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FACULDADE DE LETRAS E CIÊNCIAS SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA

MESTRADO EM SOCIOLOGIA RURAL E GESTAO DE


DESENVOLVIMENTO

Modelos de Desenvolvimento Agrário

Domingos Elias Bihale

Maputo, Julho de 2009


Índice

Resumo................................................................................................................... ....3

Introdução.................................................................................... ..............................4

Problema: Progressão Geométrica da População versus Progressão Aritmética da


Produção Alimentar....................................................................................................5

Abordagem analítica dos Modelos de Transformação Social na Agricultura...............9

1.Modelo de conservação........................................................................................9

2.Modelo de Fronteira................................................................................. ...........10

3.Modelo de impacto industrial – Urbano..............................................................11

4.Modelo de Difusão ............................................................................... ..............12

5.Modelo de Insumos de Altos Rendimentos.........................................................13

6.Modelo de Inovações induzidas .........................................................................15

À Guisa de Conclusão: Reflexão sobre Moçambique.............................................16

Bibliografia............................................................................... ................................18

2
Resumo

Este ensaio apresenta a análise das teorias básicas de transformação social na agricultura e
tem por objectivo ver como estas teorias podem ser aplicáveis em Moçambique. Assim,
apresenta-se as principais linhas dos modelos e suas críticas, e, em seguida, reflecte-se sobre a
sua aplicabilidade em Moçambique, onde se conclui que nenhum modelo só por si é capaz de
explicar o processo de desenvolvimento agrário em Moçambique.

3
Introdução

O presente ensaio debruça-se sobre as teorias básicas de transformação social na agricultura. O


objectivo é analisar como estas teorias, olhando para os seus pressupostos básicos e suas críticas,
para de seguida reflectir sobre a sua aplicabilidade em Moçambique.

O ensaio baseou-se na pesquisa bibliográfica, isto é, livros, artigos, monografias e revistas que
versam sobre a matéria, bem como apontamentos da aula de Estruturas Socio-económicas nas
Zonais Rurais. A escassez de livros constituiu a principal limitação, pelo que se recorreu
essencialmente à Internet como alternativa.

Em primeiro lugar o trabalho apresenta o problema do crescimento população versus a escassez


de alimentos. Em segundo, discute os modelos/teorias básicas e suas criticas. Finalmente, como
conclusão, reflecte sobre a aplicação dos modelos em Moçambique.

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Problema: Progressão Geométrica da População versus Progressão
Aritmética da Produção Alimentar

Desde a revolução industrial do século XVIII, a humanidade tem se debatido com os problemas
de falta de alimentos e insegurança alimentar e luta pela busca permanente de alternativa que
ajudem a reverter a situação. A revolução industrial criou condições para a redução de
mortalidade infantil e a ocorrência de várias doenças outrora consideradas endémicas, devido ao
desenvolvimento da ciência, cuja consequência foi o aumento exponencial da população.

De acordo com Deffarges (1993:71), o ritmo do crescimento demográfico acelerou-se no século


XX: com 2 biliões no princípio do século XX, a população mundial atingiu 3 biliões em 1960, 4
biliões em 1975, 5 biliões em 1987 e atingiria pelo menos 6 biliões em 2000. Delors et al
(1996:31) testemunham a extrema rapidez de crescimento demográfico mundial, recorrendo
igualmente a alguns números. Segundo estes autores, a população mundial atingiu 5.57 mil
milhões de pessoas em 1993 e deveria atingir 6.25 mil milhões no ano 2000 e 10 mil milhões em
2050.

O relatório do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA, 1996: 1 e 70-72), indica que
em meados de 1996, a população do mundo ficou em 5,8 biliões, com crescimento de quase 87
milhões de um ano. Mais de 90 por cento deste crescimento está concentrado nos países em
desenvolvimento. Embora a velocidade das taxas de crescimento da população global esteja a
diminuir, as populações da África Sub-sahariana e partes do sul da Ásia ainda estão em expansão
em torno de 3% ao ano, o suficiente para duplicar o seu número em uma geração.

Se se demorou 123 anos para a população mundial crescer de 1 bilião para 2 biliões, levou
apenas 33 anos para o terceiro bilião, 14 anos, para o quarto bilião, e 13 anos para o quinto
bilião. Onze anos depois, algures em 1998, passou os 6 mil milhões de marca.

A Ásia tem 3,5 biliões, pouco menos de 750 milhões de África, América Latina e as Caraíbas
cerca de 500 milhões de habitantes. Em contrapartida, a Europa tem 727 milhões de pessoas e a

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América do Norte tem 295 milhões de habitantes. Três quartos da população do mundo estão
concentrados nos países em desenvolvimento.

A população da África Sub-Sahariana está condenada a aumentar significativamente, de 767


milhões em 2006 para cerca de 1,7 biliões em 2050. Em alguns países, a população vai triplicar
nos próximos quarenta anos como resultado de uma alta taxa de fertilidade. Este elevado
crescimento da população está a ocorrer num contexto de elevados níveis de pobreza, baixo
crescimento económico, a insegurança alimentar, miséria, sobrecarregados sistemas de saúde
(UNFPA, 2007).

Em 2007, a região da SADC tinha 252.4 milhões de habitantes distribuídos da seguinte maneira:
África do Sul 47.7; Angola 16.9; Botswana 1.8; Lesotho 1.8; Madagáscar 19.6; Malawi 13.5;
Maurícias 1.3; Moçambique 20.5; Namíbia 2.1; RDCongo 61.2; Swazilândia 1.0; Tanzânia
39.7; Zâmbia 12.1; Zimbabwe 13.2 (UNFPA, 2007:90). (vide a tabela 4 abaixo).

Tabela 4. A situação da população da região da SADC


País População em 2007 População em 2050
(Milhões de Habitantes) (Milhões de Habitantes)
África do Sul 47.7 48.7
Angola 16.9 43.5
Botswana 1.8 1.7
Lesotho 1.8 1.6
Madagáscar 19.6 43.5
Malawi 13.5 29.5
Maurícias 1.3 1.5
Moçambique 20.5 37.6
Namíbia 2.1 3.1
RDCongo 61.2 177.3
Suazilândia 1 1
Tanzânia 39.7 66.8
Zâmbia 12.1 22.8
Zimbabwe 13.2 15.8
Total 252.4 494.4
Fonte: Elaborado com base em dados fornecidos pelo UNFPA (2007) State of World Population 2007 –
Unleashing the Potential of Urban Growth. New York.

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Ainda de acordo com UNFPA (ibidem), a Comunidade terá uma população de cerca de 494.4,
distribuída de modo seguinte: África do Sul 48.7; Angola 43.5; Botswana 1.7; Lesotho 1.6;
Madagáscar 43.5; Malawi 29.5; Maurícias 1.5; Moçambique 37.6; Namíbia 3.1; RDCongo
177.3; Suazilândia 1.0; Tanzânia 66.8; Zâmbia 22.8; Zimbabwe 15.8. O gráfico abaixo ilustra a
tendência desta evolução.
Gráfico 4. Tendência demográfica da SADC até ao ano 2050

Fonte: Elaborado com base em dados fornecidos pelo UNFPA (2007) State of World Population
2007 – Unleashing the Potential of Urban Growth. New York.

Enquanto a África do Sul, o Lesotho, a Swazilândia, a Namíbia, o Botswana, as Maurícias e o


Zimbabwe irão conhecer um crescimento lento e com tendência a manter-se (Lesotho e
Swazilândia), os restantes países testemunharão um contínuo crescimento. A República
Democrática do Congo, o país mais extenso e mais populoso, conhecerá uma verdadeira
explosão demográfica.

Porém, o aumento da população não foi nem é acompanhado pelo aumento da produção de
alimentos, facto agravado pela movimentação da população das zonas rurais para os grandes
centros urbanos a busca de emprego nas indústrias e no sector terciário. Esta situação agrava a
situação da fome que é uma das expressões mais graves da pobreza. É um problema real que
coloca a população mundial, sobretudo a maioria residente nas zonas rurais em grande risco de
sobrevivência.

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De acordo com Sachs et al (2005:49), os pequenos agricultores e suas famílias constituem,
talvez, metade da população mundial que sofre com de fome crónica, e a proporção desta
população que vive na África a Sul do Sahara ainda é maior. São agricultores que carecem de
insumos agrícolas para regenerar solos empobrecidos (fertilizantes), técnicas agro – silvícolas e
os seus rendimentos são baixos.

Portanto, está a falar-se de uma situação rural onde os determinantes de produtividade tais como
o capital físico, o capital humano, o conhecimento tecnológico e o capital social são deficientes,
isto é, os agricultores não têm maior quantidade de equipamentos e estruturas de mercado, a
maioria deles é iletrada e, por consequência, não tem acesso a tecnologias mais sofisticadas. Este
facto é agravado pela grande estratificação social, onde se destaca um maior declive nas relações
de género que faz com que os acessos aos recursos produtivos, incluindo a terra, a mão-de-obra,
o crédito, a formação e a tecnologia sejam determinados pelo sexo e, frequentemente, sejam os
homens a obterem a aprovação destes em detrimento das mulheres, não obstante estas serem a
maior força de trabalho nas zonas rurais.

Perante esta situação qual é a alternativa possível? A resposta imediata a essa pergunta dada por
agro – economistas e sociólogos tem sido o desenvolvimento da agricultura. Contudo, se estes
convergem nesta resposta, não conseguem, por sua vez, se conciliar nas formas e estratégias a
seguir para o desenvolvimento da agricultura, facto que faz emergir várias teorias que tentam dar
resposta às formas possíveis que possam conduzir ao desenvolvimento da agricultura e à
transformação social. No presente trabalho analisa-se alguns dos modelos propostos, com o
objectivo de perceber as teses que defendem e as críticas a que são sujeitas, com o intuito de
fazer uma reflexão sobre aplicabilidade destas teorias na agricultura em Moçambique.

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Abordagem analítica dos Modelos de Transformação Social na
Agricultura

A agricultura é base de transformação de qualquer sociedade. Existem vários modelos de


transformação social na agricultura, mas por razões metodológicas aborda-se neste ensaio os
seguintes modelos: modelo de conservação; o modelo de fronteira; modelo de impacto industrial
– urbano; modelo de difusão; modelo de insumos de altos rendimentos e o modelo de inovações

induzidas. A questão central da discussão travada entre os diversos modelos é como produzir e

quanto produzir? Trata-se da procura de métodos e meios de produção que garantam uma
maior produtividade. Assim, cada modelo tenta dar uma resposta a estas questões, mas como é
óbvio, as respostas são diferentes, para um mesmo problema. Reconhece-se, no entanto, que a
maioria das actividades económicas e sociais se desenvolvem em torno da agricultura e a
agricultura cria condições para o crescimento económico nas zonas rurais, transformação da
estrutura social, garante a capitalização da força de trabalho, permite a acumulação da riqueza e
reduz a pobreza e cria o bem – estar e a segurança alimentar.

1. Modelo de conservação

De acordo com ADPP (2004), o modelo de conservação parte dos seguintes pressupostos:

 O sistema de agricultura deve desenvolver-se junto com crescimento da população no


mundo;
 A Natureza está a ser degradada devido ao uso abusivo ou ao mal uso da terra;
 Os solos estão a tornar-se improdutivos devido à degradação dos solos férteis.

Assim, à luz deste modelo a escassez da terra está aumentar e está a usar-se cada vez mais a terra
menos fértil que causa a queda da produtividade marginal do trabalho e da terra, urgindo a
necessidade de manter a produtividade do solo alta ou equilibrada

Neste modelo advoga-se o uso de adubos orgânicos, o uso de terra e trabalho intensivos e a
formação de capital humano intensivo em matérias de drenagem, irrigação e facilidades físicas

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concorrentes à utilização efectiva da terra e água. Aponta-se o fomento de métodos de cultivo
que aumentem a produção ao mesmo tempo protegendo os solos da degradação, tais como: a
rotação de culturas, lavoura mínima e uso de estrumes verdes e forragens na criação animal
(Getaneh, 2002, ADPP 2004).

Este modelo vigorou durante muitos anos e vigora ainda hoje em muitos países como é caso de
Moçambique. Embora o modelo tenha permitido o aumento da produtividade em 1% por ano,
não consegue acompanhar o ritmo de crescimento da população a nível mundial.

O modelo de conservação tem sido criticado porque:

 As experiências em países desenvolvidos demonstraram que a mudança na produtividade


da terra estava acima das expectativas dos economistas clássicos e muitos dos aumentos
na produtividade agrícola eram resultantes do aumento das áreas de cultivo;
 Mesmo em algumas sociedades “tradicionais” a produtividade do solo em algumas áreas
pareciam ser uma variável dependente do aumento das áreas de cultivo;
 O modelo falha por não reconhecer o uso de insumos industriais no aumento da produção
e produtividade agrícolas, bem como o impacto das mudanças tecnológicas nos tipos de
procura de terra na agricultura;
 A medição da terra e produtividade é apenas feita em termos de unidade física, onde não
há comparação dos retornos de investimentos, usos alternativos nem importância social,
isto é, os valores económicos e sociais de investimentos são ignorados, privilegiando
apenas aspectos financeiros.
 O papel de sectores não agrários é posto de lado.

2. Modelo de Fronteira

O modelo de fronteira surgiu como resultado do reconhecimento de que a conservação da terra e


o uso de adubos orgânicos não eram suficientes para garantir o aumento da produtividade
agrícola e da segurança alimentar, pelo que o alargamento das áreas de cultivo seria uma
alternativa viável. Von Thuenen nos anos 50 foi um dos expoentes máximos deste modelo. Para
os defensores deste modelo, a terra é fisicamente infinita e a determinação das áreas de cultivo

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depende dos custos de transporte e acessibilidade; a terra é homogénea e difere apenas na
localização medida a partir do centro (vila ou cidade); há, contudo, escassez de terra arável junto
do centro, daí a necessidade de expansão (Getaneh, 2002). Foi nesta perspectiva que se
desencadeou a expansão colonial efectuada por portugueses, espanhóis, ingleses e japoneses,
entre os séculos XV e XIX (Mucavele, 2009).

O modelo de fronteira sujeita-se às seguintes críticas:

 É apenas adequado para os grandes agricultores comerciais;


 Requer grandes investimentos muitas vezes inacessíveis aos agricultores de pequena
escala;
 Pressupõe a existência de grandes extensões de terras desocupadas, o que é praticamente
falacioso;
 Concorre para a expropriação e marginalização de agricultores de pequena escala;
 Inapropriado para a transformação da estrutura social;
 No caso de Moçambique pode ser fonte de conflitos de uso e aproveitamento de terra;
 Pode ser fonte de desflorestação, degradação e erosão de solos, pois não contempla
medidas de conservação dos recursos naturais.

3. Modelo de impacto industrial – Urbano

O modelo de impacto urbano - industrial relaciona a produtividade e o desenvolvimento da


agricultura com a distância e efeitos do desenvolvimento das áreas urbanas industriais. De
acordo com Getaneh (2002), este modelo busca seu fundamento na teoria de vantagens
comparativas de David Ricardo e assemelha-se ao modelo de fronteira advogado pelo Von
Thuenen. Recorde-se que Von Thuenen defendia que o factor determinante da produtividade e
desenvolvimento na agricultura era a distancia e o custo de transporte dos produtos agrícolas
para os centros urbanos.

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Ruttan (1988) apud Getaneh (2002), defendeu que o desenvolvimento industrial estimula a
demanda de produtos agrícola, oferta de insumos industriais necessários para o melhoramento da
produtividade e aumento do surplus da mão-de-obra nas indústrias proveniente da agricultura.
Para Schultz (1953) apud Mucavele (2009) o desenvolvimento económico na ordem do modelo
de impacto industrial – urbano respeita matrizes geográficas específicas que são primariamente
urbano industrial na sua composição e a existência de organização económica contribui melhor
quando situada perto de um centro urbano.

Este modelo é criticado pelas seguintes razões:

 É inapropriado para os países menos avançados e é responsável pelo crescimento


desordenado das cidades, com todos males que esse crescimento acarreta: criminalidade,
marginalidade, desemprego e pobreza;
 Na agricultura “tradicional” e em economias fracas o modelo não pode ter resultados
imediatos e observáveis;
 A agricultura não é vista como base de transformação da estrutura social nas zonas rurais;
 A tecnologia enquanto uma força matriz do desenvolvimento agrário é total e
completamente ignorada.

4. Modelo de Difusão

O modelo de difusão assenta na disseminação de informação sobre novas técnicas de produção


agrícola, melhoramento de animais e plantas para aumentar a produtividade e crescimento da
agricultura, bem como ensino de decisões economicamente racionais na gestão de recursos aos
agricultores.

Neste modelo, o desenvolvimento da agricultura apoia-se na divulgação efectiva de


conhecimentos técnicos levados a cabo pelos extensionistas rurais. A investigação agrária
constitui a alicerce deste modelo e é complementada pelos serviços de extensão agrária e
sociologia rural no melhoramento das práticas agrárias.

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Duma forma geral o modelo permite o melhoramento de sementes e animais, mas não está livre
de criticas. O modelo é criticado porque:

 Defende a disseminação generalizada de conhecimentos técnicos, plantas e animais


melhorados e desenvolvidos a partir de certas experiências, sem olhar para contextos
específicos;
 Ignora o potencial endógeno (conhecimentos já existentes entre os agricultores locais);
 Algumas vezes os extensionistas são mal formados e, porquanto, mal transmitem os
conhecimentos sobre o uso de novas técnicas agrícolas aos agricultores;
 Os extensionistas muitas vezes carecem de conhecimentos sólidos de agricultura e das
condições sociais nas áreas onde operam e são vistos, por isso, como forasteiros.

5. Modelo de Insumos de Altos Rendimentos

O Modelo de Insumos de Altos Rendimentos surgiu na década 60 e defende a industrialização da


agricultura. O modelo de Insumos de Alto Rendimento tem como tese central a mudança
tecnológica vista como força motriz do desenvolvimento da agricultura.

O modelo de Altos Rendimentos foi introduzido por Theodore Schultz, no seu livro
Transforming traditional agriculture, publicado pela primeira vez em 1964. De acordo com
Schultz apud Dall’Acqua (1983:925),

 Os agricultores tradicionais são eficientes e racionais na alocação de recursos;


 Permanecem pobres, contudo, porque a tecnologia disponível não oferece incentivo
económico para agricultores;
 As tecnologias de alta produtividade disponíveis em países desenvolvidos não são
transferíveis para países pobres, visto que a tecnologia agrícola é de localização
específica;
 A chave para transformar a agricultura tradicional é realizar investimentos que tornem
insumos de altos rendimentos disponíveis aos agricultores.

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Podemos assim compreender que, à luz do Modelo de Altos Rendimentos, as tecnologias devem
adaptar-se aos contextos específicos e requerem investigação agrária, agro – indústrias, mercados
agrícolas e serviços de extensão agrária. Este modelo implica o envolvimento de instituições
públicas e privadas de pesquisa na produção de conhecimento técnico; do sector industrial na
produção e comercialização de insumos agrícolas e dos agricultores na aquisição e utilização
eficiente de novos conhecimentos e de novos insumos. Trata-se de desenvolvimento de capital
humano que pode permitir a produção de tecnologias e agricultores mais produtivos.

Neste modelo, o governo e o sector industrial são vistos como guardiães do desenvolvimento
agrário, não só na criação de condições políticas e macroeconómicas seguras e sustentáveis e
concessão de créditos, mas também na oferta de insumos agrícolas através de fomento de
mercados agrícolas.

Todavia, este modelo foi criticado por não trazer uma explicação exaustiva das condições
económicas e sociais que conduzem as instituições a gerar tecnologias e pessoas a absorverem e
usar eficientemente essas tecnologias, nem clarifica o processo pelo qual a relação entre preços
dos factores e do produto induzem investimento em pesquisa numa determinada direcção. Por
isso Hayami e Ruttan (1971:p.43)1 apud Dall’Acqua (1983:925) consideram o Modelo de
Insumos de Altos Rendimentos incompleto. Hayami e Ruttan propõem, portanto, mudanças de
técnicas endógenas como forma crucial de desenvolvimento da agricultura. Para esses autores a
mudança técnica é qualquer mudança nos coeficientes de produção resultante das actividades
dirigidas para o desenvolvimento de novas técnicas incorporadas em projectos, materiais ou
organizações. Em suma, Hayami e Ruttan defendem o modelo de inovações induzidas, que se
fundamenta na programação da educação em interligação com investigação e extensão agrárias,
cujo lema é inovação.

1
HAYAMI, Y., e RUTTAN, V.W. Agriculture Development: an international Perspective. London, The Johns
Hopkins University Press, 1972.

14
6. Modelo de Inovações induzidas

Como se referiu acima, o modelo de inovações induzidas foi introduzido na economia agrária
por Hayami e Ruttan em 1971. De acordo com este modelo, a transformação na agricultura
resulta da combinação de quatro elementos: disponibilidade de capital físico, disponibilidade
capital social, tecnologia e instituições (Getaneh, 2002). Assim, Hayami e Ruttan discutem os
factores de produção terra, capital trabalho e a capacidade de geração e transferência de
tecnologia, bem como os níveis de especialização, instituições de pesquisa e educação dos
produtores rurais, como elementos a serem considerados na análise do desenvolvimento.

Considera-se que qualquer mudança em qualquer um desses elementos devido à oferta ou a


demanda induz mudança em qualquer outro. Desta forma, o modelo centra-se no conjunto
complexo de interacções entre disponibilidades de recursos e entidades económicas
(machambas, instituições públicas e privadas, indústrias privadas), conduzindo a mudanças
técnicas e produtividade na agricultura.

O modelo propõe a análise do processo de desenvolvimento, com incidência para o papel da


função de produção e os mecanismos de mercado que interligam os diferentes sectores de
economia. Argumenta-se que, tanto o sector privado quanto o público têm um papel a
desempenhar no desenvolvimento agrário. Enquanto o sector privado cria novas tecnologias em
resposta às mudanças nos preços relativos dos factores e dos produtos, para aliviar os
condicionantes impostos pelas ofertas inelásticas de terra e trabalho, os pesquisadores e
administradores de instituições públicas respondem aos sinais dados pelos preços escassos
(Dall’Acqua, 1983).

Para Machado (1998), o modelo de inovações induzidas procura explicar a inovação tecnológica
da agricultura, tendo em conta que as tecnologias biológico - químicas e mecânicas resultam da
necessidade de facilitar a substituição de factores de produção relativamente escassos e, portanto,
mais caros, por outros relativamente abundantes.

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Por conseguinte, trata-se de interligar os programas de educação com a investigação e extensão,
onde o desenvolvimento da agricultura assenta sobre a inovação, rumo à resolução dos
problemas do aumento da demanda em produtos alimentares resultante da explosão demográfica
e ao desenvolvimento da agro – indústria.

O modelo de inovações induzidas é criticado, pois:

 Na sua estrutura teórica é limitado a um postulado genérico e evidente sobre a racionalidade


dos agentes socio-económicos de livre actuação das forças de mercado, pelo que o modelo
ainda está longe de permitir a resolução de todos os problemas macroeconómicos das zonas
rurais, considerando que os defensores das inovações induzidas colocam a investigação
cientifica muito acima das reformas estruturais (Romeiro, 1991:53-54);
 O modelo é internamente consistente para um mundo de um sector ou de um único bem,
onde o sector da agricultura produz um bem usando a si mesmo e o trabalho como insumo;
 A este modelo falta o poder analítico essencial para um modelo de desenvolvimento;
 O modelo de inovações induzidas não dá atenção à interacção formal entre sectores agrícolas
e não agrícolas, através dos mercados de produtos agrícolas, insumos manufacturados usados
na produção agrícola, trabalho, terra, capital e bens de consumo.

À Guisa de Conclusão: Reflexão sobre Moçambique

O desenvolvimento agrário em Moçambique não pode ser guiado com base em um único
modelo. Existe uma necessidade de aumento das áreas de cultivo e da produtividade tal como se
preconiza o modelo de fronteira, ao mesmo tempo que conserva a fertilidade dos solos,
recorrendo ao uso de novas tecnologias (modelo de conservação). As assimetrias regionais não
explicam o desenvolvimento desigual da agricultura no país, muito pelo contrário, as assimetrias
regionais podem jogar um papel importante na diversificação de produtos agrícolas e na
competitividade agrícola entre as diferentes regiões, pois cada região tem suas condições agro –
ecológicas. Mesmo as cinturas das cidades contribuem consideravelmente para o aumento de
produtos alimentares nos centros urbanos. Desta forma o modelo de impacto industrial não se

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revela tão aplicável na realidade moçambicana, a menos que haja argumentos mais do que
contrários.

Por outro lado, Moçambique está empenhado em aumentar os serviços de extensão agrária
através do aumento do número de extensionistas agro-pecuários nas zonas rurais, cuja função é
difundir as práticas de melhoramento de animais e plantas para aumentar a produtividade e o
crescimento da agricultura. Estes serviços são acompanhados com a investigação agrária
responsável de geração de novas tecnologias, melhoramento de sementes e animais, actualmente
encabeçada pela Faculdade de Agronomia da Universidade Eduardo Mondlane, Instituto de
Investigação Agrária de Moçambique (IIAM) e Institutos Politécnicos de Agricultura e Institutos
Médios Agrários. Nesse contexto, podemos também citar a empresa ProCampo que desenvolve
novas tecnologias agrícolas e as coloca no mercado agrícola moçambicano. Porém, esse processo
deve ser acompanhado de programas de educação em interligação com a investigação e extensão.
Estes exemplos mostram a aplicabilidade conjugada dos modelos de difusão, de insumos de altos
rendimentos e de inovações induzidas.

Em suma, o problema de insegurança alimentar em Moçambique pode ser resolvido através do


aumento de produtividade; aumento da área irrigada; desenvolvimento tecnológico; utilização de
novas tecnologias de capital intensivo; desenvolvimento de políticas públicas extensivas a
pequenos agricultores e desenvolvimento de políticas de protecção dos interesses dos produtores
e consumidores locais, no comércio internacional.

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Bibliografia

ADPP - Ajuda de Desenvolvimento de Povo para Povo (2004), Agricultura de Conservação, O


Movimento GAIA Manual 23, Monze, Zambia, disponível em www.gaia-movement.org, acesso
em 02 de Julho de 2009, Maputo.

DALL’ACQUA, Fernando Maida, O problema da agregação de capital: uma critica ao modelo


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DEFARGES, Phillip Moreau ( 1993), A Mundialização e o Fim das Fronteiras, Instituto Piaget,
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DELORS, Jacques el at (1996), Educação, um Tesouro a Descobrir, Relatório para UNESCO da


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GETANEH, Mehari, Agricultural Development Models Reviewed (Implied Practices in


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http://www.google.com.br/search?hl=pt-BR&q=Agriculture+development+Models&meta=.
Acesso em 11 de Junho 2009, Maputo.

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MUCAVELE, Firmino G., Notas de Aulas Estruturas Socio-Económicas, CÓDIGO: MO2,


Mestrado em Sociologia Rural e Gestão de Desenvolvimento, Faculdade de Letras e Ciências
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ROMEIRO, Ademar Ribeiro (1991), “Dinâmica de introdução de inovações na agricultura: uma


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SACHS, Jeffry et al (2005), Investir no Desenvolvimento: Um Plano Prático para Alcançar os


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