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VOZES
ALICE
Paulo Jorge
– 7ºJ
“Para mim, 25 de Abril, 5 de
Outubro, 1º de Novembro, 1º de
Dezembro e 1º de Maio é tudo a
mesma coisa, ou seja, é feriado e
isso é que interessa…
… Claro que sei que o 25 de Abril
foi quando uns militares se
meteram nuns tanques e andaram
de madrugada pelo Terreiro do
Paço. Mas se queres que te
explique o que eles lá andavam a
Madalena –
7ºB
“No dia 25 de Abril de 1974 houve uma
revolução em Portugal.
A revolução foi comandada pelos capitães, mas
há muitos anos que muitas pessoas vinham a
lutar para que esta revolução acontecesse,
porque há muitos anos que as pessoas estavam
descontentes, pois não havia liberdade no país,
e a polícia prendia quem pensava de maneira
diferente das pessoas que mandavam.
As pessoas iam para a prisão, eram torturadas e
muitas delas ficavam presas durante muitos
anos. Às vezes nem podiam ter visitas da
família. Às vezes ficavam dentro de uma cela
muito pequena, sem luz, durante muitos dias.
Antes do 25 de Abril, Portugal tinha colónias em
África e não lhes queria dar a independência.
Estavam constantemente a partir barcos
cheios de soldados, e às vezes a televisão
mostrava. Morreram muitos soldados
portugueses, e morreram muitos soldados
africanos que lutavam pela sua liberdade.
Se não tivesse havido o 25 de Abril de
1974, se calhar a guerra de África ia
continuar por muitos mais anos, e muitos
mais soldados tinham morrido.
Se calhar o meu pai podia ter ido para a
guerra e podia lá ter morrido. Se calhar o
pai da Íris, que é minha colega de carteira e
nasceu em Cabo Verde, também. Quem
sabe até um deles não podia ter morto o
outro.
Professora
de Inglês
“…naquele tempo não se podia fazer greve,
era ilegal, a polícia podia prender – e
prendia mesmo! …
…na alameda da Universidade, lembro-me
sempre dos carros da polícia a subir por ali
acima, e nós todos a enchermos aquele
espaço, a falarmos de tudo o que estava
mal, a falarmos das manifestações para
celebrar o Dia do Estudante que não nos
deixavam fazer, da falta de liberdade, da
importância que deviam ter os estudantes
no ensino deste país, e depois lá saltavam
os polícias de dentro dos carros, «cremes
níveas» era assim que lhes chamávamos
porque eram uns carochas pintados de azul
e eles atrás de nós a bater em quem apanhavam,
mas no dia seguinte lá estávamos nós outra vez
em plenário, e um dia a polícia fechou as portas da
cantina, e prendeu todos os que estavam lá
dentro. E depois a gente procurava nos jornais – e
não aparecia nada! Era como se nada tivesse
acontecido, como se a vida na universidade
corresse na maior das calmas. Estudantes presos
todos os dias, muitos a fazerem greve de fome,
ninguém a ir às aulas, plenários dia e noite, a
polícia toda mobilizada, pancadaria dia sim dia sim
– e nos jornais a polícia não deixava sair nem uma
palavra sobre o assunto…
…E muitos foram expulsos de todas as
universidade do país!... Um estudante a não poder
estudar em lado nenhum do seu país?
Os que puderam fugiram para o estrangeiro, e
Pai do
Paulo Jorge
“…esse dia para mim foi praticamente igual
aos outros, entrei na mercearia às oito,
comecei a pôr os caixotes lá fora, e depois
veio a minha tia dizer que tinha ouvido na
rádio que havia uma revolução em Lisboa,…
…Só lá para a noite, quando o meu pai
chegou é que eu comecei a acreditar. O meu
pai chegou muito tarde, …disse que tinha
sido um sarilho para apanhar o barco para
casa, no Terreiro do Paço havia tropa por
toda a parte, ele estava mesmo a ver que
não conseguia chegar à estação…
…no dia a seguir ao 25 de Abril, quando a
televisão, no café, mostrava tudo o que
D. Quitéria
(professora do pai
do Paulo Jorge)
“…Aquilo era uma terra onde não havia nada,
nem vinha no mapa, a escola não tinha
condições nenhumas, mas nenhumas! …
…Olhe que nem sequer o retrato do Américo
Tomás e do Marcelo Caetano ela tinha! A
menina é muito nova, e se calhar não sabe
estas coisas, mas antes do 25 de Abril todas as
escolas primárias... Agora elas já não se
chamam assim, acho que se chamam escolas
do ensino básico…
…Mas dizia eu que todas as escolas tinham na
parede o retrato do presidente da República e
do presidente do Conselho…
…Olhe que não havia um pau de giz! Nem
sequer o mapa de Portugal! Eu queria dar
aritmética e geometria, e nem uma caixa com
…Então eu, pacientemente, escrevia todos os
meses uma carta ao Ministério e explicava
que a escola não tinha material, e sem
material como é que eu podia ensinar as
crianças, e lá dizia também, para ver se os
comovia, que a escola nem os retratos do
senhor presidente da República e do senhor
presidente do Conselho tinha nas paredes, e
que era uma vergonha para o país uma
escola naquele estado, santo Deus…
…E do Ministério, nada. O silêncio mais
completo…
… Mas nunca desisti. Todos os meses lá ia a
carta para o Ministério. Isto durante anos! Só
em selos devo ter gasto uma pequena
fortuna! …
… Estava tão feliz, mas tão feliz, que nem estranhei a
pressa que o chofer tinha em despachar aquilo, e
nem liguei, quando ele disse que em Lisboa tinha
havido qualquer coisa esquisita, tinha encontrado
muita tropa na rua quando de lá saíra, e aquilo não
lhe parecera normal…
…a senhora Aurora, que era quem limpava a escola, a
chegar ao pé de mim e a dizer que na rádio se falava
de uma revolução, de um Movimento das Forças
Armadas que tinha ido prender o governo todo, e eu a
abrir os pacotes cheia de alegria, e a dar de caras
com os retratos do Américo Tomás e do Marcelo
Caetano! Nem um pau de giz, nem um mapa, nem
formas geométricas, nada de nada, a não ser os
retratos daqueles dois para pendurar na parede…
… Ainda hoje, que já se passaram 25 anos, de cada
vez que vejo, na televisão, documentários sobre o 25
Mãe da
Madalena
“…mas lembro-me, para aí uns dois ou três dias a
seguir, de os meus pais se terem metido comigo
e com o meu irmão no carro,…
…para um lugar que se chamava Caxias… buscar
uns amigos, e então chegamos ao pé de uma
casa enorme… era uma prisão, … quando saímos
do carro estava lá muita gente…toda a gente se
abraçava e estava muito feliz…
…lembro-me de ouvir alguém dizer que afinal os
nossos amigos não iam sair, e logo toda a gente
gritou muito, e correu mais perto das janelas com
grades, e começaram a gritar, «o povo unido
jamais será vencido»…
… E de noite o meu pai voltou a ir a Caxias, mas
acho que foi só na outra madrugada que os
amigos, finalmente, saíram…
…E também me lembro de ver a minha mãe abrir o
sofá - cama … e dizer «é para um amigo que chega
daqui a bocadinho»…. Havia outros amigos… e era
estranho porque nunca saiam do quarto, nem iam á
rua, nem abriam a porta, nem atendiam o telefone.
Viviam dias e dias fechados na nossa sala
transformada em quarto de dormir, com o sofá
sempre aberto.
Depois o amigo desaparecia, e o meu pai ficava com
uma cara muito séria e dizia que o amigo tinha ido
viajar para muito longe e que eu não deveria falar
dele a ninguém…
…muitos anos depois, num 25 de Abril em que a
televisão se lembrou de transmitir a reportagem
sobre a libertação dos presos políticos, reconheci-o
quando saía da prisão no meio dos outros…
…Lembro-me da minha mãe a fazer café e a encher
Avô da
Madalena
“…A menina imagine que, antes do 25 de Abril,
nem podíamos estar os dois como estamos
agora, aqui no café, a menina a perguntar, eu a
responder, o gravador a gravar… ao seu lado
podia estar um informador da PIDE a ouvir tudo
e o mais certo era a menina depois ser
chamada à António Maria Cardoso … era a rua
da sede da PIDE, e para lá marchavam as
pessoas para serem interrogadas, e muitas
eram interrogadas dias a dias seguidos sem
poderem dormir. Algumas eram obrigadas a
estarem de pé dias inteiros até desmaiarem…
Mas sabe como é: havia a censura e por isso os
jornais não diziam nada, a rádio não dizia nada,
a televisão não dizia nada… Às vezes, quando
oiço por ai certa gente a berrar contra o 25 de
… a minha irmã namorava um rapaz… vinham por aí
abaixo a conversar, … lá se entusiasmaram um
bocadito, e vá de darem um beijo. Pois logo nessa
altura passou um policia que os levou para a
esquadra…
… A gente até tinha medo de falar ao telefone, porque
muitos deles estavam sobre escuta. Às vezes
conseguíamos apanhar uns programas da rádio que
vinham de estrangeiro, e onde se davam noticias de
Portugal, mas tínhamos de ter muito cuidado, agente
sabia lá se o nosso vizinho de baixo não seria
informador e não ia logo contar…
… A menina sabe que havia cantigas proibidas, não
sabe? O Zeca Afonso… Mas antes do 25 de Abril ele
nunca pôde ir à televisão?... Sabe que os discos que
saíam eram logo levados pela polícia? Agora toda
agente as canta…
Obrigada!!!!!
TRABALHO REALIZADO POR:
Maria João Mogadouro Lopes – 5ºA