Educação em Debate: A Política Educacional em Múltiplos Contextos
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Educação em Debate - Marcia Nazário
UFPE
SUMÁRIO
apresentação
1
ESCOLAS PÚBLICAS RURAIS E URBANAS: O IMPACTO DA TRANSIÇÃO E ADAPTAÇÃO DOS ALUNOS NO ENSINO FUNDAMENTAL
Carmelo Souza da Silva
1.1 INTRODUÇÃO
1.2 RESULTADOS E DISCUSSÃO
1.3 DIFICULDADES E FACILIDADES NA FASE DE TRANSIÇÃO NOS DIFERENTES CONTEXTOS
1.4 A ESCOLA E A FAMÍLIA: PRINCIPAIS MEDIADORAS PARA UMA TRANSIÇÃO SEM SOFRIMENTO
1.5 RELACIONAMENTO SOCIAL NA NOVA FASE ESCOLAR: MEDO DO NOVO OU MEDO DO PRECONCEITO?
1.6 CONVIVER COM O DIFERENTE: DESCONFORTO, ESTRANHEZA, ANSIEDADE E ANGÚSTIA
1.7 REFLEXOS DA RUPTURA NO DESEMPENHO ACADÊMICO
1.8 ASSIDUIDADE, EVASÃO E DESEMPENHO ESCOLAR
1.9 UMA FORMAÇÃO NA CONTRAMARCHA DA IDEOLOGIA DO MOVIMENTO
1.10 CONSIDERAÇÕES FINAIS
1.11 REFERÊNCIAS
2
A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DENTRO DA POLÍTICA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO: ENTRE O DITO E O REALIZADO
Marcia Aurelia Nazário
2.1 INTRODUÇÃO
2.2 O REGIME DE COLABORAÇÃO E A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
2.3 PARCERIA COM O GOVERNO ESTADUAL NA IMPLEMENTAÇÃO DA EJA: ELEMENTOS DE DESRESPONSABILIZAÇÃO, CEDÊNCIA E RELAÇÕES
DE PARCERIA
2.4 O DISCURSO CONFORMISTA QUE REGE A EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS
2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
2.6 REFERÊNCIAS
3
POLÍTICA DE CORREÇÃO DE FLUXO ESCOLAR EM PERNAMBUCO: ANÁLISE DO PROGRAMA TRAVESSIA
Silvana Galvão de Aguiar
3.1 INTRODUÇÃO
3.2 POLÍTICAS DE CORREÇÃO DE FLUXO ESCOLAR IDADE/SÉRIE
3.3 CONCEPÇÃO DE FRACASSO ESCOLAR
3.4 PROGRAMAS DE CORREÇÃO DE FLUXO ESCOLAR EM PERNAMBUCO:
BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA
3.5 O PROGRAMA TRAVESSIA NO ÂMBITO DA POLÍTICA EDUCACIONAL DE PERNAMBUCO
3.6 PERCEPÇÕES DOS GESTORES SOBRE O PROGRAMA TRAVESSIA EM PERNAMBUCO
3.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
3.8 REFERÊNCIAS
4
A POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO NEOLIBERAL: UM ENFOQUE A PARTIR DOS CONTEXTOS GLOBAL E LOCAL
Carla Cristina de Moura Cabral
4.1 INTRODUÇÃO
4.2 CONTEXTUALIZANDO OS PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃO
4.3 A EDUCAÇÃO EM MEIO AOS EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO NEOLIBERAL:
UM OLHAR ENTRE O CONTEXTO GLOBAL E O LOCAL
4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
4.5 REFERÊNCIAS
5
OS IMPACTOS DOS INDICADORES EDUCACIONAIS NA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL E AS IMPLICAÇÕES DO PACTO FEDERATIVO NA INSTITUIÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
Antonio Agostinho da Silva Filho
5.1 A POLÍTICA DE FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL E O FUNDEB
5.2 A QUESTÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E DO PACTO FEDERATIVO.
5.3 A QUESTÃO DA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO E DOS INDICADORES EDUCACIONAIS
5.4 O ESTUDO EXPLORATÓRIO EM MUNICÍPIOS PERNAMBUCANOS QUE NÃO APRESENTARAM EVOLUÇÃO NA SÉRIE HISTÓRICA DO IDEB 2005-2015
5.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
5.6 REFERÊNCIAS
6
IMPACTOS E EFEITOS DA POLÍTICA DE BONIFICAÇÃO POR RESULTADO NO ESTADO DE PERNAMBUCO: O QUE DIZEM OS PROFESSORES?
Kysy Taysa Ferreira do Nascimento
6.1 INTRODUÇÃO
6.2 O PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO PÚBLICA/METAS PARA A EDUCAÇÃO E O SISTEMA DE AVALIAÇÃO DE PERNAMBUCO
6.3 BÔNUS DE DESEMPENHO EDUCACIONAL
6.4 IMPACTOS E EFEITOS DA POLÍTICA DE BONIFICAÇÃO POR RESULTADOS:
O QUE DIZEM OS PROFESSORES
6.5 AS CONCEPÇÕES EXPRESSAS PELOS PROFESSORES E OS IMPACTOS NA PRÁTICA DOCENTE
6.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
6.7 REFERÊNCIAS
APRESENTAÇÃO
A política educacional no Brasil vem sendo foco de muitas pesquisas e amplos debates. Pensar nela é pensar as especificidades e peculiaridades que abarcam um país com dimensões continentais, como é o nosso.
Cada momento histórico traz um debate específico das problemáticas que vêm sendo vivenciadas. Esta coletânea tem o objetivo de auxiliar os pesquisadores da área educacional. Os textos são resultados de pesquisas realizadas nos cursos de pós-graduação, mestrado e doutorado em Educação na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE e Universidad de La Empresa de Montevidéu –UDE. As pesquisas foram realizadas no período de 2014 a 2016.
Os textos que compõem este trabalho retratam algumas nuances da política educacional com pesquisas de abordagem qualitativa em diferentes enfoques temáticos: Política de Educação de Jovens e Adultos; Política de Educação do Campo; Gestão Educacional; Política de Correção de Fluxo e Política de Bonificação por Resultados.
Os textos trazem consigo diferentes aspectos das especificidades das políticas educativas, focando implementação, materialização e avaliação, bem como os seus diversos espaços de discussão. Trazem também a compreensão de que esse campo de estudo da política analisa o governo à luz de grandes questões públicas e, assim, entendem a política pública como a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou por meio de delegação, influenciando a vida dos cidadãos, uma vez que para entender a Política Educacional Brasileira é preciso focá-la no interior das políticas sociais.
Nesse contexto, as políticas sociais, dentre elas a educação, repousam na perspectiva de amenizar as desigualdades, na finalidade de conceder aos desprovidos de recursos materiais uma condição mínima básica para suprir suas necessidades.
Essas pesquisas tomam como referenciais a busca por uma compreensão da política, de forma não estanque, mas como algo que se constitui de forma não linear, a partir dos novos embates que emergem de diversas forças que buscam compreender e colaborar com a educação pública de qualidade para todos. Estudar a política educacional deve servir não apenas para entender, mas reivindicar, propor e difundir questões que envolvem a nossa conjuntura educacional com vistas à melhoria da qualidade da educação pública, assim como destacar a perenidade das políticas educacionais em nosso país, em que há programas de curta e longa duração que vão se modificando ao longo de cada governo de forma pouco estruturada, o que não contribui para a superação de algumas problemáticas históricas no campo educacional.
Os estudos apresentam apontamentos que contribuem com o campo da pesquisa em educação, no que cerne as discussões da política educacional, bem como diversos aspectos de modalidades e níveis de ensino que fazem parte da educação básica.
1
ESCOLAS PÚBLICAS RURAIS E URBANAS: O IMPACTO DA TRANSIÇÃO E ADAPTAÇÃO DOS ALUNOS NO ENSINO FUNDAMENTAL
Carmelo Souza da Silva
1.1 INTRODUÇÃO
O contexto histórico sobre a educação rural e a histórica luta dos movimentos campesinos por uma educação do campo, o qual se percebem as experiências pedagógicas em desenvolvimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST e seus múltiplos desafios para garantir a escolarização das crianças e adolescentes em escolas nos assentamentos foi o que impulsionou o desenvolvimento desta pesquisa.
É comum em todo início de ano letivo as escolas receberem alunos novos, transferidos de outras unidades de ensino, alguns de escolas mais próximas outros de escolas mais distantes, como vindos de sítios, acampamentos e assentamentos. Percebe-se que esses alunos precisam de um tempo para superação do impacto da ruptura e adaptação a uma nova convivência escolar. Nesse contexto, levantam-se questionamentos por intermédio da técnica de observação de campo, sem roteiro preestabelecido, por exemplo, verificando quem consegue se adaptar mais rapidamente e de forma indolor ao novo convívio escolar e o que pode facilitar ou dificultar o processo de adaptação desses alunos.
Entre os estudantes novatos, um grupo em particular chama atenção por uma inquietação maior, os filhos de camponeses assentados do MST, que estudaram desde o início de sua vida escolar em uma pequena escola localizada no próprio assentamento, e que não tem condições de oferecer àqueles alunos a continuidade necessária dos estudos. Sendo assim, eles foram obrigados a ser matriculados em uma escola pública regular da zona urbana, normalmente na escola menos distante do assentamento em que vivem com as famílias. São alunos entre 10 e 14 anos, que cursaram o 5° ano e vão para nova escola com o objetivo de dar continuidade aos estudos a partir do 6° ano, portanto se eles saíram de um modelo de ensino de pensar coletivo, de orientação marxista, que defende uma educação socializadora e igualitária a todos os cidadãos, é importante descobrir e analisar essa ruptura em diferentes contextos, as dificuldades, facilidades e combinações que possam contribuir para uma transição diferencial.
Para o desenvolvimento dessa investigação, contei com a participação de dois grupos de alunos do 5º ano do ensino fundamental I da rede pública municipal e estadual, com idades entre 10 e 14 anos (até os 14 anos em razão da grande quantidade de alunos fora da faixa etária), tanto nas escolas dos assentamentos do MST (representadas, nesta investigação, por EA-A; EA-B e EA-C), identificadas nesta pesquisa por G1 (composto por 15 sujeitos representados pelos símbolos S1 a S15), como nas escolas urbanas (representadas por EU-D; EU-E; EU-F), identificados como G2 (composto por 15 sujeitos representados pelos símbolos S16 a S30), devidamente matriculados e frequentando as aulas regularmente.
A pesquisa realizada é um estudo descritivo/exploratório que busca a clareza dos procedimentos técnicos e metodológicos, ou seja, a escolha de procedimentos sistemáticos para a descrição, interpretação e explicação dos fenômenos investigados ao longo do trabalho. Assim essa pesquisa tem uma abordagem metodológica qualitativa com aportes quantitativos, estabelecendo conexões de causa e efeito entre os fenômenos.
1.2 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na categoria do processo de transição escolar, foram analisadas e discutidas, às vésperas da ruptura, as dificuldades e facilidades na fase de transição nos diferentes contextos e a escola e a família, os principais mediadores para uma transição sem sofrimento.
Os 15 primeiros sujeitos entrevistados do G1 foram lembrados pelo pesquisador de que em breve seriam transferidos para outra escola, e perguntados se já conheciam a escola que iriam estudar no ano letivo seguinte; o que sabiam sobre ela; quem falou e o que falou sobre essa escola. A partir das respostas, foi possível perceber que a maioria não conhecia a sua futura escola e que as informações passadas não foram suficientes para um melhor conhecimento do novo ambiente de ensino. Como se pode identificar nos discursos originais transcritos a seguir.
Não conheço... nunca estive nela, mas sei onde fica... fica na cidade. Minha mãe já passou comigo por ela... ela mostrou para onde eu vou quando sair dessa escola aqui. Eu não sei como é lá, como é por dentro e como funciona. O que sei é que lá vai ser muito diferente em tudo. Vai ser muito mais difícil. Minha mãe e minha professora falam que lá o estudo é mais difícil. (S6 – G1 da EA-B).
Meus irmãos estudam lá. Eu já fui lá algumas vezes. É uma escola muito grande... tem computadores, tem biblioteca, tem uma quadra... eu já fui lá com a minha mãe algumas vezes... meus irmãos falam muito de lá... tudo que acontece lá ele fala. Lá não é igual aqui, é muito diferente. (S1 – G1 da EA-A).
Considerando os discursos citados, os dos demais sujeitos do G1 e por meio de analogia, pode-se afirmar que 80% não conhecem a escola que estarão estudando no ano letivo seguinte. Os outros 20% dos sujeitos do G1 que também foram agrupados por analogia a outro discurso original, são alunos que têm algum irmão ou irmã que já estudam naquela escola, portanto são aqueles que acreditam que já conhecem a escola que irão estudar pelo fato de terem ido até ela algumas vezes em razão dos irmãos. Segundo Morissawa, existe uma cumplicidade muito importante entre escola e família nas áreas de acampamento e assentamentos
¹. A escola para as crianças foi uma preocupação desde as primeiras ocupações do MST nas terras dos latifúndios. Foram pais, professores e estudantes que formaram as primeiras comissões para reivindicar e organizar escolas nos acampamentos e assentamentos. Foi nesse contexto que surgiu o Setor Nacional de Educação do MST, portanto entende-se não ser prudente e/ou justo vincular a falta de orientação dos sujeitos do G1 na transição para a nova jornada escolar a uma suposta falta de vontade ou desinteresse dos pais ou responsáveis.
Os 15 sujeitos do G2, entrevistados nas três escolas urbanas, após serem lembrados pelo pesquisador de que em breve estariam iniciando uma nova fase escolar na mesma escola em que já vinham estudando as séries anteriores foram questionados sobre como estavam sendo preparados para a nova fase e como imaginavam que seria. As respostas demonstraram que, embora esses alunos já frequentassem a escola em anos anteriores, eles não estavam bem informados sobre o a transição para o 6º ano do ensino fundamental.
Para melhor compreensão dos resultados, vejamos algumas respostas dadas.
Eu não sei como funciona, mas imagino que seja muito agitado... vai ter muitos professores... aqui a gente só tem uma professora. Vai ter muitas matérias difíceis, muitas tarefas e muitos livros. (S18 – G2 da EU-D).
Eu penso que vai ser bem diferente, com muitos professores e muitos colegas novos... minha mãe e minha professora já falaram algumas vezes que no próximo ano vai ser mais complicado. Vai ter mais matérias difíceis. (S27 – G2 da EU-F).
Como podemos perceber, às vésperas de uma mudança importantíssima na vida escolar desses alunos, são precárias as informações que eles têm sobre a sua futura fase escolar. Sendo assim, pode-se afirmar que 100% desse grupo também tem informações limitadas sobre sua futura fase escolar. Para Silva, a falta de informações mais detalhadas, por parte dos pais, sobre o funcionamento das escolas e, em particular, sobre a nova fase escolar que os filhos estão ingressados, contribui para uma transição sofrida
².
1.3 DIFICULDADES E FACILIDADES NA FASE DE TRANSIÇÃO NOS DIFERENTES CONTEXTOS
Foi solicitado aos alunos de ambos os grupos que relacionassem algumas dificuldades e facilidades que imaginavam ter com a nova fase escolar. Quanto às respostas oferecidas pelos sujeitos do G1, a maioria (86%) demonstrou consciência crítica sobre as condições que vivenciariam em sua nova jornada escolar. As respostas a seguir corroboram para uma melhor compreensão dos resultados.
São muitas as dificuldades... a escola fica muito longe do assentamento, a estrada é muito ruim e fica pior quando chove. Muitas vezes a gente não consegue chegar lá quando chove. A gente tem que acordar muito cedo para não perder