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Antologia Steampunk
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Antologia Steampunk

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Quatro contos de quatro escritores, onde é explorado um pouco do imenso mundo movido a vampor que é o Steampunk.

"Relógios e Bruxarias", por Inês Montenegro:
Numa sociedade em que a magia é ilegal e a bruxaria perseguida, o desejo de Mina em ver vingar o seu negócio leva-a a afastar sentimentos e preocupações.
Até ao dia em que Helena lhe pede auxílio.

"A Ascensão e Queda de “Zé Saltador”", por Ricardo Dias:
Spring-heeled Jack, mito urbano e criminoso profissional, decide escapar de Inglaterra e usar Portugal para iniciar uma carreira internacional. Mas nem tudo corre como planeado...

"A Mina de Carvão", por Carina Portugal:
Em colaboração com o Império Português, Charlotte Reeve, uma das melhores agentes da Coroa Britânica, é enviada para a cidade de Tete, em Moçambique. A sua missão é capturar vivo um dos mais retorcidos traficantes de humanos. Mas consegui-lo-á?

"A Canção da Fornalha", por Pedro Cipriano:
A grande fornalha é o coração da cidade. A sua música não deixa ninguém indiferente, muito menos o mestre das caldeiras.

LanguagePortuguês
PublisherFantasy & Co.
Release dateDec 14, 2015
ISBN9781311180070
Antologia Steampunk
Author

Fantasy & Co.

Fantasy & Co é um projecto que resulta da colaboração de vários escritores portugueses da literatura fantástica, e que tem como objectivo difundir este género literário, bem como o de divulgar o trabalho dos intervenientes. Fantasy & Co nasceu da vontade de criar um espaço totalmente dedicado à literatura fantástica. Num universo virtual saturado de espaços individuais, este blogue vem concretizar a esperança de trabalharmos em função de um objectivo comum: Divulgar a Literatura Fantástica Portuguesa. Aqui propomos a aproximação dos leitores ao trabalho dos autores emergentes no domínio do fantástico. Proporcionamos o espaço onde o cruzamento de ideias e experiências contribuem para a expansão deste género literário. Apostamos na inspiração de e para Portugueses. Neste espaço vão encontrar textos originais, no formato de Contos de dimensão reduzida ou distribuídos por vários artigos, todos sobre o domínio da literatura fantástica, publicados periodicamente e sob a égide de um olhar atento às preferências dos nossos leitores. Para um público apreciador de fantasia, de criações literárias originais, de autores dedicados ao género, apresento-vos Fantasy & Co e convido-vos a participar neste projecto, uma viagem inédita ao mundo da Literatura Fantástica Portuguesa.

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    Antologia Steampunk - Fantasy & Co.

    Relógios e Bruxarias,

    por Inês Montenegro

    I

    Os relógios dominavam a loja. Não havia pedaço de parede que se encontrasse à vista, com excepção da cortina amarela por trás do balcão. Alguns pendiam do tecto; uma meia dúzia estava simplesmente pousada no chão. Os ponteiros moviam-se em uníssono, os segundos avançando em perfeita sintonia. Não havia um aparelho que mostrasse uma hora diferente da de outro, e a luminosidade do local deixava-o em evidência.

    Tic-toc-tic-toc.

    Não eram muitos os clientes que por ali passavam. Por vezes atendia uma senhora em busca de um presente para um cavalheiro, ou recebia um desesperado por um relógio de bolso que substituísse o que fora perdido – para não dizer roubado – nessa mesma manhã. A maioria dos clientes eventuais preferia os negócios por encomenda.

    Todavia, não era a clientela da porta da frente quem lhe sustinha o negócio.

    Mina estava a ter um dia calmo. Passara a manhã a trabalhar no concerto de um relógio de cuco, almoçara uma sandes nos jardins públicos a dez minutos da relojoaria, e regressara a tempo de discutir com o serviço de entregas a melhor maneira de transportar o relógio de corda que o Visconde d’Arreios encomendara. Franzia o cenho à bainha da saia, que acabara de descobrir descosida, quando o estrondo se fez ouvir. Ergueu os olhos surpreendida, ouvindo o chilrear alarmado que se seguiu, assim como os gritos e as solas em fuga. Não demorou para que o alarme se sobrepusesse a tudo o mais.

    Não pode ter sido muito longe, ponderou. A curiosidade dirigia-a para a entrada da loja quando a porta se abriu num rompante, fazendo tocar a campainha. Uma mulher alta, envergando um fato de calça e casaco bege, e de caracóis negros apanhados num coque, irrompeu pelo local. Os olhos avelã fitaram-na em súplica, parecendo deslocados do rosto de feições duras. Respirava com dificuldades.

    − A-atrás de mim… E-eles vêm… por favor…

    Mina afastou-se, apontando para a cortina amarela. A mulher não hesitou, saltando por cima do balcão e escondendo-se nas traseiras da loja, onde os relógios em reparação eram mantidos. A relojoeira retornou ao seu posto, retirando a caixa duma das prateleiras que constituíam as traseiras do balcão, e sentando-se a refazer a bainha. A necessidade de atenção para que os pontos fossem precisos dispersava-lhe a irritação.

    Tic-toc-tic-toc.

    A campainha voltou a tocar, desta vez dando entrada a um par de guardas. Mina sentiu uma má-disposição imediata, os olhos vagueando sobre os amuletos anti-bruxaria que lhes pendiam do pescoço. Um complemento à farda azul e branca que havia sido recentemente ajustado com as Armações Bélicas Lopes & Cia, num acordo que os jornais da oposição clamavam ter sido feito mais por interesses pessoais que pelo bem comum.

    − Posso ajudá-los? – perguntou, largando bruscamente a saia. Embora a opinião pública começasse a fazer menos alarido em relação a tornozelos à mostra, ainda não era algo que fosse encarado com total naturalidade. E nos seus esforços costurais, Mina tinha puxado a sua veste bem acima do joelho.

    − As nossas desculpas, minha senhora. – A visão das suas pernas cobertas apenas pelo conjunto interior havia deixado os cavalheiros claramente embaraçados. – Procuramos por um bandido, responsável pela… Ouviu a explosão de há pouco?

    Mina torceu o nariz.

    − Teria sido impossível não a ouvir, causou um distúrbio insuportável nos meus relógios. Perdi tempo a ajeitá-los a todos novamente, e quando acabei apercebi-me que não estava em condições de sair à rua – explicou, apontando para a caixa de costura, aberta sobre o balcão. – Ainda não tive oportunidade de ir ver o que se passou – confessou, num suspiro lamuriento.

    Não tardou a que o embaraço dos oficiais fosse substituído por um misto de condescendência e aborrecimento por assuntos que não lhes interessavam.

    − Sim, uma coisa menor – cortou rapidamente o mais velho dos dois. – Procuramos o responsável. Um homem atarracado, de mau aspecto…

    − Não vi ninguém que se assemelhasse.

    − Julguei que assim fosse. Mas, por protocolo, teremos de revistar o local. Compreende, estamos a fazê-lo com todos os edifícios das redondezas.

    A relojeira falseou os queixumes preocupados, contendo aqueles que verdadeiramente desejava expressar ao ver as mãos inábeis mexerem-lhe nos relógios. Que esperavam ao levantar os engenhos que se prendiam à parede? Uma passagem escondida? Que o próprio procurado lhes saltasse por entre roldanas?

    O oficial mais novo – e mais desleixado – aproximou-se da cortina amarela.

    − Espe…!

    Viu-o afastar-se, as bochechas tingindo-se de rubro. O aviso de Mina não chegara a tempo, não o impedindo de ver fosse o que fosse que a mulher que albergara teatralizara para o afastar.

    − Nada – conseguiu tossicar para o companheiro. – Tudo limpo.

    − As nossas desculpas pelo incómodo – formalizaram, antes de abandonarem a relojoaria ao som do sino.

    − Homessa – murmurou Mina, trancando a porta atrás deles e virando a tabuleta de Fechado. Não demorou a disparar em direcção aos fundos, compreendendo, assim que afastou a cortina, o que tinha atarantado o oficial.

    A mulher encontrava-se de costas para si, o coque agora solto, libertando-lhe os cabelos costas abaixo. Olhava-a por cima do ombro, uma covinha acompanhando-lhe o sorriso. Estava escandalosamente nua.

    Não admira que o homem tenha ficado maduro, considerou Mina.

    − Não te posso manter aqui – alertou, enquanto a outra recuperava as roupas e as ia enfiando pelo corpo. – Nem quero.

    A mulher assentiu.

    − Obrigada, irmã. Já fizeste muito.

    Mina enregelou ante o vocativo.

    − Não sou tua irmã.

    A gargalhada veio contida. Novamente de costas para ela, a mulher refazia o coque como podia.

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