e pretas e suspendera aos ombros do
esposo, tirou uma.
O chefe potiguara vibrou o arco; a seta rápida atravessou um goiamum que
discorria pelas margens do lago; só parou onde a pluma não a deixou mais
entrar.
Fincou o guerreiro no chão a flecha, com a presa atravessada, e tornou para
Coatiabo.
— Podes partir. Iracema seguirá teu rasto; chegando aqui, verá tua seta, e
obedecerá à tua vontade. Martim sorriu; e quebrando um ramo do maracujá, a
flor da lembrança, [...]
— Ele manda que Iracema ande pra trás, como o goiamum, e guarde sua
lembrança, como o maracujá guarda sua flor todo o tempo até morrer.
A filha dos tabajaras retraiu os passos lentamente, sem volver o corpo, nem
tirar os olhos da seta de seu esposo; depois tornou à cabana. Ali sentada à
soleira, com a fronte nos joelhos esperou, até que o sono acalentou a dor de
seu peito."
9 Volta de Martim

 Nascimento de Moacir
 Sofrimento e morte de Iracema
 Martim enterra Iracema
5

"— Recebe o filho de teu sangue. Era tempo; meus seios ingratos já não
tinham alimento para dar-lhe! Pousando a criança nos braços paternos; a
desventurada mãe desfaleceu [...] O esposo viu então como a dor tinha
consumido seu belo corpo; mas a formosura ainda morava nela [...]
Enterra o corpo de tua esposa ao pé do coqueiro que tu amavas. Quando o
vento do mar soprar nas folhas, Iracema pensará que é a tua voz que fala entre
seus cabelos.
O doce lábio umedeceu para sempre; o último lampejo despediu-se dos olhos
baços.
Poti amparou o irmão na grande dor. Martim sentiu quanto um amigo
verdadeiro é preciosos na desventura
[...]
O camucim que recebeu o corpo de Iracema, embebido de resinas odoríferas,
foi enterrado ao pé do coqueiro, à borda do rio. Martim quebrou um ramo de
murta, a folha da tristeza, e deitou-o no jazido de sua esposa. A jandaia
pousada no olho da palmeira repetia tristemente: - Iracema!"
10 Canto da Jandaia e nascimento do Ceará
"Desde então os guerreiros potiguaras que passavam perto da cabana
abandonada e ouviam ressoar a voz plangente da ave amiga, afastavam-se
com a alma cheia de tristeza, do coqueiro onde cantava a jandaia. E foi assim
que um dia veio a chamar-se Ceará o rio onde crescia o coqueiro, e os campos
onde serpeja o rio."
11 Quatro anos depois...

 Martim volta com o filho e um padre;


 Encontro com Poti;
 Conversão de Poti: batizado católico;
 Martim, Camarão e Albuquerque partem para Mearim: expulsão do
branco tapuia.

"Poti foi o primeiro que ajoelhou aos pés do sagrado lenho; não sofria ele que
nada mais o separasse de seu irmão branco. Deviam ter ambos um só deus,
como tinham um só coração.
6

Ele recebeu com batismo o nome do santo, cujo era o dia; e o do rei,
a quem ia servir, e sobre is dois o seu, na língua dos novos irmãos. Sua fama
cresceu e ainda hoje é o orgulho da terra, onde ele primeiro viu a luz. [...]
Jacaúna veio habitar nos campos da Porangaba pra estar perto de seu amigo
branco; Camarão erguera a taba de seus guerreiros nas margens da Macejana.
Era sempre com emoção que o esposo de Iracema revia as plagas onde fora
tão feliz, e as verdes folhas a cuja sombra dormia a formosa tabajara.
Muitas vezes ia sentar-se naquelas doces areias, para cismar e acalentar no
peito a agra saudade.
A janela cantava ainda no olho do coqueiro; mas não repetia já o mavioso
nome de Iracema.
Tudo passa sobre a terra."

A LENDA E A HISTÓRIA

O livro, subtitulado Lenda do Ceará, conta a triste história de amor

entre a índia tabajara Iracema, a virgem dos lábios de mel e Martim, primeiro

colonizador português do Ceará. Além disso, como resume Machado de Assis,

o assunto do livro é também a história da fundação do Ceará e o ódio de duas

nações inimigas (tabajaras e pitiguaras). Os pitiguaras habitavam o litoral

cearense e eram amigos dos portugueses. Os tabajaras viviam no interior e

eram aliados dos franceses.

José de Alencar recorreu a circunstâncias históricas, como a rixa

entre os índios tabajaras e pitiguaras e utilizou personagens  reais, como

Martim Soares Moreno e o índio Poti, que depois viria a adotar o nome cristão

de Antônio Felipe Camarão. Mas cercou-os de uma fértil imaginação e de um

lirismo próprios da poesia romântica.

A heroína idealizada
7

Iracema é filha de Araquém, pajé da tribo tabajara, e deve manter-se

virgem porque “guarda o segredo da jurema e o mistério do sonho. Sua mão

fabrica para o Pajé a bebida de Tupã”. Um dia, Iracema encontra, na floresta,

Martim, que se perdera de Poti, amigo e guerreiro pitiguara com quem havia

saído para caçar e agora andava errante pelo território dos inimigos tabajaras.

Iracema leva Martim para a cabana de Araquém, que abriga o estrangeiro: para

os indígenas, o hóspede é sagrado.

O momento em que Martim encontra Iracema revela a idealização

romântica em seu grau mais elevado:

“Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte,

nasceu Iracema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos

mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.

O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no

bosque como seu hálito perfumado.

Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e

as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação

tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que

vestia a terra com as primeiras águas.

Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da floresta.

Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da

noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos.

Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto.

Iracema saiu do banho; o aljôfar d'água ainda a roreja, como à doce

mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das


8

penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata,

pousado no galho próximo, o canto agreste.

A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela. Às

vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras

remexe o uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os

alvos fios do crautá , as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de

que matiza o algodão. Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta.

Ergue a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.

Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é

guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das

areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas

armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.”

Note-se que o narrador seguidas vezes compara Iracema à natureza

exuberante do Brasil. E a virgem leva sempre vantagem. Seus cabelos são

mais negros e mais longos, seu sorriso mais doce, seu hálito mais perfumado,

seus pés mais rápidos.

Iracema é apresentada por um narrador que, embora se apresente

na terceira pessoa, é claramente emotivo e apaixonado. Retrata-a, portanto,

como a síntese perfeita das maravilhas da natureza cearense, brasileira e

americana. Iracema é muito mais do que uma mulher. Não anda, flutua. Toda a

natureza rende-lhe homenagem: da acácia silvestre aos pássaros, como o

sabiá e a ará. A heroína é o próprio espírito harmonioso da floresta virgem.

A harmonia rompida
9

O narrador deixa clara a ruptura nesse harmoniosa relação de

Iracema com o seu meio ao apresentar o surgimento de Martim: "Rumor

suspeito quebra a doce harmonia da sesta". A vista de Iracema perturba-se,

impossibilitada de decodificar essa estranha aparição de uma etnia que lhe é

desconhecida.

José de Alencar retrata, assim, o processo de estranhamento e

fascínio mútuo que dominou o encontro dos dois povos. Começavam a se

conhecer, sem sequer suspeitar as trágicas conseqüências do encontro para

os indígenas.

A sedução

Enquanto esperam a volta de Caubi, o irmão de Iracema que

reconduziria o guerreiro branco às terras pitiguaras, Iracema se apaixona por

Martim, mas não pode se entregar a ele, porque, como afirma o Pajé, “se a

virgem abandonou ao guerreiro branco a flor de seu corpo, ela morrerá…” Uma

noite, Martim pede à Iracema o vinho de Tupã, já que não está conseguindo

resistir aos encantos da virgem. O vinho, que provoca alucinações, permitiria

que ele, em sua imaginação, possuísse a jovem índia como se fosse realidade.

Iracema lhe dá a bebida e, enquanto ele imagina estar sonhando, Iracema

“torna-se sua esposa”. É muito importante notar o valor alegórico dessa

passagem. Ao “possuir” Iracema, Martim está inconsciente, completamente

seduzido e inebriado. Esse gesto há de provocar a destruição da virgem, assim

como a invasão do Brasil pelos portugueses há de provocar a destruição da

floresta virgem americana. No entanto, assim como Martim não tinha qualquer

intenção de provocar a morte de sua amada – o faz por paixão – os


10

destruidores da natureza brasileira o fizeram de forma inconsciente e

inconseqüente. A consciência ecológica de Alencar vai muito além da ingênua

defesa das nossas matas: percebe com clareza o seu processo de destruição.

O conflito

Martim é ameaçado pelo enciumado chefe guerreiro Irapuã, que

quer invadir a cabana de Araquém e matá-lo. Apesar da advertência de

Araquém de que Tupã puniria quem machucasse seu hóspede, os guerreiros

de Irapuã cercam a cabana, que é protegida por Caubi. Iracema encontra Poti,

que está próximo à aldeia dos tabajaras e deseja salvar o amigo. Planejam,

então, a fuga de Martim. Durante a preparação dos guerreiros tabajaras para a

guerra com os pitiguaras, Iracema lhes serve o vinho da jurema e, enquanto os

guerreiros deliram, ela leva Martim e Poti para longe da aldeia. Quando já

estão em terras pitiguaras, Iracema revela a Martim que ela agora é sua

esposa e deve acompanhá-lo. Entretanto, os tabajaras descobrem que Iracema

traíra “o segredo da jurema” e perseguem os fugitivos. Os pitiguaras, avisados

da invasão dos tabajaras, juntam-se aos fugitivos e é travado um sangrento

combate. Iracema luta ao lado de Martim contra a sua tribo.Os pitiguaras

ganham a luta e Iracema se entristece pela morte dos seus irmãos tabajaras.

O exílio

Iracema acompanha Martim e Poti e passa a morar com eles no

litoral. Durante algum tempo, eles são muito felizes, e a alegria se completa

com a gravidez de Iracema. Porém, Martim acaba por “saturar-se de felicidade”

e seu interesse pela esposa e pela vida ao seu lado começa a esfriar. Iracema
11

se ressente da frieza do marido e sofre. Martim se ausenta com freqüência em

caçadas e batalhas contra os inimigos dos pitiguaras. Enquanto guerreia,

nasce seu filho, que Iracema chama de Moacir, que significa “nascido do meu

sofrimento, da minha dor”.

Iracema dá ao filho o nome indígena correspondente ao nome

hebraico Benoni, que também significa “filho de minha dor”. Este é o nome

dado por Raquel, mulher do patriarca bíblico Jacó, ao seu último filho. Raquel

morre depois de dar à luz. Mas Jacó muda o nome do menino para Benjamim.

Os filhos de Jacó dão origem às tribos que formarão a nação Israel, assim

como o filho de Iracema representa o início de uma nação.

Solitária e saudosa, Iracema tem dificuldade para amamentar o filho

e quase não come. Desfalece de tristeza. Martim fica longe de Iracema durante

oito luas (oito meses) e, quando volta, encontra Iracema à beira da morte. Ela

entrega o filho a Martim, deita-se na rede e morre, consumida pela dor. Poti e

Martim enterram-na ao pé do coqueiro, à beira do rio. Segundo Poti: “quando o

vento do mar soprar nas folhas, Iracema pensará que é tua voz que fala entre

seus cabelos.”

O lugar onde viveram e o rio em que nascera o coqueiro vieram a

ser chamados, um dia, pelo nome de Ceará.     Martim partiu das praias do

Ceará levando o filho. Alencar comenta: “O primeiro cearense, ainda no berço,

emigrava da terra da pátria. Havia aí a predestinação de uma raça?” O

guerreiro branco volta alguns anos depois, acompanhado de outros brancos,

inclusive um sacerdote “para plantar a cruz na terra selvagem”. Começa a

colonização e a narrativa termina: “Tudo passa sobre a terra.”


12

O FOCO NARRATIVO

O romance é narrado na terceira pessoa, mas o narrador está longe

de se manter neutro e mero observador. Abundam os adjetivos reveladores de

admiração, principalmente em referência à natureza brasileira e à Iracema. Em

alguns momentos o narrador arrebatado chega a revelar-se na primeira

pessoa: “O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu.” Tais

arroubos justificam-se pela colocação, no início da obra, de que essa é "uma

história que me contaram nas lindas vargem onde nasci". Assim, Alencar

justifica a intromissão da voz na primeira pessoa em uma obra narrada na

terceira.

CARACTERÍSTICAS DA OBRA

Caracterização psicológica:

amor acima de tudo;


transgressão das regras;
amorX autoridade paterna;
amor e morte;

Possível modelo:

Teresa, de Amor e Perdição de Camilo Castelo Branco (1862)

Contradição

Plano físico: traços indígenas


Plano psicológico: modelo das heroínas européias

A idealização do índio
Caracterização física
13

"Iracema, a virgem dos lábios de mel [...]. O favo da jati não era tão doce como
o seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado."
 
"Quem cria, vê sempre uma Lindóia na criatura, embora as índias sejam
pançudas e remelentas."

(Trecho de Amar, verbo intransitivo - idílio de Mário de Andrade) [1].

A LINGUAGEM

1 - prosa poética

Capítulo 1

"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes
da carnaúba;

Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente,
perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros;
Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco
aventureiro manso resvale à flor das águas. [...]"

"Ver-des-ma-res-bra-vios (6)
De-mi-nha-ter-ra-na-tal (7)
On-de-can-taa-jan-da-ia (6)
Nas-fron-des-da-car-na-úba (7)
Ver-des-ma-res-que-bri-lha-is (7)
Co-mo-lí-qui-da-es-me-ral-da (7)
Aos-ra-ios-do-sol-nas-cen-te (7)
Per-lon-gan-do-as-al-vas-pra-ias (7)
En-som-bra-das-de-co-quei-ros (7)

2 - Adjetivação e comparações
14

"Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a
asa da graúna e mais longos que o seu talhe de palmeira.O favo da Jati não
era doce como o seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu
hálito perfumado."

3 - A língua tupi

"O conhecimento da língua indígena é o melhor critério para a nacionalidade da


literatura. Ele nos dá não só o verdadeiro estilo, como as imagens poéticas do
selvagem, os modos de seu pensamento, as tendências de seu espírito, e até
as menores particularidades de sua vida. è nessa fonte que se deve beber o
poeta brasileiro."

TEMPO

O ano em que a ação se desenvolve é 1603, século XVII, época da

colonização do Brasil, mais especificamente, no texto, da colonização do

Ceará.

Personagens

 Iracema- perfeita mulher romântica: bela, frágil, sentimental e sofredora.

“ Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais

negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira.

O favo da jati não era tão doce como seu sorriso; nem a baunilha

recendia no bosque como seu hálito perfumado.

Mais rápida que a ema selvagem,(...). O pé grácil e nu, mal roçando,

alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.”
15

 Martin – representante da cultura superior, bom colonizador. Cristão, tem

sangue de português, chega avisando que é proprietário das terras e sugere

que quer mais. É amado pelos bons índios: Iracema e Poti(tribos inimigas).

“ – Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os

meus.”

 Moacir – filho da dor, simboliza a nova civilização

 Poti – guerreiro pitiguara, exemplo do índio aculturado, conquistado pelo

colonizador branco, a quem segue como uma sombra.

“ Os dois irmãos encostaram a fronte na fronte e o peito no peito para

exprimir que não tinham ambos mais que uma cabeça e um coração.”

“- Como a cobra tem duas cabeças em um só corpo, assim é a amizade

de Coatiabo e Poti.”

 Araquém – pai de Iracema, o pajé, guardião das ritos sagrados dos

tabajaras.

 Caubi – irmão da protagonista. Inicialmente, ele acolhe o inimigo Martin,

depois o combate e afinal perdoa Iracema e a visita em sua nova morada.

 Irapuã – chefe tabajara, impulsivo e intolerante, que quer caçar Martin e

Poti a qualquer preço.

 Andira – velho guerreiro, irmão de Araquém

 Ará – pequena jandaia, que é abandonada pela dona por causa de Martin
16

CONTEXTO HISTÓRICO

Em 1603, Pêro Coelho, homem nobre da Paraíba, partiu como


capitão-mor de descoberta, levando uma força de 80 colonos e 800 índios.
Chegou à Foz do Jaguaribe e aí fundou o povoado que teve o nome de “Nova
Lisboa”.
Foi esse o primeiro estabelecimento colonial do Ceará.
Como Pêro Coelho se visse abandonado dos sócios, mandaram-lhe
João Soromenho com socorros. Esse oficial, autorizado a fazer cativos para
indenização das despesas, não respeitou os próprios índios do Jaguaribe,
amigos dos portugueses. Retiraram-se os colonos pelas hostilidades dos
indígenas. Pêro Coelho ficou ao desamparo, obrigado a voltar a Paraíba por
terra, com sua mulher e filhos pequenos.
 
Na primeira expedição foi ao Rio Grande do Norte um moço de

nome Martim Soares Moreno, que se ligou de amizade com Jacaúna, chefe

dos índios do litoral e seu irmão Poti. Poti recebeu o nome de Antônio Felipe

Camarão, e ilustrou a invasão holandesa. Seus serviços foram remunerados

com o fôro de fidalgo, a comenda de Cristo e o cargo de capitão-mor dos

índios.

Martim chegou a mestre-de-campo e foi um dos excelentes cabos

portugueses que libertaram o Brasil da invasão holandesa. O Ceará deve

honrar sua memória como o de um varão prestante e seu verdadeiro fundador,

pois que o primeiro povoado à foz do Jaguaribe não passou de uma tentativa

frustrada.

Este é o argumento histórico da lenda. São de Alencar as seguintes


palavras a esse respeito:
 
17

“O assunto para a experiência de antemão estava achado. Quando

em 1848 revi nossa terra natal, tive a idéia de aproveitar suas lendas e

tradições em alguma obra literária. Já em S. Paulo havia começado uma

biografia de Camarão. Sua mocidade, a amizade heróica que o ligava a Soares

Moreno, a bravura e lealdade de Jacaúna, aliado dos portugueses e suas

guerras contra o célebre Mel redondo; aí estava o tema. Faltava-lhe o perfume

que derrama sobre as paixões do homem e da mulher.”

De Iracema, dirá Machado de Assis no Diário do Rio de Janeiro:


 
“Tal é o livro do Sr. José de Alencar, fruto do estudo e da meditação,

escrito com sentimento e consciência… Há de viver este livro, tem em si as

forças que resistem ao tempo, e dão plena fiança do futuro… Espera-se dele

outros poemas em prosa. Poema lhe chamamos a este, sem curar de saber se

é antes uma lenda, se um romance: o futuro chamar-lhe-á obra-prima”.  

"Na primeira expedição foi um moço de nome Martim Soares

Moreno, que se ligou de amizade com Jacaúna, chefe do índios do litoral e seu

irmão Poti. Em 1608, por ordem de D. Diogo de Menezes, voltou a dar princípio

à regular colonização daquela capitania"  

"Jacaúna, que habitava as margens do Acaracu, veio estabelecer-se

com sua tribo nas proximidades do recente povoado, para o proteger contra os

índios do interior e os franceses que infestavam a costa".

"Este é o argumento histórico da lenda [...] para que não me


censurem de infiel à verdade histórica".
 
Argumento Histórico - Em 1603, Pero Coelho, homem nobre da

Paraíba, partiu como capitão-mor de descoberta, levando uma força de 80


18

colonos e 800 índios. Chegou à foz do Jaguaribe e aí fundou o povoado que

teve o nome de Nova Lisboa.

Foi esse o primeiro estabelecimento colonial do Ceará.

Como Pero Coelho se visse abandonado dos sócios, mandaram-lhe João

Soromenho com socorros. Esse oficial, autorizado a fazer cativos para

indenização das despesas, não respeitou os próprios índios do Jaguaribe,

amigos dos portugueses.

Tal foi a causa da ruína do nascente povoado. Retiraram-se os

colonos, pelas hostilidades dos indígenas; e Pero Coelho ficou ao desamparo,

obrigado a voltar à Paraíba por terra, com sua mulher e filhos pequenos.

Na primeira expedição foi do Rio Grande do Norte um moço de

nome Martim Soares Moreno, que se ligou de amizade com Jacaúna, chefe

dos índios do litoral, e seu irmão Poti. Em 1608 por ordem de D. Diogo

Meneses voltou a dar princípio à regular colonização daquela capitania: o que

levou a efeito fundando o presídio de Nossa Senhora do Amparo em 1611.

Jacaúna, que habitava as margens do Acaracu, veio estabelecer-se com sua

tribo nas proximidades do recente povoado, para o proteger contra os índios do

interior e os franceses que infestavam a costa.

Poti recebeu no batismo o nome de Antônio Felipe Camarão, que

ilustrou na guerra holandesa. Seus serviços foram remunerados com o foro de

fidalgo, a comenda de Cristo e o cargo de capitão-mor dos índios.

Martim Soares Moreno chegou a mestre-de-campo e foi um dos

excelentes cabos portugueses que libertaram o Brasil da invasão holandesa. O

Ceará deve honrar sua memória como a de um varão prestante e seu


19

verdadeiro fundador, pois que o primeiro povoado à foz do rio Jaguaribe foi

apenas uma tentativa frustrada.

Este é o argumento histórico da lenda; em notas especiais se

indicarão alguns outros subsídios recebidos dos cronistas do tempo.

Há uma questão histórica relativa a este assunto; falo da pátria do Camarão,

que um escritor pernambucano quis pôr em dúvida, tirando a glória ao Ceará

para a dar à sua província.

Este ponto, aliás somente contestado nos tempos modernos pelo Sr.

comendador Melo em suas Biografias, me parece suficientemente elucidado já,

depois da erudita carta do Sr. Basílio Quaresma Torreão, publicada no

Mercantil nº 26 de 26 de janeiro de 1860, 2ª página.

Entretanto farei sempre uma observação. Em primeiro lugar, a

tradição oral é uma fonte importante da História, e às vezes a mais pura e

verdadeira. Ora, na província de Ceará, em Sobral, não só referiam-se entre

gente do povo notícias do Camarão, como existia uma velha mulher que se

dizia dele sobrinha. Essa tradição foi colhida por diversos escritores, entre

eles o conspícuo autor da Corografia Brasílica.

O autor do Valeroso Lucideno é dos antigos o único que

positivamente afirma ser Camarão filho de Pernambuco; mas além de

encontrar essa asserção a versão de outros escritores de nota, acresce que

Berredo explica perfeitamente o dito daquele escritor, quando fala da

expedição de Pero Coelho de Souza a Jaguaribe, sítio naquele tempo e

também no de hoje da jurisdição de Pernambuco.


20

Outro ponto é necessário esclarecer para que não me censurem de infiel à

verdade histórica. É a nação de Jacaúna e Camarão que alguns pretendem ter

sido a tabajara.

Há nisso manifesto engano. Em todas as crônicas se fala das tribos

de Jacaúna e Camarão como habitantes do litoral, e tanto que auxiliam a

fundação do Ceará, como já haviam auxiliado a da Nova Lisboa em Jaguaribe.

Ora, a nação que habitava o litoral entre o Parnaíba e o Jaguaribe ou Rio-

Grande era a dos pitiguaras, como atesta Gabriel Soares. Os tabajaras

habitavam a serra de Ibiapaba, e portanto o interior.

Como chefes dos tabajaras são mencionados Mel Redondo no

Ceará e Grão Deabo em Piauí. Esses chefes foram sempre inimigos

irreconciliáveis e rancorosos dos portugueses, e aliados dos franceses do

Maranhão que penetraram até Ibiapaba. Jacaúna e Camarão são conhecidos

por sua aliança firme com os portugueses.

Mas o que solve a questão é o seguinte texto. Lê-se nas Memórias diárias da

guerra brasílica do conde de Pernambuco: - 1634, janeiro, 18: «Pelo bom

procedimento com que havia servido A. F. Camarão o fez El-rei capitão-mor de

todos os índios não somente de sua nação, que era Pitiguar, nas das outras

residentes em várias aldeias.»

Esta autoridade, além de contemporânea, testemunhal, não pode

ser recusada, especialmente quando se exprime tão positiva e

intencionalmente a respeito do ponto duvidoso.

O indianismo
21

O índio começou a ser adotado como tema literário no Brasil pelos

árcades, principalmente Basílio da Gama – que via o índio como “homem

natural”, e Santa Rita Durão – para quem o índio era apenas o “comedor de

carne humana, que só o Cristianismo salvaria”.

A busca de uma “poesia americana”

Já no Romantismo, o culto do passado e o nacionalismo literário

permitiram aos escritores cultivarem a chamada “poesia americana”, que se

valia da natureza, da História, de cenas e de costumes nacionais, fórmula em

que o Indianismo se adequava perfeitamente. Os escritores mais expressivos

do Indianismo, nesse período, foram, na poesia, Gonçalves Dias, com poemas

como I-Juca Pirama, Marabá e Leito de Folhas Verdes e, na prosa, José de

Alencar, com romances como O Guarani, Iracema e Ubirajara. A corrente

indianista foi muito prestigiada e vários poetas tentaram escrever o “poema

americano” por excelência, como Gonçalves de Magalhães com o seu poema

longo A Confederação dos Tamoios, que originou uma célebre polêmica, em

que até o Imperador participou.

A polêmica

Alencar foi o protagonista,  em 1856, dessa polêmica acalorada

sobre o papel do índio na literatura brasileira. O introdutor do romantismo entre

nós, o poeta Gonçalves de Magalhães, acabara de publicar um poema épico

com temática indianista. Amigo do imperador Dom Pedro II, Magalhães era, de

certa forma, o “poeta oficial” do Brasil naquele momento. Em uma série de

cartas assinadas com o pseudônimo de Ig., Alencar critica o artificialismo do


22

tratamento do índio dado por Gonçalves de Magalhães que, segundo ele, “não

está à altura do assunto”.

Saem, em defesa do poeta, vários amigos seus, entre eles o próprio

imperador Dom Pedro II. A polêmica se desdobra do início de junho ao final de

outubro de 1856. Podemos mesmo perceber, em alguns pontos das cartas, que

Alencar já pensava em abordar a temática nos seus futuros escritos,

associando-a ao elogio da terra brasileira:

“Digo-o por mim: se algum dia fosse poeta, e quisesse cantar a

minha terra e suas belezas, se quisesse compor um poema nacional, pediria a

Deus que me fizesse esquecer por um momento as minhas idéias de homem

civilizado. Filho da natureza, embrenhar-me-ia por essas matas seculares;

contemplaria as maravilhas de Deus, veria o sol erguer-se no seu mar de ouro,

a lua deslizar-se no azul do céu; ouviria o murmúrio das ondas e o eco

profundo e solene das florestas.”

Mas não seria através da poesia que Alencar haveria de “cantar a

minha terra e suas belezas”. Ainda na polêmica sobre A Confederação dos

Tamoios, ele critica o uso de gêneros poéticos clássicos para descrever o índio

brasileiro:

Escreveríamos um poema, mas não um poema épico; um

verdadeiro poema nacional, onde tudo fosse novo, desde o pensamento até a

forma, desde a imagem até o verso. A forma com que Homero cantou os

gregos não serve para cantar os índios; o verso que disse as desgraças de

Tróia e os combates mitológicos não pode exprimir as tristes endeixas do


23

Guanabara, e as tradições selvagens da América. Por ventura não haverá no

caos incriado do pensamento humano uma nova forma de poesia, um novo

metro de verso?” Desde as primeiras páginas de Iracema, fica claro que o seu

autor procura colocar essas idéias em prática. Alencar adota o gênero do

romance, mas o faz com um cuidado na construção das imagens e com a

musicalidade da linguagem que levaram críticos como Machado de Assis a

considerá-lo mais um “poema em prosa” do que propriamente um romance. E

levaram Haroldo de Campos a afirmar que: “O maior poeta indianista (o único

plenamente legível hoje…) foi um prosador: José de Alencar.”  Seguindo a

trilha aberta por Augusto Meyer, que já havia observado: “Bastaria Iracema

para consagrá-lo o maior criador da prosa romântica, na língua portuguesa, e o

maior poeta indianista.”

Desdobramentos

No parnasianismo, o índio aparece raramente – um exemplo é o

poema A Morte de Tapir, de Olavo Bilac – e simplesmente desaparece na

poesia simbolista.

O Modernismo volta ao tema e o utiliza às vezes como ponto de

referência para diretrizes estéticas, como no caso da Poesia “Pau-Brasil” e da

Antropofagia de Oswald de Andrade, com a questão “tupi or not tupi”. Algumas

obras aproveitaram o tema do índio e suas lendas, como Macunaíma, de Mário

de Andrade, Cobra Norato de Raul Bopp ou Martim Cererê, de Cassiano

Ricardo.

Iracema e Macunaíma
24

O crítico Cavalcanti Proença demonstrou no Roteiro de Macunaíma

as diversas relações de semelhança entre Macunaíma (1928), de Mário de

Andrade, e Iracema. Entre essas destacam-se as semelhanças entre as

personagens de Iracema e de Ci, a mãe do mato:

"Ci aromava tanto que Macunaíma tinha tonteiras de moleza" (M.A.)


-- "Todas as noites a esposa perfumava seu corpo e a alva rede, para que o
amor do guerreiro se deleitasse nela (J. A.). É a rede de cabelos que torna a
Mãe do Mato inesquecível, e é uma rede que Iracema oferece ao guerreiro
branco: -- "Guerreiro que levas o sono de meus olhos, leva a minha rede
também. Quando nela dormires, falem em tua alma os sonhos de Iracema"
(J.A.).  Ambas …não têm leite. O de Ci foi a cobra preta que sugou; em
Iracema o leite não chegava ao seio, diluído nas lágrimas de saudade. "A
jovem mãe suspendeu o filho à teta; mas a boca infantil não emudeceu. O leite
escasso não apojava o peito" (J. A.). Em Macunaíma, o filho do herói "chupou
o peito da mãe no outro dia, chupou mais, deu um suspiro envenenado e
morreu".

 
25

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, tentamos abordar o nacionalismo e o indianismo

tematizado por José Alencar no romance Iracema. Procedemos a uma leitura

crítica dessa obra para caracterizarmos o tipo de nacionalismo e de indianismo

apresentados na referida obra alencariana. Conforme pudemos esboçar nestas

poucas páginas, Alencar manteve-se coerente com sua intenção de mostrar

em um romance as tradições dos indígenas brasileiros. Ele consegue externar

a propalada valorização da nacionalidade brasileira por intermédio das

espetaculares comparações das expressões indígenas, apresentando uma

configuração bastante próxima daquilo que ele pretendeu: fazer uma literatura

que expressasse a valorização do índio brasileiro e das “coisas” do Brasil.

Entretanto, o nacionalismo e o indianismo de Alencar, brilhantemente

caracterizados pelas imagens lexicais do cenário e da personagem Iracema

principalmente, não conseguem ultrapassar essa fronteira lexical. Esses temas

são apresentados sob o crivo de uma ideologia européia. No nível da trama, os

personagens indígenas sofreram revezes quando em confronto com (ou

sofrendo de amor) pelos personagens europeus, inclusive a heroína Iracema,

que morre no penúltimo capítulo do romance.

Esta leitura crítica não questiona o valor literário do romance nem a

genialidade de Alencar, mas, tão-somente, questiona a legitimidade do

nacionalismo e do indianismo apresentados no romance. Presta-se tal leitura

ao exercício reflexivo do processo ensino-aprendizagem, especialmente, no

nível intermediário escolar. Serve como mais uma estratégia de leitura ou

releitura de obras de nossa literatura. Favorece ao aluno tornar-se mais do que


26

um codificador de palavras, de frases, de parágrafos, possibilita-o tornar-se um

leitor perspicaz da literatura brasileira.


27

BIBLIOGRAFIA

ALENCAR, José de. Iracema. 8a edição, São Paulo, Ática, 1978.

RIBEIRO, Luís Felipe. Mulheres de papel: Um estudo do imaginário em

José de Alencar e Machado de Assis. Niterói, EDUFF, 1996, p.217 – 226

SANTIAGO, Silviano. Iracema, o coração indômito de Pindorama in Mota,

Lourenço Dantas & Abdala Júnior, Benjamin (org.) Personae: grandes

personagens da Literatura Brasileira. São Paulo. Editora Senac, 2001.

SODRÉ, Nelson Werneck. A ideologia do colonialismo: José de Alencar, a

ficção numa sociedade escravocrata. Petrópolis: Vozes, 1984.

___________História da literatura brasileira. Rio de janeiro: Civilização

Brasileira, 1976.

 
28

You might also like