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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoríam)
APRESENTTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propoe aos seus leitores:
aborda questoes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal no assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Estevao Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Estevao Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacáo.
A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
índice
pao.

A FIM DE QUE O MUNDO CREÍA (Jo 18,23) 449

Profetas e "profetas":
E AS PROFECÍAS DE SAO MALAQUIAS ? 451

Problema dos educadores:


EDUCACAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 457

Urna tese batista:


"A SALWAQAO DO CRENTE É ETERNA" 466

A Grande QuestSo:
A ALMA HUMANA É IMORTAL ? 475

Filosofía e Historia:
UMA DELIMITACAO PARA A FILOSOFÍA DA HISTORIA 482

A XII ASSEMBLÉIA GERAL DA FEDERACAO INTERNACIONAL DAS


UNIVERSIDADES CATÓLICAS 486

LIVROS EM ESTANTE 489

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA

NO PRÓXIMO NÚMERO :

A autenticidade do texto bíblico hoje. — Criatividade e espon-


taneidade na Liturgia. — Biorritmo : a nova ciencia ? — Maij uma
vez a seita de Moon.

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

Assinatura anual Cr$ 100,00

Número avulso do qualquer mes Cr$ 10,00

REDACAO DE PR ADMINISTRAgAO
_ , _ . , „„„ Llvrarla Mlsslonária Editora
Caixa Postal 2.666 Ruft Méjdco> 168.B (Gástelo)
ZC-00 20.031 Rio de Janeiro (RJ)
20.000 Rio de Janeiro (RJ) Tel. : 324-0059
A FIM DE QUE O MUNDO CREÍA,..
O mundo inteiro recebeu com sensagáo e surpresa a
noticia da eleicáo do novo Papa Joáo Paulo I aos 16/10/78.
O fato sugere variados comentarios... Procuremos, & luz
da fé, repensar o importante acontecimento.
1) O novo Pontífice nao estava na lista dos papabilL
Isto é muito significativo: nao estava rotulado, nem dera
margem a enquadramentos... Mais urna vez os prognóstí-
cos e «profetas» foram desconcertados. Realmente os desig
nios de Deus nao sao os designios dos homens (cf. Is 55,9);
o Senhor conduz a sua Igreja por caminhos imprevisíveis,
tragados pela sua imensa sabedoria.
A relativa rapidez do conclave é sinal de que a Igreja, em
meio a um mundo dividido, está coesa; os eleitorés soube-
ram considerar com visáo de fé a sucessáo de Joáo Paulo I,
pondo de lado interesses espurios.
2) Joáo Paulo II é polonés... Já se disse que o Papa
nao tem nacionalidade, pois deve ser homem de Deus, guiado
por criterios transcendentais. Como quer que seja, o fato
de ter a escolha recaído sobre um filho da nagáo polonesa
tem sua importancia, visto que o plano de Deus se realiza
por meio dos homens:
— Temos um Papa que conhece de perto o sofrimento
e a perseguicáo. É alguém que está acostumado á vigilancia
e á firmeza e que procurará com grande empenho manter a
disciplina e preservar a integridade da fé dentro da S. Igreja,
como o declarou o próprio Pontífice em sua primeira alo-
cugáo aos Cardeais (17/10/78). De resto, os bispos polone
ses tém dado notável testemunho de coragem e intrepidez
diante das autoridades comunistas — o que tem contribuido
para manter viva a chama da fé e do zelo missionário no
povo polonés;
— É de crer que se ameliorem as relagóes entre a Igreja
e o Estado na Polonia e, quigá, em outros países da Cortina
de ferro. Os católicos poloneses háo de se sentir prestigiados
perante o Governo marxista de sua patria; este, por sua vez,
há de respeitar um pouco mais a Igreja Católica na Polonia,
brilhantemente sufragada pelos votos de um conclave inter
nacional. Joáo Paulo II conhece, como poucos outros Car
deais, as vias oportunas para obter mais liberdade em favor
dos cristáos sufocados pelo marxismo; a Ostpolitik, sabia
mente iniciada por Paulo VI, poderá assim prosseguir no
intuito de aliviar o jugo que pesa sobre a Igreja do Leste
europeu, sem que haja indevidas concessóes ao marxismo;

— 449 —
Wojtyla sempre foi um esteio da resistencia as injuncóes do
comunismo.
Alias, a Polonia católica bem merecía a homenagem que
se lhe prestou na pessoa do Cardeal Wojtyla; os fiéis polo
neses tém urna historia dura e sofrida, através da qual vém
afirmando com heroísmo singular os valores da sua fé.
3) Salientamos também que o novo Papa foi professor
de Teología. É um homem de estudo, apto a discernir a ver-
dade e o erro em meio as diversas correntes de pensamento
que cercam e penetram a Igreja. Levará adiante a obra de
renovagáo programada pelo Concilio do Vaticano II, seguindo
a inspiragáo fundamental do Concilio, sem indulgencia para
com desvíos.
De resto, o nome Joáo Paulo II bem significa quanto o
novo Pontífice tenciona seguir as pegadas dos anteriores, as
quais foram de inegável fidelidade aos grandes principios do
Evangelho e da Tradigáo católica.
4) Por certo, a tarefa de Joáo Paulo II nao será fácil.
O novo Pontífice terá que se adaptar as duras exigencias da
mesma,... especialmente duras para quem nao centava com
isso. Todavia o povo de Deus há de acompanhá-lo com as
suas preces; afinal de contas, o segredo das grandes realiza-
góes é a oragáo; é esta que dá fecundidade de agáo aos ins
trumentos que a Providencia divina escolhe, como também
sem a oragáo sao esteréis e perdidas as melhores qualifica-
góes humanas de qualquer chefe ou pastor.
5) Em síntese, os últimos tres meses foram marcados
por vultosos acontecimentos na historia da Igreja. Conside-
rando-os com olhar retrospectivo, o fiel católico encontra
razóes para conceber urna santa ufanía:... a ufanía de, por
graga de Deus, pertencer k santa e única Igreja de Cristo.
Esta tem dado provas de rica e singular vitalidade, surpreen-
dendo o mundo com novas e novas atitudes, do mais alto
valor, a fim de responder aos desafios que os tempos lhe
propóem. Enquanto a humanidade se debate em crises diver
sas, a Igreja Católica, sem deixar de sentir a repercussáo
dessas crises em suas fileiras, mostra dispor de urna fonte
de energía e vida que ultrapassa os valores humanos e que
denota a presenga do próprio Cristo em seu Corpo Místico.
Saiba o fiel católico compreender os sinais dos tempos
e compenetre-se dos motivos que lhe sugerem essa santa
ufanía! Consciente, pois, a novo título, da nobreza de sua
vocagáo crista, procure testemunhar com toda a coeréncia
possivel a presenga do Senhor Jesús que vive na Igreja e
vive em cada um dos membros desta... A fim de que o
mundo creia (Jo 18,23)!
E.B.
— 450 —
«PERGUHTE E RESPONDEREMOS»
Ano XIX — N» 227 — Novembro de 1978

Profetas e "profetas":

e as profecías de sao malaquias ?


Em ahítese: As "profecías" de S. Malaqulas, que voltaram á baila
por ocasláo do último conclave pontificio, carecem de toda e qualquer auto-
rldade, segundo os resultados da boa critica histórica.

S. Malaqulas (1095-1140) fol bispo de Armagh na Irlanda no século XII.


Até o secuto XVI nenhum autor ou documento mencionou as suas "profe
cías" ; estas foram Ignoradas até 1595, quando o benedltlno Amoldo de
Wyon as Inserlu no seu opúsculo "Llgnum Vltae". Hoje em día pode-se
dlzer que tal documento teve orlgem em 1590 durante o conclave que devla
eleger o sucessor de Urbano Vil; entre os Cardeals mals em vista estava
Simoncelll, cldadáo de Orvleto e antlgo blspo desta cldade; ora os amigos
de Simoncelll qulseram favorecer a eleicáo deste prelado, apresentando
urna lista "profética" de 111 Papas em que o sufragado após Urbano Vil
era o Papa "De antlqultate urbis" (Da antlguldade da cldade), Isto é, o
Papa de Orvleto (= Urbs vetus, cidade antiga); em vista disto, forjaram
urna serió de dísticos papáis mals ou menos condlzentes com a realidade
desde Celestino II (1143-1144), mas assaz arbitrarla após Urbano Vil. Toda
vía essa fraude foi vá, pols quem salu elelto do conclave em 1590 fol o
Cardeal Sfrondate, arceblspo de Mlláo, que tomou o nome de Gregorio XIV.

Estes dados bastam para dlsslpar qualquer dúvlda acerca da pretensa


autoridade das "profecías" de Sao Malaquias.

Comentario: Estiveram mais urna vez em grande voga


as ditas «profecías de S. Malaquias» por ocasiáo do último
conclave papal em outubro 1978. A imprensa as mencionava
como referencial para se predizer a identidade do futuro
Papa; as conjeturas foram as mais variadas possíveis, pre
tensamente apoiadas também em outras fontes de prognós
ticos (Nostradamus e semelhantes). Verificou-se, porém, que
os resultados foram totalmente diversos do que se previa
— o que bem mostra que a S. Igreja transcende as cate
gorías dos homens e, em última análise, é regida pelo pró-
prio Deus; quem a queira considerar segundo criterios mera-

— 451 —
i «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

mente humanos, arrisca-se a falhar, por completo, em suas


perspectivas. Pode-se esperar que as ligóes do último con
clave contribuam para avivar no público a consciéncia desta
verdade.

Em vista da atualidade que continuam tendo as «profe


cías» de S. Malaquias (as quais prevéem o fim do mundo
para o ano 2000 aproximadamente), proporemos abaixo al-
guns dados que ajudem o leitor a julgar a autoridade de
tal documento. Antes de mais nada, porém, será necessário
esbogar

1. O conteúdo das «profecías»


Sao Malaquias de Armagh (distinga-se bem do profeta
S. Malaquias, do Antigo Testamento) nasceu na Irlanda em
1095 aproximadamente. Fez-se monge em Bangor, tornan-
do-se depois arcebispo-primaz de Armagh. Veio a falecer
em 1148.

É a esse santo que se atribuí a famosa «Profecía dos


Papas», a qual terá sido escrita em 1139, quando Malaquias
passou um mes em Roma. Consta de 111 breves dísticos
latinos, que tentam caracterizar a figura de cada Pontífice
desde Celestino n (1143-1144) até Pedro II, que presenciará
o fim do mundo. Esse texto, embora seja atribuido a um
autor do séc. XII, só se tornou de conhecimento público em
1595, quando o beneditino Amoldo de Wyon o inseriu no seu
opúsculo «Lignum Vitae», publicado em Veneza naquele ano.

Os 111 disticos no «Lignum Vitae» sao acompanhados


de breve comentario do historiador espanhol Alonso Ciacco-
nio O.P. (f depois de 1601). O comentario aplica os dísticos
da Profecía aos 74 Papas que governaram desde Celestino II
(t 1144), um dos contemporáneos de S. Malaquias, até Ur
bano VII (t 1590); mostra como o conteúdo de cada oráculo
se cumpriu adequadamente na figura de cada Pontífice a que
é referido. O comentario de Ciacconio, indicando onde comega
a serie dos Papas considerados pelos dísticos, permite calcular
aproximadamente a época em que se deverá dar o fim do
Papado e a segunda vinda do Senhor; assim contam-se 38
Pontífices desde Urbano VII (t 1590) até o fim do mundo,
sendo que o Papa Joáo Paulo H, que vem a ser «De labore
solis» (Da fadiga do sol) ainda terá dois sucessores, o último
dos quais, Pedro II, verá, com a geragáo dos seus contem
poráneos, a consumagáo da historia.

_ 452 —
AS cPROFECIAS> DE S. MALAQUIAS

2. A autorídode éa «Profecía»

A Profecía de Malaquias, logo depois de divulgada em


1595, obteve sucesso considerável. É inegável que os disticos
interpretados por Ciacconio se aplicam bem aos Papas desde
Celestino n até Urbano VIL

Eis alguns exemplos mais característicos:

Avis Ostiensis (Ave de ostia) convém adequadamente a


Gregorio IX (1227-1241), que foi Cardeal-bispo de ostia e
tinha urna águia em seu brasáo;

De parvo homine (Do pequeño homem) corresponde a


Pió HI (t 1503), que se chamava Francisco Piccolomini
(Pequeño homem);

Jerusalem Campaniae (Jerusalém da Campanha) designa


bem Urbano IV (1261-1264), nascido em Troyes (Campanha)
e Patriarca de Jerusalém.

De Urbano VII (t 1590) em diante, Ciacconio nao inter-


pretou mais os oráculos. Muitos historiadores, porém, julgam
que continuam a quadrar bem com as figuras dos Pontífices
que se tém assentado sobre a cátedra de Pedro.

Assim, para tomar exemplos recentes, indicar-se-iam.

Crux de cruce (Cruz oriunda da cruz), distico que designa


Pió IX (1846-1878) com acertó, pois este Pontífice sofreu
duros golpes da parte da Casa de Savoia, em cuja emblema
figurava urna cruz;

ReHgio depopulata (Religiáo devastada) é o dístico bem


adaptado a Bento XV (1914-1922), que durante o seu ponti
ficado assistiu á primeira guerra mundial;

Fides intrépida (Fé intrépida) corresponde a Pío XI


(1922-1939), Pontífice das missóes e defensor da verdade
contra modernas teorías sociais e políticas;

Pastor et Nauta caracterizaría o Papa Joáo XXIH ex-Pa-


triarca de Veneza, cidade das góndolas, reconhecido por sua
ardente tempera de Pastor de almas...

— 453 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

Admitida a veracidade da Profecía na base das observa-


g5es ácima, julgam alguns autores que o fim do mundo nao
está longe (talvez venha por volta do ano 2000), pois só
deverá haver tres Papas até a segunda vinda de Cristo:

De labore solis (Da fadiga do sol) = Joáo Paulo II.

De gloria olivae (Da gloria da oliveira).

Para terminar, diz o texto (após o 111» dístico): «Du


rante a derradeira perseguicjLo, que a Santa Igreja Romana
sofrerá, será Pontífice Pedro Romano, que apascentará as
suas ovelhas em meio a muitas tribulacóes. Terminadas estas,
a cidade das sete colinas será destruida, e o Juiz terriveí
julgará seu povo».

Procurando interpretar os dísticos ácima, há quem queira


prever a historia dos tempos fináis nos seguintes termos:

As divisas Pastor Angelicus (Pió XII), Pastor et Nauta


(Joáo XXIII) e Flos Florum (Paulo VI) indicam um periodo
de grande paz e bonanca para a religiáo (seráo mesmo os
nossos tempos? Parecem táo diferentes de tal previsáo).
Santidade angélica deveria florescer no Pastor e ñas ovelhas
da Igreja; o Pastor, sendo navegante, gozaría de grande pres
tigio no mundo inteiro e empreenderia viagens intercontinen-
tais a fim de confirmar a pregacáo do Evangelho em toda
parte (note-se, porém, que. o grande viajante nao foi Joáo
XXEH, o Pastor et Nauta, mas, sim, Paulo VI). Os tres últi
mos disticos insinuam os acontecimentos que deveráo prece
der ¡mediatamente a manifestagáo do Anticristo; flagelos,
como urna calamitosa expansáo do islamismo (Lúa cres-
cente),1 penas e fadigas sobre os filhos da luz (Sol); além
disto, a almejada conversáo dos judeus a Cristo (a oliveira
simboliza o povo judaico em Rm 11,17-20). Depois disto,
sob o Papa Pedro II, Cristo aparecerá como Juiz Universal...

Que dizer dessas conjeturas?

Carecem de autoridade. Usando de toda a objetividade,


os bons críticos nao hesitam em rejeitar a autenticidade da
Profecía de Malaquias.

Quem primeiramente a impugnou apelando para argumen


tos aínda hoje plenamente válidos, foi o Pe. Ménestrier S. J.,

* Nada disso aconteceu sob Jofio Paulo I.

— 454 —
AS «PROFECÍAS» DE S. MALAQUIAS

no seu livro «Réfutation des Prophéties faussement attribuées


á S. Malachie sur les élections des Papes» (París 1689). Eis
as principáis razóes desde entáo aduzidas contra a genuini-
dade das Profecías:

1) Durante cerca de 450 anos, isto é, desde S. Mala-


quias (f 1148) até o opúsculo «Lignum Vitae» (1595), jamáis
autor algum fez alusáo aos oráculos de S. Malaquias; nem
os historiadores medievais e renascentistas, ao escrever a
Vida dos Papas, mencionam tal documento, que certamente
deveria ser citado, caso fosse conhecido. E por que motivo,
em que circunstancias, tena este caído em máos de Ciacconio,
seu comentador, após 450 anos de ocultamente? E como de
Ciacconio terá sido transmitido a Wyon, que o editou pela
primeira vez?

2) Ao argumento do silencio associa-se a verificagáo de


faltas históricas e teológicas na Profeda de Malaquias. De
fato, na lista dos Papas figuram antipapas (como Vítor W,
1159-1164; Nicolau V, 1328-1330; Clemente VH, 1378-1394),
efeito este que difícilmente se poderia atribuir a inspiragáo
divina. A fínalidade mesma da Profecía (insinuar a época
do fim do mundo) parece contrariar á intencáo de Cristo,
que em mais de urna ocasiáo se negou a revelar aos homens
a data do juizo final (cf. Me 13,32; At 1,7). Além disto, a
aplicagáo dos dísticos aos respectivos Papas baseia-se em
notas por vezes acidentais na figura dos, respectivos Pontí
fices, o que lhe dá um cunho de arbitrario; assim Nicolau V
(legitimo Papa de 1447 a 1455) traz o distico Da modlcitate
lunae (Da pequenez da Lúa) por ter nascido de familia mo
desta no lugar chamada Lunegiana; Pío n (1458-1464) é
assinalado «De capra et albergo (Da cabra e do albergue)
por haver sido secretario dos Cardeais Capmnica e Albergati!

Positivamente podem-se indicar as circunstancias que


deram ocasiáo á falsificagáo: observe-se, antes do mais, que
os dísticos dos Papas até 1590 aludem todos a tragos con
cretos e particulares de cada Pontífice: lugar e familia de
origem, cargos exércidos antes da eleigáo, figuras dos bra-
sóes, etc. — De 1590 em diante, porém, os oráculos apenas
referem qualidades moráis, cuja aplicagáo é assaz vaga,
podendo convir a mais de um Pontífice; assim «Vir Rsligio-
su3» (Varáo religioso), Ignis ardeos (Fogo ardente), lides

— 455 —
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1973

intrépida (Fé intrépida); qual Papa nao merecería esses qua-


liíicativos, caso nao fosse de todo indigno?

Observada esta diferenga, julgam alguns críticos que a


«Profecía de Sao Malaquias» foi forjada justamente nesse
ano de 1590, quando o falsificador já conhecia parte da his
toria dos Papas que ele havia de caracterizar, ficando-lhe
desconhecida a outra parte (a do futuro). O ensejo para se
inventar a «Profecía» terá sido o conclave de 15ao, apos a
morte de Urbano VII; o certame foi arduo, durando um mes
e dezenove dias. Entre os prelados mais em vista, achava-se
o Cardeal Simoncelli, cídadáo de Orvieto e antigo bispo dcsta
cidade; ora julga-se que os amigos de Simoncelli pretenderam
favorecer a eleigáo deste candidato, apresentando aos interés-
sados urna lista «profética» de Papas em que o sufragado
pelo Espirito Santo após o Pontífice Urbano VII era o Papa
De antiquitate urbis (Da antigüidade da cidade), isto é, o
Papa de Orvieto (= Urbs vetus = cidade antiga); em vista
disto, teráo forjado urna serie de dísticos papáis condizentes
com a realidade desde Celestino II (no século XII), mas assaz
arbitraria após Urbano VII. Essa lista, com a qual os mis
tificadores quiseram associar até mesmo o nome abalizado
de Sao Malaquias, nao logrou o desejado efeito, pois na ver-
dade quem saiu eleito do conclave foi o Cardeal Sfrondate,
arcebispo de Miláo, que tomou o nome de Gregorio XIV
... É esta urna das explicagóes mais correntes dos motivos
que teráo inspirado a pseudo-profecia de S. Malaquias!

Ménestrier, na obra referida, cita outro caso semelhante


ao de recurso á «autoridade divina» para decidir a eleigáo
de um Papa. Após a morte de Clemente K (1669), alguns
adeptos do candidato Cardeal Bona, lembrando-se do texto
de Eclo 15,1: «Quem teme a Deus, fará obras boas (bona)»
(Qui timet Deum, faciet bona), espalharam o seguinte tro-
cadilho:

«Gnammaticae leges plenimque Ecclesia snemit:

Easet Papa bonus si Bona Papa foret».


«As leis da gramática, geralmente a Igreja as despreza.
Haveria um bom Papa, se Bona Papa fosse».
Diante destas observacóes da crítica abalizada, vé-se que
váo seria evocar a «Profecía» de S. Malaquias, seja para
ilustrar a historia do Papado, seja para prever o decurso dos
futuros tempos ou mesmo a época da segunda vinda de Cristo.

— 456 —
Problema dos educadores:

educacáo sexual ñas escolas ?

Em sfntese: No Brasil dlscute-se a oportunidade de se Introduzlr ñas


escolas a educajSo sexual como disciplina Integrante dos currfculos. O
presente artigo mostra que a tarefa de educar sexualmente (e nfio apenas
ministrar nocdes anatómicas e fisiológicas) compete primeramente aos
genitores, cuja funcáo ó insubstltulvel. Toca outrosslm aos educadores, que
devem continuar a missáo dos país no Servico de OrlentacSo Educacional
de cada escola; todavía nfio há de ser ministrada em sala de aula, pois
nem todos os alunos que integram urna turma escolar experimentan* as
mesmas necessidades neste particular; os esclarecimentos útels a uns pode-
rlam suscitar problemas desnecessários e prematuros em outros. Vé-se,
pols, que a educacfio sexual deve ser oferecida de manelra gradatlva, levan-
do-se em conta a evolucSo fisiológica e psicológica do educando, ou seja,
em pleno respelto á personalldade de cada qual. — Acrescente-se que a
InstrucSo biológica é Inseparável da educagáo dos afetos ou do coracfio;
sem esta, pode produzlr clamorosas aberracóes na conduta dos educandos.

Comentario: Últimamente tem-se levantado com insis


tencia urna questáo relativa á educagáo sexual: deverá ser
ministrada na escola, em disciplinas que integrem o currículo
escolar? Na verdade, táo impregnado de motivos eróticos é
o ambiente no qual vivem as criangas e os adolescentes que
se pergunta se a escola nao deveria oficialmente assumir a
tarefa de iniciá-los na vida sexual... Seriam assim mais efi
cazmente preparados para exercer suas responsabilidades na
sociedade contemporánea. A proposta, porém, suscita obje-
Cóes... Eis por que abordaremos, a seguir, o assunto, estu-
dando: 1) o que é propriamente educagáo sexual, 2) a quem
e como compete ministrá-la.

1. Que é educajao sexual ?

1. Educagüo sexual distingue-se de instrucáo sexual.


Esta tem em mira esclarecer o discípulo a respeito da fisio
logía do sexo ou do aparelho genital e de seu funcionamento.
É exposicáo objetiva, de estilo científico e impessoal. Ora a
educacáo sexual acrescenta a essa instrugáo toda urna «filo
sofía» da vida sexual, da qual decorrem normas aptas a
orientar o uso do sexo e a formagáo de auténtica personali-

— 457 —
10 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 227/1978

dade; propóe o sentido da vida sexual, sua finalidade e seu


papel na existencia de um ser humano digno e nobre. Pro
cura assim suscitar bons hábitos na pessoa do educando.
Transcrevemos aqui as reflexóes de Joáo Mohana sobre o
assunto:

"A sexualldade é urna parte Importante. Mas n§o esquecer que é


sempre urna parte. Urna parte da vida afetlva global. Quem se esquece
de educar a afetlvldade (o corac.áo) dos jovens e pretende educar a sexua
lldade apenas, está preparando o terreno para as sementes do psiquiatra.
Os psicólogos mals credltados estSo de acordó em que a educacio sexual
deve ser entendida como uma parte da educas&o afetiva. Do contrario,
como lembrou Ignace Lepp, dá-se a entender ao jovem que o sexo é o
plvó da existencia" (Prepare seus fllhos para o futuro, p. 20).

Há cerca de cinqUenta anos, a educagáo sexual era algo


de mal visto por certos mestres católicos, que a julgavam
provocadora ou inconveniente. Nao seria lícito, pois, falar
de educagáo sexual. Esta atitude pode ter sido oportuna em
seu contexto histórico; em nao poneos ambientes evitava-se
falar. publicamente de sexo. Nos tempos atuais, visto que o
erotismo e a pornografía chamam a atengáo de todos os cida-
daos, desde a infancia, para a temática sexual, deve-se afir
mar a necessidade de sadia e bem orientada educagáo sexual
a ser ministrada desde que o educando mostré interesse pelo
assunto. Com efeito, é preciso que a crianga, ao despertar
para a realidade sexual, aprenda inmediatamente (e na me
dida em que disto seja capaz) a se comportar diante da
mesma, tomando consciéncia das responsabilidades que lhe
tocam diante da vida sexual.

2. Neste particular, dois extremos háo de ser evitados:

a) a teoría de Jean-Jacques Rousseau (t 1778), que


afirmava ser a natureza humana boa por si mesma; nao
necessitaria de educagáo nem morigeragáo, pois os próprios
instintos seriam propensos ao reto uso das fungóes sexuais.
Quem adota tais premissas, rejeita a educagáo sexual; é o
que ocorre, por exemplo, na escola de Summerhill, apresen-
tada por A. S. Neill no íivro «Liberdade sem medo» (Ibrasa,
Sao Paulo, 4» ed. 1967);

b) a teoría do quietismo, que admite, sim, a desordem


das concupiscencias instintivas do homem, mas julga que a
graga de Deus orienta cada individuo a fim de que encontré
o caminho da virtude, sem intervengo de pais ou mestres.
Tal quietismo justificaría, do seu modo, o absoluto silencio
dos educadores no tocante ao sexo.

— 458 —
EDUCACAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 11

Ora a genuína posigáo católica situa-se entre os dois


extremos. Assevera que a natureza humana é sede de im
pulsos instintivos e cegos; por conseguinte, necessita de edu-
cacáo,... educagáo que a graga de Deus favorece, sem dis
pensar, porém, a mediacáo de país e educadores, que Deus
quer chamar a colaborar consigo na formagáo dos homens.

A escola de Summerhill é utópica, e, conseqüentemente,


desastrosa... Na realidade, nao se pode dizer que a natu
reza humana seja por si mesma propensa tao somente ao
bem; todo ser humano vem ao mundo trazendo um potencial
de qualidades positivas, nao plenamente desabrochadas e
— mais aínda — mescladas de deficiencias ou más tendencias.
Esse potencial aínda nao maduro tem que amadurecer; pre
cisa também de ser burilado e podado. Para tanto, necessita
da acáo de pessoas aptas a levar ao pleno desabrochamento
as boas qualidades da crianga e do adolescente, ao mesmo
tempo que a ajudem a se desvencilhar das suas inclinagóes
deficientes. O egoísmo congénito será sempre o grande entrave
que dificultará ao ser humano a sua própria realizagáo ou
o encontró consigo mesmo; o egoísmo faz do individuo o
padráo da sua conduta, ao passo que é fora de si, no seu
Autor ou Criador, que o homem tem a verdadeira medida
do seu ser.

3. No tocante á vida sexual, o papel do educador


incluirá profundo respeito ao educando e á materia minis
trada. Trata-se de revelar o que se pode chamar «o miste
rio da vida», dando-se a esta expressáo o significado religioso
ou místico que ela comporta. Na verdade, o misterio da vida
é o plano providencial que faz das fungóes sexuais (com
todos os sentimentos que se lhes prendem) urna participacáo
no poder criador e vivificante do próprio Deus. O amor, com
todas as suas expressóes, deve entáo aparecer ao adoles
cente, como algo de belo, respeitável ou mesmo sagrado, posto
a servigo dos sabios designios do Criador.

Pergunta-se agora:

2. A quem compete educar?


O ponto nevrálgico da questáo em nossos dias consiste
em definir se a escola deve ou nao ministrar edücacáo sexual
em sala de aula.

A propósito, ocorrem as seguintes ponderagóes:

— 459 —
12 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

2.1. Os genitores

É aos genitores que toca, antes do mais, a tarefa de ofe-


recer aos filhos os inicios da educagáo sexual. Com cfeito;
esta faz parte do grande processo educacional que se inicia
no lar e desde o bergo. Mais do que ninguém os genitores
(a máe especialmente) estáo (ou devem estar) em contato
oom seus filhos; conhecem-lhes o temperamento próprio e
compreendem as suas manifestagóes, de modo a poder acudir-
-lhes oportunamente. Se os pais nao realizam essa tarefa
em casa, com o amor que lhes deve ser peculiar, fácilmente
os filhos váo pedir infórmaseos a estranhos (dentro ou fora
de casa) ou recebem de terceiros, talvez na rúa, noticias para
as quais nao estáo amadurecidos.

É preciso, pois, que os genitores vengam a timidez que


muitas vezes' os impede de exercer tal missao. Essa timidez
se deve, em grande parte, á inadequagáo pessoal que os mes-
mos experimentam para tanto. Em vista disto, os cursos de
preparagáo para o casamento devem tentar mostrar aos futu
ros nubentes a necessidade de se disporem para a tarefa que
lhes compete também no tocante á iniciagáo sexual dos filhos;
procurem eles próprios iniciar-se na pedagogía respectiva,
lendo algo a respeito e colhendo instrugóes de quem lhas
possa oferecer. Muito se recomenda a propósito o livro de
Joáo Mohana citado na bibliografía deste artigo.

O silencio dos genitores neste particular pode tornar-se


grave omissáo, dado que o assunto «sexo» está presente ás
criangas e aos adolescentes através da televisáo, das revistas
e dos jomáis, que sao realidades caseiras. A crianga tem o
direito de ser'iniciada de maneira sabia e digna no problema
do soxo e nos percalgos que este lhe pode oferecer; ora,
como a todo direito corresponde um dever, é aos genitores
que, em primeira linha, toca o dever de lhes ministrar os
inicios da educagáo sexual, desde que estes se fagam neces-
sários (note-se bem a cláusula:... desde que estes se fagam
necessários).

Vém ao caso as sabias ponderagóes de Joáo Mohana:


"Já que a sexualldade surge desde o amanhecer do homem, é preciso
que o menino nSo se slnta perplexo, tonto, dentro déla ou com ela dentro
de si. Esta é mais urna tarefa de papal e mam Se. Evitar que o Zeca se
perca ñas interrogados desse Impulso fantástico.

Nao contem com a escola. A escola completará a educacSo sexual


comecada pelos pais. A escola nSo deve fazer a IniciafSo. É tarefa delicada

— 460 —
EDUCACÁO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 13

demals, que requer paciencia, oportunldade, e lacos de confiante Intimi


dada entre as partes em questfio. Ninguém melhor que o pal e a mfie
nesta cátedra. Infelizmente multos país se sentem nela como réus no banco,
e por Isso n§o se sentam. Alguns alegam falta de esclareclmentos (o que
nSo é justiflcável no mundo atual).

A verdade é que mulios sSo portadores de frustracóes, de InsatisfacSes


neste terreno, nfio tém prazer em passear com os fllhos por reglfies onde
estarfio a pisar freqüenlemente em ferldas, cicatrizas, lembrancas amargas,
problemas latentes, latejantes. Outros nao carregam essa problemática, mas
estSo dentro das muralhas de preconceltos que satanlzaram o sexo, fogem
do assunto como da peste, ou entSo, ao contrario, por ter banldo de si um
mínimo de valores sensatos, cotnecam violando a planta frágil, pisando com
patas de cávalo no palacio de vidro.

Omitlr-re na educacáo sexual dos filhos é, em geral, o teste mals evi


dente da probtematlzacSo na nossa própria vida .sexual. NSo tenham dúvida"
(ob. clt., p. 18).

2.2. A escola

Á escola toca o papel de continuar a funcáo dos pais


(ou, se estes nao a preencheram:... a funcáo de iniciar a
educagáo sexual dos alunos). Todavía esta nao há de ser
ministrada em sala de aula, ou seja, de maneira coletiva,
pois na mesma turma de alunos pode haver (e geralmente
há) diversos graus de amadurecimento físico e psíquico e,
por conseguinte, diversas necessidades neste particular. Os
esclarecimentos úteis a certos estudantes podem tornar-se
nocivos a outros por serem inoportunos; despertaráo em
alguns educandos problemas ainda nao existentes e desneces-
sários. Por isto é para desejar que o Estado nao introduza
a educacáo sexual nos currículos oficiáis como disciplina a
ser ministrada em sala de aula; ao Governo compete res-
peitar a sensibilidade e o tino próprios dos genitores e dos
educadores que continuam a obra destes.

A educacáo sexual há de ser ministrada em caráter estri-


tamente pessoal, ou seja, levando-se em conta as caracterís
ticas próprias e inconfundíveis de cada educando, as quais
merecem ser respeitadas; cada adolescente tem sua persona-
lidade própria. Por isto é ao Servigo de Orientacáo Educacio
nal que na escola compete ministrar nogóes de educacáo
sexual, de acordó com as necessidades de cada aluno. Em
verdade, é de supor que em tal setor da escola trabalhem
profissionais capacitados nao somente por seu saber intelec
tual e sua habilidade didática, mas também por seu teor de
vida digna e modelar. Tais pessoas procuraráo manter con-

— 461 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

tato com os genitores ou os responsáveis dos educandos a


fim de poder desenvolver homogéneamente a tarefa que estes
devem ter iniciado em casa ou mesmo a fim de lhes minis
trar os subsidios de que necessitem para desempenhar-se de
tal missáo.

As observagóes ácima nao excluem que, quando algum


professor seja explícitamente interrogado por um discípulo a
respeito de assuntos sexuais, o mestre propicie os ensinamen-
tos solicitados dentro do quadro característico do aluno e em
termos pessoais.

O que em sala de aula pode e deve ser ministrado a


todos os alunos, sao principios de formacáo geral — base e
garantía da reta educacáo sexual. Por suas palavras (profe
ridas oportunamente) e, mais ainda, por seu teor de vida, o
professor de biología, de ciencias sociais, de expressáo oral
e escrita... deve ser um educador (e nao apenas um instru-
tor). A todo mestre, pelo fato mesmo de .ser mestre, toca
especial autoridade,... autoridade de que o professor deve
fazer uso para transmitir aos seus discípulos o testemunho
concreto e as grandes normas da magnanimidade, da fideli-
dade, da sinceridade, da veracidade, da coragem na luta em
prol da verdade e do bem..., e, se é cristáo, as grandes
linhas da cosmovisáo crista (cosmovisáo crista que pode e
deve iluminar qualquer tema dos currículos escolares). Ao
mestre compete interessar-se, na medida em que isto seja
oportuno, pela formacáo integral dos alunos, e nao apenas
pelo enriquecimento intelectual dos mesmos.

Restam ainda duas perguntas importantes:

3. Como... ? E quando... ?

A maneira como praticar a educagáo sexual, há de me


recer primeiramente a nossa atengáo.

3.1. Con»... ?

a) Antes do mais, é para desejar que país e educadores


tratem do tema com naturalidade e simplicidade. Evitem ati-
tudes misteriosas que poderiam insinuar tratar-se de assunto
pecaminoso ou indecente. O embarago e o constrangimento
por parte do educador poderiam despertar malicia e agucar
indevidamente a curiosidade do educando; sao aptos também

— 462 —
EDUCACAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 15

a provocar mórbidamente a imaginacáo do adolescente, ao


passo que a simplicidade dos mais velhos provoca a simplici-
dade dos educandos.

b) Requer-se outrossim que o educador nato minta nem


sonegue a verdade ao educando na medida em que este a
pede (como dito, porém, nao se deve propor tudo de urna
vez, mas graduar os ensinamentos, de acordó com as exi
gencias do pupilo). Qualquer mentira ou qualquer historieta
simplória cedo ou tarde provoca a perda da confianga do ado
lescente em relagáo aos educadores. Sabemos que,, no tocante
á origem dos bebés, há (ou havia) varias historietas em
curso: o nene teria sido encontrado no jardim, quando a ma-
máe fora colher rosas..., ou teria sido trazido pela parteira
em urna maleta... ou a cegonha teria introduzido a crian-
cinha em casa. Cada qual dessas mentirinhas exige. novas
mentiras para que nao seja imediatamente desmascarada
pelas enancas curiosas.

A perda de confianza nos pais e educadores por parte


de crianzas e adolescentes é desastrosa, pois o menino ou a
menina se sentirá impelido (a) a procurar em fontes nao
auténticas as explicagóes que poderia ter recebido dos genuí-
nos mestres. Compreende-se que estes nao proponham nogóes
demasiado científicas ou técnicas sobre a concepgáo e o nas-
cimento das criangas, mas requer-se que nao fiquem em com-
paragóes poéticas ou em termos vagos e abstratos.

c) A verdade nao excluí, mas antes exige, a discrlcSo


ou o discernimento ao falar. Os assuntos referentes á trans-
missáo da vida nao devem ser banalizados. O educador que
os aborde sem a justa medida, arrisca-se a falar demais e a
prejudicar, em vez de construir a personalidade do educando.
Por certo, nao é fácil dizer o necessário, utilizando palavras
claras (que nao deixem insatisfagáo) e, ao mesmo tempo,
breves (que nao váo além da dosagem oportuna). Todavía
o educador há de se exercitar nesta arte.

d) Como dito, a instrugáo sexual há de ser acompa-


nhada de educábate ou de principios de formagáo da persona
lidade. É preciso que o mestre ensine ao aluno o significado
da vida sexual, a sua indissolúvel ligacáo com o matrimonio,
a necessidade de subordiná-la á construgáo de um lar ou
de urna célula da S. Igreja. Chame a atengáo para as aber-
ragóes sexuais que hoje em día váo passando por normáis,
tais como as relagóes pré-matrimoniais, o homossexualismo

— 463 —
16 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS> 227/1978

e a masturbagáo; ajude o educando a nao se deixar arrastar


por correntes de pensamento e de conduta que desfigurem a
grandeza do ser humano. A propósito destes males, veja-se
a Instrugáo «Persona Humana> da S. Congregacáo para a
Doutrina da Fé, datada de 28/12/1975 e PR196/1976, pp. 139-
-150; 200/1976, pp. 337-348.

Apraz também lembrar as palavras de Pió XII, que,


embora proferidas em 1951, guarda.m sua plena atualidade:

"Há um terreno no qual a educacfio da opinláo pública, a sua retifi-


cacfio, se impSem com urgencia trágica...

Queremos falar aquí de escritos, llvros e artigos acerca da InlclacSo


sexual, os quals multas vezes obtém hoje enormes éxitos de livraria e
inundan) o mundo inteiro, Invadlndo a Infancia, submergindo a geracfio
que sobe para a vida, perturbando nolvos e Jovens casáis.

... Essa literatura... parece nfio levar em conta a experiencia geral


de ontem, hoje e sempre, a qual, fundada na natureza, atesta que, na
educacfio moral, nem a iniclacño nem a Instrugfio apresentam por si qual-
quer vantagem e que, pelo contrario, sfio gravemente malsfis o prejudiclals,
se nfio vfio fortemente unidas a urna constante disciplina, a vigoroso dominio
de si mesmo e sobretudo ao uso das torcas sobrenaturals da oracfio e
dos sacramentos" (Discurso aos Pais de familia franceses, proferido aos
16 de setembro de 1951; cf. REB XI [1951] pp. 965s).

"Referlmo-nos á inlciacáo sexual completa, que nada quer ocultar


nem deixar na escurldfio. Nfio há nlsso urna excesslva e perniciosa estima
do saber ? Existe também urna educacfio sexual eficaz, que com toda a
seguranca ensina na calma e objetlvldade o que o Jovem deve saber para
se guiar a si mesmo e tratar com o seu meio. De resto, há de se Insistir,
na educagfio sexual, como alias em toda a educacfio, sobre o dominio de
si mesmo e a formacfio religiosa" (Discurso aos Pslcoterapeutas, proferido
aos 13 de abril de 1953; cf. REB XIII [1953] p. 464).

3.2. Quando...?

Nao há um momento só na vida da crianza ou do ado


lescente em que se deva ministrar a educagáo sexual. Pois,
assim como o físico se vai desenvolvendo paulatinamente,
assim o espirito há de ser progressivamente esclarecido a res-
peito de suas potencialidades fisiológicas. É a própria natu
reza humana que pede certo resguardo da parte dos educa
dores, para que se possa desabrochar normalmente. A pre
matura apresentagáo de determinadas funches sexuais pode
despertar certos instintos em seres humanos que nao tenham
nem o corpo nem o espirito preparados para tanto. Observa
muito oportunamente o Pe. Alvaro Negromonte:

— 464 —
EDUCACAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 17

"6 verdade que o desenvolvlmento do espirito torga e antecipa o


desenvolvlmento físico. Porém, este ó infinitamente mals lento, e quebra
sempre o equilibrio necessárlo do desenvolvimento normal. E, 'mesmo que
o corpo segulsse o espirito no mesmo passo, serla aínda urna anteclpacfio
desnecessárla e nefasta, porque contraria á natureza. NSo é o espirito
que deve despertar o Instinto, mas este é que deve acordar aquele"
(A educacSo sexual. Rio de Janeiro, 3a. ed. 1942, p. 94).

É preciso, porém, que, desde que os genitores percebam


interesse ou curiosidade de seus filhos pelo que se refere ao
sexo, acompanhem mais atentamente as criangas a fim de
as orientar sobre'o assunto na medida da capacidade e da
necessidade das mesmas. Nao se pode, pois, fixar idade pre
cisa para iniciar tal tarefa. Esta terá comego logo que as
perguntas explícitas ou as atitudes dos filhos sugiram a
oportunidade de se lhes falar do sexo. As primeiras explica-
Cóes costumam influir poderosamente sobre a orientagáo de
vida do educando, pois nao raro transmitem impressóes inde-
léveis, que inclinam a enanca ou para o bem ou para o mal.

Nao temos em mira, neste artigo, descér aos pormenores


de como deva ser ministrada a eduoagáo sexual, pois isto
seria tema para outro estudo. Apenas interessa evidenciar,
no presente momento do Brasil, que a escola nao deve assu-
mir em suas salas de aula, e de maneira coletiva, a tarefa
que toca insubstituivelmente aos pais e ao Servigo de Orien-
tagáo Educacional de cada educandário.

Bibliografía: '
JoSo Mohana, Prepare seus filhos para o futuro. Porto Alegre 1972.

Pe. José Goncalves Fllho, Método de EducacSo Sexual dirigido a


Juventude. SSo Paulo 1976.

Marla-Cláudla Monchaux, A verdade sobre os bebes. Educacfio Sexual


dos 6 aos 12 anos. Sao Paulo 1976.

A. C. Andry e St. Schepp, De onde vdm os bebes. Rio de Janeiro 1968.

Gustl Gebhardt, Dos 5 aos 25 anos. Dinámica do sexo. SSo Paulo 1975.

Pe. Gláuclo vinfclo Colmbra, Casamento: O amor a servlco. Movl-


mento por um Mundo CristSo. Belo Horizonte 1977.

JoSo Batista Megale, Conversas de amor e sexo. Caxlas do Sui 1974.

A. Negromonte, A Educacfio Sexual. Rio de Janeiro 1942 (3a. ed.).

André Berge. L'éducatlon sexuelle chez PenfanL París 1965.

PR 2/1958, pp. S7-59 (educacfio sexual).


PR 97/1968, pp. 35-46 ("Llberdade sem medo").

— 465 —
Urna tese batista:

"a salvacáo do (rente é eterna"

Em sínteae: O presente artigo aborda a tese batista segundo a


qual "a salvacSo do crente é eterna". Tal predicado é entendido no sen
tido de "Inamlsslvel" — o que quer dlzer: quem ere realmente, pode
ter certeza de que obterá a salvacüo eterna, apesar das tontacóes e Infi
delidades passageiras. Na verdade, esta tese se deriva do concelto luterano
e calvinista de justlflcacfio. NSo leva em conta, porém, a llberdade de
arbitrio do homem; Deus, que nos crlou sem nos, nao nos salva sem nos,
diz S. Agostlnho. Note-se outrosslm que a S. Escritura incute vivamente a
necessldade de boas obras; cf. Rm 2,6-10; Tg 2,14.17.19. 21 s. 24. 26.
á claro que as boas obras asslm recomendadas nSo constituem urna fonte
de salvacfio Independente dos méritos de Cristo, pols sao produzldas com
o auxilio da grasa do Redentor, que nelas frutillca. Seria Imposslvel, porém,
nSo as levar em conta no processo da nossa |ustlflcacSo (cf. Mt 5-7).
Eis por que nfio se pode afirmar que a salvacSo do crente é Inamlssl-
vel deade que este creia realmente.

Comentario: As teses teológicas do protestantismo con-


tinuam a ser apregoadas entre nos, atingindo especialmente
as pessoas mais simples, que se deixam impressionar pela
eloqüéncia de quem as profere. Entre estas, merece atengáo
especial a sentenga segundo a qual a salvagáo do crente é
eterna... Isto vem confundindo os fiéis católicos a ponto
que da Amazonia a redagáo de PR recebeu o pedido de escla-
recimento da materia. É o que procuraremos oferecer ñas
páginas subseqüentes, comegando por expor a origem da
denominacáo batista.

1. Os Batistas : origem

As comunidades batistas nao se derivam nem de Sao


Joáo Batista nem de ¡mediatos discípulos do Precursor, pois
disto nao há, em absoluto, indicios documentados. Ao con
trario, claros testemunhos da historia apontam os inicios do
movimento batista no século XVI d.C.
Contemporáneamente a Lutero, um grupo de cristáos,
chefiados por Thomas Münzer, Balthasar Hübmaier, George
Baurock, Ludwig Hoetzer, julgava que o Reformador nao ia
suficientemente longe nos seus propósitos. Na Alemanha e

— 466 —
■ BATISTAS E SALVAgAO ETERNA 19

na Suíca comegaram entáo a apregoar urna Igreja, em grau


máximo, espiritual, destituida de hierarquia visível e consti
tuida exclusivamente pela adesáo consciente dos homens á
Palavra de Deus. O sinal característico dessa nova Igreja
seria o batismo a ser administrado aos adultos, nao ás crian-
gas, de sorte que os membros do grupo batizavam de novo
os fiéis que lhes aderiam (donde o nome de Anabatistas, Re-
batizadores, que lhes foi dado).

O movimento anabatista sofreu forte represalia por parte


de Lutero, Zvínglio e dos principes alemáes. Desencadeou
revoltas fanáticas, das quais a mais famosa é a dos campo-,
neses, cujo chefe, Thomas Münzer, foi decapitado em 1525.
Nao poucos anabatistas, fugindo á perseguigáo, comegaram
a propagar suas idéias na Italia, na Boémia, na Morávia, na
Alsácia, nos Países-Baixos, na Escandinávia, na Inglaterra,
subsistindo até hoje em pequeños grupos.

Mais importantes sao as ramificagóes que procederam do


tronco anabatista. Eis, alias, urna das características ou quase-
-constantes do movimento protestante: Lutero atribuiu a si o
direito de derrogar á Tradicáo para fazer prevalecer suas
intuicóes religiosas individuáis; em conseqüéncia, é imitado
periódicamente pon homens que se julgam iluminados á seme-
lhanga de Lutero, e entáo se separam do bloco luterano ou
da comunidade protestante a que pertencem, para dar ori-
gem a novo tipo de Cristianismo baseado no senso subjetivo
do fundador.

Conhecem-se hoje, como derivagóes do grupo anabatista,


as seitas dos Menonitas (de Meno Simons, f 1559), dos Ir-
máos Hutterianos (de llago Hutter), a Igreja dos Irmáos
nos Estados Unidos da América do Norte, a Igreja dos Ir
máos Evangélicos Unidos e a Igreja Batista, de todas a mais
numerosa.

Os Batistas tém por fundador o inglés John Smyth


(t 1617). Foi primeiramente pastor anglicano. Movido por
espirito reacionário, que agitava nao poucos crístáos de sua
patria, quería urna reforma ainda mais radical que a angli-
cana; em particular, nao se conformava com a organizagáo
hierárquica (episcopal) e a liturgia da Igreja anglicana, que
ele julgava supérflua. Por isto formou em Gainsborough urna
pequeña comunidade dissidente do Anglicanismo, no ano de
1604; foi, porém, obrigado a se exilar com os seus compa-
nheiros, indo ter a Amsterdam (Holanda), onde o calvinismo

— 467 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 227/1978

predominava. No degredo viveu em casa de um padeiro me-


nonita, que o persuadiu de que era inválido o batismo confe
rido as enancas (tese anabatista!). Smyth entáo adminis-
trou a si mesmo um segundo batismo, de cujo valor, porém,
comesou em breve a duvidar. Em conseqüéncia, seus com-
panheiros por ele convencidos da tese anabatista, o expulsa-
ram da comunidade; Smyth nao conseguiu ser admitido nem
mesmo entre os menonitas, aos quais pedirá acolhimento. Em
1612, um grupo de seus discípulos voltou á Inglaterra, e lá
fundou a primeira Igreja dita Batista (nao mais Anabatista),
também chamada «dos Batistas gerais», porque, contraria
mente 'á doutrina calvinista, ensinava que Cristo pela cruz
salvou todos os fiéis. Outro grupo se formou, pouco depois,
dito «dos Batistas regulares ou particulares»; com efeito, em
1641 outra pequeña comunidade de dissidentes do Anglica-
nismo em Londres se convenceu da tese anabatista; mandou
entáo um de seus membros, Ricardo Blount, a Rijnsburg na
Holanda, a fim de pedir o batismo de adulto á seita de Dom-
pelaers (cisáo menonita) e levar á Inglaterra o «verdadeiro
batismo». Blount desincumbiu-se da sua missáo; voltando em
1641, rebatizou por imersáo (única forma de batismo reco-
nhecida pela seita) 55 membros da comunidade de Londres;
aceitou do calvinismo holandés a doutrina de que Cristo salva
somente os predestinados; donde o nome de «Batistas parti
culares» que lhes coube.

Hoje em dia contam-se cerca de vinte seitas batistas,


que em 1905 se uniram de maneira um tanto vaga na «Liga
Mundial Batista»; sao, entre outros, os batistas calvinistas,
os b. congregacionalistas, os b. primitivos, os b. do livre
pensamento, os b. dos seis principios (porque aceitam como
único fundamento da fé e da vida crista os seis pontos men
cionados em Hb 6,ls: arrependimento, fé, batismo, imposi-
gáo das máos, ressurreigáo dos mortos, juízo eterno), os b.
tunkers, os b. campbellitas, os batizantes de si mesmos, os
b. abertos, os b. fechados, os b. do sétimo dia, etc.

Cada comunidade batista é independente de qualquer


autoridade visivel, seja eclesiástica, seja civil; rege-se direta-
mente «por Jesús Cristo e pelo Espirito Santo», que agem
na assembléia; nao há, pois, hierarquia nem jurisdigáo ecle
siástica. Todo o poder de governo reside na assembléia "dos
fiéis, que elege os que por ela respondem (pastores e diá
conos).

— 468 ~
BATISTAS E SALVACAO ETERNA 21

Em sua doutrina, os batistas seguem teses calvinistas:


Deus predestina diretamente nao só para a gloria, mas tam-
bém para a condenagáo eterna; a justifioagáo ou a graga é
obtida mediante a fé; nao apaga, mas recobre o pecado; os
sacramentos (Batismo e Ceia) nao sao meios comunicadores
da graga, servem apenas para corroborá-la em quem os recebe
com fé. Como em geral no Protestantismo, a Biblia é tida
como única fonte de doutrina.

Examinemos agora mais precisamente a tese segundo


a qual

2. «A salva;áo do trente é eterna»


Para os batistas, «a salvagáo do crente é eterna», o que
quer dizer: todo homem que firme e sinceramente confie em
Cristo, pode considerar-se filho de Deus, destinado infalivel-
mente a conseguir a bem-aventuranga eterna; nada absoluta
mente (nem tentagóes, nem infidelidades passageiras) lhe
poderá arrebatar o galardáo celeste; Deus, que é rico em
meios para auxiliar os seus fiéis, saberá sempre fazer preva
lecer a virtude e a causa do bem em tal homem. Donde se
segué que as obras (sejam virtuosas, sejam pecaminosas) nao
influem decisivamente sobre a salvagáo eterna; tudo depende
de crer, ou melhor, confiar em Cristo. Quanto aos que se
perdem no inferno, será preciso dizer que em verdade nunca
tiveram a graga de Deus, pois esta, urna vez possuida, leva
infalivelmente o seu possuidor a gloria celeste.

Os textos bíblicos sobre os quais se funda tal doutrina,


seriam aqueles em que Jesús ou os Apostólos afirmam terem
os fiéis recebido a vida eterna; cf. Jo 3,15.36; 5,24; 6,40.47.
Enquanto estas passagens gozam de alto aprego entre os
batistas, é menos comentado o sermáo de Jesús sobre a mon-
tanha (Mt 5-7), trecho em que o Senhor recomenda aos fiéis
urna conduta de vida aparentemente legalista, cumplidora
de obras.

Urna síntese da soteriologia batista se encontra no livri-


nho de William Taylor, «A salvagáo do crente é eterna», ao
qual havemos de nos referir mais de urna vez ñas conside-
ragóes subseqüentes.

3. Que dizer?
Em primeiro lugar, reconheca-se que «vida eterna», se
gundo as Escrituras, é realmente vida imortal ou sem fim

— 469 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 227/1978

(Taylor, no seu opúsculo, muito se empenha por demonstrar


filológica e etimológicamente que «o eterno quer dizer eterno
mesmo»; cf. p. 13). Nao resta dúvida, pois, de que a vida
que Deus dá ao homem em Cristo, de per si, carece de fim
(tem como qualidade inerente a si a imortalidade). Disto,
porém, seguir-se-á que vida eterna é também inamissível,
quando dada de presente a urna criatura?

Nao. A ilagáo nao seria lógica nem é recomendada pelas


Escrituras.

Nao seria lógica... Algo de eterno nao é necessaria-


mente algo que nao possa ser perdido pelo seu possuidor
(sem deixar de ser por si mesmo eterno). Posso possuir um
tesouro em si duradouro ou perene; se eu o guardar fiel
mente, ele será duradouro em meu proveito; se o negligenciar,
perdé-lo-ei, isto é, o tesouro continuará a ser perene, nao,
porém, em meu favor. O adjetivo eterno, portanto, designa
a índole do dom que Deus concede aos homens, quando se
considera este dom da parte de Deus e em si mesmo. Para
que este dom se torne permanente ou sem fim no cristáo,
nao se exclui (ao contrario, a Escritura a requer) a livre
colaboragáo deste, ou seja, a livre aceitagáo da graga e a
continua entrega do discípulo a esta, pois Deus, que nos fez
sem nos, nao nos salva sem nos, como diz S. Agostinho. O
Senhor, sem dúvida, é fiel as suas promessas e aos seus dons
(cf. Rm 8,31s; ICor 1,9); nao retira por iniciativa própria o
que Ele concedeu, mas também nao forga o homem nem a
aceitar nem a guardar o dom divino; justamente, se o Cria
dor fez o homem livre, fé-lo para que este, a diferenga das
criaturas inferiores, se encaminhasse para Deus usando do
seu livre arbitrio.

Entende-se, porém, por que os batistas identificam vida


eterna e vida inamissível. Nao reconhecem o valor do livre
arbitrio e da colaboragáo humana com a graga de Deus; e
nao o reconhecem por causa das premissas luteranas e calvi
nistas que eles abragam.

Em que consistem, pois, essas premissas luterano-calvi


nistas?

Lutero no sáculo XVI deu inicio ao movimento da Re


forma, afirmando, entre outras coisas, que o pecado original
destruiu o livre arbitrio no homem, de sorte que este é inca
paz de fazer o bem (praticar boas obras) de acordó com as

— 470 —
BATISTAS E SALVAgAO ETERNA 23

decisóes da sua vontade. Em compensagáo, Lutero ensinava


que seus discípulos podiam ter certeza da sua justificacáo (ou
de possuirem a amizade de Deus nesta vida) na medida em
que tivessem fé ou confianga inabalável em Cristo. Calvino
retomou estas idéias e as desenvolveu; ensinou que a fé ou
confianga no Redentor dá ao érente certeza infalivel nao só
da sua justificacáo momentánea (na vida presente), mas
também da sua salvacáo eterna (na vida futura); a vontade
humana nao entra em conta no processo de salvagáo eterna;
desta forma Calvino queria enfáticamente exaltar que Deus
é tudo, e o homem nada. A honra de Deus lhe parecía exi
gir tais afirmafióes. Notemos que os mesmos principios leva-
ram Calvino a dizer também que existe urna predestinacáo
que é absoluta da parte de Deus: desde toda a eternidade, o
Todo-Poderoso decretou que tais e tais individuos se salvaráo
no céu, ao passo que tais e tais outros se perderáo no inferno;
esse decreto de predestinacáo é de todo inalterável; o homem
nada pode fazer contra ele, de modo que o predestinado para
a gloria recebe a graca de Deus e, aínda que peque, nao fica
no pecado; o predestinado para o inferno nunca recebe a
graca de Deus e, aínda que pratique atos bons, nao deixa
de ser viciado ou mau. Estas idéias repercutiram, sem dúvida,
na formagáo do Credo batista.
Nos seus inicios (séc. XVII) os batistas se dividiam em
«Batistas gerais» (professando que Cristo por sua cruz salvou
todos os crentes) e «Batistas particulares» (professando que
salvou apenas os predestinados). No decorrer do séc. XVII,
na Inglaterra foram prevalecendo os Batistas particulares,
enquanto declinavam os Batistas gerais. No séc. XVIII,
quando as comunidades batistas corriam o perigo de certo
entorpecimento espiritual, foram provocadas a novo fervor
por John Wesley (t 1791), fundador do Metodismo, que pro-
pugnava urna espiritualidade mais metódica. Os batistas, por
seu turno, comegaram entáo um movimento de evangelizagáo
popular, tendo como um dos seus pioneiros no inicio do séc.
XIX William Carey Taylor; este fundou a «Sociedade dos
Batistas particulares para a propagagáo do Evangelho entre
os pagaos» e partiu para as indias. Foi este movimento que
deu as características próprias á vida batista na Inglaterra
e nos Estados Unidos.

4. A doutrina bíblica
Pergunta-se: nao se poderia fundamentar na Escritura a
identificagáo de vida eterna e vida inamissível?

— 471 —
24 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

Nao. É bem evidente que a Escritura acautela os fiéis


contra o perigo de, por sua própria culpa, perderem a grac.a
de Deus e, conseqüentemente, a vida eterna. É, por exemplo,
o que S. Paulo inculca aos Filipenses: «Assim como sempre
obedecestes..., assim também operai a vossa salvagáo com
temor e tremor> (2,12). O mesmo Apostólo diz que procura
tornar-se conforme á morte de Cristo, «para ver se de alguma
maneira posso chegar á ressurreigáo dos mortos. Nao que
já a tenha alcangado ou que seja perfeito, mas prossigo para
abragar aquilo para o que" fui também preso por Cristo Jesús.
Irmáos, quanto a mim, nao julgo que haja alcanzado; mas
urna coisa fago, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás
ficam, e avangando para as que estáo diante de mim, pros-
sigo para o alvo, pelo premio da soberana vocagáo de Deus
em Cristo Jesús» (3,10-14; tradugáo de Ferreira de Almeida).
Aos corintios o Apostólo afirma exercer a mesma solici-
tude para conseguir a salvagáo:
"Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar
alguns. E fago ísto por causa do Evangelho, para ser também participante
dele. NSo sabéis vos que os que correm no estadio, todos na verdade cor-
rem, mas um so leva o premio ? Corral de tal maneira que o alcancéis. E
todo aquele que luta, de tudo se abstétn; eles o fazem para alcancar urna
coroa corruptível; nos, porém, urna Incorruptlvel. Pols eu asstm corro, nfio
como a coisa Incerta; assim combato, nSo como batendo no ar. Antes
sub|ugo o meu corpo, e o reduzo á servldüo, para que, pregando aos outros,
eu mesmo nSo venha de alguma maneira a ficar reprovado" (1Cor 9, 22-27).

W. C. Taylor, analisando esta passagem táo significativa,


julga que o Apostólo nao se refere á consecugáo da salvagáo
eterna, mas apenas á obtencáo de um galardáo independente
da salvagáo; Paulo tcria tido a certeza de ser salvo, nao,
porém, a de conseguir urna coroa de vitória no céu (como
os atletas podem hesitar a respeito de sua vitória ou da aqui-
sigáo de urna coroa no estadio). Ora esta distingáo do comen
tador inglés é totalmente estranha á Biblia; vida eterna e
galardáo (ou coroa) da vida eterna se identificam plenamente
na Escritura Sagrada; o dom que Deus dá definitivamente ao
homem no céu, é um só, é simplesmente a vida eterna; nao
há vida eterna com galardáo (ou com coroa) nem vida eterna
sem galardáo (ou sem coroa):
"Bem-aventurado o varfio que sofre a tentacfio, porque, quando for
provado, recebará a coroa da vida, a qual o Senhor prometeu aos que
O amam" (Tg 1,12).

"Quando aparecer o Sumo Pastor, alcanzareis a Incorruptlvel coroa


de gloria" (1Pd 5,4).

— 472 —
BATISTAS E SALVACAO ETERNA 23

"Só fiel até a morte, e eu te darel a coroa da vida... Guarda o qua


tens para que nlnguém tome a tua coroa", diz o Senhor no Apocallpse
(210311)

Alias, toda a epistola de Sao Tiago (que Lutero rejei-


tava, mas que Calvino e os protestantes modernos reconhe-
cem como canónica) inculca fortemente a necessidade de
obras boas para que o cristáo nao venha a perder a vida
eterna:

"Meus Irmaos, que aprovelta se alguém dlsser que tem (é, e nfio
tlver as obras ? Porventura a fé pode salvá-lo?... A fé, se nSo tlver as
obras, é morta em si mesma... Tu crés que sá um so Deua; fazos bem.
Tambóm os demonios o créem e estremecem. Porventura o nosso pal Abrafio
nao fol justificado pelas obras, quando oferecla sobre o altar o seu fllho
Isaque? Bem vés que a fé coopera com as suas obras e que pelas obras a fé
fol aperfelcoada... Vés entSo que o homem é Justificado pelas obras, e nfio
somonte pela fó... Porque, assim como o corpo sem o espirito está morto,
asslm também a fé sem obras é morta" (Tg 2,14. 17. 19. 21 s. 24. 26).

Se, de outro lado, Sao Paulo tanto acentúa o valor da fé


(principalmente em Rm e Gl), parecendo excluir o das obras,
isto se deve ao fatq de que Sao Paulo tem em vista o inicio
da justificagáo; combatendo a mentalidade legalista de certos
judeus, quer afirmar nao haver méritos previos do homem
que lhe possam merecer o dom da fé sobrenatural; esta é
concedida por Deus de modo totalmente gratuito, sem que
em absoluto o homem a possa atrair a titulo de justica ou
em recompensa; é, sim, crendo dócilmente na Palavra de
Deus com ánimo contrito que o pecador comega a ser amigo
de Deus e recebe o germen da graga santificante ou da vida
eterna; depois desta primeira conversáo e justificagáo é que
poderá, com o auxilio de Deus, realizar obras meritorias.
— Sao Tiago nao contradiz a Sao Paulo porque visa a ques-
táo diferente: considera nao o ingresso no estado, de graca,
mas a conservagáo desta última; assegura entáo que finpos-
sivel é perseverar na amizade de Deus únicamente mediante a
fé; as obras boas se tornam imprescindíveis para que alguém
nao se torne como os demonios, os quais acreditam, sim, mas,
nao obstante, estáo condenados por nao terem as obras da
caridade.

Quem considera as perspectivas próprias de Sao Paulo e


de Sao Tiago, nao dará valor absoluto a afirmagóes de .um
ou de outro separadas do seu contexto, e saberá estimar a
necessidade das boas obras para que alguém nao se perca.
Merece atengáo o fato de que a S. Escritura exige categóri
camente as obras boas de todo e qualquer cristáo, sem dis-

— 473 —
26 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

tinguir entre predestinados e nao predestinados; nao fala de


homens que, aparentemente apenas, se perderáo pelas suas
más obras, e homens que realmente se perderáo pelas suas
más obras. É Sao Paulo quem assim escreve:
"Deus recompensará cada um segundo as suas obras, a saber: a
vida eterna aos que, com perseverarla em fazer o bem, procuram gloria
e honra e Incorrupcfio; mas a indlgnacfio e a Ira aos que sao contenciosos
e desobedientes a verdade e obedientes a Inlqüldade; trlbulacfio e angustia
sobre toda alma do homem que obra o mal, primeramente do Judeu, e
também do grego; gloria, porém, e honra e paz a qualquer que obra o
bem, primeramente ao judeu, e também ao grego" (Rm 2,6-10; traducfio
de Ferrelra de Almeida).

Vé-se nesta passagem como Sao Paulo mesmo associa


estritamente a sorte eterna á prática de obras.

Contudo está claro que as boas obras do justo nao cons-


tituem urna fonte de salvagáo independente dos méritos de
Cristo; sao produzidas com o auxilio da graga do Redentor,
que nelas frutifica. Seria impossível, porém, nao as levar em
conta no processo da nossa justificagáo; haja vista o relevo
enorme que Cristo lhes deu no seu sermáo sobre a montanha,
que, segundo Sao Mateus, proferido logo no limiar da vida
pública de Jesús, constituí a Magna Carta do Reino de Deus.
Nenhum comentador de autoridade, cristáo ou nao cristáo,
ousaria afirmar que «o sermáo do monte em geral só ensina
indiretamente o Evangelho... a própria linguagem do Evan-
gelho está ausente de Mateus 5 a 7» (cf. Taylor, ob. cit,
p. 79). Ao contrario, os estudiosos e os homens de Deus sem-
pre reconheceram no sermáo sobré a montanha urna das
expressóes mais típicas da mensagem de Jesús ao mundo.

Por último, será preciso reconhecer (fazendo eco á S. Es


critura e aos nossos irmáos batistas) que a graga santificante
possuída nesta vida é realmente o germen ou a sementé da
gloria celeste; nao há solugáo de continuidade entre o dom
de Deus que os justos trazem nesta peregrinagáo terrestre, e
o dom que renova a alma e o corpo dos santos no céu; a
diferenga é apenas a que intercede entre a sementé e a planta
plenamente desenvolvida. Neste sentido pode-se e deve-se
dizer que eterno é o dom de Deus; isto, porém, nao significa
que o homem nao o possa recusar livremente no decorrer
desta vida, mesmo depois de o haver aceito. Nao levar em
conta a liberdade da criatura seria indigno de Deus, que jus
tamente quer ser louvado nao apenas por autómatos, mas
por seres a quem Ele deu urna livre vontade como expressáo
de maior perfeigáo ontológica.

— 474 —
A Grande Questáo:

a alma humana é imortal?

Em síntese < A imortalldade natural da alma humana se evidencia,


no plano filosófico, a partir de tres argumentos principáis:

— a alma humana, sendo espirito, é simples ou nSo composta ; por


consegulnte, nfio se decompSe ou nfio se dissolve por sua próprla natureza.
Deus, que a crlou, poderla anlquilá-la, mas nfio o faz, pote Isto contradiría
á sabedorla e á justlca do Criador;

— a alma humana aspira naturalmente á vida, e á vida sem flm;


ora tal desejo Inato nfio pode ser frustrado, pois, se o fosse, a natureza
serla absurda e suporla o absurdo em sua origem. Todavía nfio se pode
crer que o ser humano seja o único absurdo em molo a um mundo chelo
de ordem e harmonía naturals;

— a alma humana aspira naturalmente á justa sancfio ou á retrlbuicfio


devida ao bem e ao mal. Já que esta só ocorre precariamente na vida
presente, deve haver outra vida na qual a justlca seja exercida. Em caso
contrario, a historia serla absurda, terminando com o espezlnhamento (ao
menos, parcial) do bem e da virtude e a exaltacáo (ao menos, parcial) do mal.

Verdade ó que o composto humano (corpo e alma) aspira á vida


imortal. Todavía o composto humano é, por sua natureza, pereclvel, de
modo que o seu desejo de Imortalldade é veleidade, Incapaz de encontrar
a sua resposta natural. A fé enslna que o Senhor Deus ressuscitará o ser
humano depois da experiencia da decomposlgáo ou da morte, sendo Cristo
o penhor e o exemplar da ressurreica'o de todos os homens.

Comentario: Sabe-se que a morte nao póe fim, por com


pleto, á pessoa humana, pois os feitos desta continuam pre
sentes aos pósteros; principalmente aquelas pessoas que con-
tribuem mais eficazmente para a construgáo ou a destruigáo
da humanidade, permanecem, de certo modo, atuando junto
as geracóes posteriores. É este o tipo de imortalidade que,
por exemplo, o marxismo propóe ao ser humano a partir de
suas premissas materialistas; a escola de Marx tenta recon
fortar seus discípulos dizendo-lhes que a grandeza imortal do
homem consiste em ser o carváo lancado na grande locomo-

— 475 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS 227/1978

tiva da historia da humanidade; destrua-se, contanto que faga


avangar o comboio, em cuja marcha cada um se imortaliza.

Outras correntes de pensamento admitem a sobrevivencia


da alma humana; sustentam, porém, a tese de que esta perde
a sua individualidade e se integra num grande todo que leva
urna vida impessoal. é o que professa o hinduísmo em geral.

Há, porém, quem afirme que a alma humana é por si


mesma imortal, de tal modo que, quando o corpo já nao lhe
oferece condigóes de exercer suas atividades psicossomáticas,
a alma se separa do mesmo e subsiste em sua realidade indi
vidual e pessoal, excrcendo os atos próprios da sua vida espi
ritual. É esta a tese clássica ñas escolas de filosofía cristas.
Últimamente, porém, alguns pensadores católicos, negando a
distingáo real de corpo e alma, asseveram que a morte extin
gue por completo o ser humano, mas Deus o ressuscita ime-
diatamente após a morte!

Esta última tese nao se sustenta desde que se admita,


como se deve admitir, a distingáo real de corpo e alma. No
artigo anterior ficou comprovado que a alma humana é espi
ritual e o corpo material; a recusa desta afirmativa implica,
ao menos implícitamente, profissáo de materialismo.

Ñas páginas subseqüentes, apresentaremos os argumen


tos em favor da imortalidade natural da alma humana, que
é um ser distinto do respectivo corpo.

1. A natureza mesma da alma humana

A morte é a dissolugáo do ser vivo.

Um ser pode dissolver-se de duas maneiras: por si mesmo


ou em razáo de outrem. No primeiro caso, dissolve-se direta-
mente; no segundo caso, a dissolugáo ocorre em virtude da
dependencia em que tal ser se encontra em relagáo a outro
que se dissolve.

Ora a alma humana nao pode dissolver-se' por si, por


que nao é composta de partes, mas é simples, como todo
espirito é simples ou isento de composigáo. A quantidade e a

— 476 —
ALMA HUMANA & IMORTAL 29

extensáo sao propriedades dos corpos; um espirito nao consta


de partes justapostas.

A alma humana nao pode dissolver-se em razáo de sua


dependencia de outrem, ou, no caso, do corpo, porque ela
nao depende do corpo para existir; sendo espirito, é direta-
mente criada por Deus e pode subsistir sem o corpo, embora
exista para se unir á materia e constituir com esta um todo
substancial que é o composto humano.

Objeta-se, porém: dado que a alma humana nao existe


necessária, mas contingentemente, nao poderia ela deixar de
existir ou ser aniquilada? Em outras palavras: Deus, que
criou a alma humana, tirando-a do nada, nao a poderia redu-
zir ao nada? Neste caso, a alma humana nao se decomporia
nem se dissolveria, mas simplesmente perdería a existencia.

Eis a resposta adequada: Deus, que criou, pode certa-


mente aniquilar qualquer criatura, pois seu ato criador é
livre; Ele nao é obrigado a conservar na existencia qualquer
criatura que seja. Se, porém, consideramos a Onipoténcia
Divina nao como atributo de Deus isolado, mas era relacáo
aos outros atributos divinos, verificamos que a aniquilacáo de
urna alma humana contrariarla á sabedoria e á justica de
Deus. Com efeito, sería urna especie de contradicho, pois
Deus retiraría o ser de urna criatura depois de lhe ter dado
urna natureza ¡mortal; além disto, a aniquilacáo seria algo
de injusto, pois tornaría impossivel a aplicagáo das sancóes
merecidas pelo ser humano nesta vida.

Note-se, alias, que esta última é a única razáo que Kant


(t 1804) aceita para afirmar a imortalidade da alma. A
sobrevivencia da pessoa humana, diz este filósofo, é urna exi
gencia da consciéncia moral, pois é evidente que a justica
nao reina neste mundo: a virtude nao costuma ser devida-
mente recompensada, nem o vicio adequadamente punido.
Antes, o contrario ocorre com freqüéncia: o justo é perse
guido, enquanto os maus prosperam. Ulteriores ponderagóes
sobre este assunto seguir-se-áo sob o subtitulo 2 deste artigo.

Conclui-se, pois, que a alma humana é naturalmente


imortal e nao deixa de usufruir desta sua prerrogativa, pois
Deus nao subtrai as criaturas o que lhes outorgou como atri
butos próprios.

— 477 —
30 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

2. O desejo natural

Todo ser tendo a se conservar e a perseverar na exis


tencia. Nos seres que usufruem de conhecimento, esse desejo
é condicionado pelo conhecimento. O animal irracional conhece
apenas a existencia presente e nao déseja outra realidade;
nao teme a morte porque nao a conhece. O homem, porém,
conhece o ser de modo absoluto, abstraindo do tempo. Deseja,
em conseqüéncia, existir sem tempo ou, positivamente, con
forme toda a duragáo possível do tempo — o que é existir
sem limites de duragáo.

Ora o desejo natural de urna vida sem fim se deriva da


própria natureza do homem; nao é algo de convencional ou
dependente de alguma forma de cultura. Tal desejo nao pode
ser frustrado ou váo; se o fosse, a natureza humana seria
contraditória e absurda. Mais: ela suporia o Absurdo na sua
origem, pois teria sido feita para a vida e a vida sem fim,
mas nao teria a capacidade de usufruir da imortalidade. Por
conseguirte, a alma humana há de ser imortal, a fim de
poder fruir da plenitude de vida á qual ela naturalmente
aspira.

Dir-se-á, porém: se tal argumento é válido para a alma,


há de ser válido também para o corpo, ou melhor, para o
homem todo (composto de corpo e alma). Com efeito, o ser
humano como tal deseja viver sempre e tem espontáneo hor
ror á morte.

Em resposta, consideremos o seguinte:

O desejo de imortalidade do homem (ou do composto


de corpo e alma), embora seja natural, nao é senáo urna
veleidade ou urna aspiracáo ineficaz, pois o composto humano
tende naturalmente a desgastar-se; os órgáos corpóreos se
váo extenuando e tornando ineptos para a vida; no momento
em que estáo totalmente deteriorados, a vida nesse orga
nismo se torna impossível e a alma humana se separa do
mesmo.

Ao contrario, o desejo de imortalidade da alma humana


pode ser eficaz, visto que a alma, nao sendo composta, nao
se dissolve; além do mais, tem condicóes de sobreviver sepa
rada do corpo.

— 478 —
ALMA HUMANA É IMORTAL 31

Há, pois, urna diferenga entre o desejo natural de imor-


talidade do composto humano e o desejo natural de imorta-
lidade da alma humana. Em conseqüéncia, diz a filosofía, o
primeiro nao tem conseqüéncias práticas, ao passo que o
segundo as tem.

Estas afirmagóes háo de ser completadas pelos dados da


fé. Esta ensina que o Senhor Deus, atendendo gratuitamente
ao desejo natural de imortalidade do composto humano, ins-
tituiu a ressurreicáo física dos mortos. Jesús Cristo, Deus
feito homem, tendo assumido a carne humana, quis padecer
a morte do homem, a fim de vencé-la e ressuscitar como
primicias de urna nova humanidade (cf. ICor 15,20). A res-
surreigáo de Cristo é o penhor da ressurreicáo de todos os
homens, a qual ocorrerá na consumagáo dos tempos, quando
o Senhor vier em sua gloria para dizer a última palavra da
historia.

Assim a fé ensina que o composto humano terá duragáo


sem fim, pois, embora morra, o Senhor Deus lhe quer dar a
vitória sobre a morte e conceder a plenitude da vida.

3. A sangao da ¡ust¡;a

O ser humano foi feito para a justiga, a qual aspira com


toda a veeméncia. Contudo a justiga na vida presente é
precaria. Freqüentemente as pessoas retas e dignas sao ma
terialmente prejudicadas por praticarem o bem, ao passo que
os criminosos e iniquos sao materialmente beneficiados pela
perversáo; a justiga humana e o curso da historia nao raro
«premiam» os maus e «castigam» os bons.

Ora, se a alma humana nao fosse apta a sobreviver após


a existencia presente a fim de receber a sancáo de seus atos,
a justiga ficaria definitivamente violada e conculcada no caso
de muitos homens. A historia da humanidade terminaría
com o triunfo (ao menos, parcial) da injustiga e da desordem
sobre a justiga e o bem. A prática da virtude nao seria reco-
nhecida como tal, mas, antes, colocada em plano de des-
prezo e rejeigáo. Ora tais conseqüéncias suporiam um mundo
absurdo, e, na origem deste mundo, um principio de contra-
digáo e absurdo, conseqüéncias estas que nao condizem com

— 479 —
32 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS* 227/1973

a ordem e a harmonía que se verificam em geral no universo.


Daí afirmar-se que a alma humana é, por si, imortal e, por
conseguinte, apta a receber na vida postuma a justa sangáo,
que muitas vezes na vida presente lhe é negada.

Se nada houvesse que correspondesse as aspiragóes ina-


tas á vida, á justiga, á verdade, ao amor... que todo homem
traz naturalmente em si, teriam plena razáo os que, mediante
entorpecentes e psiootrópicos, procuram «paraísos artificiáis»,
ou aqueles que póem fim a si mesmos no suicidio. Diz sabia
mente Gabriel Marcel:

"Se a morte é a realidade última, todo valor se aniquila no escándalo


puro; a realidade está como que ferida em seu coracao".

O que acaba de ser dito, pode ser ilustrado pela veri-


ficagáo de certos fenómenos ocorrentes na natureza. Esta
parece excluir a frustracáo e o absurdo; com efeito,

se tenho olhos, é porque existe a luz para a qual o olho é feito;


se tenho ouvidos, é porque existem sons e melodías;
se tenho pulmóes, existe o ar que lhes corresponde;
se tenho fome e sede, existem os alimentos de que preciso;
se a mulher tem o senso da maternidade e aspira a ser máe,
existe para ela a maternidade ou o poder tornar-se máe.

Mais aínda:

se as aguas do mar sobem por ocasiáo das mares, tornan-


do-se agitadas e inquietas, sei que essa agitagáo nao é casual,
mas se deve ao atrativo sobre elas exercido pela Lúa;

se a agulha magnética se agita dentro da bússola, posso


estar certo de que existe um polo Norte (invisível, sim, mas
muito real) que a atrai e só permite repouse quando devida-
mente voltada para o seu Norte.

Assim análogamente, se verifico em mim (anteriormente


a qualquer reflexáo filosófica ou religiosa) a sede de certos
valores ou mesmo do Infinito, posso estar certo de que tais
valores e o Bem Infinito existem no Além, em correspon
dencia a tais aspiragóes.

Simone de Beauvoir, imbuida de existencialismo, escre-


veu muito acertadamente:

— 480 —
ALMA HUMANA B IMORTAL 33

"Uma vida, para que seja Interessante, deve assemelhar-se a uma


ascensfio: galga-se um patamar e, depois, outro...; cada patamar nSo
existe senfio em vista do patamar segulnte... Se essa subida, chegando
ao auge, retrocede, ela se toma absurda desde o seu ponto de partida"
("Le sang des autres").

Aprofundando um pouco mais estas reflexóes, observa


mos: o universo se apresenta marcado por nota de profunda
harmonía; é o que declaram os estudiosos de qualquer dos
reinos naturais: mineral, vegetal e animal (irracional). Eins-
tein experimentava admiragáo extática ao considerar a drdem
do infinitamente grande. Alias, as ciencias naturais nao se-
riam possíveis se o universo e a natureza nao fossem inteli-
gíveis ou nao fossem o produto de uma Inteligencia Suprema
que concebeu cada uma das criaturas (grandes e pequeñas)
e seu maravilhoso interrelacionamento. Pergunta-se, pois:
somente o homem e sua existencia sobre a térra seriam algo
de absurdo ou destituido de explioacáo e razáo de ser?

Vé-se que o absurdo consistiría, antes, em se admitir


que somente o ser humano seja marcado pela nota do absurdo
no conjunto das criaturas; parece desarrazoado que, colocado
no todo harmonioso do universo, o homem, e somente o ho
mem, nao se beneficie da ordem que se exprime no conjunto
e em cada um dos seus outros setores.

Em conclusáo: certas interrogacóes e aspiragóes espon


táneas em todo homem exigem resposta. Ora, já que tal res-
posta nao é dada na vida presente por alguma das finitas
criaturas que nos cercam, há uma vida postuma, em que
encontramos, sem disputa nem contestacáo, a resposta aos
mais genuinos anseios do ser humano (resposta que é indis-
sociável da fruicáo do Bem Infinito ou do Criador).

A propósito:

R. Verneaux, "Filosofía do homem". Llvraria Ouas Cldades, Sao


Paulo 1969.

"Unwandelbares Im Wandel der Zelt", herausgegebon von Hans Pfell.


Band II, pp. 15-72. Aschaffenburg 1977.

PR 117/1969, pp. 372-385 (Deus existe ?);

PR 118/1969, pp. 411-416 (Absuido ou Misterio?).

— 481 —
Filosofía e Historia:

urna delimitado para a filosofía


da historia

Apresentamos, a seguir, o erudito estudo do Prof. Arno Wehllng,1


a quem a redacfio de PR exprime a sua gratldSo.
O articulista mostra como o historiador necessariamente é levado
por 8uas próprlas pesquisas a praticar urna filosofía ou urna reflexáo
aprofundada sobre o misterio do humanismo. Tal reflexfio se Impfie
principalmente quando as leis naturals, soclals, jurídicas, económicas se
revelam imprecisas e Ineffcazes para explicar o curso da historia; é
entfio que o historiador, felto filósofo, se torna mals consciente de que
nem tudo se elucida por (atores puramente naturals, mas se requer a
afirmac&o do Transcendental, ao qual está vinculado o misterio do homem
que age na historia.
• • *

Eis o .texto do Prof. Arno Wehling:

1. O problema
O crescimento do campo teórico da Historia — como,
de resto, das demais ciencias sociais — fez com que se
desenvolvesse toda urna teoría e toda urna metodología da
Historia. Problemas epistemológicos e metodológicos, até há
pouco relegados a segundo plano ou simplesmente nao exis
tentes, passaram a ser objeto de interesse por parte do
historiador.

Tal ordem de preocupacóes explica-se, por um lado, pelo


crescimento do conhecimento histórico, tanto em termos hor¡-
zontais (novos temas ou redescobertas de temas antigos,
como a pré-história, os povos nao europeus) como em ter
mos verticais (os novos ritmos temporais, com o estudo das
longas duragóes ou estruturas, das medias duragóes ou con
junturas e das curtas duragóes ou acontecimentos). Por
outro lado, explica-se pelo impacto das transformagoes epis
temológicas — especialmente aquelas acarretadas pela Física

1Bacharel e Licenciado pela Unlversldade do Brasil. Doutor em


Historia pela Universidade de SSo Paulo. Professor da Unlversidade Fe
deral do Rio de Janeiro, da Unlversidade Gama Filho e da Universidade
Santa Úrsula. Memoro do Instituto Histórico e Geográfico Brasilelro.

— 482 —
FILOSOFÍA E HISTORIA 35

einsteiniana —, promovendo o romplmento com as concep-


góes deterministas da Física newtoniana e suas representa»
góes ortodoxas do século XIX: o positivismo, o marxismo, o
evolucionismo.

Desta forma, surgiu o problema, erudito e académico,


da delimitacáo entre os dois campos recentemente abertos
ou ampliados — o da epistemología e o da metodología da
Historia — e o campo mais antígo da filosofía da Historia.

Onde estáo as fronteiras?

2. A epistemología histórica
A epistemología histórica estuda a natureza do processo
histórico. Como lembra Blanché, ela é urna das abordagens
epistemológicas possíveis, á qual se acrescentam a epistemo
logía direta ou intemporal, de caráter físico-matemático, e
a epistemología genética, de fundo biológico.1
Questóes como a dos ritmos temporais, a da construgáo
do conhecimento histórico, a do instrumental de análise do
processo histórico, a da explanagáo histórica, sao problemas
de natureza epistemológica na Historia.
Inseparável déla é a problemática metodológica, pois de
um posicionamento epistemológico fluí o criterio seletor dos
métodos aplicados ao estudo do passado. Problemas de perio-
dizagáo, de selecto e análise documental, de interdisciplina-
ridade na investigagáo, constituem por sua vez o fulcro de
urna metodología da Historia.3
A epistemología e a metodología da Historia constituem,
atualmente, o arcabougo teórico do conhecimento histórico.
Sao, efetivamente, os elementos que lhe dáo a necessária
cientificidade: nenhum historiador — ao contrario do que
ocorria há poucas geragóes — pode dispensá-los e simples-
mente mergulhar de forma desordenada no empirismo da
pesquisa.
Tal estado de espirito reflete a descoberta de urna «Nova
Historia», urna Historia em que há nao um, mas varios
níveis de acontecimento num mesmo momento histórico. Ou,
como situou em texto já clássico Braudel:

»R. Blanché, féplstémologle, París, PUF, 1972, p. 39-41.


a A. Wehllng, Os níveis da obJellvWade histórica, Rio de Janeiro,
APHA, 1975, p. 20.

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36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

"A prlmelra... urna Historia quase Imóvel, a do homem ñas suas


relacfies com o meló que o cerca;

Abaixo desta Historia Imóvet, urna Historia lentamente ritmada,


... a dos grupos e grupamentos.

Terceira... enflm, a Historia tradicional... do individuo, a Historia


de acontecimentos" 3.

3. A filosofía da historia
Como situar, face a tais revolugóes do pensamento his
tórico, o status e o papel da Filosofía da Historia?
A Filosofía da Historia é, antes de tudo, como colocou
Morente, urna necessidade espiritual do homem. Nao é urna
teorizagáo da «praxis» histórica; neste sentido as filosofías
materialistas da Historia sao epistemologías e metodologías
da Historia, já que buscam esclarecer os processos cognitivos
de abordagem do passado, e nao urna meditagáo especula
tiva sobre o destino do Homem.
Necessidade espiritual que se acentúa, segundo Morente,
ñas épocas de crise e que se diluí em momentos de transfor-
magóes mais lentas:
"O orgulho do homem chega ás vezes — sobretudo em épocas
de próspera regularidade — ao extremo de esquecer que a suprema
direcáo do transcurso histórico pertence a Deus, e acredita que a vida
dos homens —' tanto a Individual como a coletlva — pode estar intel-
ramente determinada pelas averiguacdes científicas que obtém o exer-
cíclo metódico da razSo. Mas um dia, de repente, no horizonte sereno,
aparecem densas nuvens de tormenta. Estala o confuto, sobrevém a
crise. A vida... se faz angustiosamente problemática. As leis das cien
cias sociais, moráis, jurídicas, económicas, essas lels naturais de que
táo ufano se sentía o homem, revelam-se Imprecisas, ineficazes, falsas".4

Com efeito, se pensarmos ñas meditagóes de Santo Agos-


tinho, em plena crise do século V, no Maquiavel das lutas
renascentistas, em Vico ás voltas com a inquietagáo ilumi-
nista, num Hegel pós-napoleónico, em Marx contemporáneo
das origens do industrialismo, em Spengler e Toynbee mar
cados pelas guerras mundiais, e no próprio Morente ao escre-
ver essas suas «Idéias para urna filosofía da Historia da
Espanha» após a guerra civil e durante a mundial, nao há
como deixar de reconhecer que o trágico estimula a medita-

» F. Braudel, La Mediterráneo et le monde méditerranéen á l'.époque


de PMlippe II, Paris, A. Colín, 1949, p. Xlll-XIV.
*M. Q. Morente, Idea de la hispanidad, Madrid, Espasa Calpe, 1961,
p. 131-132.

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FILOSOFÍA E HISTORIA , 37

gao filosófica sobre o destino temporal do homem, a Histo


ria. É nestes momentos, quando as explicagóes sociais, eco
nómicas, políticas parecem ao homem casuísticas, menores,
que se impóe a grande reflexáo filosófica. Ela surge, para
tras dos pequeños acontecimentos críticos, na poesía de Dante
e de Goethe, ou na prociamagáo de Spengler:

"Haverá quem enxergue além das horas presentes, além do seu


continente e do seu país, quem alongue a vista para lá do circulo estrello
de suas próprlas ativídades ?" *.

Além da necessidade espiritual, a filosofía da Historia


traz a marca da especulagáo filosófica. Ela nao é — episte
mológica ou gnoseologicamente falando — urna atividade his
tórica, coordenada por elementos e categorías nascidos da
investigagáo (pesquisa pura, metodología ou teoría). Ela uti
liza padróes, criterios e normas de origem filosófica, que se
aplicam, mutatis mutandis, as demais adjetivagóes de que se
vale a meditagáo filosófica: a filosofía da natureza, a filosofía
da ciencia, a filosofía da matemática, etc.

Finalmente, a filosofía da Historia utiliza o conheci-


mento histórico, de preferencia naquilo que possua de «aca
bado», «estáveb ou «imutável». A informagáo histórica em
qualquer de seus niveis serve de referencial — daí a neces
sidade do consenso historiografía) e da objetividade da infor
magáo — á especulagáo filosófica. O arquetipo construido
pelo filósofo da Historia é um modelo ao qual os referen-
ciais históricos dáo a organicidade conceitual e a viabilidade
teórica.
É evidente, portante, que a «dúvida», a «tema em aberto»,
a questáo pouco documentada, a inferencia, nao podem ter
abrigo senáo incidental e provisoriamente numa auténtica
filosofía da Historia, sob pena de a mudanga posterior do
referencial comprometer a solidez do edificio teórico.

A Filosofía da Historia é urna meditagáo sobre o homem


no tempo, vale dizer, na Historia. Nao é, nem se propóe,
urna meditagáo sobre o processo histórico em si, pois que o
perpassa e ultrapassa:
"Um olhar para a Historia da humanldade nos conduz ao misterio
do nosso humanismo" °.

6 0, Spengler, Jahre der EntscheMung, Munique, Deutscher Verlag,


1961, p 21
6K, Jaspers, The orlgin and goal ol Histoiy, New Haven, Yale,
1968, p. XIII.

— 485 —
Á XII ASSEMBLÉIA GERAL DA FEDERADO
INTERNACIONAL DAS UNIVERSIDADES CATÓLICAS
De 21 a 24 de agosto pp. teve lugar em Porto Alegre
(«Campus> da Pontificia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul) a XII Assembléia Geral da Federagáo Internacional
das Universidades Católicas (FIUC). Este organismo con
grega cerca de 160 das 600 Universidades Católicas do mundo
inteiro, procurando promover entre as mesmas o conheci-
mento mutuo e o intercambio de valores. Em Porto Alegre
estavam representadas 98 Universidades ou Associacóes Uni
versitarias Católicas provenientes de um total de trinta na-
Qóes. Além do que, se assinalavam o representante do Dire-
tor Geral da UNESCO, o do Conselho Internacional do En-
sino Católico, o de «All India Association for Christian Higher
Education», o da Associacáo Internacional das Universidades
e outros varios, que contribuiam para abrilhantar os debates
da assembléia.

O tema dos estudos empreendidos tinha por título «A


Universidade Católica, caminho de pluralismo cultural a ser-
vico da Igreja e da humanidades. Com outras palavras: a
XII Assembléia da FIUC procurou aprofundar o papel da
Universidade Católica numa sociedade em que as correntes
de cultura sao cada vez mais variegadas; estas, alias, se
defrontam mesmo dentro da própria Universidade Católica.
Tal tema foi previamente estudado a nivel regional (nacio
nal, continental), de tal modo que cinco relatónos fóram
apresentados á Assembléia: o da Europa, o da América do
Norte, o da América Latina, o da India e o da Asia Sul-Este
(Filipinas, Indonesia e, por extensáo, Coréia e Japáo)...
Esses relatónos espelhavam bem as características culturáis
das respectivas regióes e os embates que provocam ñas insti-
tuicóes de ensino superior católico: nao raro convergiam
entre si, afirmando que á Universidade Católica toca a mis-
sáo de evangelizar a cultura e promover o diálogo entre a
fé e a ciencia; tal tarefa, como se compreende, há de assu-
mir notas próprias em cada regiáo ou mesmo em cada país.
Nao foi possivel, nos debates, descer a pormenores muito con
cretos nem deduzir dai resolugóes de ordem precisa, visto que
os membros da assembléia provinham dos mais diversos pon
tos do globo e, por isto, viviam realidades muito diferentes
urnas das outras. Todavía urna das metas mais consideradas
nos grupos de estudos foi a constituigáo de assembléias seto-

— 486 —
XII ASSEMBLÉIA GERAL DA FIUC 39

riáis, ñas quais as Universidades Católicas poderáo discutir


entre si a solucáo de problemas comuns. Como acontece em
todas as assembléias internacionais, a troca pessoal de idéias
é experiencias entre os participantes foi um dos grandes valo
res que enriqueceram a todos. Mais de urna vez foi posta em
relevo a importancia do ensino católico como fator de evan-
gelizacáo; a presenca numerosa e significativa de Reiteres,
Vice-Reitores, Decanos da India, das Filipinas, do Japáo, da
Coréia, da Indonesia... dava testemunho lúcido do valor da
agáo missionária empreendida em séculos passados naqueles
países; a Asia, embora seja um continente preponderante-
mente nao cristáo, conta hoje com importante representacáo
da Igreja nos diversos níveis escolares de algumas de suas
grandes nacóes. Este fato estimula os educadores católicos
a que prossigam a sua tarefa, certos de que os frutos da
Escola Católica nem sempre sao perceptíveis de imediato,
mas nao raro permanecem invisíveis ou só posteriormente se
tornam patentes.

Á guisa de conclusáo, apraz-nos citar aqui as palavras


com que o Presidente da FIUC, Pe. Hervé Carrier, ex-Reitor
da Universidade Gregoriana de Roma, encerrava em Porto
Alegre as suas reflexóes sobre a funcáo da Universidade
Católica em nossos dias:

«Urna nova cultura crista chegará a tomar vulto em nossos tem-


pos ? Qualquer que seja a resposta teórica ao problema de saber-
mos se pode haver urna cultura crista, todos podemos alimentar a
conviccáo de que nos:a fé no Evangelho, forca sempre criadora,
saberá estimular os homens atuais em sua busca da verdade e da
¡ustíca, da fraternidade e de um sentido da vida, que exige urna
justificativa cabal. Em sva longo historia, será que alguma vez as
Universidades Católicas tiveram responsabilidade rao pesada, táo
estimuladora? Somos um fermento modesto, talvez desprezível, se
considerarmos a pobreza de nossos instrumentos; todavía a causa
do Evangelho, a qual nos queremos servir, torna Ilimitadas as nossas
esperancas, fundadas sobre a verdade. Henrí Marrou, o grande his
toriador do Cristianismo, o afirmava na Sorbonne com audacia sur-
preendente — quase paulina — quando falava da 'todo-poderosa
minoría decidida'. A verdade, e nao nossos fracos recursos, legitima
a nossa desmedida esperanca, recordava Marrou, e acrescentava :
'Também nos, crlstaos, embora indignos e pouco numerosos, podemos
e devemos assümir a responsabilidade do mundo e a orientacáo da
historia. Só nos podemos dar-lhe um sentido solido ! Aqui repetiré!

— 487 —
40 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 227/1978

os dizeres misterioso! que um apologista deseonhecido, no sáculo II,


proferia perante o mundo pagao : 'Numa palavra, o que a alma é
no corpo, os crístSos o sao no mundo' (epístola a Diogneto). Pala-
vras fortes demais? Muito rudes talvez, para quem fale a linguagem
do pluralismo? Por certo, sim, se quisermos entender tais dizeres
como expressoes da cobica do poder ou de urna ideologia de domi
nio terrestre. A mesma afirmacao, porém, terá sentido totalmente
diverso, se a entendermos como expressáo das finalidades supremas
do Evangelho e do absoluto da nossa esperanca.. .

A Universidade Católica alimenta um tipo de esperanca única


em meio as culturas atuais e, se através do diálogo pluralista está
atenta a todas as vozes dos homens, ela Ihes recordó todas as
palavras do Evangelho».

Em síntese, o Pe. Carrier, interpretando auténticamente


a situagáo das Universidades Católicas no mundo contempo
ráneo, julga que Ihes toca incomensurável esperanza, porque
propóem aos homens a mensagem da Verdade, a qual goza
de extraordinario poder persuasivo. Exercendo tal missáo,
faráo jus as palavras que um autor anónimo proferia no
século II: «O que a alma é no corpo, os cristáos o sao nc
mundo».

Sabemos que a Verdade tem seu fulgor próprio, apto a


arrebatar todo homem sincero, pois toda criatura racional
foi feita para a Verdade e para o Bem. É precisamente o
brilho da Verdade que explica tenha o Cristianismo obtido a
vitória sobre o Imperio Romano perseguidor nos tres primei-
ros séculos; sem armas nem dinheiro, a mensagem da ver
dade do Evangelho prevaleceu sobre o poderío armado dos
Césares, porque o atrativo da Verdade é mais forte do que
tudo; a Verdade é a grande resposta a que todo homem reto
aspira. É a certeza disto que fundamenta a esperanga de
quem trabalha ñas Universidades Católicas.

A próxima assembléia geral da FIUC terá lugar em


agosto/setembro de 1980, na sede da Universidade de Lou-
vain-la-Neuve.
Estévao Bettencourt O.S.B.

— 488 —
livros em estante
Hlpóteses sobre Jesús, por Vittorlo Messori. Tradugáo de Jorge Soa-
res. — Ed. Paulinas, SSo Paulo 1978, 132 x 200 mm, 364 pp.

Els a obra de um Jornallsta que resolveu abordar as questfies funda


mentáis da mensagem crista: Deus existe ? Jesús Cristo exlstlu ? Foi
mero homem ? Fol um deus da mitología ? é Deus e homem ? Qual o
ámago da mensagem crista ? Em que se diferencia de outras mensagens
religiosas, como a do Islamismo e a do budismo ? A estas e outras per-
guntas o autor responde com raciocinios e ponderacfies acesslvels ao
grande público, mostrando que realmente a mensagem crista é a de Deus
feito homem para revelar aos homens o que a razfio jamáis terla atingido.
Com outras palavras: V. Messori chega á conclusfio de que a mais plau-
slvel das hlpóteses sobre Jesús é a que a fó propóe. A razfio aconselha
a apostar em favor da historicidade dos Evangelhos. Assim o livro se apre-
senta como valioso compendio de apologética católica, útil aos cristáos
que desejem fundamentar melhor a sua fé, e também aos nSo cristáos que
estejam dlspostos a investigar sinceramente a veracidade da mensagem
católica. NSo sem fundamento já conhece tal llvro dezolto edicSes e olto
traducdes para llnguas estrangeiras (o original é italiano). Vem preencher
Importante lacuna em nossa bibliografía teológica brasileira.

Deus é comunhSo. O concello moderno de pessoa e a teología trl»


nltárla, por Cirilo Folch Gomes O. S. B. — Roma 1978, 170 x 242 mm,
191 pp.

Registramos a publlcacao deste volume, que é parte de urna tese


de láurea elaborada pelo conhecido professor de Teología D. Cirilo, que,
após brllhantes estudos em Roma, voltou recentemente ao Brasil. Trata-se
de trabalho de alta erudlcSo, no qual o autor procura aprofundar o con-
celto de pessoa aplicado á SS. Trindade; a dlssertacáo significa notável
marco no desenvolvimiento da teología trinitaria. Congratulamo-nos com
o autor.

Cegó e sem mfios, por Jacques Lebratón. TraducSo do Pe. Mauricio


Ruffier. ColecSo "Testemunhos de hoje" - 4. — Ed. Paulinas, Sao Paulo
1978, 140 x 210 mm, 247 pp.

Jacques Lebreton nasceu em Brest (Franca) no ano de 1922. Por oca*


sifio da segunda guerra mundial, allstou-se em Londres no exérclto francés
da resistencia ao nacional-socialismo. Enviado para a Libia, após a batalha
de ElMAIameln, urna granada explodiu-ihe ñas mfios; perdeu entSo as mSos
e os olhos. A principio revoltou-se contra a nova sltuacSo, mas, após ardua
luta Interior, resolveu conformar-se e mesmo tornar-se útil aos seus Irmáos.
Casou-se e tornou-se pai de familia. Como tivesse um irmáo que era padre-
-operario, resolveu Ir morar num barraco dos suburbios de París a flm de
comparlllhar a sorte dos humildes. Passou-se, porém, para o comunismo...
Finalmente o contato com sacerdotes e as boas leituras o reconduziram a
Igreja Católica; velo a ser fervoroso discípulo de Cristo.

Tal é a narracao feita pelo próprio Lebreton nesse llvro, que vem a
ser a sua quase autobiografía. Admiram-se, através dessas páginas, a fir
meza de caráter do autor e a acfio da Providencia Divina, que amparou
Jacques Lebreton de modo a fazer dele, mutilado e cegó, um dos grandes
heróis da humanidade. Els um dos trechos fináis do livro:

— 489 —
42 «PERGUNTE K RESPONDEREMOS» 227/1978

"Senhor, eu experimente) a dor atroz de perder Juntamente as


e os olhos, mas esta nada era e eu preferirla revívenla mil vezes, de prefe
rencia a outra: a de perder-te novamente I

Quanto me sentía envergonhado, enquanto camlnhava rumo á tua casal


Outrora eu vivera debalxo do leu teto. Cedendo a urna Incompreensrvel
demencia, eu atralcoara o teu afeto e o abandonara para procurar alhures
a felicldade com que me cumulavas. Sédenlo de amor, ndo podías aceitar
que o meu te fosse oferecldo á torca e, nao sem tristeza, sabendo bem
demals o que eu la colher, delxaste-me partir.

Oh I Pal, quantas decepc&es, quantas amarguras I

E agora, esfaimado pela falta de ternura, eu regressava. Nao havla


que temer o teu Julgamento, a tua cólera, o teu castigo ? Teda sido pura
]usllca; tudo Isso, eu merecía" (p. 246).

O llvro será substancioso alimento para o espirito de quantos sofrem


físicamente e julgam a vida carente de sentido. O testemunho de Lebreton
mostra que pode haver enorme riqueza interior e verdadelra felicidade
mesmo no contexto das deficiencias ffsicas. Estas nao sao desejávels a
quem quer que seja, mas, desde que ocorram, podem vlr a ser ocasiáo de
extraordinario cresclmento Interior.

Cartas de um condenado, por A. M. Lemonnler. Apresentacáo de


Michel Quolst. Traducfio de María Helena Kosinskl de Cavalcanti. Colecto
"Perspectivas" — 7. — Ed. Paulinas, SSo Paulo 1978, 110 x 180 mm,
146 pp.

Jacques Fesch, após duplo crlme, passou tres anos e olto meses
na prlsSo da Santo em París, á espera de julgamento e condenacSo. De
ateu que era, tornou-se crlstio no cárcere e morreu santamente, pela gul-
thotlna, a 1"?/10/1957. O Itinerario espiritual desse homem ó narrado ao
vivo pelo próprlo J. Fesch em cartas dirigidas a familiares e amigos. Tais
depolmentos sfio Interessantísslmos, pols vém a ser o espelho de um drama
Interior, que val sendo aos poucos Iluminado e-suavizado pela entrada de
Cristo e a vida de fé. Trata-se de experiencias multo pessoals e profundas,
que se assemelham á do bom ladrfio do Evangelho (cf. Le 23, 40-43).

A. M. Lemonnler compilou e, com as devldas licencas, publlcou tais


cartas, Ilustrando-as com dados biográficos que ajudam o leltor a com-
preender melhor o perfil psicológico e religioso do condenado. — Este
livro vem a ser, a seu modo, precioso. Servirá para aclarar o sofrlmento
de pessoas que, culpadas ou nao, se sentem desanimadas e prestes a
desesperar. Será útil também, de modo geral, a todos os homens, pols
n8o há quem, por um motivo ou por outro, nSo conheca o sofrlmento e
nSo precise de encontrar o sentido da dor.

Eis como Jacques descreve o seu primeiro encontró com Deus:

"Pouco a pouco ful obrlgado a rever meue conceltos, nSo tinha mals
certeza da inexistencia de Deus, eslava Meando receptivo, sem no entanto
ter fé. Tentava crer por meló da razio, sem rezar ou quase nada rezando.
E depols, no flm de um ano de pilsáo, me velo urna dor afellva multo
forte, da qual sofrl multo, brutalmente, e em poucas horas Uve a fé, orna
certeza absoluta. Acredite! e nSo compreendla mals como tinha sido possl*
vel delxar de crer. A graca me vlsilou, urna grande alegila me Invadiu e,

_ 490 —
PREZADO ASSINANTE,

NAO HA QUEM IGNORE OS ELEVADOS ÍNDICES DE

INFLACAO MONETARIA POR QUE PASSA O BRASIL, JA HA

ANOS... APESAR DISTO, A NOSSA REVISTA TEM PRO

CURADO, DE CERTO MODO, IGNORAR TAO VIOLENTA

SUBIDA DO CUSTO DE VIDA, ELEVANDO MUITO MÓDICA


MENTE O PREOO DE SUA ASSINATURA ANUAL ASSIM

PROCEDEMOS PORQUE NAO TEMOS OBJETIVOS COMER

CIÁIS. EIS, FORÉM, QUE NESTE MOMENTO JA NAO NOS

É LICITO FECHAR OS OLHOS A REALIDADE, POIS ISTO

SERIA MORTAL PARA O NOSSO PR. TIVEMOS, POIS, QUE


FAZER UM ORCAMENTO MINUCIOSO PARA 1979... EM

CONSEQOÉNCIA, EVIDENCIOU-SE QUE, SE PR NAO QUER

SAIR DE CIRCULACAO NO PRÓXIMO ANO, DEVE COBRAR


CR$ 180,00 (CENTO E OITENTA CRUZEIROS) POR ASSINA

TURA ANUAL.

É O QUE LHE COMUNICAMOS, CERTOS DE SUA CAPA-


CIDADE DE COMPREENSAO. CONTAMOS, POIS, COM A
COLABORACAO DE V.S. E OUSAMOS AÍNDA PEDIR-LHE
QUEIRA DIFUNDIR PR, OBTENDO-NOS NOVOS ASSINANTES.

V.S. PODERA UTILIZAR O VERSO DESTA FOLHA.

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DIRECAO E REDACAO DE PR
AMIGO, SE ESTA REVISTA LHE É OTIL, AJUDE-NOS A DIFUN-
DI-LA PARA QUE OUTROS SE POSSAM DÉLA BENEFICIAR. SABEMOS
QUE MUITOS PROBLEMAS SAO TAIS ÚNICAMENTE POR FALTA DE
RETO EQUACIONAMENTO DOS RESPECTIVOS DADOS.

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sobretudo, urna grande paz. Em poucos Instantes tudo ficou claro. Fol urna
alegría sensivel multo forte, talvez agora tenha a tendencia de querer sen-
tl-la aínda, quando o essenclal nSo é a emocáo, mas a fe" (p. 31).
Louvado o Senhor, que, como diz S. Agostlnho, "nunca permitirla o
mal se dos males nao soubesse tirar bens aínda malores" !
O sangue pela Justlca. Pe. Joao Bosco Ponido Burnler SJ., por Pe.
José Coelho de Souza S. J. — Ed. Loyola, SSo Paulo 1978, 140 x 208 mm,
251 pp.

Aos 12/10/76, morrla em Ribelrfio Bonito (MT) o Pe. JoSo Bosco


Penido Burnier S. J., vltima da violencia de um soldado, que o feriu porque
tentou defender mulheres pobres e Inermes torturadas pela policía. Este
duro fato despertou vivo interesse tanto no Brasil como no estrangeiro.
Em conseqüéncla, o Pe. José Coelho de Souza, da mesma Companhia de
Jesús, houve por bem coletar documentos, depoimentos e outros dadcs
com os quals redlgiu a primelra biografía desse heról. Nascldo em 1917,
JoSo Bosco entrou na Companhia em 1937, vlndo a ocupar al diversos
cargos importantes: foi Secretarlo do Pe. Asslstente para a América Latina
em Roma, Vlce-Provlncial, Pe. Mestre. Finalmente resolveu deixar os estu-
dos e a vida urbana para Ir dedicar-se aos Indios de Mato Grosso, pas-
sando os dez últimos anos de sua vida como mlsslonárlo na prelazla de
Diamantino. .A tarefa era ardua por causa do clima de tensóes entre fazen-
delros, peoes e posseiros, que disputavam as térras até mesmo dentro das
reservas dos selvagens. O Pe. Joáo Bosco sustentou heroicamente a mlssSo,
animado como era por ardente espirito de oracSo e por notável austerldade
de vida, que o levava a renunciar freqOentemente a si em favor dos Interesses
do próximo.

Parabens ao Pe. Coelho por haver compilado estes prlmelros dados


biográficos, que nos permitem compreender melhor a acfio da graca em
um mártir contemporáneo I

Vida depols da vida, por Dr. Raymond A. Moody Jr. — Circulo do


Llvro, SSo Paulo, sem data, 120 x 175 mm, 172 pp.

Já em PR 216/1977, pp. 501-506, comentamos o artigo de "Selecfles


do Reader's Dlgest" que condensava o conteúdo do llvro ácima registrado.
Esta obra foi publicada em portugués e dlfunde-se entre os assoclados do
Circulo do Llvro e seus amigos. Reproduz os depoimentos de pessoas que
tocaram as ralas da morte, mas foram reatlvadas por médicos o puderam
narrar o que assim julgaram experimentar. Desejamos frisar mals urna vez
que se trata de testemunhos fantaslstas, que supoem os principios do
espiritismo kardeclsta: o espirito vaguearla fora do corpo e assistlria do
alto ás tentativas de reatlvacáo efetuadas por clínicos e especialistas; o
além é descrito á semelhanca da realidade terrestre, com jardlns, tunéis,
barrelras, párenles e amigos, etc. Nao haveria dlferenca de sancfio para
bons e maus; um espirito de luz acolherla os desencarnados...!

As questOes atinentes á morte e ao além sao das que mais despertam


a curlosidade de todo ser humano. Em conseqüéncla, muitos escritores e
poetas tentaram Imaginar o que sejam, apoiando-se naturalmente na figura
das realidades terrestres; os conceltos de viagem, migracáo, retorno, reen
contró... sao freqüentes em tal tipo de literatura. Entende-se, pols, que
certas pessoas, convidadas a descrever sua pretensa experiencia do além,
o tenham feito mediante tais artificios da fantasía e da literatura. Sao dema
siado antropomórflcos e puerls para poder merecer crédito. Em linguagem
crista, dlr-se-la com o (Apostólo Sao Paulo: "O que o olho nao viu, o que
o ouvldo nSo ouviu, o que o coracáo do homem jamáis percebeu, els o
que Deus preparou para aqueles que O amam" (1Cor 2,9). O crlstáo sabe
que, após a morte, encontrará sem véus nem sombras Aquele que é a
Beleza infinita e cuja presenca ele já desfruta na penumbra de cada dia.
Tal experiencia é inefável ou indizfvel I
E. B.
FID ELID ADE

«A FIDELIDADE COMPREENDE A OBSERVANCIA DAS NORMAS

LITÚRGICAS PROMULGADAS PELAS AUTORIDADES ECLESIÁSTICAS.


REJEITA, POIS, O COSTUME DE INTRODUZIR NOVIDADES ARBITRA
RIAS. .. OU DE RECUSAR, COM OBSTINACAO, QUANTO SE ESTA-
3ELECEU LEGÍTIMAMENTE COM RELACÁO AOS SAGRADOS RITOS. . .

A FIDELIDADE SE REFERE TAMBEM A GRANDE DISCIPLINA DA

IGREJA... DISCIPLINA QUE NAO é DE TAL ÍNDOLE QUE DEPRIMA


OU — COMO DIZEM ALGUNS — MORTIFIQUE, MAS QUE TEM EM
VISTA DEFENDER A SADIA ORGANIZACÁO DO CORPO MÍSTICO DE
CRISTO, A FIM DE QUE TODOS OS MEMBROS, UNIDOS ENTRE SI,
REALIZEM SUAS FUNCOES DE MODO EFICIENTE E NATURAL.

ALÉM DISTO, A FIDELIDADE EQUIVALE AO CUMPRIMENTO DAS


EXIGENCIAS DA VOCACÁO SACERDOTAL E DA VOCACÁO RELI
GIOSA, DE MODO QUE SACERDOTES E RELIGIOSOS OBSERVEM
SEMPRE O QUE LIVREMENTE PROMETERAM DIANTE DE DEUS E
PROCUREM MAIS E MAIS QUE A VIDA SEJA CONCEBIDA EM TODO
O SEU SENTIDO SOBRENATURAL.

POR ÚLTIMO, NO QUE DIZ RESPEITO AOS FIÉIS — SEGUNDO


INDICA A PROPRIA PALAVRA — CONVÉM QUE A FIDELIDADE SEJA
UMA ATITUDE QUE PROCEDA ESPONTÁNEAMENTE DA SUA CON-
DICÁO MESMA DE CRISTÁOS».

JOÁO PAULO II, aos 17/10/78

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