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ANTOLOGIA Nº 1
1993
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Direitos autorais reservados para
ACADEMIA ITAPECERICANA DE LETRAS E CULTURA
Organizadora
CÉLIA LAMOUNIER DE ARAÚJO
Coordenação Editorial
PROF. ALBERTO LIBÂNIO RODRIGUES
(Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais)
Revisão/copidesque
. Organizadora
. Equipe do CMC
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SUMÁRIO
ESTATUTO AILC 9
SÓCIOS E PATRONOS 15
ITAPECERICA 18
OS COMPADRES 22
MUNICÍPIOS 28
AUTOS DE CRIAÇÃO E ABERTURA 29
COMBATE DO CAJU 30
VIAGENS DE SAINT-HILARE 32
ITAPECERICA – 200 ANOS 36
A COMARCA – JEFFERSON RIBEIRO FILHO 37
DOM ANTÔNIO CARLOS MESQUITA 41
CÉLIA LAMOUNIER DE ARAÚJO 47
DJALMA TEIXEIRA DE OLIVEIRA 73
FRANCISCO BARBOSA MALAQUIAS 76
JOÃO PEREIRA DA SILVA 78
JOSAFÁ DA COSTA MESUITA 79
JOSÉ LOURENÇO DE SIQUEIRA 85
LEVY ANTÔNIO BEIRIGO MALAQUIAS 101
LINDOLFO PENA PEREIRA 118
MARINA COUTO 127
RAYMUNDO NONATO DE ARAÚJO 133
ROBERTO GOMIDES 153
DOM SEBASTIÃO ROQUE RABELO MENDES 158
AITA 163
SEVERO AUGUSTO RIBEIRO 164
MAJOR ZIRICO 170
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DEDICATÓRIA
O amor por nossa terra natal nos levou a empreender este despretensioso trabalho
pois acreditamos no ensino e na memória popular.
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ACADEMIA ITAPECERICANA DE LETRAS E CULTURA
Criada em 29.12.80 – Utilidade Pública Lei 1016/86
35550-000 – Itapecerica-MG – CNPJ: 20.896.999/0001-06
Reg. Cartório de Títulos e Doctos. sob nº 57.9/10/81
1ª Diretoria: 1980/85
Presidente – Roberto Duarte Gomides
Secretário – José Lourenço de Siqueira
Tesoureiro – Severo Ribeiro da Silva
Sócios fundadores – 16
2ª Diretoria: 1986/88
Presidente – Célia Lamounier de Araújo
Vice-pres. – Roberto Duarte Gomides
1º Secretário – Lindolfo Pena Pereira
2º Secretário – Carlos Mesquita Maia
Tesoureiro – Levy Antônio Beirigo Malaquias
Conselho Fiscal:
José Lourenço de Siqueira
Francisco Barbosa Malachias
Tereza Tuffi Amin Batista
3ª Diretoria: 1989/93
Presidente – Célia Lamounier de Araújo
Vice-pres. – José Lourenço de Siqueira
1º Secretário – Jorge Malaquias do Couto
2º Secretário – Severo Ribeiro da Silva
Tesoureiro – Carlos Mesquita Maia
Conselho Fiscal:
Jefferson Ribeiro Filho
Lindolfo Pena Pereira
Roberto Duarte Gomides
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A PALAVRA DO EDITOR
Prof. Alberto Libânio Rodrigues
Diretor de Editoração do CMC*
e membro do Instituto Histórico
e Geográfico/MG – Cadeira nº 46
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ESTATUTO
Capítulo I
DA ORGANIZAÇÃO E OBJETIVOS
Capítulo II
DO QUADRO SOCIAL
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nascidos em cidades mineiras, um por um município de origem, que por seus trabalhos se
comprometa a engrandecer Itapecerica e auxiliar na realização dos objetivos da entidade.
Capítulo III
DOS ÓRGÃOS
Seção I
Da Assembléia Geral (AG)
Art. 12º - Fica convocada para o dia 29/12 nos anos pares, uma AG Ordinária para
eleição de Diretoria, verificação e apreciação das contas e patrimônio, estudo do
procedimento de membros e da entidade.
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Seção II
Do Conselho Fiscal
Seção III
Da Diretoria
Art. 17º - A Diretoria eleita em AGO no dia 29/12 dos anos pares será responsável
pelos destinos da entidade durante dois anos e se comporá de: presidente e vice-presidente,
secretário e 2º secretário, tesoureiro e 2º tesoureiro.
Art. 18º - Compete à Diretoria:
a – cumprir e fazer cumprir este estatuto;
b – encaminhar relatórios, convocações e correspondências;
c – dar posse em reuniões festivas aos novos membros;
d – deferir a demissão requerida por membro que ocupe cargo, designando outro no
prazo de 10 dias, bem como licenciar membros por motivos imperiosos;
e – fazer cumprir as decisões de AG e do Conselho Fiscal;
f – organizar e trazer em dia o Livro das Efemérides; álbum de recortes com notícias
sobre a entidade, seus membros e trabalhos.
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g – empossar novos membros responsabilizando-se pelas assinaturas do
compromisso no Livro de Ouro e diplomas;
h – admoestar por escrito o membro cujo procedimento incidir no art. 9º e 22, no
prazo de 10 dias, e oficiar punições ou desligamento resolvidos pelo Conselho Fiscal,
conforme art. 16, letra c, mesmo prazo.
§ 2º - Compete ao Secretário:
a – redigir imparcial e minuciosamente os fatos em atas;
b – organizar e distribuir a correspondência, responsabilizando-se pelo arquivo
cronológico em pastas de “expedida” e “recebida” mantendo contato mensal com todos os
sócios através de circulares;
c – trazer assinados os livros de Presença e Atas.
§ 3º - Compete ao Tesoureiro:
a – responsabilizar-se pelos valores recolhidos, depositando-os em conta bancária da
entidade, movimentando-a em conjunto com o Presidente;
b – apresentar o Relatório Anual com balancete de Receitas e Despesas de acordo
com recibos numerados, cheques e notas fiscais, com base no orçamento aprovado;
c – assinar com o Presidente cheques e documentos para movimentação de recursos,
assumindo pessoalmente dívidas feitas sem autorização;
d – cobrar, receber e dar recibos das mensalidades, subvenções e doações,
computando-se nos livros próprios.
§ 4º - Compete ao Bibliotecário:
a – organizar, zelar e dirigir a biblioteca e arquivo;
b – registrar todas as doações e aquisições por ordem cronológica, anotando nomes,
datas e números sobre doações, doadores ou notas de compras;
c – manter livro de carga e descarga dos volumes, fitas e bens manuseados
exclusivamente pelos membros.
Capítulo IV
DAS FINANÇAS E PATRIMÔNIO
Capítulo V
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
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b – Acadêmicos efetivos: ser votado para cargos de Diretoria e Conselho Fiscal,
todos os demais direitos abaixo;
c – Acadêmicos correspondentes: ocupar cadeira patronal por escolha ou indicação
da Diretoria, demais direitos abaixo;
d – Membros Honorários: candidatar-se ao cargo de tesoureiro, se desejar, todos os
demais direitos abaixo;
e – Membros beneméritos: fazer uso da palavra em reuniões festivas e demais
direitos abaixo;
f – Todos os membros: participar de reuniões, votar e opinar em AG, requerer ao
presidente votação de assuntos conforme art. 13, defender-se por escrito quando acusado,
usar da Biblioteca para si e para outros e ainda vetar, por opinião única, a dissolução da
entidade.
Art. 23º - A eleição de Diretoria e Conselho Fiscal será feita cargo por cargo, a
critério de cada membro que votará, se quiser, em alguma chapa apresentada.
Parágrafo único – Em caso de empate, ocupará o cargo aquele que foi empossado
primeiro.
Art. 24º - As cem cadeiras criadas por este Estatuto terão sempre o nome de
itapecericanos falecidos, seguindo-se o nome dos ocupantes vivos pelo tempo de posse,
relembrados em saudação pelos novos ocupantes.
Art. 25º - As cem cadeiras patronais citadas serão assim subdivididas, atendendo à
aptidão dos futuros membros:
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de trinta e um a quarenta – Comp. Musical e Pintura;
Art. 27º - A sociedade entrará em liquidação somente por decisão unânime, pessoal
e escrita de TODOS os sócios em Assembléia Geral.
Art. 28º - Os membros da diretoria e Conselho Fiscal não serão remunerados pela
sociedade.
Art. 29º - A sociedade não distribuirá a seus sócios qualquer parcela de seu
patrimônio ou rendas que venha a possuir.
Este Estatuto entra em vigor na data de sua aprovação, sendo registrado em Cartório
da Comarca de Itapecerica. Janeiro de 1981.
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AILC – SÓCIOS E PATRONOS
Dr. José Lourenço de Siqueira – Cadeira nº 01-F
Seção de Letras Jurídicas e Oratória
Patrono: Waldemar Malburges de Oliveira
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Dr. Carlos Mesquita Maia – Cadeira nº 12-F
Seção de Línguas – Patrono: Bento Ernesto Júnior
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Dr. Fábio Antônio Coutinho – Cadeira nº 43-E
Seção de Jornalismo
Patrono: Mons. Otaviano José de Araújo
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Brasão
Desenho de José Maria Guimarães
idealizado por CLA
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ITAPECERICA
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pediu e obteve do governador ordem ao Bispado, no sentido de que o vigário encomendado
de Tamanduá desistisse de seu emprego e todos os moradores obedecessem a ele, Pe.
Toledo. Depois disso, dirigiu-se a Tamanduá, em companhia do Juiz Ordinário da vila de
São José. Chegaram os dois, hospedaram-se e trataram de dormir. Mas não dormiram.
Durante a noite, fizeram-se ouvir gritos de protesto, tiros, uma barulheira infernal; e, a
verta hora, apareceu debaixo da porta do quarto do Juiz Ordinário uma carta,, intimando-
o a sair cedo do arraial, pois, do contrário, o vigário iria assistir ao seu funeral. O juiz
não se intimidou e não saiu. No dia seguinte, pela manhã, dirige-se Pe. Toledo à igreja,
que encontra fechada; e ninguém dava notícia das chaves. A quase totalidade da
população saíra do arraial. O Comandante Inácio Correia Pamplona, depois disso,
escreveu ao governador, reclamando providências do governo. Era o protetor do vigário,
que ali, não pudera exercer seu ministério. No ano seguinte, 1783, usando da faculdade
concedida aos vigários da vara, o vigário de São José nomeou o Pe. Lourenço Pinto
Barbosa como capelão, o Comandante e Mestre de Campo Inácio Correia Pamplona
escreveu ao Comandante de Tamanduá, capitão José Pais de Miranda, ordenando que
facilitasse a posse do novo capelão. Chegou o Pe. Lourenço. Mas o capitão Miranda
alegou que havia perdido as chaves da igreja. Durante dois dias procurou-se inutilmente.
Pe. Lourenço teve ímpetos de mandar arrombar a porta da igreja; mas examinando o
ambiente em que se encontrava, julgou mais prudente não o fazer. Afinal, desiludido,
retirou-se de Tamanduá, segundo ele próprio declarou em carta a Pamplona, “antes que
façam alguma desatenção”. Foi então o próprio Pamplona a Tamanduá, abriu inquérito e
expulsou do arraial três elementos dentre os que julgou mais responsáveis pela resistência
popular: Antônio Rodrigues Azambuja, Custódio José da Silva e João da Silva Pereira. O
comandante do distrito de Desterro, a pedido de Pamplona, também esteve em Tamanduá,
numa tentativa de conciliar a situação. Tudo inútil. O bravo povo de Tamanduá não se
submeteu. A carta que o Mestre de Campo remeteu ao Governador constitui verdadeira
catilinária contra o povo de Tamanduá e seu padre; e terminou com estas palavras: “Eu
considero estes padres do Tamanduá (referia-se ao Pe. Gaspar e seus capelães) e seus
arrabaldes como jesuítas com os índios nas missões”. Na época da terrível perseguição
aos jesuítas, o que ele achou de mais forte para jogar sobre o Pe. Gaspar foi o nome de
jesuíta. O Comandante de Tamanduá, cap. José Pais de Miranda, por sua vez, escreveu ao
Governador; sua carta é um libelo contra Pamplona; declarava que Pamplona estava
avançando demais em suas atribuições e que Tamanduá estava fora de sua regência.
Cônego Trindade faz referência ao requerimento do Pe. Correia de Toledo ao Bispo,
acrescentando o ilustre historiador que nada mais encontrou sobre o assunto. Pois bem, a
disputa terminou com a mais completa vitória do bravo povo de Tamanduá. Não ficaram
inativos os moradores. Dirigiram seus apelos ao Bispo e pediram sua proteção a favor do
antigo vigário, Pe. Gaspar. E, num dos avulsos do Arquivo Público Mineiro, encontra-se
um documento assinado pelo Vigário Geral do Bispado, Cônego Dr. Francisco Pereira de
Santa Apolônia que, mais tarde, como vice-presidente da Província, esteve por duas vezes
à frente do governo mineiro. Com data de 17 de novembro de 1783, determinava: “mando
a qualquer oficial da justiça do Distrito Eclesiástico que, em cumprimento deste, indo por
mim assinado, a requerimento dos fregueses de Tamanduá, notifiquem ao Revmo. Vigário
da freguesia de S. José, Carlos Correia de Toledo, e seu coadjutor, operário Lourenço
Pinto Barbosa, para que, no termo de oito dias, exibam no juízo geral e contencioso desta
cidade os despachos que obtiveram do mesmo juízo, e ainda de S. Exma. Revma. depois de
que, posta em juízo a ação pendente entre os mesmos padres, sem a suspensão de posse e
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execução dos acórdãos da Coroa, por certidão e Cura paroquial na forma referida nos
mesmos Autos, pena de se julgarem nulos e de nenhum efeito”. A freguesia foi elevada a
colativa, por alvará de 1780. Atendendo a insistentes requerimentos dos moradores, o
governador Visconte de Barbacena resolveu a 20 de novembro de 1789, criar vila, na
freguesia de S. Bento do Tamanduá. E, a 18 de janeiro de 1790, o Dr. Desembargador
Ouvidor Geral e Corregedor Luís Ferreira de Araújo Azevedo, em nome do Governador,
erigiu o arraial em vila, com as solenidades de estilo, levantando o pelourinho na Chapada
do Morro, da banda do Sul, por detrás da Igreja Matriz. A primeira Câmara
imediatamente eleita pelos homens bons e pela nobreza, compunha-se de Domingos
Rodrigues Gondim, Juiz Ordinário Ten. Bel. João Pinto Caldeira, Antônio Garcia de Melo,
José Joaquim Carneiro, José Ferreira Gomes e Antônio Joaquim de Ávila. Nos primeiros
anos do século passado, o município de S. Bento do Tamanduá abrangia enorme área:
Bambuí, Piuí, Formiga, Candeias, S. Antônio do Monte, Campo Belo, Luz, S. Roque,
Carmo da Mata, etc. Eram ao todo, 34 distritos, incluindo o do arraial velho, nome com
que ficou sendo conhecido o povoado primitivo, pois a vila desenvolvera-se ao redor do
pelourinho.
O povo de Tamanduá sempre foi valente e brioso; por ocasião da guerra de
independência, em janeiro de 1823, mandou para a Bahia substancial auxílio: novecentos
e vinte e nove mil e novecentos réis, importância obtida em subscrição popular, logo
depois de instalada a vila, é ali iniciada a construção de novo e grandioso templo. Mas...
ficou anos, nos alicerces. Só depois de uma visita pastoral, com um apelo do Bispo,
animou-se o povo a terminá-la; e, em 1853, estava recebendo o telhado (Avulsos A.P.M.).
***
Formação Judiciária:
Tendo a Câmara de São José d’El Rey tomado posse do arraial em 1744 passou a
pertencer à Câmara do Rio das Mortes. Por ocasião da criação do município e vila em
20.11.1789 passou a ser sede do Termo da Comarca do Rio das Mortes e somente em 1839
foi criada a Comarca do Rio Grande que abrangia Tamanduá, Formiga e Oliveira, mas
nesta época o município tinha ainda muitos distritos. Em 1872 passou a ser sede d Comarca
do Itapecerica.
“Quanto menos tempo decorrer entre o crime e a pena, maior a certeza no espírito do
povo de que não há crime sem castigo.”
“A punição serve de freio aos celerados.”
(C. Beccaria)
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OS COMPADRES
O sertanista Antônio Afonso Lamounier entrou com Inácio Pamplona nos sertões do
Tamanduá em 1765, obtendo sesmaria na serra da Marcela em 1767. Tornaram-se
compadres, em virtude de ter sido Pamplona honrado para ser padrinho de sua filha Ana
Luiza, batizada em Lagoa Dourada, nesse ano de 1767.
Era licenciado em cirurgia, função que viria exercer, mais tarde, o filho homônimo, o
capitão Antônio Afonso Lamounier.
Ao que parece, este compadresco entre o velho Lamounier e Pamplona teve certa
influência na formação, ou melhor, na criação da vila de Tamanduá. Lamounier foi o braço
forte do “conquistador do Oeste”. O visconde, ao resolver “criar uma vila na Conquista do
Campo Grande e Picada de Goiás”, o fez atendendo a reivindicações dos dois sertanistas.
***
Nada nos garante vencer mas devemos lutar por nossos ideais.
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MUNICÍPIOS
VOCÊ SABIA?
Que em 1881 foi publicado um livreto de 12 páginas sobre nossa terra? Chamava-se
“Memórias sobre o município de Tamanduá, província de Minas Gerais”. Organizadas e
descritas por Marciano Henriques de Araújo, presidente da Câmara Municipal de
Tamanduá, e oferecidas à Biblioteca Nacional para figurar na Exposição de História e
Geografia do Brasil no Rio de Janeiro.
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AUTO DE LEVANTAMENTO E CREAÇÃO DE SAM BENTO
DO TAMANDOÁ
“Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Crispto de mil setecentos e noventa
aos dezoito dias do mês de Janeiro do dito anno neste Arrayal de Sam Bento do Tamandoá
minas e comarca do Rio das mortes onde veyo por ordem do ilustrisimo e Excelentisimo
Visconde de Barbacena, Governador e Capitam general desta capitania das minas geraes,
o Douto Dezembargador Luís Ferreira de Araújo Azevedo profeso na ordem de Crispto, do
Dezembargo de Sua Magestade Fedelisima que Deus goarde, e ouvidor geral e Corregedor
da dita comarca com alsada no civil e crime, para effeito e Levantar a Vila o dito Arrayal;
e logo em execução da dita ordem que neste Livro se acha copiada a folhas huma, com a
instruçam na mesma mencionadas creou, e erigio em vila com todas as Solenidades do
estilo. Levantando Pelourinho no Logar que melhor pereseu a contento, e com aprovação
dos moradores dela, a saber na xapada do Morro que fica para a banda do Sul, por detras
da Igreja matris da predita Vila, por ser o citio maes Comodo, e capas o qual ele dito
Doutor Dezembargador apelideu com o nome de Sam Bento do Tamandoá, e mandou que
com este Titulo fose de todos nomeada e reconhecida, e lhe assinou por Termo todo o
terreno, da parte do termo da Vila de Sam Jozé, que pertense a Freguezia desta dita Vila
de Sam Bento do Tamandoá, ficando servindo de diviza, e Limite entre hum e outro termo,
que divide as ditas duas freguezias o Ribeirão Lambary, athe onde desagoa no Ryo Jacaré,
e dahy em diante o mesmo Ryo Jacaré visto as Moradores, e vezinhos do Arrayal de Nossa
Senhora da Oliveira declararem que lhe hera mais conveniente ficarem no termo da dita
Vila de Sam Jozé. Como se ve do termo de sua declaraçam escripto neste Livro, e por eles
asignado retro, ficando no enquanto as mais confrontações, que servem ao dito termo da
Vila de Sam Jozé, na mesma forma, sem delas se desmembrar terreno Algum; e sendo pelo
dito Ministro examinado, e averiguado quaes herão os distritos, confrontantes com a Vila
de Pitanguy, em que se tinhão sucitado duvidas em prejuizo do Sucego, e tranquilidade dos
habitantes de hum, e outro Territorio, e vindo no conheçimento de serem as perturbações
ocazionadas por orgulho de particulares, que só servem de fumentarem discordias, e
diçenções; e atenta a ordem Regia datada em des de Janeiro de mil e sete centos e oitenta e
tres, que se acha registrada na Camera da dita Vila de Sam Jozé; ficase servindo de deviza
entre o termo desta Vilia de Sam Bento do Tamandoá, e o da dita Vila de Pitanguy, o
destrito chamado Calháo de Sinaque he huma lage, que fica vizinha ao Rio denominado
Pará, e segundo rumo direito par baixo da Serra negra a passagem velha do Rio Sam
Francisco, apelidado à Piraquara, e desta seguindo o mesmo rumo a Pedra Menina, e
dahy a Serra das Saudades, e no mesmo rumo seguir athe confinar com a Capitania da
comarca de Goyaz, asestindo nesta nova creação o Mestre de campo Regente destes
distritos Ignácio Correia Pamplona, como tambóm a Nobreza, e o Povo dela, e se levantou
com efeito do dito Pilourinho, e houve ele dito Menistro por erecta a dita Vila e para
Logradouros, e comodidade dos habitantes dela lhe comsedia e dito Ilustriçimo e
Excelentisimo governador, e Capitão general huma Sesmaria de meya Legua de terra e por
vertude da dita ordem criou os officiaes necessarios de justiça, comduçentes ao bom
regimen dela e mandou se procedeçe a eleição de Pelouros para os offiçiaes que homdem
servir em camera na forma da Ley, e de tudo mandou fazer este auto que asinou e eu João
Pedro Lobo de Araújo Pereira escrivão da ouvedoria geral que o escrevy – Luiz Ferreira
de Araújo Azevedo.
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AUTO DE ABERTURA DO PELOURO DAS JUSTIÇAS QUE NESTA
VILA ONDEM SERVIR O PREZENTE ANNO
Ilmº. Exmº. Sr. tendo levado ao conhecimento do Exmo. Sr. General das Armas
desta Província, e Commandante em Chefe das Forças Legaes, que dessa Capital marchão
sobre Queluz, e S. João d’El Rei, os acontecimentos mais notaveis depois da epocha em
que officiei a V. Exc., julgo de meu restricto dever leva-los também aos conhecimentos de
V. Exc. ora em que se me offerece a opportunidade de portador.
Depois que forão solemnemente repelidas as proposições absurdas, que o sedicioso
Dr. José Jorge dirigio as Autoridades desta Villa, (48) força foi dobrar de esforços, e
actividades nos meios de neutralisar os planos de aggressão, que por ventura tentassem os
sediciosos contra os Legalistas, sendo hum delles o distribuir Destacamentos por todos os
pontos mais transitaveis em direcção da Villa da Oliveira para esta, Villa Nova da Formiga,
Araxá, e Uberaba.
Ora tendo o Chefe dos sediciosos intimado que se não accedessemos as suas
pretenções até o dia 6 do corrente mez, como foi presente a V. Exc., certo seriamos
accommettidos, destaquei para a estrada do Areado, que da Oliveira se dirige para esta, e
Formiga, uma Força de 60 Praças commandadas pelo Alferes de G.N. Ladislao Ferreira de
Oliveira no mesmo dia 6, e decorridos cinco dias, eis que de improviso desfila a Força dos
sediciosos pela mesma estrada em numero, segundo hoje se sabe, de perto de 400, e ao
30
passar ao campo do Cajú, o Destacamento Legal, então constante de 30 Praças, por estarem
as outras dispersas por pontos visinhos, arroja-se denodadamente ao transito dos sediciosos,
e depois de vivissimas descargas e de fogo continuado por espaço de huma hora, os
inimigos virão-se na necessidade de retroceder em confissão, e debandada, deixando o
campo juncado de muitos cadaveres, treze ponxes, uma reuna, nove cavallos, e doze malas,
excepto outros muitos despojos, que forão extraviados, por se não poder explorar no
mesmo dia o campo por estar visinho a huma mata, em que se embrenharão os mesmos
sediciosos; o número dos feridos foi para mais de 40, sendo que da nossa parte, apenas
soffrerão levemente 3, que já se achão restabelecidos.
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Com essa Força marchou também o Juiz de Direito interino da Comarca do Rio das
Mortes (Manoel Antônio Fernandes) que se havia reunido aos Legalistas de Tamanduá
depois que a Cidade de S. João d’El Rei, e a Vila da Oliveira forão occupadas pelos
rebeldes.
Também acabo de ter certeza de achar-se ocupada a Cidade de Sabará por huma
Columna Legalista, comandada pelo Coronel Manoel Antonio Pacheco, que ali entrou entre
mil demonstrações de jubilo da população, que alguns dias estivera opprimida sob dominio
dos rebeldes.
***
32
TRECHOS DO LIVRO “VIAGEM ÀS NASCENTES DO RIO SÃO
FRANCISCO” POR AUGUSTO DE SAINT-HILAIRE
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO
Eu já disse que os lavradores da Comarca de São João del Rei eram mais
desleixados com suas casas do que os fazendeiros dos distritos auríferos. É evidente que
essa parte da comarca, mais afastada dos centros de civilização do que o resto da Província
de Minas, não constitui exceção. A propriedade de Cachoeirinha, situada um pouco antes
de Tamanduá, tem três léguas de comprimento por duas de largura. Vi aí uma quantidade
considerável de gado vacum, de porcos e de carneiros. Seu proprietário, o Capitão-Mor
João Quintino de Oliveira, vendera nesse ano, no Rio de Janeiro, porcos no valor de dois
contos de réis. Era um homem educado e cuja mesa atestava se sobra a sua riqueza. Não
obstante, a casa que ocupava era quase tão mal cuidada e modesta quanto as que eu vira em
todas as outras fazendas. Ficava situada, como as senzalas, ao fundo de um vasto terreiro e
rodeada por mourões que tinham a grossura de uma coxa e a altura de um homem, tipo de
cercado muito em uso na região. Da varanda, bastante ampla, em cuja extremidade fora
erguido um pequeno oratório, passava-se para uma grande peça coberta de telha-vã e de
paredes sem caiação, cuja única mobília consistia em alguns bancos de madeira, tamboretes
forrados de couro e uma enorme talha com um caneco de ferro esmaltado para retirar a
água. Os poucos quartos que davam para essa sala eram pequenos e não apresentavam
mobiliário mais variado.
Depois de Tamanduá, principalmente, já nos limites do sertão, as casas da sede das
fazendas se compõem de várias edificações isoladas, mal construídas, e dispostas sem
ordem.
A estrada que leva a essa fazenda atravessa terras mais montanhosas que as que eu
percorrera nos dias anteriores. Os vales são mais profundos, as matas mais extensas, e só o
alto dos morros é coberto de capim. O morro mais elevado das redondezas ergue-se acima
de um pequeno curso de água denominado Camacho, e do seu cume se descortina uma
vasta extensão de terras. Encontrei aí algumas plantas que ainda não tinha visto desde o
início da minha viagem.
A pouca distância do Morro de Camacho vê-se no fundo de um vale um pequeno
lugarejo denominado Curral e formado por uma meia dúzia de casinhas construídas junto a
uma fazenda de certas dimensões. Desse ponto até Cachoeirinha a distância é de apenas
uma légua e meia.
33
José Mariano partira na frente com o resto da tropa e devia esperar-me na fazenda
de um certo Marcos, distante duas léguas de Cachoeirinha. Quanto a mim, fui até
Tamanduá acompanhado do advogado dessa cidade, do ajudante do capitão-mor e do
cirurgião, que tinham ido passar dois dias na fazenda. Durante todo o tempo em que estive
com eles a conversa gioru quase que unicamente sobre a França. Os mineiros nunca se
cansavam de ouvir falar de Napoleão Bonaparte e da história trágica de nossa revolução.
Tamanduá, onde logo cheguei, deve sua fundação a um punhado de criminosos que
fazia uns cem anos tinha ido procurar asilo no meio das matas cerradas da região. pelo fato
de terem matado um papa-formigas no local, onde se tinham instalado, esses homens deram
ao lugar o nome de Tamanduá, que tanto em português, como em guarani, designa o
comedor de formigas. Descobriu-se ouro ali, a população do lugarejo foi aumentando, e em
1790 o arraial foi elevado a cidade, durante o governo de Luís Antônio Furtado de
Mendonça, Visconde de Barbacena,, capitão-geral da Província de Minas.
Ainda se vêem nos arredores de Tamanduá algumas lavras de extensão
considerável, que hoje estão inteiramente abandonadas. Elas forneceram muito ouro, que no
entanto foi dissipado pelos que o recolheram e cujos descendentes vivem atualmente (1819)
de esmolas – um triste exemplo das conseqüências da mineração e de uma imprevidência
demasiadamente comum entre os mineiros.
Os atuais habitantes de Tamanduá são em sua maioria agricultores que só vão à
cidade aos domingos e nos dias de festa. Há também alguns negociantes e trabalhadores
comuns, além dos indigentes, que se aproveitam da abundância existente na região para
pedir comida ora numa casa, ora outra, e passam a vida na ociosidade.
Sede de um termo e de uma paróquia, Tamanduá é administrada por juízes
ordinários. Sua população (em 1819) conta com 1.000 habitantes aproximadamente, e a do
território sujeito à jurisdição da paróquia, que se estende num raio de mais de duas léguas,
soma 3.000. Finalmente, a do termo todo tem de 24 a 25.000 habitantes, estendo-se o seu
território por 30 léguas na direção norte-sul e 16 de leste a oeste. O número de habitantes da
região aumentou bastante depois que começou a se desenvolver ali a agricultura e a criação
de gado.
O fumo é uma das plantas mais extensamente cultivadas nos arredores de
Tamanduá, sendo esse produto exportado em quantidades consideráveis.
Contam-se 36 léguas de Tamanduá até Vila Rica, 24 até São João del Rei e 32 até
Sabará. A cidade está situada num vale e é rodeada de morros bastante elevados e cobertos
de matas. Suas ruas são inteiramente irregulares, cheias de pedras e de ladeiras. As casas
são geralmente isoladas uma das outras e cercadas por muros, tendo algumas uma aparência
bastante bonita. Não obstante, quando se contempla a cidade de um ponto mais elevado a
sua própria irregularidade produz um efeito muito agradável na paisagem. No seu conjunto,
a cidade oferece um belo contraste contra o verde sombrio das matas que a rodeiam de
todos os lados, não somente devido à brancura das paredes de suas casas e ao colorido dos
telhados, mas também, e em especial, por causa da posição das casas, que parecem lançadas
no meio das massas de verdura formadas pelas bananeiras e laranjeiras que enchem os seus
quintais.
Tamanduá possui três igrejas: a de S. Francisco de Paula, a igreja paroquial,
dedicada a São Benedito, e a do Rosário. Há também duas capelinhas, mas que não são
dignas de menção.
Segundo me disse o cirurgião da cidade, a hidropisia é ainda a doença que causa o
maior número de mortes na região, não sendo rara também, ali, a lepra.
34
Não posso deixar de mencionar aqui dois fatos que me foram contados pelo mesmo
cirurgião. O primeiro ocorreu em tamanduá e me foi narrado na presença de várias pessoas,
que não o desmentiram. Um cão que se supunha hidrófobo mordeu vários indivíduos, mas
em nenhum deles as conseqüências foram além das dores causadas pela mordida. Um dos
homens tinha pedido a um padre que orasse por ele, e julgou poder atribuir sua cura a essas
preces. Passado algum tempo voltou a procurar o padre e lhe falou sobre algumas coisas
que sentia. Em resposta, o eclesiástico lhe disse que não lhe convinha considerar-se curado,
e o aconselhou a se medicar devidamente. O homem retirou-se apavorado e nesse mesmo
dia, ou no dia seguinte, teve um ataque de hidrofobia e morreu dessa terrível moléstia.
O segundo fato passou-se em Caeté, onde se achava então o cirurgião. Um homem
atacado de morféia foi mordido por um cão raivoso. Quando se manifestaram os primeiros
e terríveis sintomas da doença prenderam-no dentro de um quartinho. Sua mulher, ao lhe
levar a comida, horrorizou-se com o seu estado e saiu correndo, deixando aberta a porta do
quarto. O doente fugiu e se pôs a correr pelos campos. Algumas horas mais tarde ele
reapareceu, inteiramente calmo, dizendo que tinha sido mordido por uma cascavel e
pedindo a presença de um padre. Confessou-se com ele, completamente lúcido. A ferida
causada pela mordida da cobra foi medicada com amoníaco. A partir desse momento
cessaram todos os sintomas da hidrofobia, e passado algum tempo a lepra desapareceu
completamente.
Depois de ter almoçado em Tamanduá, na casa do capitão-mor, parti acompanhado
do tal de Marcos, de quem já falei e em cuja casa eu esperava encontrar os meus
acompanhantes.
35
ITAPECERICA – 200 ANOS
Nossa preocupação com a verdade dos fatos vem de longe pois, já no curso
primário, aprendemos as datas históricas relacionadas com Itapecerica; e se tornou pública
em julho de 1972 quando, através do jornal Janelão, instituímos um concurso com o tema:
“a verdadeira idade de Itapecerica: provas”, publicando posteriormente um resumo de datas
e documentos encontrados. Em outubro de 1982, convidada para oradora oficial,
novamente, levantamos a questão e em 1985 publicamos um folheto “A grande mentira”.
Através do jornal Quatro Bicas (1987/89), no rádio e em palestras, mostramos ao
povo as datas e os fatos. Hoje muita gente se conscientizou da realidade e estamos
iniciando o ano do bicentenário, mudando a data das comemorações, juntando forças e
convidando a população para unida refazer em Itapecerica aquela cidade tradicional,
histórica, culta e ativa que foi.
Contar casos e ser saudosista é uma forma de reavivar o patriotismo e o amor à terra
natal. Conhecer os vultos ilustres é aproveitar sua experiência para construir um futuro
digno. Uma cidade é feita de pedras, de fatos, de almas; precisa sobretudo de
governantes conscientes daquilo que é essencial. Acreditamos estar iniciando um período
brilhante marcado pelas comemorações do bicentenário e, mais uma vez, para que todos
saibam, vejamos as datas:
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JEFFERSON RIBEIRO FILHO
A COMARCA
37
e Santo Antônio do Monte.
Somente após a República foi criada a comarca de Inhumas, hoje Santo Antônio do
Monte, desmembrada da comarca de Itapecerica.
A eleição de juízes municipal e de órfãos foi feita até 1857, quando passou a ser o
mesmo nomeado e com a exigência de ser bacharel.
Não vamos enumerar todos os juízes de direito e municipais e de órfãos que
passaram pela comarca, dado o seu elevado número, mas, indicar alguns mais assinalados.
O primeiro juiz da comarca foi Dr. Manoel Jacinto Rodrigues Véo, que exerceu o
cargo até dezembro de 1845, quando foi brutalmente assassinado no Arraial de Campo
Belo, onde se achava em diligência.
O primeiro juiz municipal e de órfãos, eleito após a criação da comarca, foi Egídio
de Souza Gonçalves e o primeiro nomeado foi o Dr. Bernardo Jascinto da Veiga, em 1857.
Entre os juízes municipais estão em nossa lembrança o conterrâneo Dr. Francisco de
Assis Tavares, covardemente assassinado, numa tocaia, quando estava em diligência, no
ano de 1882, no interior da comarca.
Assinale-se o juiz de direito Dr. José Afonso Lamounier Júnior, casado com uma
nossa tia materna, que foi depois juiz de direito em Tiradentes e em outras comarcas,
chegando a Desembargador do antigo Distrito Federal, Rio de Janeiro, os drs. Antônio
Ribeiro Pena, José de Castro Pires e Osvaldo Abrita.
Juízes de direito: o Dr. Afonso Cordeiro Negreiros Lobato, que substituiu o
primeiro juiz Dr. Rodrigues Véo. Outros juízes de direito: Drs. Augusto Celso Nogueira,
Carlos Pereira Tinoco, Guido Cardoso de Menezes e Souza, Joaquim Daniel Pereira de
Melo, Benito Esteves Oscerinjarequi, Gorazil de Faria Alvim, Erotides Diniz, Agenor de
Sena Filho, Hélio Costa, Eurípedes Corrêa de Amorim, Fernando Gomes de Morais, Célio
Valle da Fonseca, Tito Lívio de Souza, Jefferson Monteiro, Isnar Soares Pena e, finalmente,
o Dr. Rafael Afonso de Andrade Leite. Todos estes conhecemos e tivemos a felicidade de
conviver e de trabalhar com eles, desde o Dr. Joaquim Daniel Pereira de Melo.
Citaremos aqui os nomes de alguns promotores, desde que nossas pesquisas não
alcançaram todos os nomes e, muitos deles, eram promotores adjuntos e não bacharéis.
Sabemos, por exemplo, que em 1880, era promotor e Dr. Ilídio Salatiel dos Santos,
e em 1893 o Dr. Júlio Belegrade Freire Xavier; em 1895 o Dr. Artur Ferreira Diniz.
sEguiram-se os drs. Oscar Bhering, Amasílio Moreira Pena, Joaquim Pereira da Silva,
Eduardo Ferreira Alves, João Cleto Corrêa Mourão, Paulo Lessa, José Meira, José Torres
Duarte, Waldir de Barros, Sílvio Pélico Piló, Dario Abranches Vioti, Renato Gomide Leite,
Sálvio José Seixas de Siqueira e, finalmente, com brilho e inteligência, a Dra. Vanda Fraga
de Oliveira.
Entre os adjuntos quero, especialmente, lembrar o nome do meu querido pai
Jefferson Ribeiro, que, sendo engenheiro agrônomo, gostou tanto da função que se
provisionou e por mais de 25 anos advogou na comarca. Relembro, também, com carinho, a
figura do Dr. Severo Rios Corrêa que, como adjunto, exerceu as funções por vários anos,
com grande dedicação. Finalmente, o Dr. Carlos Maia, culto, correto e capaz.
Os colegas advogados nos perdoem. Já abusamos em demasia do tempo de todos e
há uma audiência a seguir.
Muito obrigado.
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Obs.: Pela Rádio Difusora de Itapecerica, todas as famílias da cidade foram convidadas a
participarem deste livro com fotografias.
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DOM ANTÔNIO CARLOS MESQUITA
Vigário Coadjutor em Nova Lima, em 1952, de agosto até dezembro. Volta para o
Seminário, sendo Diretor espiritual de todo o Seminário (Maior e Menor).
Em 1955, Vigário de Santa Quitéria em Esmeraldas, onde construiu a Nova Matriz,
aumentou o cemitério Paroquial, fundou o Lactário, Diretor do Ginásio “Santa Quitéria” e
professor de religião, latim e francês. Foi transferido para Belo Horizonte, em 1964, como
Vigário de Santa Rita de Cássia, no bairro S. Pedro – Incentivou a devoção à Santa Rita,
organizou obras sociais – Em 1974, o Papa Paulo VI o nomeou Bispo Coadjutor e
Administrador Apostólico “sede plena” de Oliveira trabalhando ao lado de Dom José
Medeiros Leite que o enviara ao Seminário, graças a boa vontade também de Mons. Leão
Medeiros Leite.
Tomou posse no dia 14 de julho do mesmo ano – Passou a ser Bispo Diocesano de
Oliveira, no dia 6 de março de 1977, com a morte de Dom José Medeiros Leite – Em 1983,
o Papa João Paulo II o transfere para Bispo de São João Del Rei, tomando posse no dia 19
de fevereiro de 1984 – Reformou a Residência Episcopal, o Seminário Diocesano São
Tiago, em 9 anos já ordenou 15 sacerdotes a serviço da Diocese, reorganizou a Pastoral, e
realizou três Assembléias diocesanas de Pastoral.
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CARMELO MESQUITA
Saúdo, com reverência e amor, aquele que Deus escolheu para ser o meu pai, na
terra: Carmelo Mesquita.
Ao lado de minha mãe, Maria Blandina, soube cumprir sua missão, ser o
instrumento de Deus, para comunicar a muitos filhos o dom da vida e o dom de graça
divina.
Podemos dizer que realizou como sacramento do Pai sua missão de nos preparar
para a vida, moldando-nos força, caráter e nobreza de vida.
Seu amor pela arte, especialmente pela música, demonstra a delicadeza de sua alma,
nos acordes festivos de seu violino, alegrando a todos nós e cantando os louvores de Deus e
Nossa Senhora das Dores, nas santas missas, setenários e procissões de Nossa Senhora,
como também nas retretas e festas civis.
“Quando vosso amigo se cala, vosso coração continua a ouvir seu coração...”
(Gibran)
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FESTA DE NOSSA SENHORA DO CARMO
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CÉLIA LAMOUNIER DE ARAÚJO
(cadeira nº 13 – Poesias e Jornalismo)
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ODE A TAMANDUÁ
Célia Lamounier de Araújo
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ODE A TAMANDUÁ
Célia Lamounier de Araújo
Troféu ERRIENE no 1º Salão
de Poesia em 18.01.90
Abraço Tamanduá.
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TROVAS
Célia Lamounier de Araújo
Trabalhar Filosófica
Por um mundo de justiça Vai em paz, segue a jornada
onde haja compreensão Que Deus te traçou da cruz
onde o egoísmo e a cobiça vence a vida atribulada
se desfaçam na oração. caminha em busca da luz.
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LÍRICAS
CLA
Nº 1 – Lírica do Amor
E pela madrugada
a cidade ainda dorme...
mas o céu veio para a terra
está no corpo dos homens
está na alma das mulheres
está no espírito das luzes
que cintilam como estrelinhas.
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DISCURSO A ITAPECERICA - 1982
Há sempre um tempo certo e um momento oportuno para cada coisa. Tempos atrás,
eu-criança empolgada, vibrante de civismo e de entusiasmo, feliz passava por estas mesmas
ruas, em desfile a homenagear Itapecerica. E pensava: que presente poderia dar? Somos
tantas crianças, quem sabe, reunindo algumas pratinhas de cada uma, compraríamos...
compraríamos o quê? Presente para uma cidade? E me perdia em divagações enquanto
vaidosamente marchava ao som das baterias, acreditando que não poderia errar o passo nem
baixar a cabeça, querendo mostrar a todos que nós, crianças, ali estávamos iguais – peça tão
importante no aniversário e na vida da Cidade das Rosas quanto aquela outra, formada por
pessoas grandiosas, distantes, donas de Itapecerica, que ficava no palanque.
Não imaginava que algum dia estaria emocionada, junto a estas, neste mesmo palco
por onde passaram tantos oradores ilustres, tantos políticos de destaque, os quais bem sei,
por suas vidas e seus atos souberam dignificar o nome de Itapecerica. Estamos hoje ao lado
de dois novos e ilustres filhos da terra: o Exmo. Sr. Dr. Francelino Pereira dos Santos,
governador do estado de MG e o Exmo. Sr. Senador Murilo Badaró.
Sozinhos...
no palco da terra.
52
Mas hoje não... Aqui neste momento de felicidade, e de alegria em que nos
reunimos para saudar Itapecerica, não estamos sozinhos pois nos une o amor à terra natal,
nos une o desejo imenso de vê-la crescer, nos une a vontade de gritar-lhe: “Parabéns,
Itapecerica! Parabéns pelo seu aniversário”.
Parabéns não somente pelos seus 120 anos mal contados que se comemora hoje,
mas principalmente pelos seus 193 anos de idade verdadeira a completar no próximo dia 20
de novembro.
A estes jovens que me escutam, que desconhecem questões e datas, contarei a
história. Um pouco de história é ótimo para mostrar que a vida não é feita de comodismo:
Em 1676, Lourenço Castanho Taques por aqui passou a descobrir florestas e abrir
clareiras. Mas foram Feliciano Cardoso de Camargos e Estanislau de Toledo e Pisa os
primeiros moradores da terra dos Tamanduás. Isto por volta de 1739, lutando contra o
tacape dos cataguases, às margens de ribeirões cheios de ouro e cobras, que logo se
povoaram de mineiradores. Homens audaciosos que mourejavam no garimpo e ao cair da
noite, reunidos em torno de fogueiras, ouviam o canto triste do urutau, de parceria com suas
saudades e esperanças. O sonho era enriquecer e voltar mas acabavam por aqui,
conquistadores conquistados pela natureza.
O bravo povo de Tamanduá “domesticado” pelo Padre Gaspar, transformou-se
rapidamente numa família de gente trabalhadora, corajosa e esperta. Tanto afirmo como se
comprova pois não aceitavam imposições. Reconhecendo o seu valor, o então governador
Visconde de Barbacena, criou por Alvará o 10º município mineiro: a Vila de São Bento de
Tamanduá, em 20.11.1789 e a instalação e a instalação solene se deu em 18.01.1790.
O município, com 34 distritos e grande extensão de terras, caminhou a passos de
gigante e tornou-se importante centro regional, fornecendo à Pátria homens fortes,
inteligentes e capacitados. Mas seus distritos cresceram e se desmembraram, formando
novos municípios.
Aqui faço um parêntesis que foge ao ritmo de minha saudação natalícia, mas é
necessário para completar minha assertiva: todas as cidades mineiras do período colonial
(16 ao todo) e muitas do período imperial (± 95) foram elevadas a município com o título
de “vila” e posteriormente tiveram esse nome trocado por cidade, mas a sua emancipação
política-administrativa se dava realmente na data de instalação da vila, quando então era
levantado o pelourinho, eleita a 1ª Câmara e eleito o 1º Juiz. Por outro lado, para confirmar
o mesmo assunto, perguntamos: é plausível que um distrito, filho de uma cidade, seja dela
desmembrado e se torne mais idoso? Podem acreditar, mas, Formiga está mais velha.
Legitimando nossa argumentação histórica em torno de datas, podemos dizer ainda que, se
Itapecerica recebeu em 1972 uma das medalhas da Inconfidência, distribuídas pelo governo
aos municípios existentes na época da Inconfidência, obrigatoriamente tem mais de 190
anos de idade.
Contudo, se assim querem, continuamos a dizer: Parabéns, Itapecerica, pelos seus
120 anos.
Quisera lembrar aqui o nome de muitas pessoas maravilhosas que ajudaram
Itapecerica a crescer mas direi apenas o nome de Antônio Paulino do Nascimento, um
homem simples que sonhou e realizou muito; do Dr. Severo Augusto Ribeiro, aqui
presente, cujas ações atestam a grandiosidade de sua pessoa, e não posso deixar de citar
também o nome de meu avô, Theodoro Afonso Lamounier Netto. Façamos da mesma
forma, sem alardes, sem ajuda, façamos alguma coisa.
Hoje, eu-mulher que saúdo Itapecerica, em nome de seus filhos, já descobri o
53
presente ideal. Disse Rui Barbosa: “Pátria é o sol, o céu, o povo, a tradição, a consciência, o
lar, o berço dos filhos, o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da
liberdade. Os que a servem são os que não infamam; os que não conspiram; os que não
sublevam; os que não desalentam; os que não emudecem; os que não se acovardam; mas
resistem; mas ensinam; mas se esforçam; mas pacificam; mas discutem; mas praticam a
justiça, a admiração, o entusiasmo.”
Esta nossa terra de jovens bonitas e elegantes, de pessoas cultas e inteligentes,
chamada “Atenas Mineira” tem uma tradição que precisa continuar.
É isto que Itapecerica nos pede – um esforço conjunto não somente no dia do
aniversário mas sempre, em busca da realização de suas necessidades. Tenho dito.
Obrigada.
Itapecerica, out/82
(a) Célia Lamounier de Araújo
***
54
TAREFAS PARA A GINCANA HISTÓRICA/1987
Célia Lamounier de Araújo
55
MEIA HORA COM CÉLIA
(Cópia da gravação do programa radiofônico do dia 13.03)
Vocês sabiam que em 08.03.1857 houve uma greve de operárias em Nova York e
159 mulheres morreram no incêndio criminoso praticado contra elas? Daí ter sido escolhido
este dia para ser o DIA INTERNACIONAL DA MULHER. 1975 foi o Ano Internacional
da Mulher e de 75 a 85 muitos países comemoraram a Década Internacional da Mulher. Em
julho de 1985, aconteceu a Conferência de Nairóbi com participação de 150 países
analisando os acontecimentos da Década, na tentativa de MUDAR: mulher-objeto sexual,
através da educação e da cultura, para mulher-gente. Para acordar as pessoas é necessário
um tratamento de choque... (cantei Sonho).
Mas depois que se entrega ao amor, a coisa nem sempre continua bem. A deusa é
chamada de demônio, a santa é anjo mau, a amante é prostituta. Homens matam mulheres
“em defesa da honra” (honra?) e são absolvidos. Mas se é a mulher que mata condenam 12
anos (Prof. Maria Inês Benevides Cruz). É hora de descobrir que as mulheres têm os
mesmos direitos e as mesmas qualidades que os homens. É hora de descobrir que também
sabem trabalhar, decidir, criar, governar e viver. Antigamente, a mulher vivia presa em casa
e se chegava uma visita focava presa no quarto (Saint Hilaire). Nas ruas e caminhos a
mulher andava atrás do homem. Felizmente em nosso tempo a mulher já anda lado a lado,
de mãos dadas, olhos nos olhos (música Sonho).
Falta agora à mulher mostrar que pode estar lado a lado com o homem nas decisões
comerciais, sociais e políticas. Neste setor, apesar de ser a mulher mais da metade das
gentes, a proporção ainda é uma em cem. A participação é quase nada: em cada cem
deputados uma mulher, em cada lista de jurados só homens? Eu me orgulho de ter sido a 1ª
56
mulher na lista de jurados de Ipatinga e vocês? Têm também orgulho de participar de
alguma coisa?
E terminando o programa de hoje que foi oferecido à MULHER, vou cantar para os
meus ouvintes-homens, que já aprenderam a valorizar a mulher como companheira e como
gente, a música “Sábado”. (CLA)
Esta pressão-opressão
de desejar andar e ficar assentada
de desejar voar e estar deitada
de desejar viver e sentir-se morta
de desejar escrever e auto censurar
cria um vazio
que cresce e acresce
o abraço das cadeias
e implode o coração
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O SABOR DE UM ABRAÇO
Célia Lamounier de Araújo
FELICIDADE
Cla – 1965
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MENSAGEM PARA 1988
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TAMANDUÁ hoje ITAPECERICA
(Trabalho de escola)
Em 1676 Lourenço Castanho Taques por aqui passou a descobrir florestas e abrir
clareiras, desbravando este Brasil gigante. Segundo a “História Média de MG” e Carta da
Câmara da Vila de Tamanduá, os 1ºs. moradores chegaram por volta de 1733, vindos do
arraial de Ibituruna e Rio das Mortes. Passou também por aqui, na época da Guerra dos
Emboabas - 1708 o famoso Anhanguera Bartolomeu Bueno.
Tamanduás e cabanas cobertas de cascas de pau deram nome ao povoado de
“Paragem da Casa da Casca do Tamanduá”.
Mas foram Feliciano Cardoso de Camargos e Estanislau de Toledo e Pisa que
realmente começaram em 1739 a construir o arraial às margens dos ribeirões Tamanduá e
Rosário, construindo a Ermida do Senhor Bom Jesus de Matosinhos. As explorações de
ouro passaram para as margens do Riacho Vermelho e o povoado era chamado “Conquista
do Campo Grande da Picada de Goiás” em virtude de ser o centro de comunicação na larga
faixa sertaneja. A riqueza do povo chamou a atenção de São José d’El Rey pois a paróquia
rendia de dízimo por ano 17000 cruzados, uma fábula, e em 18.06.1744 a Câmara tomou
posse nomeando as 1ªs. autoridades locais “a bem desta República”.
D. Frei Manoel da Cruz criou uma paróquia por provisão de 15.02.1757 nomeando
vigário ao Padre Gaspar Álvares Gondim que chegou a construir uma igreja e sete capelas
filiais. A localidade se chamou então “São Bento de Tamanduá” por causa das cobras
encontradas. A freguesia foi elevada a colativa por alvará de 1780 a atendendo a
requerimento dos moradores e sendo de tal modo notável o progresso do arraial, o
governador Visconde de Barbacena elevou-o à categoria de município e vila em 20.11.1789
(ano da Inconfidência Mineira e da Revolução Francesa). A instalação se deu em
18.01.1790 com as solenidades de estilo, levantando-se o pelourinho em lugar diferente
elegendo-se a 1ª Câmara e o 1º Juiz. ESTAVA CRIADO O 10º MUNICÍPIO MINEIRO
(época colonial). O povo mudou-se e o antigo local de nome Arraial Velho ainda tem
vestígios da 1ª povoação tais como árvores centenárias, mangueiras e velha Estrada Real.
São Bento do Tamanduá abrangia 34 distritos em imensa área e era habitado por
“um povo ordeiro, trabalhador, valente e brioso”. As fazendas prosperavam, o gado era
gordo e a lavoura farta. Houve época em que a produção de leite era de 7 e meio milhões de
litros e 220 mil quilos de manteiga. A sede do município cresceu no vale entre sete colinas.
Mas sua área foi diminuindo muito.
A criação da vila importava na criação da comarca mas a nova vila ficou sendo sede
de Termo da Comarca do Rio das Mortes até o ano de 1839 e somente então foi criada nova
comarca com o nome de Rio Grande.
Em 1799 a Câmara Municipal teve a audácia de criar uma escola e foi censurada por
D. Maria I que ordenou em 1800 o fechamento da escola. Mas em 1822 nasce o Colégio
Tavares Dias, mais tarde em 1882 o Colégio São Bento e em 1917 o grupo escolar Severo
Ribeiro.
Em 1823 ordena-se o 1º padre nascido no município: Padre José Camilo de Faria.
(Até hoje o município deu ao Estado mais de 45 padres católicos).
60
Em 1839 Formiga desmembrou-se e foi criada então a Comarca do Rio Grande com
sede em Tamanduá.
Durante a Revolução de 1842, a região foi invadida pelos rebeldes comandados por
José Jorge da Silva mas o Cel. Narciso, fazendeiro de Tamanduá, emboscado com 30
homens no lugar chamado Campo do Caju, destroçou toda a força armada de 400 homens
que se dispersaram. Com isso os rebeldes em Santa Luzia, não recebendo reforços,
renderam-se ao Duque e Caxias.
Em 1872 foi criada a Comarca do Rio Itapecerica tendo sede no nosso município.
Em 1884 surge o 1º jornal impresso: O Itapecericano. Terra de intelectuais e
políticos, logo outros jornais surgiram. Em todas as constituintes brasileiras havia um
itapecericano. (1824 – Vigário Antunes; 1891 – Lamounier Godofredo; 1934 e 1948 –
Gabriel Passos). E Manuel José Soares foi Senador do Império. Hospital surgiu em
27.04.1899.
Em 1891 chega o progresso através da linha férrea que deveria seguir até Formiga,
mas por uma questão política não foi terminada, existindo até hoje o caminho da estrada
com os pontilhões. Em 1904 o município ganha a 1ª Usina Elétrica de captação d’água. Por
essa época desmembrou-se parte das terras para Divinópolis, mas o distrito de Santo
Antônio dos Campos somente foi desmembrado em 1923.
A matriz é inaugurada em 1912, 82 anos depois de iniciada a construção.
Em 1939 a Santa Casa de Misericórdia estava em festa com a chegada das Irmãs
Batistinas vindas da Itália. A 1ª cesariana feita no Oeste de Minas aconteceu aqui em 1925
e foi feita pelo Dr. Carlos Vieira de Menezes.
O Colégio Imaculada Conceição foi criado em 1928 e o Ginásio Padre Herculano
Paz em 1947. A época de ouro renasceu na década de 1950 com a criação da Rádio
Difusora, Associação Comercial e linhas de ônibus. Em nossa terra sempre existiram duas
bandas de música e os partidos políticos tinham nome diferente: tareco e papiatas. Isto deu
margem a muitos fatos e a muito riso pois o povo era forte, firme e cheio de humor.
Verdades ou lendas, os casos são muitos. É do conhecimento geral até mesmo que o
romance “O Seminarista” de Bernardo Guimarães – 1872 – se baseia em fatos acontecidos
nestas paragens.
61
ITAPECERICA
Na zona da Vertentes nasceu há 198 anos uma doce mineira, filha de mineiros,
tamanduás e cataguases. A mistura deu raça forte, lutadora, de vanguarda, cabeça tamanho
do “a” quando gente abre bem a boca pra falar. Crianças nasceram e falavam todo o Brasil.
Aqui para nós se enganou este ano – muitos importantes saíram do oeste de lá. Décima
dona da terra, de ouro e de vastos quilômetros, pelo olhar de Pamplona 34 distritos, talvez a
maior.
Até D. Maria conheceu desobediência escolar, padres se cuidavam de estrepolias,
povo bravo na guerra, tocaia na cava, e no vestibular de ontem e hoje iam brilhar São
Paulo, Rio, Beagá.
Cabeça de Tamanduá, cabeça dura, escorregadia pedra, boa política de escorregadá,
manda, desmanda, constrói, fazendas, fábricas, teatros; tudo dá na terra boa, campo grande,
casa da casca, São Bento protege enquanto é/há tamanduá.
Filhos crescidos abandonam mãe: formiga campo divino, Bentinho, Gabriel, Pena,
Corrêa, GTO e muitos e muitos outros vão indo; velha mãe se acanha, se curva, se morre
entre sete colinas que ficam cantadas por Barreto e Hilton.
A divisão é a morte. Perde escolas, rosas, jornais, padres, irmãs, mestre Juca. Vida
estudante, moça presa, moço preso, um muro só de sonhos dura pouco. Vida gostosa de
tamanduá, coronéis, fartura, importância deixa de ser, sete dois anos subtraída quando
cidade vila não conta, desconta, desfia fio, cortando tempo morre teatro, avenida, cinema,
fica a tevê. Visita de gente tareco, papiata, em pouco cerra porta janela, luz fraca, sono vem
e gente dorme. Janelão Itapecerica grita acorda é hora de facultare. Fogo queima partituras
coração não mais conversa, não mais velhotas casamenteiras, serestas, vestido de missa e
de baile não mais, semana santa um a um, procissão mulher de cá, homem de lá mais não,
estrada de ferro casa praça prefeitura derrubada, tudo muda cara nova gente e fim a
tamanduá. Terra suja água tiro na co.passa vem só discurso, cabeça dura sem estudo faz
doença mil e oito filho do pai. Brasil ou Etiópia? Dito anda que coberta vira circo e cercada
não sobra um: feliz.idade.
Fica pingo de amigos, nem pinga pra presentear famosa, tradição cultura passado de
nome e museu pra que? morreu morreu o doido, o poeta, o músico, o fotógrafo. Fica pingo
de visionários que se unem em Beagá e Brasília a recordar no clube anos dourados, a
buscar passado na tentativa de tirar da pedra lisa essa loucura que anda por lá e com muito
amor ressuscitar Atenas, hoje apenas Itapecerica.
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ESTUDOS PARA A HISTÓRIA DE
TAMANDUÁ HOJE
ITAPECERICA
por Célia Lamounier Araújo
em 1988/1989
“Da Capitania de São Paulo e das Minas de Ouro, por influência da Guerra dos Emboabas, surgiu em
1720 a Capitania das Minas Gerais. Tantas eram as minas e tão gerais que Minas Gerais ficou sendo”.
(Série Municípios Mineiros – MG - 84 a 87)
Aberto o caminho da Picada de Goiás em 1736, logo nasceu o povoado que se transformou em
20.11.1789 na vila e Município de São Bento do Tamanduá, com uma área de pelo menos 16 mil km²
distribuída por 34 distritos de ordenanças:
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LEGENDA DO MAPA
64
19 – São Roque da Serra da Canastra – São Roque de Minas
20 – N. Sra. do Livramento do Piui – Piui
20a - +Perobas - Doresópolis
21 – Santo Antônio do Capetinga – Dist. de Santo Hilário, Pimenta
22 – São Vicente Ferrer da Formiga – Formiga
22a - +N. Sra. do Carmo dos Pains – Pains
23 – N. Sra. da Ajuda do Rio Grande – Cristais
24 – Córrego do cavalo – Candeias
25 – N. Sra. das Candeias de Bom Jesus de Matosinhos – Candeias
26 – Sete Lagoas – Candeias
26a - +N. Sra. das Dores do Camacho – Camacho
27 – São Lázaro do Miranda - ???
28 – Boa Vista – Eermida da Mata da Sra. do Carmo – Carmo da Mata
29 – São Francisco de Paula – São Francisco de Paula
30 – Jacaré – Distrito de Porto dos Mendes - ???
31 – Mato do Jacaré de Tamanduá – Santana do Jacaré
32 – Bom Jesus de Matosinhos do Jacaré – Cana Verde
33 – Sr. Bom Jesus do Campo Belo e Sra. da Conceição – Campo Belo
34 – Água Limpa – Santo Antônio da Água Limpa – Aguanil
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ALGUMAS ANOTAÇÕES SOBRE CADA DISTRITO,
HOJE CIDADES:
66
* Lagoa da Prata – desmembrada de Tamanduá junto a área de Santo Antônio do
Monte em 1875 ou teria sido em 1839 para Formiga?
* Bambuí – Capela em 1768, Vila em 22.09.1881 pela Lei 2785 com área
desmembrada de Formiga e Piuí, foi antes desmembrada de Tamanduá para Formiga em
1839; cidade com 1.407 km² em 10.07.1886.
67
Tamanduá em 1839 para Formiga; pertenceu também a Piuí, Bambuí e Pains; cidade em
1948 p/Lei 336 desmembrada de Pains c/ 375 km².
* Carmo da Mata – Boa Vista ou Mata da Boa Vista em 1753 com ermida
construída por Inácio Afonso Bragança em 1754, distrito em 1842; área desmembrada de
Tamanduá e de Oliveira para formação da cidade em 17.12.1938, tem 357 km².
* Cana Verde – Primeira sesmaria em 1729, Lavras do Funil; Diogo Bueno e outros
em 1753, curato em 1832 e distrito em 1858; área desmembrada de Tamanduá em 1802
para São José d’El Rey, pertenceu também a Campo Belo e Perdões; cidade em 20.12.1962,
tem 145 km².
* Campo Belo – Distrito em 1818, sua história está ligada a muitas outras de
Tamanduá; vila em 1848 teve a Lei 373 revogada em 1850 e somente em 13.06.1876 pela
Lei 2221 tornou-se vila, desmembrada de Tamanduá com vários outros distritos, instalação
solene em 28.09.1878.
68
Campo Belo? Distrito de Campo Belo em 1948, cidade em 1962 desmembrada de Campo
Belo, tem 167 km².
* Cláudio – O escravo Cláudio descobriu uma imagem que sumia e aparecia e todos
foram ver o Ribeirão do Cláudio; capela de N. Sra. do Cláudio; área desmembrada em 1911
de Oliveira e parte do distrito de Marilândia.
***
As razões existem e a alma deve falar sempre: para os seus e para os que ainda não tem
uma. (CLA)
69
BRINCANDO COM NÚMEROS
* Em 1802 perde para São José o distrito de Santana do Jacaré (97 km²) e o distrito
de Cana Verde (145 km²);
* Em 1839 perde para Formiga vários distritos, hoje cidades de: Formiga – 1.404
km², Iguatama – 600 km², Arcos – 507 km², Piuí – 892 km², Japaraíba – 184 km²,
Doresópolis – 156 km², Bambuí – 1.407 km², Pimenta – 375 km², Luz – 1.185 km², Pains –
404 km², São Roque – 2.002 km². A área desmembrada para Formiga compreendia todas
estas cidades.
* Em 1875 perde Santo Antônio do Monte com 1.101 km² e junto vai Lagoa da
Prata com 300 km².
* Em 1876 perde Campo Belo com 500 km² e junto os distritos de Candeias com
693 km² e Cristais com 447 km², este em 1881.
Aguanil teria sido desmembrado quando? Tem 167 km².
* Em 1911 perde Esp. Santo do Itapecerica com o nome de Henrique Galvão, hoje
Divinópolis c/716 km², o distrito de S. A. Campo das Hortas em 1923. Perde também parte
da área de Marilândia em 1911 para Cláudio.
* Em 1962 são desmembradas as áreas para Camacho – 227 km², São Sebastião do
Oeste – 387 km² e Pedra do Indaiá – 327 km².
RESPOSTA: feitas as contas podemos afirmar que Tamanduá tinha mais de 16 mil
km² de área. CLA. 1989.
70
71
A ANTIGA TAMANDUÁ
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DJALMA TEIXEIRA DE OLIVEIRA
Senhora e Senhores,
Posso vê-lo, ainda com suas passadas largas, o corpo curvado para a frente, o
guarda-chuva na mão, passando, alheio, ao que existia a sua volta. Com a fisionomia
carregada e a cabeça baixa parecia inteiramente voltado para um mundo de conjectura.
Em estágio mais avançado do mal que o afetara, costumava colocar na janela de sua
casa objetos, à guisa de presentes, expressão bizarra e singela de uma comunicação efetiva
que a doença pode ter distorcido mas não logrou extinguir.
Era-lhe grato ao coração o dia 22 de maio, por ser o que a Igreja dedica à Santa Rita
de Cássia – Santa para a qual voltara sua devoção, juntando-a à de seus pais. É significativo
que, exatamente nesta data, tenham-lhe cessado os padecimentos. No dia 22 de maio de
1937, toda Itapecerica chorava a morte do Padre Belchior, aos 62 anos de idade.
73
de outro. Ficou, porém, a sensação de que Monsenhor Mendonça, por razões afetivas,
poderia ter idealizado a personalidade do Cônego Belchior.
Mais tarde apareceu o excelente trabalho de pesquisa de Padre Gil Antônio Moreira
e Constantino Barbosa, transformado no livro “Itapecerica, sua fé e sua música”, em que se
encontram dados recolhidos pelos autores sobre a vida do Cônego Belchior e sobre sua
atuação em cidades por onde passara.
Há um ditado que diz: Pela carruagem se conhece quem vem dentro. A ligação do
Cônego Belchior com as cidades do Sul de Minas tem início quando, Diácono ainda,
recebeu convite para integrar a comitiva de S. Exa. Revma. Dom Silvério Gomes Pimenta,
em visita pastoral àquela região do Estado. Um tão honroso convite, não teria sido feito
aleatoriamente. Dom Silvério, uma das forças mais expressivas e respeitáveis da Igreja,
escritor de muitos méritos que, no sistema orográfico da intelectualidade brasileira, ocupa
um dos picos de mais elevada culminância. Figura considerada um dos mais belos
ornamentos da cultura nacional, ao selecionar um grupo de sacerdotes que queria junto
dele, incluía o diácono Belchior por lhe ter certamente descoberto as características que lhe
correspondiam às suas exigências. Foi aí que teve a fortuna de disciplinar os hábitos de seu
espírito, nos sentimentos da fé robustecida pelas investigações da filosofia.
A partir daí, o Cônego Belchior deixou marcos de sua vida dinâmica nas atividades
que desenvolveu em S. Gonçalo, Pouso Alegre e Campanha, onde atuava como padre,
professor e jornalista.
Ao final da leitura das notas biográficas do Pe. Gil, concluí que minha impressão
era falsa. Monsenhor Mendonça estava certo.
Tenho aqui, hoje, o que chamaria o meu terceiro encontro com o Cônego Belchior,
propiciado pelos que tiveram a feliz iniciativa de criar esta Academia, aos quais
cumprimento na pessoa de Célia Lamounier Araújo, de cujo trabalho somos devedores.
Esta dívida, no meu caso se avulta, na medida em que me coloca ao lado de confrades cujo
talento, competência e dignidade nobilitam as instituições e as pessoas a que se ligam,
como as engrandeciam aquele homem a quem escolhi para meu patrono, nesta Academia.
Senhores,
74
que ele impregnou de bondade e de doçura espiritual em todos nós, ficou como a
perpetuidade de um exemplo. Por isso reverenciamos a sua memória limpa e santa”.
Senhores! Essas palavras constituem a melhor versão que eu poderia dar ao meu
sentimento.
Devo interromper aqui. depois do Poeta, só a prece.
***
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FRANCISCO BARBOSA MALACHIAS
76
ELIANA
Francisco Barbosa Malachias
77
ODE A TAMANDUÁ
João Pereira da Silva – BH/1990
Troféu: Dr. Antônio Felizardo Siqueira
78
VALSA DA FRATERNIDADE QUEM SOU EU
Josafá da Costa Mesquita
Em golpe sutil
na matéria esculturando
GTO eterno.
PENSAMENTO
“O homem que é alguém tem contra si todos aqueles que se desesperam de não
serem alguma coisa” (Rastin)
79
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83
ANTÔNIO FELIZARDO SIQUEIRA
Caro collega
“Aquele que recebe um beijo e deixa o resto para depois, não merece o que se lhe
deu”.
(José Ingenieros)
84
JOSÉ LOURENÇO DE SIQUEIRA
IN MEMMORIAM
PADRE MARCIANO
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Deus.
Abre-se, porém, na eternidade uma perspectiva sobre adorante de um novo e
poderoso intercessor junto ao trono das Misericórdias. Desapareceu um apóstolo,
alquebrado pelos anos, trabalhos e sofrimentos... evidenciou-se mais um testemunho de fé,
mais um exemplo de resignação na enfermidade suportada em silêncio, inspirado em N.
Sra. das Dores, Rainha dos Apóstolos, dos mártires e dos confessores.
Permanecerão tuas ligações de piedade, Padre Marciano, a bravura de sacerdote
jovem, ardoroso e destemido, a coerência à vocação que tanto amaste, transfundindo,
momento a momento, não obstante tuas limitações de criatura humana, a pujança de teu
ideal, agora transformado pela divinização da nova vida, que não te foi tirada mas
transformada em nurífico Tabor de glórias de Deus trino e uno.
Olha daí da parúsia celeste, Padre Marciano, para os teus familiares, ex-
paroquianos, amigos e conterrâneos.
Invoca instantemente ao Divino Espírito Santo, a florescente eclosão de novas e
santas vocações sacerdotais e religiosas. Vela pela tua Igreja peregrina. Desperta a
religiosidade e o fervor adormecido no coração da juventude. Acompanha daí da tua glória
esta mesma Igreja que tanto amaste e a ela foste fiel até o fim. Reza pelos pobres a quem
revelaste solicitude e compaixão. Consumistes, Padre Marciano e te devoraste no zelo
ardente como o profeta na pregação da justiça e da fraternidade.
Descansa agora na eterna luz que não se apaga, como o Apóstolo que combateu o
bom combate e guardou a fé.
Despetalam-se, sobre tua memória abençoada, as flores da humildade... fossem
lágrimas de fervido pranto sobre teu sacerdócio, suspirem todas as almas pelas colinas
eternas e glorifique-se a Deus Pai, a tua morte, antecâmara radiosa de tua ressurreição.
86
E O SONHO ACABOU?
87
daquela época: José Lourenço, Antônio Claret, Sebastião Henrique Souza, Matias Arantes e
Célia Lamounier de Araújo, que fizeram empréstimos bancários para quitar os pagamentos
conforme combinado e dar condições, assim, de ficar com o imóvel para a Prefeitura. Os 20
milhões ou 10.362,69 OTNs de 05.08.88 transformaram-se em 120 milhões após seis meses
e a Prefeitura não tinha em mãos este dinheiro. Mesmo assim continuava sendo uma ótima
aquisição.
No dia de passar a escritura para a Prefeitura, chamados ao gabinete do Prefeito,
falamos sobre a parte da Academia e sua resposta foi: “já está tudo pronto, vamos passar a
escritura do imóvel todo e depois eu resolvo isso”. Na boa fé que nos merecia, assinamos.
Infelizmente... o prefeito passou a ter novos amigos, novas idéias e se distanciou do
planejado. Até a biblioteca carinhosamente refeita pelo Zé Lourenço foi passada a outras
mãos. Sequer soube ter um retorno referente ao imóvel que ficou, durante 4 anos
“emprestado” para uma Escola Estadual enquanto a própria Prefeitura reconstruía o prédio
da citada escola: salas alugadas a particulares que não pagaram nada e o sonho da
Faculdade se derreteu frente ao muro do indiferentismo total.
O Prefeito e seu digno assessor chegaram ao cúmulo do absurdo de dizer que não
sabiam nada sobre o direito da Academia em parte do imóvel. Temos o testemunho de suas
próprias assinaturas, de muitas outras pessoas, do sr. Arnaud Antônio da Silva, atual vice-
prefeito, documentos e fatos.
RESSALTE-SE que estava sendo pedido não a parte de direito, mas tão somente o
reconhecimento de nosso empenho através de uma sala, num prédio que foi comprado pela
Academia para a Municipalidade e do qual muitos estavam usufruindo sem nada ter feito
em prol de sua aquisição.
A Academia não precisa de imóveis e sobrevive muito bem sem uma sede. Se
tocamos no assunto hoje é única e exclusivamente para que fique o fato registrado e nos
faça justiça a geração do futuro. Se tudo mudou, fica então resguardado que a omissão não
foi nossa. Queríamos seguir em frente mas fomos retirados do caminho. CLA
Academia Itapecerica de Letras e Cultura
JOSÉ LOURENÇO DE SIQUEIRA
88
PREZADA IR. VIRGÍNIA FERREIRA
PROVINCIAL DA CONGREGAÇÃO DE SÃO JOÃO BATISTA
FOGOS
Da Revista do Arquivo Público Mineiro nº 1 de 1897:
O Termo da Vila de São Bento do Tamanduá em 1830 tinha 863 fogos assim
distribuídos
Vila e Matriz de Tamanduá 264
Arraial de S. Antônio do Monte 51
Bom Jesus de Matozinhos A. Velho 30
A. da Formiga 147
A. do Destino 36
A. e M. do Piumhy 83
A. e M. do Bambuy 38
A. e M. de Campo Bello 71
A. dos Cristaes 16
A. Sra. Ajuda do Rio Grande 16
A. de Candeias 39
A. de Matosinhos das Candeias 23
A. de S. Francisco de Paulo 49
89
ATA DA REUNIÃO ESPECIAL DA AILC
As. Levy Antônio Beirigo Malaquias, Lindolfo Pena Pereira, José Lourenço de
Siqueira, Carlos Mesquita Maia, Magda Rios Lamounier, Ieda Madeira, Célia Lamounier
de Araújo, Sebastião Henrique de Souza, Roberto Duarte Gomides e Ricardo Antônio
Renó.
90
TERMO DE ENTREGA DO IMÓVEL DO COLÉGIO IMACULADA
CONCEIÇÃO, SITO À RUA J.K., 96, EM ITAPECERICA-MG
Promitente Vendedora
As. Irmã Maria Joana da Conceição Ferreira
Promitente Compradora
As. Célia Lamounier de Araújo
TESTEMUNHAS:
As. Geraldo Manoel dos Santos
As. Ronaldo Ribeiro Silva
***
91
PROJETO DE LEI Nº 28/88
Sujeito a 2 discussões
APROVADO em 14.12.88
as. Presidente da Câmara
92
JUSTIFICATIVA AO PROJETO 28/88
Consideramos que o Município é indicado para ser proprietário do imóvel e para dar
a ele a destinação adequada. Mas para que isto se concretize há necessidade de se fazer um
financiamento liquidando o investimento, o qual enriquecerá sobremaneira o patrimônio do
Município.
Diante do exposto, pedimos a aprovação deste histórico projeto, marco inicial do bi-
centenário de Itapecerica, fecho de ouro da nossa Administração.
Atenciosamente,
Em 12.12.88
93
RECIBO NCZ$ 49.796,20
94
ACADEMIA ITAPECERICANA DE LETRAS E CULTURA
Excelentíssimo Senhor,
Tendo em vista as negociações feitas em 1988 e 1989 para compra do antigo
Colégio Imaculada Conceição, iniciadas pela Academia Itapecerica de Letras e Cultura, e
finalizadas passando-se o imóvel para a Prefeitura de Itapecerica ficando em suspenso a
doação combinada de uma fração do imóvel para a Academia, conforme é do conhecimento
de muitos, solicitamos vossa especial atenção e temos a certeza de que, com a participação
ativa de V. Exa. o assunto será satisfatoriamente resolvido ainda este ano para o progresso
da Academia e de Itapecerica.
Contando com vossa costumeira justiça e ajuda, pela Academia, atenciosamente,
As. Célia Lamounier de Araújo, Levy Antônio Beirigo Malaquias, Jefferson Ribeiro
Filho, Fábio Antônio Coutinho, Jorge Malaquias, Carlos Mesquita Maia.
***
Ilma Sra.
Dra. Célia Lamounier de Araújo
Itapecerica-MG
Prezada Senhora,
Em resposta ao ofício de V. Sa. nº 03/92, de 10.11.92, em que trata da possível
doação do imóvel (sala) à Academia Itapecericana de Letras e Cultura, pela Prefeitura
Municipal, temos a informá-la de que foi solicitado um aprofundamento do assunto ao Sr.
Secretário Geral da Prefeitura, o que realmente foi feito, conforme cópia anexa para sua
apreciação.
Sem outro particular, apresentamos a V. Sa. nossas
Cordiais Saudações.
Lindolfo Pena Pereira
Prefeito Municipal
95
ITAPECERICA, 10 DE DEZEMBRO DE 1992
Exmo. Sr.
Dr. Lindolfo Pena Pereira
DD. Prefeito Municipal de Itapecerica-MG
Atenciosamente,
***
96
JORNAIS DE ITAPECERICA
97
PINGOS DE SABEDORIA
* “Quem conheceu Itapecerica jamais esquecerá o seu povo elegante e amigo, as Semanas
Santas e o jardim onde era o encontro dos namorados ao som da retreta no coreto
enluarado. Depois as serenatas e o violão de Neto e Victor Bento.”
(Áurea Venâncio – Divinópolis)
98
99
100
LEVY ANTÔNIO BEIRIGO
MALAQUIAS
101
feliz ao Vaticano II que prescreve prioritariamente o culto da latria, para colocar em
vivência os valores da verdadeira piedade. Rezava também nos altares, venerando todas as
sagradas imagens. Por muitos e muitos anos foi festeiro da Ascenção do Senhor, celebrando
o evento com muita piedade, não deixando de vestir o terno de alpaca inglesa da solenidade
que somente é celebrada em nossa terra, com as características locais do conhecimento
itapecericano. A fidelidade à sua vocação de cristão marcou toda a sua história e o projetou
entre seus pares e pósteros, herança que ele nos legou e à sociedade.
Chegara a hora derradeira... e o mistério do Horto nele iria se cumprir. Estava
combalido o corpo e forte o espírito, pronto e disponível. No limiar do definitivo encontro
com o Pai, no silêncio e na paz ele rezou aquela última oração da cruz: “Consumatum est”,
tudo está terminado!
Em 30.06.1972, quando sua alma sedenta de Deus, como corça que busca águas
tranqüilas da fonte, voava para o céu com quase 84 anos de idade bem vividos.
Esse itapecericano não foi um homem célebre na política, nem na tribuna ou nos
feitos dos grandes vultos da história de nossa terra. foi apenas um nobre e humilde cristão,
sujeito às contingências e limitações humanas, herança de nossos primeiros pais. Toda sua
vida foi trabalho e oração.
Assim, a permanência de Francisco Gonçalves Beirigo, em meio a nós se perpetua
hoje e sempre na bondade de seus exemplos.
“Sua vida não lhe foi tirada, mas transformada e arrebatada” para o convívio dos
anjos e dos santos no paraíso celeste, onde ele nos espera um dia para o reencontro
definitivo na CASA DO PAI.
***
102
ORDENAÇÃO DO PADRE JOSÉ ORLANDO SIQUEIRA
103
A messe é grande, dizia o Senhor, e os operários são poucos. E o saudoso Papa Pio
XII dizia que o mais grave e perigoso problema da Igreja é a escassez de clero. Porque onde
falta o sacerdote, falta a voz que repete a palavra da vida eterna; onde falta o sacerdote, a
Igreja fica fria, muda, deserta; sobre seu altar não desce mais Jesus Cristo, e falta a mão
para distribuir a Eucaristia às almas famintas; falta a mão que abençoa, o amor que funda os
lares sobre a proteção divina.”
Em Itapecerica, em cada casa, existe uma prece de agradecimento pelo seu
sexagésimo primeiro filho a alcançar a dignidade do sacerdócio e uma veemente súplica a
Deus para que outros itapecericanos venham aumentar o número dos eleitos do Senhor.
Nem todos itapecericanos puderam estar presentes na vossa ordenação sacerdotal,
padre José Orlando. Entretanto, espiritualmente, se transportaram todos para esta
hospitaleira cidade de Capitólio, parte integrante da acolhedora Diocese de Luz, cuja frente
está o grande vulto da Igreja. D. Belchior Joaquim da Silva neto, autêntico pastor, outro
Cristo em nome do qual, vigilante, usa o báculo para congregar os súditos e afugentar os
lobos que põem em risco o seu rebanho.
A D. Belchior e ao povo de Capitólio, nossos agradecimentos pelo que nos é dado
festejar e pela recepção com que nos acolheram.
Padre José Orlando, rogamos a Nossa Senhora da Glória, mãe caríssima de todos
nós, que aconteça o que acontecer, por mais dificuldades que tenha que enfrentar na vida
sacerdotal, permaneça fiel ao vosso compromisso e possa fazer da frase do saudoso servo
de Deus, D. Luiz do Amaral Mouzinho a vossa senha: “ser padre foi a maior graça de
minha vida.”
(Capitólio, 15/08/81)
104
Discurso proferido por Levy A. B. Malaquias por ocasião da posse do
Pe. EDILSON ANTÔNIO MANUEL como Vigário de Itapecerica
Local: Grupo Severo Ribeiro – Janeiro de 1986
É para nós muito grato, dirigir uma palavra de saudação ao Revmº Pe. Edilson neste
momento de confraternização entre o Pastor e suas ovelhas.
Atendendo ao chamado divino ingressastes nas fileiras dos levitas do Senhor a fim
de dedicardes toda a vossa vida à santa missão de pastor de almas.
E que haverá de mais nobre que o Sacerdócio que abraçastes? Curar as almas,
confortar os aflitos, amparar os fracos, esclarecer os ignorantes, afervorar os tíbios, trazer
ao bom caminho os transviados, fortalecer os crentes, eis o que de vós espera a nossa
Paróquia, à qual, no dia de hoje, assumistes.
Vossa piedade e vossa cultura são aliás o penhor de que vossa missão será levada a
cabo com fervor e unção, características dos verdadeiros servos de Cristo Senhor Nosso de
quem sabemos ser um soldado incondicional.
105
ANIVERSÁRIO DE SEVERO RIOS
06/05/1987 (Pronunciado no Sítio da Prata)
Aqui estamos reunidos para não só trazer nossos abraços de felicitações a uma
pessoa que, na verdade, merece a nossa admiração, mas também para desejar-lhe com toda
sinceridade e com todo o calor de nossa alma, dias cercados pelo carinho dos familiares e
de nós outros.
Não importa saber que fazer anos é envelhecer. Pessoas como Severo Rios não
envelhecem nunca. Vê-se, perfeitamente, que através do brilho de seus cabelos começando
a ficar grisalhos existe uma perene luz de mocidade, um clarão de energia, essa juventude
que permanece na alma dos fortes, no coração dos bons, no espírito dos honestos e que tem
a música, essa divina arte como eterna companheira.
Ao repassarmos as páginas amareladas de 80 anos de vida do nosso amigo Severo,
damos o nosso testemunho de 50 anos vividos para o trabalho, a família, a música e a
comunidade. Os outros trinta, através de terceiros ficamos cientes que tiveram as mesmas
características.
Severo Rios deixou em inúmeras gerações impressões fortes e saudosas recordações
pelos sons maviosos da inesquecível Jazz Oriental, executando melodias imortais de Noel
Rosa, Pixinguinha, Benedito Lacerda, João de Barros, Ataulfo Alves e outros monstros
sagrados da nossa música popular.
Vale a pena, portanto, fazer anos, reunindo familiares e amigos para festejar 80
anos, vividos plenamente, conhecendo alegrias, sofrimentos, próprios da nossa condição
humana.
Severo, se na terra encontramos momentos de felicidade, essa reunião é o
testemunho vivo da felicidade que desfrutamos graças ao seu aniversário. Portanto,
rendemos graças a Deus que lhe proporcionou este grande acontecimento que muitos
tiveram vontade de vivê-lo e não foi possível.
Do outro lado, invisível aos nossos olhos materiais, mas visíveis aos nossos olhos
espirituais, existem outras pessoas participando da mesma alegria e confraternização.
Se fosse possível parar o tempo, eu o pararia neste instante, transformando este
aprazível Sítio da Prata, num novo Tabor. Entretanto, como isto é impossível, pelo menos
retenho o tempo com a minha inexpressiva palavra para dizer que vêm e vão os
aniversários, a vida vai se acabando pouco a pouco, porém não passará jamais a amizade
que dedicamos a você e que terá sempre o mesmo calor deste momento. Recebe pois estas
palavras de quem não pode parar o tempo, mas que pode vencê-lo com a eternidade do
afeto que concretiza a homenagem que lhe prestamos, que estendemos a todos seus
familiares.
106
DEZ ANOS DE SAUDADES...
MAESTRO CESÁRIO MENDES DE CERQUEIRA
“Ontem, uma presença, hoje uma saudade, mas eternamente uma lembrança”.
Este instante é de quietude e pesar. Sabemos que a nossa palavra mal cabe neste
campo santo. Porém, não poderíamos deixar de vir aqui hoje, neste teu segundo berço,
quando fazem dez anos que o Senhor, atendendo a convocação do Maestro dos Maestros
partiu, nos deixando chorosos, para se unir, na Jerusalém Celestial, aos seus familiares e
músicos da Corporação Musical Nossa Senhora das Dores, que sentiam sua falta e
esperavam pelo Senhor para o reencontro definitivo na plenitude da bem-aventurança
eterna, onde não mais haverá angústia, dor, sofrimento e separações.
Entretanto, sua volta à casa do PAI, mesmo acreditando na ressurreição, nos deixou
tristes, e porque não dizer, saudosos nestes dez anos que hoje contamos.
Tio Zaio, invisível aos nossos olhos materiais, mas visível aos nossos olhos
espirituais, num outro plano de vida, mais pleno, não sujeito às limitações humanas e do
tempo, queremos dizer que temos o Senhor sempre presente em nossos pensamentos, que
para nós o Senhor não morreu, apenas assumiu uma nova dimensão: a imortalidade. Nos
antecedeu para provar que um dia esteve entre nós. O Senhor em nossos corações.
“Morrer é debruçar-se sobre a aurora. É ouvir na noite solitária agora a música
infinita do silêncio”.
A nossa presença é para prestar-lhe o culto da nossa amizade, gratidão e saudade.
Consola-nos saber que está junto de N. S. das Dores, da qual foi um devoto piedoso e fiel.
Amigos: “Existe algo imortal que nem o tempo e a distância podem separar: A
lembrança”. Cesário Mendes de Cerqueira é esta lembrança.
107
MARIA DO ROSÁRIO DE MORAIS
BODAS DE OURO
“Os filhos e netos deste casal exemplar e simpático, são como ramos em redor de
sua mesa e ornamentam de muita alegria e felicidade os dias ditosos de uma família digna”.
A evidência do milagre e perenidade do amor se estampa claramente nesta reunião,
repleta de tanto carinho, oração e fé.
A perpetuidade do amor e doação está nesta confraternização para lição – desafio a
tanta derrocada do suporte da família.
Este casal nos ministra lições de bondade, coerência e amor.
Que estas lições salutares sejam imitadas por nós.
É bom lembrar: “Felizes os que caminham unidos para construção da vida”.
É por toda esta riqueza de bons exemplos que filhos e netos, conterrâneos e amigos
festejam tão ditoso casal.
Aromas de bênçãos pairam sobre este local, porque a Igreja hoje se ufana com a
renovação do sacramento.
PAULINHO DOS BANGUÉS, fazendeiro honesto, trabalhador, pai exemplar,
cidadão probo, religioso, pelas suas qualidades de caráter estendeu sua solicitude e
operosidade à cidade que o viu nascer.
Agricultor, pecuarista, se fez homem público, tendo sido Delegado de Polícia
Municipal, Juiz de Paz, Presidente da Câmara, Vice-Prefeito e Prefeito por dois mandatos,
sendo a tônica dominante por onde passou, a honestidade e o amor à causa pública.
Trabalhou com afinco por Passa Tempo, imprimindo vida nova. Humanista sempre
acolhia os reclamos das obras sociais. Na humildade de seu trabalho, por uma força viva
para Passa Tempo.
Amante da lavoura e da pecuária, delas tirava o sustento da vida, auxiliado na
administração da fazenda por sua dedicada Maria do Rosário e filhos, que hoje se dobram
108
diante do Senhor das Searas e celebram a proteção divina.
E MARIA DO ROSÁRIO, também no recesso da casa se nos apresenta como
exemplo de mãe e mulher religiosa, sempre voltada para a família, sustentáculo das lutas de
PAULINHO.
É aquela mulher cristã que sabe transferir o Evangelho para a vida, para que a vida
seja Evangelho.
Seus filhos, genros e netos têm nela o exemplo do cumprimento do dever, da
solidariedade e do amor fraterno.
É por isto que eles estão aqui diante de todos para o louvor e ação de graças,
rodeados de tanto carinho.
A vossa jornada de união não termina aqui.
“Continuareis unidos pelo resto da existência e mesmo além das fronteiras deste
mundo efêmero, porque soubestes honrar o juramento que fizestes a Deus e enobrecer a
confiança que um coração depositou no outro”.
Queremos festejar a bondade de vocês e rogar a padroeira querida de Passa tempo,
Nossa Senhora da Glória, nossa Mãe Celeste, Rainha do Belo Amor, que os conserve por
muitíssimos anos de vida abençoada para a alegria de todos nós.
109
UM ANO DE SAUDADES
A Sepultura, para os que amaram Deus, como o Dr. Severo amor, é a porta da sala
da casa do nosso PAI comum. É taxativa a promessa de Jesus Cristo: “QUEM COME A
MINHA CARNE E BEBE O MEU SANGUE TEM A VIDA ETERNA E EU O
RESSUSCITAREI NO ÚLTIMO DIA”.
Dr. Severo continuará a viver em nossos corações, pois, “Na terra, há sempre um
lugar em que os nossos mortos não morrem nunca: dentro de nós mesmos”.
Concluindo, queremos repetir aqui ALVES MENDES “Homens como o Dr. Severo
Augusto Ribeiro não vão por inteiro à sepultura: deles em caráter imorredouro,
permanecem vivos em nossas lembranças os exemplos, os ensinamentos de sua cultura e
sua inteligência”.
“As cidades que não cultivam a memória dos seus grandes filhos não radicando ao
passado, não se projetam no futuro”.
110
CARTA DE 27.01.1977
Sr. Prefeito,
Antônio Lopes de Araújo
111
para a posteridade os nomes daqueles que enfrentaram a difícil missão com o risco da
poluição do desconhecido. Eldumar Martins, Antônio Rios, Fátima Mesquita, José Luiz de
Andrade, José Belchior Pereira, Maurício Geraldo da Silva e o autor deste despretensioso
relatório.
Cada um de nós todos passamos na vida. entretanto, cada um teve sua parcela de
responsabilidade nos acontecimentos que envolveu ou foi envolvido seja por ação ou
omissão e deverá prestar contas de seus atos perante o tribunal da história.
A papelada restante do arquivo morto que a nosso ver não constituía objeto de
futuras pesquisas históricas, foi toda amarrada e colocada no prédio alugado pela Prefeitura,
residência antiga e terrena do saudoso e prestativo cidadão OSIRES FRANCISCO
MALAQUIAS do qual com orgulho e sem modéstia temos o prazer de declarar que somos
um dos seus inúmeros netos, naturalmente, o mais humilde a venerar sua imperecível
memória.
Sr. Prefeito, pedimos desculpas por este final sentimental e familiar, é a emoção do
contato com os documentos e a participação dos meus ancestrais que nos levaram a ele.
Com os protestos de nossa estima e reconhecimento, felicitamos V. Sa. pela medida
tomada que assim que deu uma nova dimensão para uma tomada de posição, visando situar
nossa gente e os fatos a ela relacionada para as futuras gerações, subscrevemo-nos
comovidamente.
112
O SETENÁRIO DE DORES EM ITAPECERICA
REMINISCÊNCIAS E REFLEXÕES
Jair Moreira
Janeiro 1985
113
veneração dos fiéis na urna de vidro, ao pé do altar do Seráfico Pai, São Francisco.
Já na Sacristia, estava o Senhor Morto, coberto com uma colcha de sêda violácea,
entremeada de renda bege, muito bonita, despertando contrição aos adultos, piedade e medo
aos meninos, que raramente, se aproximavam da venerada imagem, impressionados com
seu enorme porte e chagas sangrentas.
Dir-se-ia um cadáver exposto, em velório fúnebre lacrimoso e tétrico.
Amava-se, então, agora, sobre o presbitério até a altura das janelas interiores dos
consistórios ou tribunas laterais, uma grande escadaria de sete degraus atapetados,
encimados por longo tablado, onde seriam colocadas, em cada noite, as imagens dos Passos
da Paixão.
Atrás dessa escadaria, elevava-se uma enorme cruz, que assentada no chão rente ao
altar mór, se projetava até o teto.
Atrás da grande cruz, bem no fundo do palco improvisado, descia um denso manto
negro, enfeitado de ramos, palmeiras e algumas luzes.
Esse manto cobria as refulgências do ouro do altar, seus adornos artísticos e
caprichosos arabescos.
O cenário da Paixão era uma alegria comovida e novidade para a garotada, e, porque
não dizê-lo: um despertar de religiosidade profunda, que transbordava daquelas almas
puras, não contaminadas ainda pela poluição da maldade, do vício e do pecado.
E lá no outro consistório, atrás do altar mór, no primeiro lance da escada, as
Senhoras Dª. Dasdores, Maria José Mesquita, exímias floristas e Dª. Clara Beirigo; Dica e
Zeca Barbosa; São Malaquias e Zica Beirigo, genitora do Ozires, alfaiate, radicado em Belo
Horizonte, e do ilustre Dr. Levy, primoroso zelador e restaurador da Igreja da Ordem
terceira Franciscana; Dª. Ducarmo d’Anunciação e Maria Cândida Porfírio, cantora;
Madalena Libório, a mestra bondosa e enérgica e Dª. Maíta, dedicada costureira das
imagens que até hoje, ficam veladas, o ano inteiro, num cômodo de madeira, tipo capela, no
mesmo local.
Essas senhoras não permitiam, salvo exceção, que os meninos curiosos, assistissem
à piedosa tarefa.
E quando esses meninos teimavam em ficar no recinto, elas os escorraçavam,
dizendo-lhes assim:
– “É proibido... é pecado! Vocês não podem ficar aqui”.
E mansamente, um a um, eles iam saindo todos.
Todas a noites às 18:30h, e ao meio dia da Semana de Dores, os Sinos de São
Francisco bimbalhavam, como suspiros, de almas sofridas e contritas, e como lamentos,
corriam na longa voz dos ventos, e, iam se derramando sobre a cidade compungida,
convidando a todos, para rezar.
E o povo piedoso e dócil, ia contrito, venerar a Mãe Dolorosa, ao pé da Cruz,
lacrimosa.
Iniciava-se, pois, o setenário com o toque da primeira Marcha Fúnebre.
Em seguida, descerrava-se, de alto a baixo, à semelhança do véu do templo, o pano
preto, pesado e grosso do arco do presbítero, para que todos contemplassem, lá no alto da
escadaria, as lágrimas de Nossa Senhora e o Calvário do Filho amado.
Diante de tanta piedade e emoção, mães compungidas, aflitas e esperançosas, bebiam
do pranto de Maria, conforto e confiança, piedade e força, para os trabalhos de cada dia...
Pais cansados e apreensivos, buscando, entre preces e silêncio místico, certeza e
proteção da Virgem Dolorosa.
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Jovens e moças de olhos fitos para o alto, contemplando tanto amor e tanta amargura,
tanta doação e tantos sofrimentos, expressos nos semblantes da Mãe e do Filho mártires em
suas almas sonhadoras.
É por isto que aqueles casais eram bem mais felizes, bem mais compreensivos e
tolerantes no casamento, porque sublimavam seu afeto, na Contemplação mística da vida de
Nossa Senhora. Jamais lhe acabava ou esgotava aquele amor, jurado no altar.
Sabiam perenizá-lo, apesar das limitações e vicissitudes, até que a morte os
separassem.
O corpo da Igreja (nave central) ficava apinhado de gente. As Senhoras mais
humildes, com suas saias grossas e rodadas daquele tempo, se assentavam no chão,
dificultando a passagem a quem quisesse ir até o Altar.
E em toda a extensão dos outros dois consistórios, vulgarmente chamados
“Torrinhas”, ladeando a nave, debruçavam-se nos gradis os rapazes para o furtivo olhar às
jovens senhoritas, na busca de um sorriso e conquista do coração, moças casadoiras e toda
sorte de gente, também tentavam visualizar, melhor, as imagens da Paixão, lá no alto da
escadaria.
Era, pois simplesmente, edificante a presença de Dª. Saçãozinha, da Rua de Santa
Rita, senhora corpulenta e simpática, trazendo brincos e cordões de ouro, instalada,
confortavelmente, em genuflexório, ao lado do altar dos Passos; Sra. Rita, muito alta e
esbelta, escura, de alma branca, moradora da antiga Rua dos Coqueiros, trajando sua
inseparável capa preta, comprida, grossa e rodada, com ares de baronesa; Dª. Altina, a
ceguinha apressada e comunicativa, da Rua Nova, atualmente, Rua Afonso Pena,
devotíssima de Nossa Senhora Visitadora; Dª. Olaia, irmã do Padre Herculano, encurvada e
alegre, de voz afinada e agudo contralto; Dª. Maria Isabel do Sr. Antônio Bamba; Dª. Olina
do Largo e a menina Maria Efigênia; Siá Herculana e Siô Regino, irmãos pequeninos e
inseparáveis, caminhando todas as manhãs e todas as tardes para a Igreja, um atrás do
outro, mas bem distantes; dª. Maria Rita Macota, de gargalhada gostosa, mãe de dois
padres, um médico, um farmacêutico e dois netos sacerdotes; Dª. Nininha do João
Caldeireiro (Macota); Dª. Elísia, gorducha e serviçal, caridosa em extremo, esposa do Sr.
Lafaiete; Paulina do Alto do Rosário; Dª. Ritinha e Beralda Diniz; Siá Germana e
Pantaleão, muito altos, inseparáveis e cortezes moradores do antigo Arranca Tôco.
A par dessas matronas respeitáveis, o Siô Pedrinho, alfaiate, arrastando a sua
bengalinha, velhinho alegre a palrador, parecidíssimo com o Popó, personagem do “Chico
Anísio Show”; Zé Galdino, o congregado mariano exemplar, flautista, capinador de
quintais, rachador de lenha, o moço dos sete instrumentos, alto, magro, de fala grossa e
arrastada, manso e humilde, prestimoso irmão do Ilídio pintor, residente hoje em
Divinópolis; Zé do Ronca ou Zé da Boca Aberta, bom e inofensivo, sempre presente a
todos os enterros e atos religiosos, ia junto da Banda de Música e ficava marcando o
compasso; José Basílio, ou Zé das moças, sempre bem trajado de fraque, colarinho
engomado, gravata borboleta, lenço branco no bolsinho do paletó ou cravo na lapela, óculos
escuros e sapatos polidos.
Este simpático senhor era o esmoler de opa roxa da Irmandade do Senhor dos Passos,
que pedia esmolas, de casa em casa, todas as sextas-feiras da Paixão, o humilde Leandro,
paciente e resignado lavrador de muitas terras, depois pajem carinhoso, de muitas famílias.
Ele era, todos os anos, o Centurião, trajado, como no tempo do Império Romano que
montava a guarda do Santo Sepulcro, na Sexta-feira Santa; Honório Coragem, Crucífero
oficial de todos os enterros, naquele tempo, e nas procissões. Era uma fotocópia do
115
eminente Gaspar Dutra; Bibino e Aquiles Araújo, do Largo de São Francisco, fazedor de
lindos presépios; Pedro Surdo, o cabeleireiro ambulante; Sr. Vêncio, fazendeiro
pachorrento, esposo de Dª. Joaninha; Cel. Zirico, católico, comerciante, amigo dos pobres,
festeiro perpétuo de São Bento, era da Ordem Terceira de São Francisco e da Irmandade do
Santíssimo Sacramento; Cel. Zinho, fazendeiro, residente no Ingá, simpático, risonho e
probo, membro da Ordem Terceira de São Francisco e Irmão do Santíssimo; Cel. Egídio
Luiz de Cerqueira, comerciante muito caridoso, benfeitor da SSVP, fundador da Vila dos
Pobres e tesoureiro perpétuo da Matriz, também membro da Ordem Terceira e Irmão do
Santíssimo; o popular Tonico do Morro e muitos outros que se nos fogem à memória, mas
que nos deixaram exemplos de fé e de bondade; e Chico da Olina, tipógrafo da “Gazeta
Liberal” e auxiliar de Cartório, músico da banda, e cantava a baixa no coro.
Hoje, todos eles estão na glória do Pai, vivos nas reminiscências, nos conduzindo,
agora, a piedosas reflexões, despertando tantas e tantas saudades.
As reflexões do setenário a cargo dos Revmos. Cônegos Domiciano, Cesário,
Belchior Mendes, Monsenhor Cerqueira, Pe. João Victor Corrêa e Pe. Herculano Paz
filtravam as almas e os corações dos fiéis, concitando-os à reconciliação e penitência
sacramental, frutos imediatos da Paixão de Cristo.
A meninada irrequieta e dócil, provocava, de quando em vez, reprimendas do Pe.
Herculano, exigindo silêncio e respeito.
É que essa criançada estava mal instalada e espremida na escadaria ou em torno do
altar improvisado, ao pé do cenário da Paixão. Naturalmente, se estabelecia confusão sem
ser desrespeito à Igreja.
O piedoso Pai Lano, presidia todo o setenário, revestido de sobrepeliz fina e rendada,
de estola e capa roxa douradas.
As cerimônias eram abrilhantadas, em anos alternados, pelas corporações musicais de
Santa Cecília e Nossa Senhora das Dores, conduzidas pelo ilustre e honrado maestro José
Pires B. de Moraes e Cesário Mendes de Cerqueira, compositor talentoso e exímio
violoncelista.
Pe. Herculano celebrava e acompanhava os atos, solfejando baixinho, marcando os
compassos, à execução dos motetos e antífonas, ladainhas e partituras, sempre criticado
pelos seus opositores políticos, por essa atitude, que jamais fora desrespeito à liturgia e aos
mistérios que se celebravam.
Após a oração do solene “Oferecimento”, rezado pelo celebrante e acompanhado, em
silêncio, por todos, Pai Lano incensava as imagens e o altar, enquanto vozes e a orquestra
executavam belíssima antífona de Dores.
Essa incensação litúrgica se repetia diante do Santíssimo exposto, ao som do
“Tantum Ergo”.
Era o sagrado momento da adoração e do louvor perene.
A fumaça odorífera do místico incenso e o perfume dos manjericões trescalentes,
subiam até o Coração de Deus, levando preces, votos e pedidos dos fiéis contritos.
Revestindo agora com primoroso véu de ombros brancos e dourados, o Padre dava a
sagrada Bênção do Santíssimo, ao toque festivo das campainhas e espocar dos foguetes.
Encerrava-se, cada noite, o setenário com uma marcha fúnebre.
Os derradeiros acordes impregnavam as almas de sublimes inspirações e aspirações e
paravam no ar suspenso e sombrio daquelas noites evocadoras e melancolicamente tristes,
como triste e transida estava a alma de Maria.
Finalmente, quase vazia a igreja, enquanto a Banda lia no Coro e provava as marchas
116
para a noite seguinte, começava, cá embaixo no pé do altar, a encantadora disputa dos
meninos, sempre prediletos de Deus, e naquele tempo, tão afeitos à religião. Queriam, todos
carregar as pesadas imagens para as casas, onde, na 3ª e 4ª-feiras da Semana Santa seriam
montados os “Passos da Paixão”, ao longo do trajeto das procissões de Dores e do
Encontro, sempre muito piedosas e concorridas.
Lindo e edificante realce para nós outros: Na sexta-feira de Dores, consagrada
liturgicamente, aos sofrimentos de Maria, celebrava-se depois das 8 horas, missa solene,
muito concorrida, com orquestra e coral, ocasião em que os velhos devotos de Nossa
Senhora e muita gente nova faziam sua Páscoa anual.
Sextas-feiras tão saudosas tinham sabor de dia domingueiro, quando se praticavam
muitas mortificações, jejuns, intensas orações e proveitosas meditações.
Ah! Se voltassem aquela religiosidade e aquela devoção Mariana... O mundo seria
bem mais feliz e fraterno, como o fora naquele tempo.
Os roceiros e gente humilde edificavam a todos, cumprindo os seus votos e
promessas.
Era um renascer de fé... uma pureza de convicções.
E lá fora no Largo, de temperatura amena e saudável, Dª. Rita Sapateira, Zé
Macotinha, Geraldo Macotinha, Bobó Boaventura, o cambista tranqüilo e mais outros, iam
vendendo doces e salgados, quitandas e pastéis, cafés e chocolates quentinhos, almôndegas
e lingüiças fritas e apimentadas, trescalantes de gostosura, tentando e despertando os mais
exigentes apetites.
E lá no alto da frondosa Capoeira de Saõ Francisco, o misterioso calor da lua, ainda
que distante, ia mansamente dando os seus primeiros toques de indefinida poeira de ôcre,
para envolver de luz todos os espaços, na luz prateada da fé, que ilumina todo homem, que
vem a este mundo.
Os coqueiros, frente à Igreja, perfilavam hírtos e farfalhantes, à semelhança de
testemunhas vivas e verdadeiros epônimos da Paixão de Cristo, alheios ao vozeiro e vai-e-
vem do povo.
Eram, realmente, noites de muita luz interior e paz, de muitas saudades acredoces, de
emoções inesquecíveis, de sonhos e recordações, de muita fé cristalina, envoltas na diáfana
luminosidade religiosa, sob o fascínio daquela luz de fé, ante-câmara do luar de Sexta-feira
da Paixão.
O Setenário de Dores em nossa terra, sempre foi, além de um aprimoramento de fé,
confraternização social e cristã. Era também o encontro de velhas amizades, convívio com
os conterrâneos distantes, que vinham de longe rever os amigos, matar saudades e rezar.
Alegria para os namorados, idílio dos noivos apaixonados, esperança alvissareira de
expansão de novas famílias cristãs, divinamente constituídas.
Sempre foram assim os Setenários de nossos ancestrais e avós. Assim hão de ser hoje
e sempre alforramento de compromissos com a Justiça, com a Verdade e com os Pobres,
esperanças para a Igreja Viva de Itapecerica, um despertar consciente e sincero da nova
Juventude, para os ideais do Evangelho de Cristo.
“É preciso um gesto”
(Jean Paul Sartre)
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HINO DO BICENTENÁRIO
118
LINDOLFO PENA PEREIRA
AS QUATRO BICAS
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Ternas canções doridas
Chorando mágoas de amor
Enquanto o sujo se ia
Morrer no puro das águas
A solfejarem também
Seu murmúrio musical
Encantado,
Encantado.
Encantado se tornava
Quem dessas águas bebia
Deixando-se aqui ficar
Nunca embora mais se ia
Prisioneiro enfeitiçado
Da lendária magia
O progresso
Prepotente
Com o asfalto chegou
Frio
Indiferente
Nem notou as quatro bicas
Desprezando a poesia.
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O trem-de-ferro, assustado
Depressa se afastou,
Até hoje ninguém sabe
Por onde anda o coitado.
E as quatro, de tão cândidas
Em si mesmas se fecharam,
Coradas, emudeceram
E nunca mais juntaram
Seu canto com as lavadeiras.
E as quatro se eternizam
Nos eternos da saudade
No sem-fim do pensamento
Nas lendas que o povo conta
Dos encantados sem conta
Que jamais daqui se foram
Perdidos no seu feitiço
No canto das lavadeiras
Cantando, dolentemente:
121
LINDOLFO PENA PEREIRA
POBRE DIABO
Numa dessas tardes calmas, marcada por intenso calor, estando só, pus-me,
sonolento, a cismar, após atenta leitura sobre assuntos metapsíquicos, quando, mergulhado,
completamente, em sugestionantes cogitações, vi, num repente, diante de mim, como se
trazido, ali, via dos sortilégios de uma bruxa qualquer, um vulto muito estranho.
Amedrontado, quis fugir. No entanto, dominado pelo pavor, não pude fazê-lo.
Reuni, então, trêmulo, todas as minas forças e apenas consegui fazer breve menção de
afastar-me.
Notando meu precário estado e minha intenção de ir-me, o vulto falou-me, tentando
disfarçar sua voz roufenha e desagradável:
– Não é preciso ter medo, amigo. Fique calmo. Nenhum mal vou fazer-lhe.
Mais à vontade, depois daquelas tranquilizadoras palavras, pude examinar melhor a
esquisita aparição.
Era um velho, alto e magro, de rosto encarquilhado e triangular, arrematado por
uma barbicha inteiramente branca, logo abaixo de bocarra imensa, rasgando-se de fora a
fora, acima da qual pendia, adunco, pontudo nariz. A testa, enrugada, caminhava pela
cabeça acima, em largas e compridas entradas, em cujo centro rareavam cabelos já
grisalhos. Os olhos esfumaçados, mirando, humildemente, o chão, denunciavam amarga
tristeza.
No alto da cabeça, dois rombudos chifres, e, ladeando-a, duas pontudas e imensas
orelhas, um tanto caídas, de tão envelhecidas e murchas. Nas costas, um par de horrorosas
asas, feitas de grossa armação de barbatanas, sustendo cinzenta pele, ralamente coberta de
pelos espessos, pontilhando, de longe em longe, recurva nos intervalos entre uma barbatana
e outra, tal qual nos guarda-chuvas, de aspecto mais asqueroso do que as asas dos
morcegos.
Entre as pernas, longo rabo que se arrastava pelo chão, dolentemente.
A mão direita, na qual sobressaíam gastas unhas, ainda algumas pontiagudas, outras
quebradas, segurava enferrujado tridente, cujo cabo se apoiava no solo.
A mão esquerda, que segurava ensebado livro de capa preta, exibia dedos cujas
unhas apresentavam aspecto idêntico ao observado na direita.
Curvado, por força de acentuada corcunda, o tronco nu mal sustinha arqueados
ombros, torturados, parecia, por insuportável peso.
A pele, cadevericamente pálida, nem sequer escondia os ossos que se deixavam
adivinhar por baixo dela, mostrando asqueroso aspecto enfermiço.
De quando em vez, violenta e irritante tosse estrangulava aquele peito que se
anunciava doente, fazendo temer que sufocaria a terrível visão.
Depois do minucioso exame a que submeti o vulto de ignóbil parecer, meu pavor
inicial transbordou-se em um dó imenso.
Penalizado, dirigi-lhe, por fim,, a palavra, indagando-lhe:
– Quem é você que, tão abruptamente, se , se intromete em meus cismares e quase me
122
mata de susto?
Ouvindo minha voz e percebendo que eu estava disposto a uma diálogo, o vulto
pareceu ficar satisfeito, deixando escapar um triste sorriso. Entreabertos os lábios, de um
amarelo inexpressivo, consegui ver, por trás deles, uma boca inteiramente desdentada.
– Amigo, eu sou o diabo, respondeu-me. Você, com certeza já ouviu falar muito de
mim e de minhas façanhas.
– Sim, de fato, já ouvi, e muito, repliquei. Mas o diabo, a respeito de quem ouvi
contar terríveis histórias, não era assim como o vejo agora, desculpe-me a franqueza rude,
velho, débil, acabado, humilde e desanimado. O diabo que me pintaram, desde a infância, e
que, naquela época, colocava inquietantes nuvens negras no límpido azul de meus
descuidados pensamentos infantis e povoava de atrozes pesadelos meus inocentes e
coloridos sonhos de criança, era um diabo diferente, vigoroso, soltando fogo pela boca, por
entre afiadas presas e pelas narinas infladas, cheirando a enxofre e terrivelmente incansável,
correndo o mundo, na sua eterna busca de almas pecadoras, para as chamas do seu
implacável reino infernal.
Vejo-lhe os chifres, porém não mais pontiagudos; noto-lhe o tridente, outrora terrível,
era enferrujado e mal seguro por cansada e velha mão; percebo-lhe a boca má, no entanto,
desdentada; e as unhas gastas; e a calvície acentuada, arrasando com o que resta da antiga e
indomável cabeleira ruiva. Não lhe sinto o característico fedor de enxofre e nem o vejo
botar fogo pela boca.
Cabeça baixa, olhos fitos no chão, o diabo ouviu tudo calado.
Surpreendi-lhe uma lágrima solitária, no canto de um dos olhos, quando levamos as
vistas, pousando-as, sonhadoramente, lá longe, no infinito.
– Verdade; tudo o que você disse é a mais pura expressão da verdade. Este que,
cansado e desiludido, aqui vê, à sua frente, não é nem a sombra do temível demônio de
outrora.
Fui a mais cara criação de Jeová. Entre todas as figuras angelicais, eu era a mais pura
e inteligente.
Preferido do chefe, possuidor de supinas qualidades, num dado momento,
conscientizei-me do grande poder de que fora dotado e julguei-me capaz de ser igual a ele.
Foi apenas isso. Jamais lhe quis o lugar de chefe, conforme, maldosamente, propalaram,
pois sempre julguei que aquele lugar, por direito, até de antigüidade, sempre foi somente
dele, que o exercia, aliás, justiça se faça, com toda competência.
Ele, entretanto, velho frio e insensível, voltou sua ira contra mim, e, sem maiores
indagações, sem nem sequer cuidar de instaurar um inquérito ou coisa parecida para a
apuração da verdade, acreditando nas insidiosas aleivosias de algum colega invejoso do
meu sucesso, acusou-me de traição, expulsando-me, sem dar-me qualquer oportunidade de
defesa, dos territórios de seu vasto domínio.
Minha revolta foi tão grande, pelo que considerei um ato de inominável injustiça, que
o ódio apossou-se inteiramente de mim. Esse sentimento, altamente negativo, constitui
deletéria peçonha que, por não poder, naquele momento, descarregar sobre outrem, atuou
sobre mim mesmo, envenenando-me a delicada tessitura, que, então, transformou-se,
inteiramente.
Minhas belíssimas asas de brancas penas, finamente tecidas, mudaram-se em negras
asas, armadas de barbatanas quais a de um morcego. Meus dentes de pequeninas e alvas
pérolas, cresceram, atingindo descomunal tamanho, semelhando hediondas presas de abjeto
animal. As orelhas se deformaram, transmudando-se em horripilantes orelhas, mais feias
123
dos que a de um asno, afiladas e pontudas.
Enormes chifres cresceram em minha testa. Minhas unhas viraram terríveis garras e,
completando-me a desgraça, vi surgir de mim disforme e peludo rabo.
O ódio, represado em meu íntimo, saía-me pelas narinas e pela boca, em forma de
chamas ardentes.
Só não se alterou a minha inteligência apurada. Isso era patrimônio meu e ninguém,
nem mesmo ele, m’a podia tirar.
Senhor de quase toda a sabedoria que era, juntei minha ciência e meu ódio, infinitos,
e jurei vingança, colocando esses dois invencíveis servos meus a serviço do mal, em
implacável e eterno combate a Jeová.
Procurei um local adequado, um local tenebroso e ermo, onde nem os mais horrendos
animais e insetos conseguiam freqüentar e, aí, edifiquei a minha morada; meu reino, onde
imperaria, absoluto.
Ateei fogo ao local, fogo arrancado do meu ódio supremo, crepitando, eternamente,
em chamas indomáveis.
Construi caldeirões imensos, enchendo-os de água e enxofre, em permanente estado
de ebulição. Nesse ambiente passei a viver adequadamente, visto como afinava-se, de modo
perfeito, com as condições do meu estado íntimo.
Mais ou menos por essa época, havia Jeová completado uma obra de cuja perfeição se
orgulhava: um mundo a que deu o nome de terra, e, dentro dele, em local escolhido a
capricho, um maravilhoso jardim a que denominou Paraíso. Para habitar esse jardim de
delícias, fez, o que considerou sua obra prima, um homem e uma mulher, que eram o seu
encanto. Fui informado de que Jeová, velho vaidoso, ficava, horas a fio, admirando o casal
que criara, embevecido com sua beleza e perfeição.
Resolvi, então, que a melhor maneira de feri-lo seria atacar a obra de que mais
gostava, botando a perder o casal, o que, por certo, o irritaria profundamente.
Planejei tudo, minuciosamente, e obtive êxito, completo na empreitada, conforme já é
do seu conhecimento, pois está contado no Antigo Testamento.
Minha maior satisfação foi ver Jeová, no paroxismo do desespero e do ódio, expulsar
o casal do paraíso.
Plenamente realizado com o êxito da empresa, propus-me prosseguir na vingança,
indefinidamente, perseguindo o casal e sua descendência, pelos tempos afora, de forma a
conduzi-los, quando morressem, para o meu reino infernal, que já lhe descrevi, como forma
permanente de irritar o terrível Jeová, conquistando, definitivamente, para mim, o que ele
havia criado para ser só seu.
Para tanto, em constante lições, repetidas, minuto a minuto, dia a dia, de geração em
geração, fui instruindo os homens, descendentes do infeliz casal, ensinando-lhes a prática
reiterada do mal, em todas as suas nuances.
– Não entendo, disse eu, interrompendo-o, qual a causa da tristeza e do desânimo de
que o percebo portador; pelo que sei, é inegável que você vem encontrando grande sucesso
no intento.
– Você se engana, retorquiu o diabo, com acento ainda mais triste na voz. Até certo
tempo sim, venci, gostosamente. Era temido e detestado, com meu inferno azucrinando,
constantemente a humanidade; minhas diabólicas artimanhas pondo-a a perder; e eu
gozando as reiteradas vitórias e a fisionomia decepcionada de Jeová.
Hoje, entretanto, prosseguiu, olhar perdido no infinito, expressão de fundo desgosto
no semblante abatido, não é mais assim.
124
– Acaso, atalhei, a humanidade deixou de ouvi-lo, melhorando-se? Não é isso,
absoltamente, o que se nota, hoje em dia. Aliás, o contrário disso é o que se vê, por toda
parte.
– É aí, justamente, continuou, onde está o meu problema. É verdade que os
descendentes do primeiro casal já não me ouvem, mas não é por se terem melhorado. Pelo
contrário. O homem superou-me, infinitas vezes, em maldade, construindo, na terra, um
inferno incomparavelmente mais eficiente do que o meu.
De que vale o meu pobre inferno, com seu fogo eterno, suas caldeiras de água
fervente e mil outros requintados suplícios, criados pela minha sabedoria sempre voltada
para o mal, diante do grandioso inferno, criado pelos homens? O ódio, a vaidade, a astúcia,
a ignorância e inúmeros outros trevosos defeitos que a humanidade cultivou, com esmero
invulgar, gerando guerras hediondas e terríveis que matam populações inteiras, em poucos
minutos, inclusive criancinhas inocentes, constituem maldade, um sem número de vezes,
melhor do que a minha.
As bombas que o homem inventou podem, num simples apertar de botões, destruir a
terra inteira, coisa de que cogitar nem sequer cogitei.
Veja, você, as crianças famélicas, perdidas nas ruas, dormindo ao relento, nas noites
de gelo ou de chuva, cursando a universidade do crime; os mendigos, tristes velhos
abatidos, qualquer que seja a sua idade, sem teto, sem pão, sem rumo e sem esperança, cada
vez aumentando mais, sob a cruel indiferença dos homens absortos em amontoar, só para
si, tesouros na terra.
Tenho assistido a homens torturando outros homens, com a mais espontânea
naturalidade, como se fosse coisa corriqueira. Até máquinas inventaram para isso, o que
aumentou minha frustração ao comparar os métodos que vi, com as ingênuas torturas do
meu inferno criado com tamanho ódio.
Veja, ainda, o afã do ódio, que domina as lutas políticas, no mundo todo, matando,
indiscriminadamente, pessoas inocentes, completamente alheias à disputas, em atos que
chamam terrorismo. Se se matassem entre si, os que disputam e, por isso, se odeiam, eu
aplaudiria, pois seria coisa perfeitamente enquadrada no meu modo de agir. Mas fazê-lo
cegamente, castigando os indefesos porque não podem ferir o inimigo é algo que ultrapassa
o meu diabólico entendimento.
Uma vez, há cerca de dois mil anos, quando eu estava no auge do meu poder e da
minha força, pensei que seria derrotado por causa de um homem, simples, humilde e sábio,
filho de um obscuro carpinteiro galileu que apareceu no mundo e ensinou um caminho, sem
complicações, infalível para derrotar-me. Pois bem, os homens deturparam-lhe os ensinos,
repletos de autêntica sabedoria, abafando-os sob o peso formidável de sibilinas
elocubrações, e, pior, passaram, maquiavelicamente, a utilizá-los em favor de seus
propósitos maléficos.
Diante de tudo isso, e de outras coisas mais de que não preciso falar, porque estão à
vista, meu inferno é um pobre e triste inferno.
Coisa de amador à frente de profissionais competentes e vividos.
Fui irremediavelmente superado pelo mesmo homem, que, um dia, ingenuamente, eu
quis perder.
Ninguém mais me tem medo. Meu reino infernal, orgulho de minha inteligência
superior, virou, até, motivo de chacota.
Dizem, até, que não existo, e, de fato, melhor fora não existisse mesmo, se é para
viver, assim, envergonhado e inútil.
125
Na verdade, é penoso dizê-lo, faço-o a custo, minha presença na terra tornou-se
inteiramente prescindível, por falta de objetivo. Fui vergonhosamente derrotado, não pelo
meu inimigo capital, Jeová, mas pelo produto de sua obra, o que é pior...
Quis prosseguir, mas pranto de inenarrável angústia dominou-o, por completo, e, em
impressionantes convulsões a sacudir-lhe o combalido corpo, desapareceu, deixando-me
triste a cismar, na tarde calma:
Pobre Diabo!
126
MARINA COUTO
PEREGRINOS DO AMOR
127
minha salvação!
– Senhor, confio em Vós. Sei que ouvireis nosso lamento... Sei que amais os que
são sinceros.
– Confesso, Senhor, as minhas culpas. Perdoai os meus pecados!...
– Criai em mim um coração que seja puro! Dai-me de novo a alegria de viver!
– Ensinai-me a aceitar sempre a Vossa vontade e a exercitar os dons que me destes.
– Concedei-me que eu morra convosco para convosco ressuscitar! Senhor, que nos
guardem sempre vossa graça e vossa verdade!
– Perdoai, Senhor, se às vezes não creio em mais nada. Senhor, Vós, sois meu
alimento na longa jornada...
– Senhor, creio que cada dia estou mais perto da Terra esperada.
– Pai-Nosso que estais no céu, santificado...
– Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós...
E assim, continuava o povo de Deus, em sua caminhada, com fé, esperança e
amor!...
***
128
ALBERTO CORDEIRO DO COUTO
UM MISSIONÁRIO DO ENSINO
129
A sociedade itapecericana acolhe o jovem Alberto Cordeiro do Couto
carinhosamente que, pela simpatia e comunicabilidade conquista o espaço afetivo que será
seu, definitivamente. Encontrou clima que lhe fez bem ao corpo e ao espírito, pois cinco
anos depois de ter chegado à nossa terra, casava-se com Maria da Conceição de Araújo,
itapecericana pertencente à tradicional e ilustre família Corrêa.
Não transpus os umbrais de sua intimidade para aprender os segredos de apurados
meios de educar que lá exerciam. Não foi necessário. As normas seguidas em sua casa,
medidas nos sãos princípios de moral cristã se revelam no ilibado da vida dos que lhe
descendem.
As virtudes da vontade e do coração, da vida em família, não lhe discreparam
daquelas da vida pública. Quer fosse como funcionário do governo federal ou como
servidor do estado, no serviço de saúde ou, ainda como comerciante, observou sempre a
mesma imutável retidão. Esses meandros por onde andou, foram, na realidade, desvios da
estrada real que o conduzia para sua irremediável vocação: o ensino. O ensino, no seu
sentido mais abrangente, de educar, cujo labor ele inicia em 1903, para só terminar com sua
morte, quase meio século depois. Cria escolas em que leciona durante anos para jovens, não
só da cidade, mas dando oportunidade a que também os do meio rural tivessem acesso ao
aprendizado.
De 1922 a 1929, residindo em Divinópolis, revela sua percepção do alcance social
do ensino, que muitos anos mais tarde viria a ser uma das grandes metas dos governos de
nosso país, com a alfabetização de adultos. Como escriturário da Rede Mineira de Viação
pôde sentir que uma grande parte de maquinistas, foguistas e outros ferroviários compunha-
se de analfabetos ávidos de conhecimentos e angustiados por suas limitações. Cria um
curso para esses funcionários que se revelam alunos dedicados. A gratificação do professor
se vê aumentada, na medida em que melhoravam a posição social no meio do núcleo
operário em que viviam, muitos dos quais tendo adquirido o hábito de ler jornais. Outros
chegaram a conquistar melhores posições, cursando o ginásio.
Este único episódio teria sido suficiente para que o retirássemos do esconderijo da
modéstia para mostrar o altruísmo do educador sem fronteiras, cujo desejo era o de ensinar
em qualquer lugar e sob quaisquer circunstâncias.
De volta a Itapecerica, em 1929, não se acomoda o inquieto professor. Deseja ver
sanada uma grande falha da época: o desnível social e cultural dos rapazes, em relação às
moças que se habilitavam com o diploma de normalistas. As dificuldades para o
reconhecimento oficial de um Curso Noturno de Comércio que pensou criar com um
objetivo certo, foram de tal ordem intransponíveis que as aulas tiveram de ser interrompidas
depois de dois anos de funcionamento em caráter provisório. Mais uma vez, o professor
Alberto Couto mostrava sua sensibilidade e tentava resolver um problema de grande
significado para o equilíbrio psico-social da comunidade.
Quando, em 1934 a diretora do Colégio Imaculada Conceição, Maria Luiza Toscano
de Brito, tomou a deliberação de encerrar sua atividade de educadora, Itapecerica corria o
risco de perder um educandário que já estava incorporado ao patrimônio cultural de nossa
cidade. O professor Alberto Couto percebeu, em um relance, todo o sentido daquela perda.
Seria a esterilização intelectual de nossa terra. pela primeira vez lamentou não ser um
homem rico. Mas, os bens materiais nunca foram a sua meta. Jamais teria colocado o
ensino como uma segunda intenção ou como um pretexto. Os que o conheceram,
expressamente o absolvem do amor ao dinheiro. Só uma grande indiferença aos lucros
pessoais levaria uma pessoa a investimentos tão distantes dos interesses pecuniários.
130
Mas o professor Alberto Couto tinha grandes somas acumuladas em um valioso
patrimônio moral das quais lança mão para obter os recursos de que vai necessitar. Sai de
porta em porta, pede a cada um, com a altivez de quem sabe que está pedindo a salvação de
todos.
Terminada a Odisséia, a Escola Normal ficou em Itapecerica e com ela, montando
guarda à sua conquista, o grande batalhador. As dificuldades não pararam aí. Apenas
mudaram de aspectos, mas ele sofreu os contratempos, virilmente.
Não fui dos que privaram com ele, mas recebi os seus efluvios através das filhas
com quem convivi de perto e a quem me ligo pelo afeto: minha professora Adyles Couto e
minha colega Concita Couto, com quem cursei a escola primária.
Bendigo a meus pais por terem tido a lucidez, quem sabe inspiração, de me
colocarem, no início da vida, sob o abrigo que o “SEU ALBERTO” nos ofereceu.
Em um diário ele costumava escrever sobre sua maneira de pensar e de viver,
consoante os princípios do Evangelho. Em um dos seus escritos dizia: “Minha vida é uma
contínua união com Deus. Eu estou com Ele. Ele está comigo. Hei de vencer!” No dia 6 de
agosto de 1948, fechou os olhos na fé.
Ensinou sempre, com a palavra e o exemplo. Foi educador de gerações e ainda o é
dos que o imitam como modelo maravilhoso de civismo.
O professor Alberto Cordeiro do Couto, realmente, venceu. Venceu o próprio tempo
que não conseguiu apagar sua grande figura da memória dos itapecericanos.
O MESTRE QUERIDO
Marina Couto
131
irresistível: O CAMPO DA EDUCAÇÃO.
Desde o início de sua chegada a Itapecerica, atendendo a pedidos de alguns amigos,
dedicou-se à preparação de candidatos a exames de Admissão ao Colégio Pedro II, no Rio.
Com o decorrer do tempo, durante 45 anos, seu trabalho se ampliou, abrangendo o
Ensino Primário, Ginasial, Comercial e o de Formação de Professores (Curso de
Normalistas). Nesta última categoria, o Prof. Alberto chegou ao clímax de sua realização
pessoal.
Foi o guardião, o diretor e professor da Escola Normal Imaculada Conceição
durante muitos anos, encerrando suas atividades a 6 de agosto de 1948, dia de seu
falecimento.
132
RAYMUNDO NONATO DE ARAÚJO
Casou-se com Isaura Lamounier de Araújo e tiveram cinco filhos: Célia, Marília,
Edna, Eliane e Auro Lamounier de Araújo. Homem inteligente e culto foi cronista do jornal
Janelão e nomeado Delegado Municipal da União Brasileira de Trovadores em 23.01.80.
Promoveu o 1º Concurso Nacional de Trovas de Itapecerica. Em 1984 fez uma Chuva de
Trovas a Itapecerica com participação de trovadores de vários estados do Brasil. Sempre de
bom humor foi até mesmo em 1939 o diretor técnico da Liga Camachense dos Preguiçosos,
participando de algumas peças teatrais. Deixou um vazio imenso quando partiu.
133
“CONTANDO HISTÓRIAS”
E temos uma história divertida: tempos atrás vivia aqui um certo Cipriano, com sua
Flaubert, tendo por vizinha uma árvore de abacates que caíam todos ainda verdes. A
proprietária triste reclamando e ele “sem saber de nada” diz gostar deles meio verdes
mesmo e passa a comprá-los. E conta-se dele ainda uma história sobre as Quatro Bicas:
acertou o cachimbo na boca de um velho que curtia a tarde e a fonte, dando-lhe depois 10
mil réis para comprar um cachimbo novo.
Agora, a história do velho padre foi contada pelo Dr. Antônio: já velhinho, saindo a
cavalo para ir rezar missa na igrejinha da Caixa D’Água, passa nas Quatro Bicas e conversa
com a comadre. Continua a viagem e lá na frente, premido por certas necessidades, apeia
alguns momentos. O cavalo aproveita para comer o mato e dá meia volta. O velho padre
chega, monta e segue viagem. De repente avista a comadre novamente com sua mala de
roupas e diz: – Uai comadre, a senhora veio também!
Mas já que estamos a falar das Quatro Bicas, vem uma quente: durante o dia
lavavam roupa mas a zona boêmia ficava lá e, à noite, muitos homens aqui chegados se
apaixonavam pela região deixando-se ficar na boemia por dias e dias. Muitos terminavam
conhecendo as moças da cidade e por aqui se casavam. Daí o adágio: “quem bebe água das
quatro bicas aqui fica.”
***
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VERSOS DE ERRIENE
135
VERSOS DE ERRIENE
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“NÃO RAPO NADA”
Conversa de casamento
Isto é que não me agrada
Quando falam nisso
É QUE NÃO RAPO NADA...
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CONVERSA COM PAI
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PARECE MENTIRA
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PARECE MENTIRA
(mas é verdade)
Conta-nos o Tio Nicas que, indo a São Paulo, foi abordado por um lépido e
simpático rapaz que, mostrando-se seu grande conhecido, alegremente lhe disse: – “Olá,
amigão, como vai? Sempre progredindo, hein? Gente boa, terra boa, não me esqueço. Você
tem duas notas de cinco, aí?” Atordoado ante aquele inesperado amigo, o Tio Nicas tira do
bolso, separa e mostra-lhe duas notas de cinco cruzeiros, quando então, rapidamente, o seu
amigo, pegando em uma delas, lhe diz: “ME DÁ UMA E FIQUE COM A OUTRA.”
Assim se despediu, correu e sumiu, aquele amigo do Tio Nicas.
Ao ouvir esta, austero e seguro conterrâneo nosso contou-nos, que há dias, estando
em Belo Horizonte, na Av. Afonso Pena, veio ao seu encontro uma bonita jovem, vestes
bem atualizadas, olhos ternos, penetrantes e sorridentemente lhe disse: – “Como vai o sr.?
Sempre folgado e aproveitando a vida, não é? Vá lá em casa tomar o nosso cafezinho”.
Mesmo não se lembrando quem fosse a sua linda interceptora (e, cá entre nós, já
antegozando o agradável sabor daquele cafezinho) o nosso amigo arriscou: – “Mas, onde
moram vocês agora?” – “Rua tal, nº tal, disse-lhe ela, e para não pedir-lhe um cigarro em
plena rua, dê-me o dinheiro para comprar um maço.” Ante mais esta demonstração de
intimidade o nosso amigo não hesitou em entregar-lhe uma nota de dez cruzeiros que por
ela foi colocada na bolsa e, ato contínuo, retira-se elegantemente, repetindo-lhe: – “Tome
nota do endereço”. Feliz e apressado o nosso amigo procura localizar o endereço anotado:
Rua tal, nº tal – “Compra-se Ferro Velho”.
146
PARECE MENTIRA...
MAS É VERDADE
No carnaval, aquele “careca”, após levar esposa e filhas a um dos bailes de lá,
discretamente escapuliu, foi a um bar próximo, onde num reservado, colocou farta
cabeleira, pôs costeletas e um bonito bigode, tipo português, tirou a gravata e trocou a
camisa branca por uma de exagerado e colorido estampado. Ao espelho, sorriu contente
com a transformação conseguida.
Noutro bar tomou algumas doses de coragem e confiante voltou ao salão recebido
como autêntico jovem cabeludo, foi alvo da maior e mais disputada acolhida.
Deslumbrado pelos convites que lhe chegaram através dos trejeitos e olhares
daquelas mais ousadas, em pouco, pulava, dançava, sorria, bebia e retribuía com carinho as
demonstrações recebidas.
Horas depois, embriagado pelo sucesso “do cabeludo” e talvez mais ainda “por
muitas e outras” que bebeu, ei-lo à nossa frente, exuberante de alegria, braços em torno dos
quadris de duas jovens que pareciam carregá-lo e, sorridente para ele cantavam: – “Ui, ui,
ui me deram um beliscão; ui, ui, ui, no meio do salão” enquanto ele cantava: – “É dos
carecas que elas gostam mais”.
Alguém a nosso lado comentava: – “Por que será que este jovem cabeludo teima em
cantar a marchinha dos carecas?” Era a esposa dele que também, quem sabe, simpatizara
com o jovem cabeludo.
***
147
PARECE MENTIRA...
mas é verdade!
***
A Agência da Caixa Econômica Federal de Itapecerica foi visitada por ladrões tão
corretos que, não conseguido seu intento e mesmo sendo forçados a uma retirada meio
brusca, decidiram deixar-nos um deles de lembrança. Em retribuição à gentileza, boa parte
da população, em verdadeira romaria, foi visitá-lo na Delegacia onde, exibindo reluzentes
pulseiras que distintamente a polícia colocou em seus anti-braços, ele recebeu aquela
cordial homenagem.
Quase sempre, em fatos desta natureza, tem tido a Bela Adormecida quem vele pelo
seu sono; desta vez, na pessoa do Tonho, do Roxinho, do Fabiano, Chico Tuffy, Pedro
Américo e tantos outros que lhes serão apresentados no próximo número em “a estória
alegre de um assalto”. Pena é que não poderemos contar com a colaboração daquele
representante aqui deixado pelos senhores ladrões pois, não sabemos porque, a polícia local
não se afeiçoou muito a ele mandando-o em “bom despacho”.
“Aqueles que nos matam ou difamam nos fortalecem para a vida eterna.”
148
PARECE MENTIRA MAS É... VERDADE
* Nos dias em que o louco ou, monstro de Capinópolis colocou em pânico cidades
daquela região, o nosso amigo Diomar chegou a Ituiutaba para onde levava algumas
mercadorias, inclusive um manequim de mulher, sem embalagem, de modo que deixava à
mostra as suas pernas e cabelos muito longos. A vista das notícias sobre o louco, Diomar
preferiu ele mesmo descarregar o caminhão e tudo correu muito bem enquanto entregava
dois, três volumes aqui, outros tantos ali. Mas, quando chegou a vez do manequim...
Também pudera! Com aquele corpanzil, barba e cabelos grandes, roupa suja, camisa solta,
carregando com aquela facilidade o que a muitos pareceu um corpo de mulher, ninguém
teve dúvidas em ver nele o temido louco. Dado o alarme e aos gritos de “olha o louco” foi
aquela correria e o Diomar não teve a quem entregar o belo manequim que aqui veio parar
e denunciar a estória do “louco de Itapecerica”.
O Fabiano, gerente da Caixa, veio célere a fim de evitar o assalto mas foi infeliz
pois chegou no exato momento dos tiros, o que fez empacar o seu Volks em cima do
canteiro.
Mais feliz um pouco foi o Tião do Januário, que, também avisado para o “pega-
ladrão” não acreditou e voltou para a cama. Quando estouraram algumas pipocas perto da
janela de seu quarto, persignou-se, cobriu a cabeça e, de fora, houve quem o escutasse
pedindo misericórdia e prometendo acreditar da próxima vez.
O Dimas Henrique, já calejado com ladrões, pois faz pouco tempo teve um
entrevero com dois deles em sua loja, alta madrugada, mesmo pensando poder ser um trote,
levantou-se, saiu pelos fundos e foi à rua para ver, quando então deu de testa com o Pedro
Américo, que, de cócoras, na esquina, estava à espreita. Felizmente um correu do outro sem
outras conseqüências senão um bom gole d’água.
149
O Zé Roxinho que se comprometera a imobilizar o volks dos ladrões, quebrando-
lhes os faróis, foi sem sorte porque o ladrão chegou correndo e entrou no carro no momento
em que ele se preparava para, sem ruídos, executar a tarefa.
Quase que o Volks, em sua rápida arrancada, o atropela. E pior: o Roxinho não sabe
se deitou ou caiu com os tiros do cabo Raimundo; na verdade ele custou a acreditar não ter
sido atingido.
Por sua sorte, o cabo só tinha 4 balas, o que deu ao 2º ladrão “aquele que não
conseguiu pegar o carro” a oportunidade de passar pelo cabo e dizer-lhe: “eu vou a pé
mesmo”.
Mas a sorte do ladrão foi ter visto, depois de bastante caminhar pela rodovia, uma
certa caminhonete. Resolveu pedir “carona” e achou-se de repente ao lado do pessoal que o
buscava por ali mas não pensava em parar ainda.
***
“Ao meditar e compreender que a minha missão é ser útil e, pelo menos, não
prejudicar o próximo, tento evitar dois grandes defeitos: desonestidade e estrelismo”.
Comendador Murilo Teixeira
150
PARECE MENTIRA...
mas é verdade!
QUE estivemos ausentes desta coluna, em função das dificuldades que se tem em
conseguir verdades que pareçam mentiras;
QUE reaparecendo, estamos apenas nos despedindo por algum tempo;
QUE anteriores e até antigas publicações do Janelão tenham amofinado tanto e tal
modo a alguns desajeitados que não escolheram sequer oportunidade para se vingar, alheios
ou esquecidos de alguns resultados positivos já obtidos;
QUE Povo, Política e Políticos locais andam de tal forma desinteressados que
parece não haverá aqui um tão próximo dia quinze.
QUE em Itapecerica, até casamento civil pode ser pago a prazo ou pela financeira e,
até mesmo, adiado por causa do Janelão, não é sr. Osires?
QUE a Banca Examinadora veio e...
O Chico do Tuffy, tão habituado a dirigir mas sempre sonhando com os 13 pontos,
emocionou-se tanto quando o examinador lhe disse ter perdido exatamente 13 pontos que
arrancou adoidado com seu volks zerinho em cima do coitado que estava na sua frente;
A D. Isaura, segura durante o aprendizado, nem sequer arranhou o seu carro mas, no
dia, um pouquinho só antes do exame achou melhor aprender também a dar uma batida. O
nervosismo que lhe adveio não lhe permitiu mais nada e ela nem lá se apresentou;
Boa parte dos alunos da Escola do Clareão ficou no escuro;
O Paulinho, aquele soldado fiscal do trânsito, naufragou no exame porque apenas
não soube colocar a boia;
QUE um ladrão, já bastante conhecido por suas especialidades e pela mania de
esconder as “coisinhas subtraídas” na cerca de ciprestes da Praça de Esportes, não podendo
mais fazê-lo porque a dita cerca virou muro, escondeu no próprio interior da Casa Rios a
máquina de escrever e a de somar roubadas do comerciante vizinho, sr. Josefino Caseca,
tendo levado consigo até os níqueis de um centavo lá encontrados, teve tempo de furar a
parede divisória dos estabelecimentos mas se esqueceu de que o santo aqui é forte.
Cuidado, amigo, seus pais não vão gostar de vê-lo no xadrez. Mude de idéias ou mude-se
daqui enquanto é tempo.
QUE o Zé Curinga em uma de suas últimas preleções, daquelas que geralmente faz
aos sábados, nas esquinas após elevado percentual de caninha a comandar-lhe o cérebro,
houve por bem dizer: “Falo u qui quero, e posso falá purque falo certo! Tapicirica nunca
vai acordá purque o comodismo da maiuria é qui nem corchão de paina dos poucos mais
ispertos. Mi intrega isto proceis vê cumo eu cuncerto tudo! Mi intrega a Profeitura, o
Grafite, a Siderúrgica, o Ginásio, os grupo, as Iscola, os cartório e tudo qui tem aqui,
procêis vê!... Num intrega não, né? Intão dispois num fala qui eu num avisei. Num intréga
não, né?”... E sempre naquele seu estribilho, lá se foi o Zé Curinga, noite afora, pelas ruas
quase desertas da Bela Adormecida. “Dispôis, num fala qui eu num avisei!” Lá mais
151
distante o eco de sua voz!
QUE a volta do Janelão vai em boa parte depender do que nos escreverem os
sugerirem os leitores, conterrâneos, e especialmente assinantes e anunciantes, isto durante o
mês de novembro corrente.
***
152
ROBERTO LUPERACCI
Nasceu em 1926 sendo o caçula dos 5 filhos do casal Joaquim Duarte Gomides e
Rosa Luperacci Gomides. Concluiu seu curso primário na E.E. Severo Ribeiro e fez o curso
básico e datilografia em Belo Horizonte. Residiu no Rio de Janeiro e trabalhou como
caxeiro-viajante no Nordeste onde conheceu os personagens de seu romance “Eclipse da
Alma”.
Estabeleceu-se no comércio em Itapecerica em 1951. Dirigiu o Conselho Mun. de
Ação Social; conseguiu uma gleba na Fazenda Modelo onde desenvolveu em regime de
parceria com pequenos agricultores o plantio de cereais doando parcelas das colheitas a
entidades filantrópicas. Com apoio da Pref. Mun., Nacional de Grafite e a comunidade,
construiu e fundou a Escola Profissionalizante de Calçados “Dr. Clóvis Cordeiro”. Elegeu-
se vereador, foi Pres. da Câmara, Pres. da Cia. Telefônica, Pres. do Diretório do PDS, Pres.
do Rotary Club, Pres. da AILC onde ocupa a cadeira 28 – seção Romance, tendo por
patrono o Dr. Severo Rios Corrêa.
A ÚLTIMA LEVA
(conto)
Da janela de seu casebre, absorta, Joana mantinha seu olhar perdido no espaço. O
céu se mostrava inteiramente límpido. Nem sequer uma nesga de nuvem ousava macular o
azul do firmamento. O sol se esbaldava na abóbada celeste lançando impiedosamente seus
raios causticantes sobre a terra já torrada, abrindo suas entranhas em sinal de defesa.
Enquanto o céu transmitia bonança, muita luz e harmonia, na terra somente havia
desolação. Da caatinga apenas restavam vestígios de vegetação. As aves e os pássaros
migraram para outras paragens. Os animais silvestres, muitos foram caçados, outros
153
desapareceram, alguns sucumbiram dizimados pela inclemência da seca. A fome e a sede
ameaçavam os últimos habitantes daquele povoado do agreste nordestino. Com exceção de
Joana, toda a comunidade se encontrava reunida na Capela Nossa Senhora da Guia ouvindo
a pregação do Pastor que, após proferir algumas preces, expôs aos fiéis a situação
calamitosa na qual se encontravam, sugerindo a retirada. Mencionou que vários já haviam
partido e que a permanência naquele local seria desastrosa. – “Com as bênçãos de Deus e as
poucas forças que nos restam deveremos partir o mais breve possível”. Todos concordaram,
mas para a família do Pedro existia o problema de Joana que se encontrava grávida de sete
meses e a cidade mais próxima, rumo ao litoral, distava cerca de cinco léguas do povoado.
Pedro pediu a compreensão dos presentes alegando o estado em que se encontrava sua filha
sugerindo aguardarem por mais tempo o momento da retirada. Os demais contestaram
alegando que Joana era jovem e que daria conta da caminhada, disseram ainda que os
suprimentos que dispunham se esgotariam dentro de curto prazo. Ao término da reunião,
todos foram para suas casas cuidar dos preparativos para partida.
Joana, ao tomar conhecimento do ocorrido, não se mostrou animada a enfrentar
aquela empresa. Sentia-se indisposta e depauperada. Mostrava-se bastante desiludida. O
noivo havia partido há seis meses em busca de trabalho e nem sequer notícias tinha lhe
enviado. Aos dezessete anos de existência já encarava a morte como um fator natural ou
talvez a melhor solução para o seu problema. Já via dissipada a esperança de se casar.
Apenas a tristeza residia em seu pobre coração. A devastação causada pela seca não lhe
causava temores. Todavia, ao contemplar seus irmãos mais jovens que se mostravam
ansiosos para partir, ordenou a seus pais que partissem com os retirantes. Afirmou que
sobreviveria comendo raízes colhidas na caatinga e que encontraria água nos cactos. Houve
relutância por parte de sua mãe, mas Joana os convenceu a partir alegando que ficaria com
Deus e Japi, o cão de casa.
Ao romper da aurora do dia seguinte, tendo à frente o Pastor que marchava
lentamente apoiando em seu cajado, deu-se o início da última leva de retirantes do sertão.
Não havia nenhum entusiasmo naquela triste jornada, apenas alimentavam a esperança de
sobrevivência. Com o coração apertado, a mãe de Joana voltava seu olhar melancólico atrás
temendo pela sorte de sua filha abandonada. Orava constantemente pedindo ao Pai Eterno a
proteção Divina para a sua pobre filha. Indiferente a tudo que se passava, Joana bastante
conformada pela situação imposta pela circunstância assistia a marcha dos retirantes
solfejando uma canção sertaneja que certa vez ouvira em um circo referindo-se sobre a
seca.
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DOM SEBASTIÃO ROQUE RABELO MENDES
Dados biográficos de
CESÁRIO MENDES DE CERQUEIRA
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onde nela viveu por mais de meio século o nosso Maestro Cesário executando os mais
variados tipos de acordes. Que ele sempre permaneça em nós através de sua música pois o
HOMEM É IMORTAL QUANDO SUA OBRA PERMANECE EM NÓS.
159
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MINEIRO CANTOU DE GALO
Muitos jornais dos Estados Unidos, de países por onde passaram, e aqui do Brasil
também, deram as notícias do “raid” e Cesarinho ficou famoso pela façanha vitoriosa.
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Aos jovens da “AITA”
Marina Couto *
Todos nós nos lembramos com emoção das homenagens prestadas a D. Sebastião
Roque Rabelo Mendes, por ocasião de sua sagração como Bispo de Leopoldina, e ao Dr.
José Maria Borges, recentemente nomeado Secretário da Saúde, do Estado de Minas
Gerais.
Tais acontecimentos de alta expressão religiosa e cívico-social constituíram-se, sem
dúvida, em forte motivação para aqueles que vinham alimentando o grande sonho de
reerguimento do antigo “Centro Itapecericano”. A partir daí, essa aspiração tornara-se
realidade. Surgiu a “AITA” – Associação dos Amigos de Itapecerica!
Impressiona-nos, sobremodo, o arrojo de seus idealizadores. Em poucos meses
conseguiram legalizar a Entidade e empossar a Diretoria Provisória, em memorável festa
que contou com a presença de mais de duas centenas de amigos e itapecericanos, num
reencontro de amizade e de alegria!
A finalidade e os objetivos da instituição traduzem o desejo de seus membros de
cultuar seus antepassados, vivenciar princípios e valores cristãos, tradições e costumes, e de
facilitar e manter a comunicação social entre amigos e conterrâneos.
Fora da terra querida, por contingências diversas, os itapecericanos querem
acompanhar seu progresso, participar de seus anseios, de suas lutas e conquistas.
Surgem agora as indagações para que se efetivem tais propósitos: Como manter o
intercâmbio entre os associados? Como conseguir uma filiação expressiva? Como fazer a
divulgação da Entidade? Como obter recursos? Ninguém desanima, ninguém desiste,
ninguém desestimula... E por quê? Diríamos que essa corrente de amor é sustentada pela
jovialidade de seus quarenta e oito membros da diretoria. Constitui-se de jovens estudantes
ou profissionais bem sucedidos já no início de seu campo de trabalho. Não apenas de
jovens em idade, mas também de adultos jovens que se impõem pela sua vivência, pelo
equilíbrio, pela objetividade, pelo entusiasmo!
E, como “o calor da juventude” é que garante “a temperatura da terceira idade”,
sentimos que o sucesso e a manutenção da “AITA” dependerá muito da vitalidade de
nossos jovens sócios. Cabe-nos a responsabilidade de criar ali um clima moral e social que
os ajudem na busca de sua formação profissional ou de seu campo de trabalho, ou de
descoberta de novas maneiras de viver, individual e coletivamente. Nossa Instituição há de
ajudá-los também a se tornarem consciente das realidades do momento. Há de estimulá-los
à análise dos fatos, à crítica compromissada com o Bem-Comum.
Nossos jovens engrandecerão nossa Itapecerica. O Amor nos unirá e nos fortalecerá
em nossa caminhada. Que Deus nos abençoe!
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DR. SEVERO AUGUSTO RIBEIRO
José de Carvalho Ferreira
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e da Magistratura, vindo a falecer na comarca de Alto Rio Doce, na época, quase
inacessível e onde, é claro, só se chegava a cavalo, depois de léguas e léguas de viagem. Na
vetusta Faculdade do Largo de São Francisco fora colega de João Pinheiro, que viria a ser
presidente do estado de Minas Gerais.
Com o prematuro falecimento do chefe da família, aos 46 anos, deixando a viúva e
nove filhos pequenos, adveio a pobreza de que Dr. Severo, na grandeza de suas
considerações, se orgulhava e via como obstáculo vencido.
Nasceu em Itapecerica e em Itapecerica viveu toda sua vida profícua e dadivosa. Por
duas vezes foi prefeito municipal de sua terra e incontáveis são os benefícios derramados de
suas mãos.
Bravo na defesa intransigente de seus princípios, era de amenidade sem par no trato
com os semelhantes, talvez pela experiência adquirida no exercício da medicina, nos velhos
tempos do atendimento domiciliar.
Sua inteligência era atributo que se não escondia, ainda que não se esforçasse por
demonstrá-la, principalmente quando deveria orná-la com sutilezas irônicas que nem a si
mesmo poupavam.
Quando completou noventa anos de idade, no banquete oferecido pela Associação
dos Amigos de Itapecerica, pronunciou admirável discurso no qual evidenciava a plenitude
de sua lucidez, servindo-se da ironia para revelar completo despojamento, ao fim de tão
longa vida.
No início da carreira, foi o típico “médico da roça” “le medecin de campagne”,
caracterizado por Balzac, e oi tristemente desaparecido médico de família.
Os hospitais eram precários e os pacientes não estavam habituados a freqüentar
consultórios: o atendimento era domiciliar, na cidade ou na zona rural. E como se
orgulhava das longas viagens a cavalo, enfrentando intempéries, atravessando córregos que
na invernia se transformavam em caudais, em noites escuras ou poeticamente enluaradas,
envolvido na sua “capa ideal”, quase sempre acompanhado por um secretário que, mesmo
despreparado, tanta vez se transfigurava em enfermeiro!
Ao completar oitenta anos, deixou o exercício da medicina por entender que a
ciência e arte a que se dedicara evoluíram muito e seus jovens colegas eram mais capazes.
Foi a alma da edificação da atual Santa Casa de Misericórdia e Maternidade
Santana, construída com a ajuda de todos os seus co-munícipes, mas indispensável em tais
empreendimentos que resultam de uma força impulsionadora de cunho nitidamente
idealista. Viu-a inaugurada em outubro de 1959, com a presença do Governador Bias
Fortes, mas, em abril de 1965, fez com que se retomassem as obras para ampliação e
definitiva conclusão. Exibia, com emocionante contentamento, uma fotografia de si mesmo
e do sobrinho, Dr. José Alfredo, em trabalho de cirurgia no Hospital.
O apuro no vestir-se era complemento de suas boas maneiras.
Em decorrência de discreta hemiplegia facial, dizia-se portador de um ricto
diabólico. Não era: apenas uma característica muito pessoal, como reflexo de um elevado e
cultivado hábito ao longo do tempo.
A radicalização da política partidária em Itapecerica chegou, em dilatado período,
ao extremo entre “tarecos” e “papiatas”. Dr. Severo integrava as hostes dos primeiros,
como combatente intimorato e, ao perceber que tal posição poderia dificultar o seu grande
sonho de ver construído o Hospital, entregou a tarefa à neutralidade do então vigário de
Itapecerica, Pe. José Medeiros Leite que seria, depois, o primeiro bispo diocesano de
Oliveira.
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A paisagem sócio-cultural da velha e centenária Itapecerica, antiga Tamanduá, sofre
grande mutilação com a morte de Severo Augusto Ribeiro indispensável à sua inteireza.
Setembro/1990
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DISCURSO
Senhor Prefeito,
Senhor Presidente da Câmara de Vereadores,
Senhores Vereadores,
Autoridades,
Senhoras e Senhores.
Meus conterrâneos.
Aqui nasci. Aqui me criei e me casei. Aqui constituí família. Aqui travei a boa
batalha, como o diz São Paulo.
Em uma das fases dessa batalha, me foi dada a oportunidade de servir, por duas
vezes, à comunidade itapecericana, quando, por circunstâncias políticas das épocas, tive
que assumir a Prefeitura Municipal.
Quiseram os fados, inda uma vez, que a bondade dos Amigos lembrasse minhas
passagens por esta Casa, fazendo inscrever na memória histórica do município, com esta
homenagem tão comovente, os fatos que vão longe na memória do tempo...
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OZIRES FRANCISCO MALAQUIAS, O MAJOR ZIRICO
Há pessoas que passam pela vida, marcando-a com o fulgor de seus valores, legando
exemplos de virtude e honradez a seus pares e a seus pósteros.
Major Zirico celebrou sua vida benemérita e perlustrou a história de Itapecerica,
como um dos mais honrados cidadãos da Terra.
Ozires é o seu nome de batismo e, mitologicamente, nos lembra o deus Sol, dos
antigos egípcios. Lá na terra dos faraós. Ozires comunicava forças estranhas a todos que lhe
rendiam culto e adoração.
Aqui, em Itapecerica, Ozires foi o benfeitor que acudia necessitados e indigentes.
Francisco completava também seu nome. Lembra-nos o “poverelo de Assis”, o
cantor do Irmão Sol e da “Dama Pobreza”. Aqui ele foi a luz que o inspirou a servir o
próximo.
Malaquias, seu sobrenome, lembra o do Profeta de Deus, que proclamou o amor e a
justiça e fez do Major, o servidor de sua gente.
Inspirado, pois, no seu próprio nome, nosso ilustre biografado, assumiu a prioridade
do Cristo, que veio à terra proclamar e viver a justiça e a fraternidade, acolhendo humildes
e necessitados.
Cento e dezoito anos são passados do nascimento do Major Zirico, ocorrido a 14 de
maio de 1868. Era filho de Francisco Antônio Malaquias Bolívar e Maria Magdalena Dias
Malaquias. Deixou uma numerosa prole, digna e simpática: o Zé do Zirico, viúvo de D.
Joaninha, já falecidos; Osires Malaquias Júnior, o Ziriquinho, residente em Belo Horizonte,
viúvo de Dona Margarida Mosqueira Malaquias; Maria Madalena Malaquias Beirigo,
casada com Francisco Gonçalves Beirigo, já falecidos; Maria Anunciação Malaquias
Couto, viúva do Sr. Elpídio Cordeiro do Couto; Bento Bolívar Malaquias, engenheiro
agrônomo, viúvo de D. Aracy Ribeiro Malaquias; Marina Carolina Malaquias Mendes,
viúva do fazendeiro Luizinho Mendes, e Maria das Dores, a “Primeira”, filha adotiva, todos
os integrantes da elite itapecericana.
O Major Zirico era exigente e bom, enérgico e compreensivo. Ajudou todos os
filhos a se tornarem independentes. Consumado conselheiro e prudente orientador, levava a
todos sua palavra clarividente e paternal, dando-lhes algo de si mesmo.
“Seo” Zirico nasceu, na casa de José Leopoldo Corrêa, lá no “Largo do Bisaico”,
conservada até hoje, com as mesmas características bisseculares.
Depois, foi viver toda a sua vida de merecimentos no sacarão do Largo que tinha o
seu nome.
Ainda permanece o solar vetusto, à semelhança da “Casa Grande” ou “Sede da
Fazenda” dos tempos coloniais e do Império. Continuará como lembrança de um tempo
feliz e bonançoso, enquanto o homem, sob o signo do progresso, não venha destruí-lo, na
ânsia de modernizar tudo.
Lamentavelmente, porém já demoliram a espaçosa escadaria, que imprimia ao
majestoso logradouro um quê de nobre e solene.
Aquele conjunto harmonioso – casarão e escadaria – sempre foram o epônimo dos
campos, para os itapecericanos, na evocação do poeta. Hoje, porém, está bem desfigurado o
primitivo cenário.
Gigantesca e frondosa magnólia enfeitava e sombreava o patamar da vivenda, em
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cujo tronco, fazendeiros, roceiros e agregados amarravam seus animais, aos domingos e fim
de semana, enquanto assistiam à missa ou procuravam os amigos e faziam outras compras.
Do mesmo lado do casarão, subindo mais o largo, amplo curral murado para compor
o logradouro, dentro do qual se desenvolvia a faina de uma fazenda em pleno coração da
cidade.
É aqui que o gado trazido das Quatro Bicas, Areão e Brucutu, em ordenha, fornecia
o leite gordo tirado até por D. Dada, sua esposa.
- Major Zirico, o comerciante estabelecido na sua própria e espaçosa residência.
Dispunha a sua loja de variadíssimo estoque, porque ele atendia uma enorme gama
de fregueses.
Lá se encontravam armarinhos, secos e molhados, tecidos e apetrechos para a
lavoura, ferraduras e celas para animais, leite gordo e apreciados queijos, toucinho e sal,
açúcar e quitandas, rapaduras e querosene, vinhos importados e nacionais, excelente
cachaça e outras mercadorias.
Comumente sempre estava na “venda”, assentado numa cadeira, rente ao balcão,
para falar com os amigos que chegavam e supervisionar o movimento da loja.
O Major providenciava, com espírito cristão, o sepultamento dos roceiros, cujas
famílias não queriam o velório na Santa Casa. Cuidava também da alimentação dos que
acompanhavam o finado.
- Seu perfil físico era inconfundível: Alto, magro, sorriso discreto e amável. Usava
óculos de aro dourado, com lentes bifocais alongadas, bigode e barba aparados, cavanhaque
à “la baron”, afável e amigo de todos. Trajava sempre roupas escuras e bem cuidadas,
sobretudo de cassemira grossa, debruado de veludo preto na lapela. No bolso do colete
trazia um “omega”, preso à corrente, com um medalhão de São Geraldo.
- Major Zirico, o amigo abnegado e protetor dos pobres.
Suas portas estavam sempre abertas para acolher os pobres, principalmente aos
sábados, conforme costume da época. Distribuía-lhes os “quarenta réus” muito valorizados,
“in illo tempore”, dando-lhes, também, outros agrados com que minorar-lhes as
necessidades.
Construiu muitas casas para os indigentes, velhos e inválidos, na antiga Rua dos
Coqueiros e outros recantos da “pulcherrima urbs”.
- Major Zirico, o cristão fervoroso e praticante. Rezava em casa com a família, na
Igreja e também com os humildes e doentes.
Vivia, antes de tudo, valores do Evangelho. Todas as noites, ele reunia em casa os
filhos e netos e outros familiares para a oração do terço.
No dia 3 de maio, festa de Santa Cruz, celebrava o terço com muita pompa, com
mais pessoas e muita piedade de sempre.
Foi um verdadeiro vicentino preocupado com os pobres.
Membro da Conferência de São Bento, a mais antiga; Irmão do S.S. Sacramento;
Irmão da Ordem Terceira de São Francisco; Presidente da Liga Operária Católica.
- Integrou a Comissão de Construção da Matriz, muito generoso para ajudar a
custear as obras, com seus próprios recursos.
Dourou às expensas, o altar-mór de S. Bento e o altar de N. Senhora do Rosário, na
sua própria Igreja, pelos idos de 1909 ou 1910, quando sua filha Maria da Anunciação fora
“Rainha do Rosário”.
Era o “festeiro perpétuo” e fazia-se presente em todos os novenários e rezava com
edificante piedade. Anualmente, assumia as despesas decorrentes do evento, sem alarido e
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com muita humildade.
Após as memoráveis novenas solenes e procissões do Orago da Cidade, era
festivamente conduzido pelo povo e pela Banda Santa Cecília, até sua residência, onde
recebia a todos com indizível alegria e cavalheirismo. Nunca se mostrava envaidecido pela
homenagem, mas com simplicidade, retirava-se discretamente para os seus aposentos,
deixando que seus familiares se encarregassem da recepção.
- Nas festas anuais do Reinado, seu casarão se transformava numa espécie de Paço
Real, de onde o “Rei”, a “Rainha”, as “Princesas”, “Corte” e “Povo” saíam festivamente
para os rituais solenes, ao toque de dobrados e marchas festivas.
O magnânimo José Pedro Bandeira, seu estimado amigo, quando “Imperador do
Divino” saía também desse Solar, acompanhado do povo, para as Festas de Pentecostes que
marcavam época nos Anais da Cidade.
- Major Zirico, o Provedor da Santa Casa.
Por longos anos revelou-se desprendido e esforçado, o Apóstolo do Bem.
Assumiu a Provedoria do nosocômio, por muitas gestões e, numa delas, em
circunstâncias tão difíceis e dramáticas, que ninguém mais duvidava da precariedade da
situação. Firme e corajoso, conseguiu que o Hospital continuasse atendendo e abrigando
nossos irmãos doentes e necessitados.
Entregava-se aos pesados encargos e jamais faltava com sua presença confortadora,
moral, espiritual e religiosa aos facultativos, funcionários e doentes internos. Aos
indigentes, dava diretamente sua ajuda financeira.
Foi tão generoso e desprendido que doou à Santa Casa belíssimo Carrilhão, não só
para compor a sala de visitas, mas para marcar com muito amor, as badaladas da Caridade.
Sempre provia a dispensa e cozinha, quando dificílima a manutenção.
Foi exemplo e estímulo de bondade para os Servidores da Casa: Chico Alves e D.
Rosa, os enfermeiros de todas as horas. Sabia ser dócil com os faxineiros e os de serviços
domésticos. Todas as manhãs ia verificar o movimento geral do Hospital e voltava à tarde
para a recitação do terço, hora do conforto espiritual.
- Major Zirico, o Político, homem sem vaidade e radicalismo.
Vereador por várias legislaturas. Membro ativo da egrégia Edilidade, Juiz de Paz
por muitas vezes, comprovando em todas as funções inteligência, lisura e descortínio.
Convidado pelo seu adversário político, o ilustre Dr. Gabriel de Resende Passos,
para assumir a liderança da política municipal, declinou dessa honra para ser coerente e fiel
aos seus velhos amigos.
Morreu o Major Zirico a 15 de dezembro de 1939, aos 71 anos, como o modelo do
“pater famíliae”.
Foi padrão de dignidade, honra, respeito e autoridade. Enalteceu sua terra pela sua
trajetória humana.
Pedimos-te, por isso, ó Vô Iço, nesta singela homenagem:
- Abençoa teus filhos, netos, bisnetos, parentes, amigos e conterrâneos e a Terra que
tanto amaste!
- Faze eclodir, na terra itapecericana, homens de tua têmpera, dignidade e fortaleza
de espírito!
Fraternal admiração!
Pelos itapecericanos
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Rousseau ensina “que se deve conduzir as crianças à virtude pela estrada do sentimento
e da educação”. Só assim teremos uma nação mais forte e feliz.
AILC
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