You are on page 1of 17
PCE RTC CMA ICM rec | yA Diaspora Africana Crete CeCe Pe cr) (ALENT, Waldemac, Surv dato bis ty Nok ds Brit Daan: Cente det Hass Bees Ae mericaines, 1969. (Universite de Dakar, 9). 4 WESTERMANN, Dietrich. study of ‘ University Press, 1930, ice ei ine Loan: Oxford Univer Prag 1952 EW treed Aan he N ithe Ngee Ind, Tops UNS Conference, 1997. p, 544-553, ia pobreza sincea no ‘As vozes centro-africanas no Atlantico Sul (1831-1850) Marcos Abreu Leitio de Almeida Unicamp/Fapesp Que tinguas os aftcanasfalam wo Rio de Jancirot! British Parliamentary Papers, 1849 pergunta da epigrafe foi feita a Lord Howden, no Patlamento britinico, em 1849, Howden foio repre inglés no Brasil no fim da década de 1840, em meio io do “tifico da escra- wentant is pres vatura” © a0 intenso contrabando negreiro que apiahou de britinieas para a abol jyentes 08 portos clandestinos ¢ as praias brasileira, pontos ‘le desembarque para o que entio passava a ser compreen- 12 SAMARIN, William, Language in the colonization of Cental Arica, 1880-1900, 15 Ibid, 4, As linguas centro-africanas no sudeste do Brasil Nas décadas de 1830 e 1840, os centro-aftieanos, embar- cados involuntariamente ¢ ilegalmente jogados nas senzalas das grandes fizendas do sudeste brasileiro, encontravam ‘uma situagio social e demogrifica capay. de sustentat a esta- bilidade de comunidades de linguas africanas até o final do trifico negreiro. A recente produgio historiogrifica estabeleceu © padtio demogrifico da relagio entre livres ¢ escravos na provincia do Rio de Janeiro c na Corte Imperial. Como mostra Luiz Carlos Soares, 0 desequilbrio entre livres © escravos. era vvivenciado de forma intensa na Corte Imperial, onde 41% da populagio era propriedade de outrem.* Pasa o Vale do Paraiba, Ricardo Salles mostra que a populagio de escravos suplantava a quantidade de pessoas livres, ¢ 80s muni pios de Valenga e Vassouras, 0 coracio da economia cafe- ira, chegavam a 70% da populacio total. Além disse, na regio, a populagio eserava cra majoritariamente africana: pot volta de 1840, cerca de 74% dos cativos eram africanos ilegalmente escravizados. im meados do séeulo XIX, por tanto, a escravidio no sudeste brasileiro era majoritariamente formada por afticanos e, entres estes, a maioria esmagadora era de centro-africanos. Sobretude, como argumenta Robert Slenes, as baixas taxas de manumissio nas grandes propriedades, principal- mente em comparacio is pequenas propriedades, nfo eram suficientes para gerardivisdes intemnas nas senza que tefl firiam a competigio em busca das recompensas senhoriais ‘Ao contritio, em uma senzala formada sobretudo por cen- tro-afticanos recém- chegados, a percepeiio das dusas condi- bes em que viviam, aliada a baixa expectativa de reeeberem a.alforva, levaria 0s escravos a apostarem em uma formagio de identidade conjunta altamente faclitada pelo comparti- Thamento de tradigées culturais ¢ visoes cosmolégicas. 4ASOARES, Luiz Carls. 0 “pov de Cam na Capita do Bras. 43. 45 SALES, Ricardo, » Vah er nna, p. 181-182 INES, Robert. A ‘Great Arb” desiring Dessa maneira, qual era a situagio sociolinguistica desse contesto demogritico ¢ social? Em 1847, Caetano Congo foi apreendido nas raas do Rio de Janeiro por um policial por ser suspeito de ser opal, Ele trabalhava no interior como tratador de cavalos, « talvez tenha fugido para a corte, como estratégia para se cevadir do eativeito, Segundo a lei de 1831, a nto proficién- cin do africano na lingua portuguesa era a principal prova de que ele fora recém-importado, e, portanto, considerado ileyalmente esctavizado, tendo o direito, entio, de ser con- sidcrado um afticano livre, Tal seria 0 caso de Caetano, nas, 20 meio do proceso, seu ptetenso senhor, até entio ‘lesconhecido, reclamou 0 aftieano como sua propriedade © pediu a anulagio do processo. Ao justficar a ruzdo pela «jut! Caetano no sabia falar bem o portugués, o advogado do senhor explicou que Seo pretoé anos atilad, on algun tanto enararado wo falar, (sso no seria para admirar em wom proto habituade constande- ‘vente ao servigo da roa, ¢ mito mats sido eh da nagio que € donde os mesmoas acerca dor quaic no sd eontesayao sobre 6 pom de baverem sido inportados en 0 tempo Ueto cna fomaram bem a Haga, coma ainda Boje a cada paso se td vendo par esta cidade: au Ao defender 0 diteito de posse sobre Caetano Congo, 0 sulvoxado no apenas relaciona a dificuldade na aquisigao da Jinja portuguesa no meio rural como associa essa dificul Ale especialmente a uma nagio, os congas. Conquanto o tes- Iymunho do advogado de um senhor que busea a reeseravi suipio de um afrieano seja suspeito, € interessante notas agi 1 simples possibilidade de este argumento ser vezossimil o Aificiente para compor uma defesa. Afinal, a argumentacio & ncaa po pro enconto nos navos preenidos ln comissio mista Thin ce Janczo, Corte de Apelagio, Revista Civel, pocesso nimero ‘is 1.694, 1846 (Arquivo Naciona). Assim, subjacente a retorica do texto do advogado, encon- ‘ramos nfo uma mentira descabida, mas uma realidade con- veniente para see utilizada pelos senhores de escravos como um abrigo retérico para suas priticas de escravizacao ilegal Desa maneira, 0 argumento senhorial de que os africanos congos que trabalham na roga no aprendem bem a lingua portuguesa nao deixa de ser também uma fenda no texto através do qual o historiador entrevé uma comunidade de fala que prescinde da lingua senhorial para se comunicar, em tum ambiente absolutamente africanizado, com uma maioria centro-alricana.** Nesse sentido, niio surpreende, portanto, ‘que os funcioniios do Império, cujo papel era averiguar se co africano havia chegado mesmo depois da lei de 1831, eom- partilhem a crenca senhorial, declarando Caetano “ladino, posto que respondia atrapalhadamente as perguntas «ue se hes fez, mas isto dvido a sua lingea, por isso que os pretos congo quase que pouco falam desembaragado”.” Assim, também nfo surpreende a defesa de Jonquim José de Souza Broves,” famigerado contrabandista de africanos € proprietirio de fazendas de eafé no sudeste brasileiro: quando o Império do Brasil invadiu suas terras na ilha da Maeambaia por suspeitas de trifico negreiro, e a diligéncia apreenden 199 africanos bocais, 0 “rei do café”, como entio ppassom a ser conhecido, defenden-se no jornal: Com que justiga me arrebatou esses eseravos, 86 porque ‘io sabiam bem falar 0 idioma portugués? Pois SS. que tem estado em favendas ignora que ha pretos que em pouco tempo 0 aprendem, ¢ outros que ainda com 30 anos de casa no falam cousa alguma que se enten bois ningun ignora que non afrcano que dega as nossas faendas € lego mete no meio dos outros os trabalbos da avonra, flando apenas com um jeitor que os dre, que quase 448 Sobre a rela entre retirica e prova ef. GINZBURG, Carla. Re lope de fog: 49 Rio de Jancito, Corte de Apelagio. Revista Ciel, peocesso nimero 20, 50_Ver artigo de Hebe Mattos, Martha Abreu e Patricia Brandio Couto, “O meu pai conta”, 277 deste lvro. sempre se escolbe da mesma nagao para se entenderim equ por iso Hes teva amito tempo a aprender 0 nosso idioma [ (Grito mew) Da mesma forma que 0 advogado do senhor de Caetano Congo, © testemunho de Breves relaciona a demora em aprender a fingua portuguesa & presenga de uma comunidade sle fala na senzala, como uma estratégia para escamotear sua AnuseRo como contrabandista. Essa “verdade conveniente” 6 sinda enunciada de forma mais clara: o texto de Breves ponta no apenas para a relagio entre a nagio do africano 4 sua capacidade de se comunicar com seus iguais, como inclica 0 crtério de elegibilidade de feitores baseado em uma Vinygua africana capaz de ser compreendida por toda a comu- nvilade dle uma senzala Como estamos observando, em torno de 1850, a maciea importagao de afticanos durante 0 contraband de escravos apenas formou uma maios cesmagadora de africanos nas senzalas, em detrimento daqueles nascidos no Brasil, como 0 padeao desse trifico trouse para o Império africanos contro-oeidentais com amplas semelhaneds linguisticas. No contexto rural, sobretudo nas areas de plantation, com poueas chances de mobilidade social, a lingua franca quicongo- quimbundo-umbundo teria sido a principal forma de coma nicagio entre os escravos, adiando a aquisicio por individuos «hy lingua senhoria, enquanto os africanos de procedéncias diversas, a8 minorias, teriam sentido a necessidade de no lin «la maioria de seus companheiros de eito. A possibilidade de um feitor digit uma eseravaria em uma lingua centro- uiricana, neste sentido, é bastante verossimil as adquitira lingua dos senhores como também a Podemos concluir, portanto, que, diferentemente do que pensavam Lorde Howden e Mary Hunter, 0 impacto lo trifico ilegal de escravos nao apenas reforcou a estabi- lidade de uma lingua franca baseada no quicongo-quim- 5 BREVES, Joaquim José de Sousa, Negécios da Marambain. Jornal do Conomeo, 6 mat. 1881 100 bbundo-umbundo, que continuou a servir de cédigo seereto € simbolo de oposicio dos eseravos centro-afrieanos a0s seus ‘senhores, como também, em Face do peso demogritico dos ‘eseravos afrcanos nas senzalas€ da predomindncia dos cs tro-africanos entre eles, essa lingua, enquanco dina franc, ppassou a viabilizar a comanieagio com o pequeno grapo de afticanos ocidentais ¢ com africanos orientais, adquisindo também, nos anos finais do trificoilegal de escravos, a fungi de lingua de trabalho nas senzalas do centro-sul brasileiro Referéncias documentais Arquivo Nacion: 1) Anditoria Geral dt Masih - microfine: AN 1500-2000 Macaense 2) Supremo aba de Jssiga ~ precnsio do aficano bogal Caetano Congo (AN, Cone de Apelasio, (Cala 3694, processon" 20, ano: 1846) Arquivo Hist ico do Ttamarai ‘Comissio mista anglo-bexseia (process de Navios Lata/Mao) Canine (313) rian 4/3) Carlin (6/2) ite 10/1) Diag de Bonga (12/1) Espen (14/1) Fal (15/1) Orin 25/1) Referancias bibliogrsficas ALMEIDA, Marcos Abreu Leitio de. Ladies 0 regime de lingans do contraband de afieanos (1831-<1850)- Campinas, 2012. Dissertagi0 (Mesrado em Hlstsa)— Universidade Estab de Campinas BROADHEAD, Susu Hedin, Beyond deen: the Kingdom of dhe Kongo in the eighteenth and nineteen cenecies. Th Intron Jura of "Aficon Hird Stal, Boston, ¥ 12, 9-4 p 615: 650, 1979. CANDIDO, Macana. Enulong fotos slavery, trade and identity ia “Benzuel, 17B0-I850e. Toronio, 2006. Tese (Doutorado em Hist) ‘York Universi CANNECATIM, Bernardo Maria, Calgao de abenoiergramaiais sobre a Ving bands ov anu Lisboa: loprensio Régi, 1805. CONRAD, Robert. Tabi oeitieo de esravos para. o Bra So Pale: TBntsiens, 1985, “CURTIN, Philip D; VANSINA, J1a. Sources of the nineteenth centiey "Anan lave ade, Tb Jonna of fan Histy (SU) x 8,2, 185: 208, jan, 1964 DIAS, il, Novas identidades afeanas cm Angola no contexto. do ‘comérco atinica Ine BASTOS, Cristina; ALMEIDA, Miguel Vale des EELDMAN-BIANCO, Bela. Taner alii dilogos exticos iso bears. Campinas: Ed, Unicamp, 2007. p. 315-343. [EL:TIS, Davi etal Te wth ao tral database, Dsponivel ems we slavewoyagesorg Acesso ent 18 mao 2011 FARIA, Jaana Barseto; SOARES, Carlo Buginio ano; GOME ‘Sans. Nolan dis nyo aficanos ekletidaes 9 Rip de Janeito, seco XIX. Rio de Janceor Arquivo Nacional, 205, FERREIRA, Roquinaldo Ferrciea, Dor vertcs av Atlante eifco Hea ide eacravon e comércio eto em Angola, 1830-1860. Rio de Janet, 1096. Disestagio (Mestrado em Historia) ~ Universidade Federal do Rio de Janina. “The suppression of che slive mde and sive departures from [Sio Leopoldo}, & 15, 0.1, Tragola, 1B3s- 1860s. Histrie Unis, 3-13, abe 2011 VLORENTINO, Manolo, Ea aadar ngs ma historia do eifcoalinico (je eseravos cotze x Aca 0 Rio de nei, séulos XVII e XIX. So Paulo: Companhia das Vetras, 2010. GINZBURG, Cathe. Rodger de foe histrin, rerricn, prova. Sto Pass ‘Companhia das Letras, 200. HAIR, RELH. Colonial Freetown andl dhe study of Aican languages. Afi joural of the lnterrational African Instute, [SU w 57, 2-4 ps 56h 565, jan. 1987 ARMS, Robert W Rio wea nar rae de Central Zit Bsn in hee ff theives 150-1891, New Haver: Yale Uns Pres 198 ORNE, Geral, Olas stun os Pstados Unidos, Brasil 0 tiico ile esennvosaficanos Sio Paulo: Companhia das Letzas, 2011 KARASCH, Mary C, ie dy ecraes no Rio de Jai (1808-1850). So ‘Paulo: Coropanbia das Letras, 2000. JORNAL do Commetcin. Rio de Jancc,few-mat: 1851. CLARA, Sihin HL Lingaagem, domiaio senhorial ¢ idntidade étic, tn DASTOS Cristina, ALMEIDA, Miguel Vale de; FELDMAN-BIANCO, lo, Tans wna dilogosexicoshuo-beasilizos, Campinas; Fa Uinicamy 2007, RWIS, M. Paul (Ed). Eidmolgu: languages of the word, Sixteenth ved, Dalits: SIL Intemational, 2009. Online version: . MILLER, Joneph C. Wey of deat merchant capitalism an the Angolan Slave ve, 1730-1830, University of Wisconsin Press, 19%. TN Alsen central durante a era do comércio de escravizaios, de 7460-1880. in: HEYWOOD, Linds M. (Ong). Disipors ma ne Bras ‘Sto Paulor Contexto, 2005. SSALLES, Ricardo FE 6 Vale om oer: Vassouras culo XIX, Senbores € ‘ecenvos ao earns do Impéio, Rio de Janel: Civizagio Brasilia, 2009, SAMARIN, Willan. Language inthe colonization of Cental Aico, 1880- "1908, CadonJouva of Aion Studs Rete Cadiant Des Ets Apia, 23, 232-249, 198. SILNFIRA, Renato da, Nagio aficana no Basil esravisas problemas Tedricosewetodgeos, fins, 38, p 245-301, 208, SSLENES, Rober. “Malang, Ngom Ver! Affca cobertae deseoberta 0 Brit”, REVISTA USP, So Paul, x 12, p 48-67, 1992 'A grande greve do crinio Tocusi espirito das Aguas centro WHlcaas idemtidade escrava no inicio do século XIX no Rio de Jancit. In: HEYWOOD, Lika M. (Oxy). Dior naa no Brad Sto Palo: Context, 2005 ™ Tay yerho de muito long, ea vealo exvand':jongueiroscumba a venvala cenwo-afecana, In: LARA, Silvis, PACHECO, Gustav, ‘Meni de jong a8 gavage histtcas de Saley J Stein, Vassowra, 109. Rio de Janene: Folha Seca, 2007 arbre Neanla replant: cakes eaflition kongo et identi des claves de plantation cans eBrési dy Sexl-Est entre 1810-1888, Cais ‘de Bai! Govemors, Pais FHIESS, 2.67/68, p. 217-313, 207. se Saine Anthooy ache esssroadsin Kongo and Bra: ‘relization and identity polities in the Black south Adantic, Ca, 1700/1850. ts BARRY, Boubacag SOUMOUNNI, Fé SANSONI, Livia. Aig ‘Bret and nin of rata ide, (SL: Aen Week Press 208, Git Arsh” deeming, ancision rates, subalten soci Tmbiity and slave ana free) back wdenttes in southeastern. Bra, 1790-1888, (Testo inéito} SOARES, Luis Catlos. O ‘par de Cam’ na eital do rast a escensiio urbana no Rio de Janeiro do século XTX. Rio de ance: 7 Ltrs 2007 “SOARES, Mariza de Carvaa. Dar ds cor entidadeétnica,religosidade ‘eescrvdo no Rio de Jair, sévalo XVII. Rio de aneito: Ciizagion Basen, 200. THORNTON, John. As guerns cv n0 Congo € otrifico de eeeneos & histnn ea demogeafia de 1718. 1844 sevstadas Ector r-Asitins, Rio de Janct, x 32, . 55-74, dex. 1997 A Ai tains frmes co and Adin, 1400-1800. Ba. lecver, 2004, ‘Central Atican eames and Afea-Amesican naring patterns, The Wa ad Mary Ona, 50.4, p 727-742, 1993. \VANSINA, Jan. Pormguese vs Kimbundu: language wse in the colony vot Angola (1575-1845). Balkin a Seances Acne Rye de Siu (POum: Mir Mededelingea dee Zitingen- Koninke Academie voor ‘Overzeese Wetenchappen [Sle Sa, 47, p. 267-281, 200 How sce ae hr goneconnee ia West Centeal Afica before 7ai0, Charlonesville,Univescy of Virginia Press, 2005 King of te svc. Te Universi of Wisconsin Press, 1970. \IFIRA- MARTINEZ, Caroline. Bug Kimani language commoaniy Tecomiered ia West Centtal Afvica, c 1500-1750. Los Angeles: oiversity of Califoenia, 2006 03

You might also like